segunda-feira, 27 de maio de 2019

*Celso Rocha de Barros: Ustrapalooza

- Folha de S. Paulo

A turma que convocou a passeata deste domingo (26) era a série B do Bolsonarismo

As manifestações deste domingo (26) foram do tamanho e tom certos para que o impasse entre governo e Congresso continue.

Os protestos não foram grandes o suficiente para pressionar o Congresso, ou para servir de ponto de partida para o golpe com que sonham os bolsonaristas.

Mas tampouco foram pequenas o suficiente para que Bolsonaro se conforme com a necessidade de respeitar as instituições e comece a dar expediente como chefe do Poder Executivo.

Em todas as grandes cidades, as passeatas não superaram as dos estudantes do dia 15. Nenhuma foi nem sequer comparável às passeatas a favor do impeachment ou às de 2013. Lembraram mais outra passeata a favor, as passeatas contra o impeachment de 2016.

Ainda é bastante gente, sem dúvida, e é preciso admitir que a pauta da direita radical tem apoiadores.
Mas para uma passeata convocada pelo presidente da República, foi pouco. Bolsonaro começou o domingo elogiando as manifestações em um culto religioso e tuitando imagens de gente indo para o ato.

Todo mundo entendeu que o plano inicial das manifestações era atacar as instituições.

E teve isso: na praia de Copacabana uma faixa dizia "STF, preste atenção, a sua toga vai virar pano de chão". Houve bonecos infláveis pouco lisonjeiros do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o único sujeito que ainda trabalha para aprovar a reforma da Previdência do Guedes.

Para não deixar dúvida, Eduardo Bolsonaro compartilhou em suas redes sociais, dias antes do ato, o vídeo de uma entrevista que fez com a viúva de Brilhante Ustra.

Sutil.

Já sabendo que seria isso, o bolsonarismo institucional, que depende das instituições para manter sua influência, foi contra a passeata. O MBL, cujos líderes se elegeram parlamentares em 2018, Janaina Paschoal e Joice Hasselmann, deputadas extremamente bem votadas, Luciano Bivar, presidente do partido de Bolsonaro, todos foram contra os protestos. A Fiesp, os evangélicos, a grande maioria dos militares, todos ficaram de fora.

Não descarto que ao menos algumas pessoas nessa lista topassem medidas repressivas contra a esquerda. Mas outras devem ter mesmo convicções democráticas, e todas têm suas tribunas dentro da democracia.

Se o bolsonarismo já era a série B da direita brasileira, a turma que convocou a passeata de ontem era a série B do Bolsonarismo: os olavistas, os defensores de golpe militar, o cara que rasgou a placa da Marielle, os monarquistas, aquele seu parente burro que é uma ou várias dessas coisas.

Se as manifestações não foram grandes o suficiente para assustar deputados ou ministros do STF, talvez tenham sido grandes o suficiente para provocar uma redistribuição de poder dentro do bolsonarismo a favor dos radicais, com o apoio do presidente da República.

A macarronada de domingo do bolsonarismo ficou mais tensa.

As alas não doidonas do governo tentaram moderar as manifestações.

A turma de Paulo Guedes, por exemplo, tentou fazer colar que a passeata era em defesa das reformas do governo. Proponho medir a proporção das faixas ou dos minutos de discurso de ontem sobre ajuste fiscal. Duvido que tenha sido alta.

De qualquer modo, é chocante que ainda haja quem precise do autoritarismo bolsonarista para manifestar sua frustração pós-Lava Jato. A oposição ainda tem muito trabalho pela frente.

*Celso Rocha de Barros é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

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