quarta-feira, 13 de março de 2019

União faz mais um plano para socorrer os Estados: Editorial / Valor Econômico

O ajuste fiscal do novo governo, que começa pela reforma da previdência, terá de encontrar uma forma de contemplar a delicada situação financeira dos Estados. Há um projeto pronto para isso, o Plano de Equilíbrio Fiscal, que, mais uma vez, colocará algum dinheiro novo à disposição dos governadores, condicionados a exigências de aperto nas contas. Não se conhecem os detalhes do plano, em especial, de onde sairá o dinheiro. O plano, além de dar algum alívio financeiro aos Estados, também é uma necessidade política - os Executivos estaduais podem ter alguma (não muita) influência sobre as bancadas que votarão as mudanças na previdência.

A história dos socorros aos Estados é um relato de fracassos e sucessos parciais. Sem a renegociação das dívidas e a Lei de Responsabilidade Fiscal - e antes deles, a privatização dos bancos estaduais - o Plano Real não teria conseguido debelar a inflação. Planos de estabilização na Argentina, por exemplo, malograram porque foram incapazes de colocar freio nas despesas dos Estados.

A reestruturação das dívidas, às custas do Tesouro, e a LRF sobreviveram por mais de uma década, período em que a economia brasileira deslanchou. Diante de políticas desastrosas, como a da presidente Dilma Rousseff, e de pavorosa recessão, as fragilidades dos mecanismos institucionais vieram à tona. Na prática, nenhuma das penalidades previstas para quem descumprisse a lei foi aplicada. Os Tribunais de Contas, que deveriam fiscalizar as finanças estaduais, abdicaram de seu papel, quando não contribuíram ativamente para a deterioração das contas.

O aparente equilíbrio foi mantido por muito tempo porque o crescimento da economia, logo das receitas estaduais, tornava mais fácil o cumprimento dos parâmetros da lei, como o do endividamento em relação à receita líquida total e o teto para os gastos com pessoal em relação às receitas. Quando veio a recessão, após o governo Dilma ter autorizado Estados que não tinham rating adequado a se endividar mais, o panorama financeiro que se descortinou era desanimador. No período de alta do ciclo econômico, os Estados incharam a folha de pagamentos, contando, além disso, com espertezas contábeis. No período de baixa do ciclo, bateram diretamente às portas do Tesouro, mas sempre relutando em aceitar programas de ajustes recomendados.

Em 2016, o então ministro Joaquim Levy tentou unir uma solução para o endividamento - a extensão do prazo de pagamento por 20 anos - com o compromisso dos Estados de unificar o ICMS, para abrir caminho a reforma tributária. Levy saiu do governo, e os Estados ganharam mais prazo sem se comprometerem com nada.

Henrique Meirelles, no comando da Fazenda do governo Michel Temer, tentou estender aos Estados o alcance do teto de gastos e medidas duras de ajuste aos quais a União se submeteu, em troca suspensão temporária de pagamentos. Só o Estado do Rio, em estágio terminal, ingressou no Regime de Recuperação Fiscal. Com o caixa em frangalhos, os demais governadores que deixariam o cargo passaram a conta para os seguintes.

A equipe de Paulo Guedes tenta de novo, acenando com dinheiro aos governadores, apenas durante o período de exercício do mandato. Os governadores terão de reduzir despesas reais, principalmente com folha de salários, diminuir incentivos, suspender aumentos etc. Para atingir as economias previstas, receberão um percentual não definido da meta em empréstimos de bancos privados, com aval da União, ou do próprio Tesouro - ou ambos. O formato final do plano não foi divulgado. Onze Estados, com rating C do Tesouro, serão elegíveis ao plano.

É mais um remendo, inelutável, e que poderá ser bem sucedido no curto prazo se a economia crescer com vigor, algo possível se as reformas, a começar pela da previdência, forem aprovadas. Propor a desindexação e desvinculação de todos os Orçamentos, de União e Estados, o que exige mudanças constitucionais, pode ser um passo maior que as pernas que o governo ameaça dar. A medida, correta, não será uma bala de prata a curto prazo. No caso da União, benefícios da previdência e folha de salários consumiram 72% das receitas líquidas totais em 2018, sem incluir demais gastos de custeio.

O importante, porém, seria colocar os órgãos de fiscalização para funcionar e aperfeiçoar os meios legais para que governadores e prefeitos sejam de fato punidos quando tratarem as contas públicas com uma ligeireza tão grande quanto os estragos que provocam ao negar serviços básicos ao povo que governam.

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