quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Míriam Leitão: Brasil faz aposta de alto risco

- O Globo

Por Alvaro Gribel - (Míriam Leitão está de férias)

A decisão de reconhecer o líder da oposição venezuelana como novo presidente do país quebrou a tradição conciliadora do Itamaraty, mas havia poucas opções ao governo brasileiro, na visão do ex-embaixador Rubens Ricupero. Ele diz que agora o Brasil terá que torcer por uma solução rápida, com a queda de Maduro. Do contrário, “haverá consequências imprevisíveis” para a região. “É uma situação que cria um precendente preocupante, mas que está ocorrendo dentro de um caso extremo. Chegou-se a uma situação impossível, com fome e falta de remédio. Não havia no horizonte outro tipo de solução. Os dois lados não queriam o diálogo”, afirmou.

A maior preocupação do ex-embaixador é a possibilidade de uma guerra civil ou de uma invasão armada de outros países, com participação brasileira. Para ser legal do ponto de vista do direito internacional, teria que haver autorização do Conselho de Segurança da ONU, onde Rússia e China, parceiros da Venezuela, têm poder de veto. “Se houver luta armada na Venezuela, a primeira consequência é o aumento do fluxo de refugiados para o Brasil. Além do mais, Roraima depende da eletricidade da Venezuela, que vem da represa do Guri”, explicou.

O governo brasileiro fez uma aposta de alto risco e poderá ser arrastado para um conflito armado, mas a posição foi atenuada pela participação de outros países do Grupo de Lima, diz Ricupero. Ainda assim, ele avalia que o melhor seria o Brasil ter tentado uma posição autônoma, buscando um papel conciliador na região. “A tradição foi quebrada completamente, a última vez que fizemos isso foi em 1965 na República Dominicana”.

Risco de guerra civil
O economista Angel García Banchs, da consultoria venezuelana Econométrica, abandonou a Venezuela e hoje está refugiado na Espanha. De lá, contou à coluna que o clima em seu país mudou e que não acredita em uma solução pacífica. “Maduro está há 20 anos se preparando para isso e não vai se entregar. Uma guerra civil é inevitável”, disse. Para o economista, a oposição terá que contar com o suporte militar internacional, incluindo Brasil, Estados Unidos, Colômbia e Inglaterra. “Este é o meu prognóstico, haverá uma coalizão de forças armadas”.

Sem paridade e integralidade
A proposta de aumentar de 30 para 35 anos o tempo de serviço dos militares brasileiros e de elevar a alíquota de contribuição das pensionistas é boa, porém, insuficiente para conter o aumento da despesa com inativos das Forças Armadas. O maior problema é a manutenção da integralidade e da paridade dos inativos, principalmente para aqueles que vão cedo para a reserva. Ou seja, quem vai para a reserva ou é reformado ganha o último salário e tem os mesmos reajustes dos que estão na ativa. Para se ter uma ideia, até meados de 2040 o país ainda deve ter militares se tornando inativos com as regras anteriores à minirreforma de 2001, que cortou benefícios.

Projeção de gasto é caixa-preta
Nem mesmo os especialistas em Previdência conseguem calcular o quanto o Brasil gastará a mais com as Forças Armadas nas próximas décadas. Isso porque os militares não divulgam os cálculos atuariais e também não revelam informações ao TCU sob alegação de que isso colocaria em risco a segurança nacional. Uma coisa é certa: o dinheiro gasto com os inativos deixa de ir para os investimentos militares e com isso o país está ficando para trás em equipamentos de alta tecnologia. Entre as caixas-pretas que o presidente Jair Bolsonaro prometeu abrir, está faltando a dos próprios militares.

Inversão da lógica
Se o objetivo do presidente é mesmo dar o exemplo para facilitar a aceitação às mudanças na Previdência, faz mais sentido começar pelos militares. Primeiro, porque a reforma poderá ser feita por projeto de lei, que precisa de menos votos na Câmara e no Senado do que uma alteração constitucional. Segundo, porque Bolsonaro passou a vida parlamentar defendendo os interesses das Forças Armadas, e isso significaria cortar na própria carne. Começar pelos militares já em fevereiro daria uma forte sinal aos mercados e abriria caminho para o debate mais profundo das demais categorias.

Com Marcelo Loureiro

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