segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

Pelo BC autônomo: Editorial | Folha de S. Paulo

No Brasil, faz sentido fixar mandatos para o comando do Banco Central

A possibilidade de os mandatários interferirem nos resultados de curto prazo da economia para favorecer os seus interesses eleitorais é uma tentação que as democracias maduras aprenderam a controlar.

Esse longo e penoso processo pedagógico tirou lições das consequências políticas da lassidão, pois ela desequilibra as condições da disputa pelo poder e embota a alternância nos postos eletivos. Beneficiou-se também dos efeitos econômicos do chamado populismo.

Está cada vez mais estabelecida a relação entre movimentações frequentes, erráticas e imprevisíveis nas regras do jogo econômico, de um lado, e patamares frustrantes de desenvolvimento, do outro.

Por essa dupla motivação, é bem-vinda a intenção do governo Jair Bolsonaro (PSL) de aprovar, entre as 35 medidas prometidas para os os cem primeiros dias da administração, um estatuto conferindo autonomia formal ao Banco Central.

O mecanismo, cuja relatoria na Câmara cabe ao deputado federal Celso Maldaner (MDB-SC), baseia-se na clássica fórmula de estabelecer mandatos para o presidente e os diretores do BC não coincidentes —nem entre eles próprios, nem com o do presidente da República.

Todos continuariam a ser indicados pelo chefe do Poder Executivo e submetidos à aprovação do Senado Federal, mas só poderiam ser demitidos por falta ética grave ou por mau desempenho na tarefa de tentar atingir os objetivos fixados pelo governo.

O Banco Central se tornaria, assim, uma espécie de agência pública obrigada a perseguir, com autonomia funcional, as metas inflacionárias definidas de antemão. Ganharia, com essa mudança, uma proteção a mais contra interferências no seu processo decisório.

A literatura especializada favorece a autonomia legal para a autoridade monetária. Nações que adotam o regime em geral reduzem as taxas de juros da economia, em razão do bônus de credibilidade e estabilidade embutido nessa opção.

Decerto de pouco adiantaria instituir mandatos para operadores da política monetária em países que desprezam o valor da estabilidade. Não funcionaria no Zimbábue de Robert Mugabe, na Argentina de Cristina Kirchner nem na Venezuela de Nicolás Maduro.

Mas no Brasil, após a desastrosa aventura intervencionista de Dilma Rousseff (PT), o estatuto pode ser efetivo e instilar nos agentes econômicos motivação extra para arriscar-se nos investimentos produtivos sem o temor de tribulações politicamente motivadas no BC.

Os cidadãos, as instituições de controle e a opinião pública deram mostras recentes de intolerância com o populismo inflacionário ao punir no Congresso, nas cortes e nas urnas os seus patrocinadores. Faz sentido consagrar em lei esse compromisso com a razoabilidade.

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