sábado, 6 de julho de 2019

Passo previdente: Editorial / Folha de S. Paulo

Sob pressão, comissão da Câmara preserva o essencial da reforma da aposentadoria

A despeito da dissonância do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que na última hora retomou suas referências corporativistas na tentativa de defender mais vantagens para policiais, a comissão especial da Câmara dos Deputados resistiu às pressões e aprovou uma boa versão da reforma da Previdência Social.

Aprovado com ampla maioria, de 36 votos a 13, o relatório preserva a espinha dorsal da proposta original, com impacto estimado nas contas públicas em torno de R$ 1 trilhão ao longo de dez anos, perto do que queria a equipe econômica.

Como esperado, caiu o dispositivo que previa um regime de capitalização, ideia controversa, mal explicada e que não encontrou amparo político. Ficou o mais importante para o momento —idade mínima, equiparação entre regimes dos servidores e da iniciativa privada e uma transição não muito longa para os trabalhadores já na ativa.

A rendição de Bolsonaro aos policiais federais —depois de ser chamado de traidor pela categoria— quase impediu a votação nesta semana, o que teria praticamente inviabilizado a apreciação pelo plenário antes do recesso.

Desta vez, a responsabilidade por evitar a perda de controle para os grupos de pressão coube aos parlamentares favoráveis à reforma.

Os pontos negativos foram a retirada de estados e municípios do texto, embora ainda haja chance de reparo nas próximas etapas da tramitação, e a perda de contribuições rurais de R$ 80 bilhões em uma década, mostra da força da bancada ruralista —que continua a defender isenções descabidas.

O próximo passo é a votação no plenário da Câmara, o que, segundo promessas das lideranças partidárias, deve ocorrer na próxima semana. Espera-se uma dura batalha, sempre com risco de diluição maior da proposta.

Entretanto há sinais de apoio político expressivo —e a esta altura já parece realista contar com uma reforma suficientemente robusta para reduzir o risco de descontrole nas contas públicas, ainda que outras medidas sejam necessárias.

A mudança do sistema de aposentadorias não bastará, decerto, para tirar a economia do país da estagnação atual, mas se mostra imprescindível para estabelecer um ambiente de maior confiança. De imediato, abre caminho para a redução dos juros do Banco Central, hoje de 6,5% ao ano.

Ao longo do tempo, desde que haja avanços em áreas como tributação e regulação, pode-se esperar um aumento na disposição do setor privado para investimentos. Setores ligados à infraestrutura e à construção civil despontam como os mais promissores, com elevado potencial de geração de empregos.

Para apressar o processo, é fundamental que governo e Congresso resistam às demandas corporativas e preservem o vigor da reforma. Concessões significam mais déficit orçamentário e dívida pública que, cedo ou tarde, implicará custos para todos os brasileiros.

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