segunda-feira, 29 de abril de 2019

Inflação surpreende no curto prazo, mas não preocupa: Editorial / Valor Econômico

A prévia da inflação de abril superou as expectativas do mercado financeiro, chegando a 0,72%. Esse novo repique do índice de preços, entretanto, não deve ser, de forma alguma, motivo de preocupação para os agentes econômicos nem pesar nas avaliações do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central sobre uma possível retomada nos cortes de juros básicos da economia.

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) se acelerou entre abril e março, passando de 0,54% para 0,72%. Nesse percentual, superou a média das projeções, de 0,67%, coletadas pelo Valor Data. A inflação acumulada em 12 meses nesse indicador se acelerou de 4,18% para 4,71%, ficando acima da meta definida para o ano, de 4,25%. Se o IPCA-15 ficasse em 0,72% em todos os meses do ano, a inflação anual chegaria perto de 9%.

Nenhum desses dados, no entanto, desperta preocupação. A inflação se acelerou devido a choques passageiros de preços, que tendem a ser revertidos no futuro. Um dos itens que mais pesaram foi alimentação no domicílio, que teve um avanço de 1,43%. Mas, pesar de ainda altos, os preços desse conjunto de produtos já vem se desacelerando, já que no IPCA-15 de março haviam subido 1,91%.

Outro item com destaque no IPCA-15 é o preço da gasolina, que respondeu por 0,14 ponto percentual da alta de 0,72% do índice. O coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Getulio Vargas (FGV) disse, em entrevista ao Valor, que espera que a descompressão de preços se intensifique até o final do mês, fazendo com que o IPCA cheio feche entre 0,55% e 0,6%.

Caso se confirme o arrefecimento das pressões inflacionárias até o fim do mes, mesmo assim haverá uma aceleração do IPCA cheio acumulado em 12 meses a perto de 5%. Isso porque, em abril de 2018, a inflação medida por esse índice foi de apenas 0,22%.

Essa alta de preços não assusta porque, nos períodos seguintes, tende a se reverter. Os analistas econômicos reduziram, no último mês, as suas projeções para o IPCA de maio. Há cinco semanas, previam que o índice de preços chegaria a 0,46% e, na semana passada, já projetavam 0,3%. Uma das explicações para essa queda nas projeções é que os economistas do setor privado consideram que, depois de subir, alguns preços tendem a cair, sobretudo alimentos. Em junho, a inflação em 12 meses tende a cair ainda mais devido ao descarte do IPCA de 1,26% de junho de 2018, provocado pela greve dos caminhoneiros.

O que dá segurança para os analistas econômicos apostarem na queda das projeções, porém, é o trabalho de ancoragem das expectativas feito pelo Banco Central - especialmente em fins de 2016, quando manteve os juros básicos até o mercado financeiro e setor real passarem a acreditar no cumprimento das metas de inflação.

Sem a ancoragem das expectativas, surtos inflacionários de curto prazo tendem a se perpetuar por mecanismos inerciais, mesmo quando a atividade econômica está fraca. É o que se vê na Argentina, por exemplo, onde se assiste a uma aceleração inflacionária em meio a uma desaceleração econômica.

Além da credibilidade do Banco Central, porém, também há uma considerável força desinflacionária originada do alto grau de ociosidade da economia. Isso faz com que os núcleos de inflação se mantenham em níveis baixos, mais próximos do piso da meta de inflação do que do seu teto. A média dos sete principais núcleos de inflação ficou em 3,3% em 12 meses, segundo cálculos da Goldman Sachs. Nesse percentual, eles estão pouco acima do limite inferior do intervalo de tolerância do regime de metas, de 2,75%.

O Copom, que se reúne na semana que vem, reconheceu em diversos pronunciamentos que o alto grau de ociosidade da economia poderá levar, novamente, a uma inflação abaixo da meta. O colegiado disse que precisa de tempo para avaliar quanto da fraca recuperação da atividade se deve à falta de estímulos e quanto se deve à onda de incerteza que persiste mesmo no novo governo.

A aprovação da reforma da Previdência no Congresso Nacional é o caminho mais seguro para a recuperação da confiança e para a retomada da atividade econômica. Significará tambem uma redução relevante dos riscos no horizonte do Copom, permitindo que o colegiado promova mais estímulos monetários sem comprometer os ganhos obtidos com o controle da inflação nos últimos dois anos.

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