quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Ribamar Oliveira: Outras medidas impopulares de ajuste

- Valor Econômico

Nova fórmula para o salário mínimo pode não ter reajuste real

Embora a atenção da sociedade esteja voltada para a proposta de reforma da Previdência Social que o governo Jair Bolsonaro irá encaminhar ao Congresso, a equipe econômica prepara outras medidas que também terão grande dificuldade de aprovação. Elas são necessárias para o governo cumprir o teto de gastos da União nos próximos anos. Bolsonaro terá, por exemplo, de propor uma nova fórmula de correção do salário mínimo, que valerá a partir de janeiro de 2020.

Durante a transição, a equipe econômica do ex-presidente Michel Temer sugeriu ao novo governo, em documento, que não fosse concedido aumento real para o salário mínimo durante, pelo menos, os próximos três anos. O mínimo seria reajustado apenas pela inflação do ano anterior, medida pelo INPC. Com isso, o valor real do piso salarial seria mantido constante nos próximos anos. Até 2019, o mínimo foi corrigido pelo INPC e acrescido de um aumento igual ao crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes.

Com a medida, a equipe de Temer estimou ser possível economizar R$ 7,6 bilhões em 2020, R$ 22,3 bilhões em 2021 e R$ 39,1 bilhões em 2022. A economia nos três anos seria, portanto, de R$ 69 bilhões. O salário mínimo é o piso dos benefícios previdenciários e assistenciais.

Se ele não tiver aumento real, as despesas previdenciárias e assistenciais também serão menores. De acordo com o anexo de riscos fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), válida para 2019, cada R$ 1 de aumento no salário mínimo gera um incremento de R$ 303,9 milhões ao ano nas despesas do governo.

Há um dado curioso na projeção feita pela equipe de Temer e que consta do documento intitulado "Panorama Fiscal Brasileiro": o ganho fiscal de 2020 a 2022 com a ausência de aumento real para o mínimo seria maior do que a economia a ser obtida com a reforma da Previdência Social no mesmo período (ver tabela abaixo).

Se a emenda aglutinativa à proposta de reforma da Previdência Social, que estava sendo relatada pelo deputado Arthur Maia (DEM-BA), fosse aprovada, a área econômica de Temer acreditava ser possível obter uma economia de despesas de R$ 6,3 bilhões em 2020, primeiro ano de vigência das mudanças, R$ 18,6 bilhões em 2021 e R$ R$ 32,8 bilhões em 2022, em um total de R$ 57,7 bilhões no período. O montante é, portanto, inferior ao que seria obtido com a ausência de reajuste real para o mínimo.

Outra medida sugerida pela equipe econômica de Temer foi suspender, por um determinado período, reajustes salariais para os servidores da União. Além disso, a proposta prevê a realização de concursos públicos apenas para reposição de vagas, ou seja, não haveria criação de postos na administração federal direta.

Temer tentou adiar o reajuste dos servidores do Executivo previsto para primeiro de janeiro deste ano. Não conseguiu, pois o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar cancelando a medida. Em julho deste ano, haverá nova rodada de negociação do governo com os servidores do Executivo. Neste momento, a equipe econômica terá que dizer se negará o reajuste salarial para 2020.

A questão mais delicada nessa área é que o governo federal não tem ingerência nas políticas de pessoal do Judiciário e do Legislativo. Se os servidores desses dois poderes e do Ministério Público da União tiverem aumento salarial, será difícil o governo negar, por muito tempo, reajuste para os servidores do Executivo.

Como o pagamento de servidores ativos e inativos, civis e militares é a segunda maior despesa primária do Orçamento da União, a ausência de reajuste salarial teria forte impacto nas contas. A equipe de Temer estimou uma economia de R$ 15,4 bilhões em 2020, R$ 30,4 bilhões em 2021 e R$ 50,9 bilhões em 2022. Ou seja, o ganho fiscal seria de R$ 96,7 bilhões em três anos - bem acima da economia que seria obtida com a reforma da Previdência Social nos três primeiros anos.

Uma terceira medida sugerida pela equipe de Temer foi mudar as regras de elegibilidade para recebimento do abono salarial. Atualmente, os trabalhadores que ganham até dois salários mínimos têm direito ao benefício. A proposta é que apenas os trabalhadores que ganham até um salário mínimo por mês continuem a receber o abono.

Com a adoção dessa proposta, o Ministério da Fazenda de Temer estimava que a economia seria de R$ 7,9 bilhões em 2020, de R$ 17,1 bilhões em 2021 e de R$ 18,1 bilhões em 2022. Ou seja, no espaço de apenas três anos, o ganho fiscal com a medida seria de R$ 43,1 bilhões.

Se todas as medidas sugeridas fossem aprovadas, incluindo a reforma da Previdência, a estimativa do Ministério da Fazenda era de que seria obtida uma economia de R$ 37,2 bilhões em 2020, de R$ 88,5 bilhões em 2021 e de R$ 141 bilhões em 2022. Com isso, a equipe de Temer acreditava que seria possível manter o teto de gastos, sem cortar excessivamente os investimentos e as despesas de custeio da máquina administrativa.

Não se sabe ainda quais medidas desse "cardápio amargo" apresentado pela equipe de Temer foram acolhidas pela equipe econômica de Bolsonaro. Mas parece evidente que não será possível adotar medidas muito diferentes do que as que foram sugeridas durante a transição de governo.

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