quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Isabel Versiani: Enquanto a reforma não vem

- Valor Econômico

Amarração política da sabatina ainda é dúvida

A aprovação célere da nomeação do novo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pelo Senado Federal pode ser a primeira boa notícia entregue por esta legislatura ao mercado, que aguarda ainda pacientemente informações sobre as perspectivas para o andamento da reforma da Previdência. A transição no Banco Central é objeto de zero preocupação entre bancos e investidores, mas a oficialização da troca de comando da autarquia abre uma janela de agenda positiva e pode ser também uma demonstração de vigor político do governo, a depender do placar das votações da nomeação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e no plenário.

Com a definição da composição da CAE e a ratificação do nome do senador Omar Aziz (PSD-AM) como seu novo presidente, previstas para esta quarta-feira, a expectativa é que a comissão seja instalada na próxima semana. Isso abre espaço para que a sabatina de Campos Neto na comissão seja marcada para a última terça-feira do mês (dia 26). Em caso de aprovação, sua participação na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em meados de março, estará garantida.

A esperada corroboração de que Campos Neto pretende seguir cartilha semelhante a de Ilan Goldfajn na política monetária e regulatória trará conforto ao mercado e porá em destaque uma pauta que é, em geral, favorável ao governo. A taxa básica de juros vai completar um ano no nível mais baixo da história, as contas externas estão comportadas e o crédito começa a ganhar fôlego, apesar do ritmo de recuperação da atividade ainda modesto. Nesse contexto, a nomeação de Campos Neto, que estava há oito anos no banco Santander, tem sido bem recebida. Suas primeiras indicações para a diretoria do BC - os economistas Bruno Serra e João Manuel Pinho de Mello, que igualmente precisarão passar pelo crivo do Senado - também agradaram os agentes.

As incertezas ficam por conta da condução de uma sabatina no Senado na nova conjuntura política. Normalmente um ritual protocolar, com frequência modorrento, as arguições nas comissões do Senado só costumam surpreender ou gerar ansiedade em momentos de esgarçamento nas relações do Congresso com o Executivo. Um exemplo extremo foi a sabatina do agora ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Edson Fachin, que aconteceu em 2015 em um ambiente tenso pós eleição de Dilma Rousseff em um pleito polarizado e em meio ao avanço da Lava Jato sobre políticos, incluindo o então presidente do Senado Renan Calheiros (MDB-AL). Fachin foi submetido a um suplício de mais de 12 horas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ter seu nome aprovado.

Nada semelhante é esperado para Campos Neto na CAE. Mas a forma como a sabatina será amarrada politicamente é um ponto de interrogação em um Senado que não conta ainda com um líder do governo e é conduzido por um presidente estreante na função. As cenas de embates explícitos vistas no processo de eleição do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) dão uma ideia de como a liturgia pode desandar em caso de exaltação de nervos. Temores de algo nessa linha ocorra na CAE podem ser amenizados ou agravados a depender do perfil da nova composição da comissão, tradicionalmente ocupada pelos senadores que estão entre os mais influentes da Casa.

Superada a sabatina, um próximo desafio para o Congresso poderá vir também do Banco Central. A garantia da independência da autarquia está entre as metas dos primeiros 100 dias do governo Bolsonaro. Pressupõe-se, portanto, que a meta poderá ser considerada descumprida se não houver aprovação de um projeto estabelecendo essa independência até meados de abril. O prazo é exíguo. Ainda que, conforme esperado, o governo opte por trabalhar pela aprovação de um substitutivo do deputado Celso Maldaner (MDB-SC) que já estava pronto para ser votado no plenário da Câmara dos Deputados no final da legislatura passada, será preciso assegurar apoio ao texto entre os deputados e ainda promover a tramitação no Senado.

O ritmo desse andamento estará obviamente condicionado às exigências impostas pelo avanço da reforma da Previdência, prioridade número um, e não há como prever se o horizonte de cerca de sete semanas será suficiente para assegurar a aprovação da independência. Se forem, o governo marcará um gol. A independência, considerada uma blindagem institucional importante para o Banco Central contra pressões políticas, é um desejo antigo dos economistas ortodoxos e dos mercados. Por outro lado, se o projeto não receber o ok no prazo estabelecido pela própria Casa Civil, estará criada uma pauta negativa.

Uma entrega certeira que será necessariamente feita em breve pelo Congresso no campo econômico é o encaminhamento para sanção presidencial de projeto que muda a relação financeira entre o Banco Central e o Tesouro Nacional. O texto põe fim a um modelo que é criticado pela falta de transparência e por permitir o financiamento da União pela autoridade monetária. Nesse caso, o trabalho duro de articulação política foi feito na legislatura passada. A votação do projeto foi concluída em dezembro e o que falta é apenas a aprovação do texto final pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, uma etapa regimental que deve acontecer nas primeiras sessões da comissão.

Como nos demais casos, a sanção do projeto por Bolsonaro não vai contribuir para acalmar nenhum investidor em caso de sinais de fracasso no andamento da reforma da Previdência. Mas pode ajudar a reforçar as credenciais liberais do governo e alimentar o noticiário com medidas concretas enquanto a reforma é costurada e negociada. Por quanto tempo o mercado vai tolerar aguardar uma definição mais nítida sobre a Previdência sem dar sinais mais evidentes de ansiedade é uma questão em aberto.

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