sexta-feira, 21 de junho de 2019

Claudia Safatle: Há luz no fim do túnel

- Valor Econômico

Governo precisa parar de atrapalhar e de perder tempo

Há boas e más notícias sobre a possibilidade de expansão dos investimentos do setor privado no país, que será a base da retomada do crescimento econômico em algum momento no futuro. Esmiuçando os dados dos balanços de 319 grandes companhias de capital aberto não financeiras, identifica-se acentuada queda do nível de endividamento, aumento da rentabilidade e redução do custo de capital.

Ao mesmo tempo há uma "revolução" em curso no financiamento das empresas. De 2005 para cá 1.369 novas companhias, na maioria (62,8%) fechadas, entraram no mercado de dívidas corporativas.

A situação das pequenas e médias empresas, porém, contrasta frontalmente com a das grandes, o que é um fator negativo. Em dezembro de 2017 havia 4,937 milhões de pequenas e médias empresas inadimplentes. No ano passado esse número já era de 5,305 milhões.

Duas importantes variáveis na decisão de investir são: 1) se a taxa de retorno do capital investido é maior do que o custo do capital; e 2) qual é a expectativa de crescimento do PIB. A resposta à primeira questão é positiva. Quanto ao aumento da demanda por causa de uma melhor expectativa de crescimento, a resposta já não é tão óbvia. Tem sido sistemática a queda nos prognósticos de expansão do PIB por queda de confiança, alto grau de incerteza e elevada capacidade ociosa. Esse quadro pode estar deteriorando as finanças das empresas nos últimos seis meses.

Ao contrário do setor público, não é por excesso de dívidas que as empresas privadas de grande porte não estão aumentando os seus investimentos.

Segundo estudo apresentados pelo economista Carlos Antonio Rocca, diretor do Centro de Estudos do Ibmec (Cemec), em recente debate na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), a dívida bruta sobre patrimônio líquido (alavancagem) das companhias abertas (inclusive Petrobras, Eletrobras e Vale) caiu de 1,43 para 0,92 entre 2015 e 2018. Desconsiderando as três empresas gigantes, a queda foi de 1,35 para 0,95 em igual período.

O lucro líquido das companhias abertas, que chegou ao pico de 3,48% do PIB em 2010, caiu para menos 1,07% do PIB em 2015 e encerrou 2018 equivalente a 2,43% do PIB. Excluindo os três grupos citados acima, o lucro líquido atingiu 1,71% do PIB em 2010, caiu para menos 0,2% do PIB em 2015 e subiu para 1,47% do PIB em 2018.

Rocca expôs, também, indicadores sobre as emissões de dívidas corporativas que mais do que compensaram a retração do BNDES nos últimos anos, com o corte do crédito direcionado. Nos 12 meses encerrados em março as emissões de ações e de dívida corporativa captaram R$ 220,4 bilhões, cifra 379,7% superior aos desembolsos de R$ 58 bilhões do BNDES em igual período e mais do que o banco liberou no auge da expansão da sua carteira de empréstimos.

Nos dois últimos anos, a dívida corporativa foi a grande fonte de financiamento das empresas, sobretudo para capital de giro. Quando o crédito em geral teve uma contração de R$ 104 bilhões, em 2017, as emissões das companhias somaram pouco mais de R$ 62 bilhões. No ano seguinte, a expansão do crédito foi modesta, R$ 23,47 bilhões, comparada à captação de R$ 73,2 bilhões em papéis corporativos com juros mais baixas e prazos mais longos.

Esse é um primeiro passo em direção ao que o economista antevê como "revolução" no financiamento das empresas no país, que terá grande transformação também com as inovações tecnológicas e regulatórias, da duplicata eletrônica ao open banking.

O que deve retirar a economia do estado de letargia em que se encontra é o investimento privado em infraestrutura. Não há qualquer esperança, no horizonte visível, de uma expansão dos investimentos públicos por absoluta falência do Estado brasileiro, mesmo com a aprovação da reforma da Previdência. Basta ver a boca de jacaré aberta no quadro abaixo, que mostra o aumento brutal da dívida bruta do setor público ao tempo em que o setor privado encolhia seu endividamento.

O investimento público teve queda de 55% entre 2013 e 2018, quando saiu de 2,7% do PIB para 1,2% do PIB. O investimento privado caiu 25%, de 19% do PIB para 14,2% do PIB. Hoje o investimento privado é responsável por 92% do investimento total.

Um dado impressionante do trabalho de Rocca refere-se ao financiamento da dívida pública que, como uma draga, consome 75,1% de toda a captação de depósitos do sistema bancário.

Outros componentes da demanda são o consumo privado e as exportações. Com o desemprego de mais de 13 milhões de brasileiros e as famílias ainda endividadas, é muito difícil se imaginar um aumento relevante do consumo privado. A liberação de parte das contas ativas do FGTS e do PIS/Pasep como prometido pelo governo será, segundo o economista, uma gota d'água no oceano.

As exportações podem trazer algum benefício da guerra comercial entre chineses e americanos. Ele indica, porém, que a efetiva devolução dos créditos fiscais acumulados pelos exportadores faria uma enorme diferença.

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