domingo, 7 de julho de 2019

Censo sem bom senso: Editorial / Folha de S. Paulo

Debate em torno do questionário reduzido em 2020 está politizado em excesso

A controvérsia a respeito do Censo Demográfico 2020 levantou dúvidas relevantes a respeito do questionário a que os brasileiros vão responder no ano que vem, mas a opinião pública permanece pouco esclarecida quanto à pertinência de inovações e críticas.

Instituições costumam ser refratárias a mudanças, mesmo no caso de burocracias de competência e integridade reconhecidas, como o IBGE. Por outro lado, a nova direção do órgão agiu com atropelo intransigente, à maneira do atual governo. A polêmica acabou politizada além do razoável.

O comando do instituto determinou a diminuição do número de questões no censo em cerca de um terço. Argumentou que uma pesquisa enxuta favorece o aumento da cobertura (mais casas recenseadas) e a qualidade das respostas.

Segundo o raciocínio, os temas eliminados podem ser tratados por meio de levantamentos amostrais, registros administrativos e tecnologias de processamento de dados.

Os críticos denunciam o risco de “apagão estatístico” e a súbita desconsideração de anos de trabalho técnico e de consultas públicas.

Afirmam que certos pontos deveriam constar do formulário básico (de 26 questões dirigidas ao universo da pesquisa, todos os 71 milhões de domicílios) e não apenas do formulário da amostra (de 76 questões para 7,1 milhões de domicílios), também encurtado.

De fato, causa inquietude a eliminação da pergunta sobre a renda total do domicílio na pesquisa completa, com o que faltarão dados específicos de cada cidade.

Quanto ao acesso a serviços e à posse de bens, restaram questões a respeito de internet e máquina de lavar roupa (e não mais aquelas sobre energia elétrica, veículos e outros eletrodomésticos). Não se entende bem o motivo da supressão, dado que o tempo da entrevista pouco aumentaria.

Caem as perguntas sobre emigrantes, informação que talvez possa ser suprida por registros administrativos, assim como aquelas relativas ao tipo de escola frequentada ou a nascidos vivos e mortos.

A direção do IBGE argumenta que o censo brasileiro é um dos mais extensos do mundo. Os críticos respondem que o Brasil é um país enorme, com populações dispersas e que ainda não conta com registros administrativos acessíveis ou de qualidade bastante para dispensar informações censitárias.

Tal problema não seria solucionado, acrescentam, por pesquisas amostrais de maior frequência.

Difícil discordar, em tese, da pertinência desses pontos de vista antagônicos, tanto responsáveis quanto inovadores. Mas falta discussão mais aberta e objetiva quanto a vantagens e desvantagens relativas de cada posição. A polêmica constitui amostra precisa da má qualidade do debate nacional.

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