segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Celso Rocha de Barros: Estou pessimista demais?

- Folha de S. Paulo

Tudo indica que o impulso autoritário do futuro governo é real

Alguns eleitores de Bolsonaro me perguntaram se as últimas colunas não foram pessimistas demais. A propósito, fora da internet há, sim, bolsonaristas prontos para discutir educadamente.

Minhas expectativas para o governo Bolsonaro são mesmo muito, muito ruins. Mas é possível que eu esteja errado, porque talvez os otimistas tenham informações que eu não tenho.

Vou dizer o que sei. Se você souber mais do que eu, sinta-se livre para ser mais otimista com Bolsonaro.

Minha principal preocupação com o novo governo é o risco que ele representa para a democracia. Quase todo mundo concorda comigo: mas tem gente boa que acha que a melhor estratégia para evitar uma escalada autoritária é tratar Bolsonaro como se fosse um presidente normal e torcer para que ele tope participar da conversa nesses termos.

Temos excelentes motivos para nos preocuparmos: não, as declarações golpistas de Bolsonaro, Mourão e Eduardo não eram brincadeira.

O núcleo duro do bolsonarismo é entusiasta do que havia de pior no regime militar. Da proposta de ampliação do número de juízes no Supremo (que pode voltar à mesa como revogação da PEC da bengala) à tipificação do protesto político como terrorismo, passando pelo uso de verbas públicas para pressionar a imprensa, tudo indica que o impulso autoritário do futuro governo é real.

Mas talvez haja gente que conheça muito melhor as Forças Armadas do que eu e que saiba que ninguém ali apoiaria, em nenhum cenário, uma escalada autoritária bolsonarista. Sem ao menos a ameaça de intervenção das FFAA (Forças Armadas), o resto das instituições brasileiras manteria Bolsonaro na linha.

Torço para que essas pessoas existam, e para que estejam certas, mas chamo atenção para duas coisas: os analistas que não veem risco para a democracia brasileira até outro dia ridicularizavam Mourão como uma exceção nas FFAA, uma piada, e hoje ele é vice-presidente da República.

E, que eu me lembre, todos esses analistas apostavam que candidatos de centro eram favoritos na eleição presidencial de 2018.

Também sou pessimista com a economia em um governo Bolsonaro. Os depoimentos do novo presidente na semana passada pareciam tirados do programa do Partido da Causa Operária. O novo czar da economia tem demonstrado um nível de habilidade política que faz Dilma Rousseff parecer Tancredo Neves.

Se Fernando Haddad tivesse sido eleito e dito essas mesmas coisas, o mercado teria implodido. Não implodiu, talvez porque haja gente bem informada que saiba de compromissos razoáveis entre Guedes, o Congresso e Bolsonaro.

Torço para que essas pessoas existam, e para que estejam certas, mas volto a lembrar: os otimistas com a economia de Bolsonaro também apostavam que o Brasil em 2018 chegaria na eleição de 2018 crescendo algo como 3,5%, o que, novamente, garantiria a eleição de um candidato de centro.

Enfim, o que me preocupa é que, se o pessoal otimista com Bolsonaro tivesse acertado no último ciclo, hoje o presidente seria Geraldo Alckmin.

Nada disso garante que Bolsonaro será um desastre. O pessoal que errou da última vez pode acertar nessa —acontece toda hora, política é muito difícil de prever.

Mas ainda acho que os otimistas só vão acertar se forem capazes de obrigar Bolsonaro a se adequar às suas previsões.
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Celso Rocha de Barros, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

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