sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Caminho longo e difícil para a abertura comercial: Editorial | Valor Econômico

O Brasil vai deslanchar um processo de abertura comercial, anunciou o presidente Jair Bolsonaro, nesta semana, no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. Aqui, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que o projeto faz parte das metas estabelecidas para os cem primeiros dias de governo e contem medidas para facilitar o comércio, a convergência da regulamentação, a reforma da estrutura tarifária e a negociação de acordos comerciais.

Acredita-se que a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, vai tomar como ponto de partida a resolução da última reunião de 2018 da Câmara de Comércio Exterior (Camex), que reduziu a tarifa média de importação de bens de capital e de informática de 14% para 4% nos próximos quatro anos. Originalmente, pretendia-se que a medida saísse na sequência do acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Como esse acordo acabou adiado, o governo Temer considerou oportuna uma decisão unilateral da Camex, marcando a retomada da abertura comercial do país para modernizar a indústria de bens de capital e de informática, processo interrompido no fim da década de 1990. A decisão não foi publicada e ficou como herança para Bolsonaro.

O Brasil tem uma economia reconhecidamente fechada e um comércio internacional aquém do tamanho da sua economia. A incipiente recuperação de 2018 aumentou em 19,7% as importações, para US$ 181,1 bilhões, enquanto as exportações cresceram 9,6% para US$ 239,5 bilhões, totalizando uma corrente de comércio de pouco mais de US$ 420 bilhões. Levando em conta os números de 2017, a Organização Mundial do Comércio (OMC) classificou o Brasil como o 26º maior exportador, atrás da Polônia, Tailândia e Malásia; e como o 29º maior importador. A fatia do Brasil nas exportações é de 1,2% do total; e das importações, de apenas 0,9%.

Os defensores da liberalização comercial entendem que, ao oxigenar a indústria com bens importados, o governo estará estimulando ganhos de produtividade e de competitividade. Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com base nos dados de 2015 chegou à impressionante conta de que o custo da economia fechada para a população era de R$ 130 bilhões em um ano. Esse era o preço a mais pago por consumidores e empresas pelos produtos domésticos na comparação com seu equivalente disponível no mercado internacional (Valor 13/11/18). Ou seja, a sociedade economizaria R$ 130 bilhões se houvesse tarifa zero e livre concorrência. Na prática, esse montante foi "transferido" dos consumidores para os produtores de 67 atividades econômicas. A indústria automobilística é a maior beneficiária da proteção tarifária - R$ 18,7 bilhões, calcula o Ipea. Em seguida vêm os setores de abate e produtos de carne, produtos alimentares, vestuário e acessórios, bebidas e produtos de metal, móveis, borracha e plástico, informática e produtos eletrônicos.

Bolsonaro agora promete abrir a economia e fazer negócio com todo o mundo, "sem viés ideológico", garantindo que as relações exteriores serão "dinamizadas" - tarefas entregues ao ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Em seu discurso de estreia internacional, o presidente disse que o Brasil vai se integrar ao mundo "por meio da incorporação das melhores práticas internacionais, como aquelas que são adotadas e promovidas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Defendeu a reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC) para "eliminar práticas desleais de comércio e garantir segurança jurídica das trocas comerciais internacionais".

Alguma coisa já foi feita. É o caso do Portal Único do Comércio Exterior, implantado no ano passado, que permitirá às empresas exportadoras economizar R$ 44 bilhões por ano em custos logísticos e facilitará a fiscalização aduaneira. O portal fez o Brasil ganhar 33 posições no ranking de comércio exterior do relatório Doing Business 2019, do Banco Mundial, passando da 139ª para a 106ª colocação.

Mas há vários desafios pela frente. A intenção de mudar a embaixada em Israel para Jerusalém, por exemplo, já causou impacto nas vendas de carnes para os países árabes e mostrou a influência do "viés ideológico". Há a guerra comercial em curso entre as grandes potências, que tem respingado em várias áreas de negócio do Brasil, como o aço. A disputa ainda ocorre em momento de desaceleração global, que certamente afetará as relações comerciais. Os empecilhos não devem adiar os planos, mas indicam que o momento é para se avançar com cautela e perseverança.

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