terça-feira, 12 de março de 2019

Avanço do investimento e da poupança está longe do ideal: Editorial / Valor Econômico

Os dados das contas nacionais de 2018 trouxeram algumas melhoras. Depois de quatro anos em queda, a taxa de investimentos subiu, sustentada por um aumento da poupança. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) cresceu 4,1%, passando de 15% para 15,8% do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2017 e 2018, e a poupança passou de 14,3% para 14,5% do PIB no mesmo espaço de tempo. Mas, esses números embutem artificialidades contábeis e estão longe do desejável para assegurar um crescimento sustentável da economia.

Foi o segundo ano consecutivo de expansão da poupança depois de ter despencado para 13,4% do PIB em 2016, o menor nível da série iniciada em 2000. Apesar do aumento, a taxa está distante dos 19,3% do PIB de 2007. Em comparação com outros países do grupo dos Brics, o Brasil está mal colocado. A poupança atingiu 45% do PIB na China, 28,5% na Índia e 27% na Rússia. Até nossos vizinhos exibem taxas superiores, com 20,5% no Chile, 19% na Colômbia e 21% no México.

A redução dos gastos das empresas e do setor público com os juros sustentou o ligeiro aumento da poupança, avaliou o coordenador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, Armando Castelar (Valor 6/3). O déficit nominal, que inclui os gastos com juros, diminuiu 0,7% do PIB no ano passado, passando de 7,8% para 7,1% do PIB. As empresas se beneficiaram pelo mesmo motivo. Já as famílias tiveram ganhos menores em suas aplicações, além de terem consumido mais, e pouco pouparam. O consumo das famílias cresceu 1,9% em 2018, depois do aumento de 1,4% em 2017.

A principal consequência da baixa poupança é a dificuldade para se financiar o investimento, o que prejudica a perspectiva de crescimento da economia. Depois de ter caído quase 30% nos últimos quatro anos, o crescimento de 4,1% dos investimentos no ano passado não chegou a animar. Além disso, é preciso considerar que o número está inflado pela mudança aplicada na contabilização de plataformas de petróleo em consequência das novas regras do programa Repetro, de incentivo tributário ao setor de petróleo e gás.

O Repetro passou a incorporar plataformas de petróleo já em operação no país dentro da FBCF. Embora a alteração permita retratar com mais precisão o aumento de estoque de capital, na prática, o dado não significa aumento real da capacidade de produção porque essas plataformas já estavam operando no país. Sem o efeito do Repetro, calcula-se que a taxa real de crescimento dos investimentos ficou pela metade do registrado, em torno de 2%.

A piora da situação fiscal do governo contém a poupança e os investimentos. Além da incerteza em relação às reformas econômicas, a crise econômica na Argentina e a greve dos caminhoneiros, em maio, também influenciaram. Outro problema é a situação da construção, que representa 52% da taxa de investimento. Na decomposição da FBCF, a construção caiu 3,4% em 2018 pelo quinto ano consecutivo, baixa que acabou compensada pelo avanço de 15,4% de máquinas e equipamentos, em que são contabilizadas as plataformas de petróleo. Há indicações que o setor está melhorando, levando-se em conta a movimentação nas imobiliárias e em alguns segmentos da construção civil. A atividade imobiliária, considerada indicador antecedente da atividade na construção, subiu 3,1% no ano passado e liderou o avanço dentro de serviços. No entanto, a crise fiscal enfrentada pelos diversos níveis de governo levou a cortes nos investimentos públicos, atingindo em cheio as obras de infraestrutura.

Além da retomada da construção, fator importante para estimular a recuperação da poupança e do investimento, é preciso reduzir as incertezas e fortalecer a confiança dos investidores e dos consumidores, o que depende do andamento das reformas, que vai impactar o ajuste fiscal e influenciar a eventual disponibilidade do governo para investir. Os números dependem também das privatizações da infraestrutura, que podem animar o setor de construção e a demanda por máquinas e equipamentos. Dada a elevada ociosidade nas indústrias, as compras desses produtos são destinadas à manutenção e modernização.

Acredita-se que ainda vai levar tempo para a poupança e o investimento atingirem um patamar adequado ao crescimento sustentável da economia. No início do ano passado, as estimativas de crescimento de 3,5% do PIB embutiam previsão de aumento de quase 8% do investimento. O PIB propriamente dito frustrou as expectativas e acabou crescendo apenas 1,1%.

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