quarta-feira, 3 de julho de 2019

Redução no compulsório deve ter baixo impacto no crédito: Editorial / Valor Econômico

O aceno de uma escalada de redução dos depósitos compulsórios dos bancos, dado na semana passada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, surpreendeu. A promessa foi feita no dia seguinte ao Banco Central (BC) ter promovido um corte de 33% para 31% no compulsório sobre os depósitos a prazo. A mexida feita pelo BC vai liberar estimados R$ 16,1 bilhões para o mercado. Já o ministro disse que as mudanças a caminho vão injetar mais de R$ 100 bilhões com o objetivo de ampliar o crédito privado uma vez que "estamos despedalando os bancos públicos" e o governo quer realizar uma "desestatização do mercado de crédito".

O governo vem sendo severamente criticado pela letargia da economia. O ano até começou bem, embalado pelo otimismo com a mudança no Palácio do Planalto e pela perspectiva de aprovação da reforma da Previdência. Mas, à medida que a discussão da mudança de regras para a aposentadoria foi ficando mais complicada, a economia tropeçou. O PIB recuou 0,2% no primeiro trimestre e já se espera estagnação neste segundo trimestre e crescimento inferior a 1% no ano. Já se fala que apenas a redução dos gastos públicos propiciada pela mudança na Previdência não será suficiente para reanimar a economia.

Uma das frentes de pressão é exatamente por um aumento da oferta de empréstimos, especialmente por parte de empresários. Em artigo publicado na "Folha de S. Paulo" na semana passada, o presidente da Associação Brasileia da Indústria de Plásticos (Abiplast) e vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), José Ricardo Roriz Coelho, escreveu que o crédito é a "faísca" que falta. A pressão também vem dos políticos, que ensaiam iniciativas para esvaziar o protagonismo do governo.

A realidade é que o crédito vem desacelerando desde 2012 e chegou a encolher 3,5% em 2016, e 0,5% em 2017. No ano passado, cresceu 5,5%, o que não é muito frente à inflação de 3,75%. Neste ano, depois de aumentar 0,6% em maio em relação a abril, acumula 0,9% no ano, com o estoque chegando a R$ 3,286 trilhões, o equivalente a 47,2% do PIB. Em 12 meses, a expansão está em 5,5%, mantendo o ritmo de 2018, sendo 9,9% nas linhas para pessoas físicas e de apenas 0,3% para as empresas.

Esse desempenho levou o Banco Central a reduzir a previsão de crescimento do crédito no ano que saiu de 6% no início do ano para 7,2% e agora volta atrás, para 6,5%. Se a variação se confirmar, vai ser mais um ano fraco. A oferta de crédito vem sendo especialmente afetada pelo recuo do crédito para empresas e por parte dos bancos públicos, que concentram os empréstimos direcionados, que devem encolher 7% neste ano, mais do que os 6% antes projetados.

Há dúvida se a redução do compulsório é mecanismo suficiente para ativar o crédito - nem essa é a intenção da autoridade monetária. O Banco Central, depois da declaração do ministro da Economia, esclareceu que "a redução estrutural" dos depósitos compulsórios é uma ação ainda "em curso, sem definições de prazos ou montantes". Antes, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, havia dito que há espaço para mais liberações, sublinhando que o objetivo não é fazer política monetária com o compulsório.

Apesar de os bancos reclamarem que os compulsórios ampliam o spread, estudo publicado pelo Banco Central em um dos boxes do Relatório de Economia Bancária de 2017 mostra que a redução dessas reservas obrigatórias pode ter efeito tímido no crédito. O estudo conclui que, nas condições de 2017, um corte de 10% no compulsório diminuiria o juro para o tomador de recursos em 0,15 ponto percentual se todo o dinheiro fosse canalizado para o crédito. Se o banco dividisse o montante entre títulos e crédito, na mesma proporção praticada anteriormente, a taxa recuaria 0,11 ponto percentual e o saldo de empréstimos aumentaria apenas 1%.

Nem por isso os governos deixam de apelar para o compulsório quando querem animar a economia. Foi o que aconteceu em maio de 2008, quando os compulsórios foram cortados pela metade e saíram de R$ 100 bilhões para R$ 50 bilhões. Depois voltaram a crescer, subindo para R$ 200 bilhões em 2010 e chegando a R$ 400 bilhões atualmente. Para muitos, mais eficiente seria baixar os juros ou influenciar diretamente no spread. Já o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari, jogou um balde de água fria ao dizer que caixa não é problema para os bancos e que falta demanda por crédito porque a confiança está baixa e a economia segue parada.

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