segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Limites abaixo do céu: Editorial | Folha de S. Paulo

Sob Bolsonaro, política externa brasileira ensaia maior alinhamento aos EUA

No final de novembro, Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, visitou integrantes do governo Donald Trump em Washington e se deixou fotografar usando um boné com o slogan do republicano, “Faça os EUA grandiosos de novo”.

Na quinta-feira (6), após raro voto do Brasil a favor de Israel na ONU, em moção que condenava a facção radical Hamas, o deputado elogiou o Itamaraty e a embaixadora americana, Nikki Haley. Na véspera, em evento em São Paulo, o futuro chanceler, Ernesto Araújo, afirmara que“o céu é o limite” para a relação com Washington.

Os episódios insinuam prontidão em se alinhar ao governo Trump. Estando obscuro o que o Brasil ganhará com tal dedicação, torna-se difícil ver nesses passos mais do que simpatia ideológica, algo que Jair Bolsonaro (PSL) prometera expurgar da política externa.

Historicamente, Brasil e EUA mantêm relação engrenada sob todos os presidentes, exceto pelo breve mal-estar de Dilma Rousseff (PT) ao se ver espionada, em 2013.

Em que pesem o antiamericanismo de assessores de Luiz Inácio Lula da Silva e a atrofia diplomática dos sucessores, é falacioso alegar que o Brasil tenha se afastado de seu segundo parceiro de negócios, a maior economia do planeta, que perfaz 12% da balança comercial.

É igualmente ingênuo não ver limites para a relação bilateral. O Brasil, afinal, não constitui aliado estratégico para os americanos. Localiza-se em região estável, sem bombas nucleares nem ameaças a interesses americanos.

Não haveria, portanto, atrativo para Trump despender mais atenção a Brasília, sobretudo estando às voltas com uma investigação que pode lhe custar a Presidência e a campanha à reeleição em 2020.

Tal quadro pode mudar caso a situação na Venezuela se agrave, alçando o Brasil a parceiro necessário. Excluído esse cenário calamitoso, porém, o espaço para mudança de patamar é exíguo.

Os dois países mantêm uma profusão de debates, dos quais poucos avançam. Concentrar os diálogos em pautas mais concretas, como a energética, traria ganhos a ambos.

O acordo de bitributação para poupar cidadãos e empresas expatriados de pagar imposto a dois governos pode retornar à agenda.

Já a dispensa de vistos para brasileiros está além dos presidentes. A crise econômica fez saltar a busca pelo documento e, com ela, a rejeição de pedidos, deixando o país longe do nível que a lei americana impõe para liberar a exigência.

Distante também está um acordo de livre comércio, cuja confecção leva mais de quatro anos e enfrenta um Congresso democrata.

O imenso poder econômico e político dos Estados Unidos é, sem dúvida, atraente. A aproximação não pode, contudo, ofuscar o pragmatismo e prescindir de negociação.

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