quinta-feira, 11 de abril de 2019

Vinicius Torres Freire: Batatas e feijões caros na política

- Folha de S. Paulo

Alta do preço da comida deve ter contribuído para o mau humor do início do ano

A piora dos humores nacionais neste início de ano em parte se deve à inflação da comida, é muito provável.

Os preços dos alimentos não subiam tanto desde o em geral terrível 2016 ou desde o fatídico 2013, embora a carestia deste 2019 não tenha sido tão grande quanto naqueles anos.

Não se quer dizer também que a inflação total esteja em alta. Trata-se de um problema por ora bem restrito, que não tende a se difundir sem mais pelos demais preços, embora seja um problema real, humano, que causa algum ruído sociopolítico. Inflação de comida em alta tira prestígio de governos.

Quem vai ao mercado tem visto legumes, batatas, frutas e grãos caros, ruins e feios, quando não faltam.

Nos últimos 12 meses, o custo da “alimentação no domicílio”, como aparece nas tabelas do IBGE, aumentou 8,7%. Apenas no mês de março, a inflação média total foi de 0,75%. O equivalente a um quarto dessa alta se deveu aos preços de tomate, feijões e batata-inglesa.

No mês, os preços dos combustíveis para veículos também ajudaram a fazer o estrago, pesando outro quarto no IPCA de março.

Para o povo miúdo, bem mais da metade do país, comida mais cara é um óbvio sofrimento, ainda mais depois de meia década de empobrecimento geral, embora muito governante ainda desdenhe de inflação (Dilma Rousseff teve tal atitude, um dos tantos motivos de sua desgraça).

Muita gente ainda deve se lembrar de que, um par de meses antes do tumulto geral de junho de 2013, houve a “inflação do tomate”, metonímia da carestia geral da comida, que chegou a subir quase 16% em um ano. O preço do tomate subia então a 194% ao ano; agora, aumentou 28,5%. Os problemas maiores da temporada são a batata (alta de 91%) e o feijão-carioca (alta de 135%).

O que houve?

Foi ruim a “primeira safra” de feijão, que ocorre de dezembro a março, na maior parte. Para este ano, a área plantada caiu 19%, a produtividade baixou e, enfim, a produção ficou 28% menor, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Tomates e batatas em feira no interior de Pernambuco - Bernardo Dantas - 23.set.13/Folhapress
Em alguns lugares do país, atrativos do mercado da soja tiraram espaço do feijão na preferência de alguns agricultores. A estiagem de novembro a janeiro fez o estrago maior nas plantações. A julgar pelos dados da Conab, a situação começaria a melhorar a partir de abril, com a segunda safra.

No caso da batata, além do problema da seca no período de plantio, o excesso de chuva atrapalha a colheita e prejudica a qualidade do tubérculo, quando não estraga mesmo o produto, segundo relatos do Hortifruti, grupo de pesquisadores e analistas do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Esalq, a faculdade de agronomia da USP. As chuvas também estragaram os tomates.

As medidas menos voláteis de inflação, que em geral aparam o preço da comida (núcleos de inflação), estão comportadas, na casa dos 3,5%. Medidas como a inflação de serviços, também. O motivo dessa calmaria relativa não é bom, em geral: salários crescendo muito devagar, desemprego e subemprego enormes, economia lerda, em suma.

A inflação anual (acumulada em 12 meses) foi agora a 4,6% e deve chegar perto de 5% em abril e maio. Pelas previsões, voltaria então a cair, talvez para algo menos do que 4%, no fim do ano.

Com bons argumentos ou não, o soluço da inflação prejudica a defesa da baixa da taxa básica de juros. Na vida real, com reflexos sociais e políticos, deve contribuir ainda por um tempo para o mal-estar.

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