sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Bruno Boghossian || Palanque amazônico

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro ganha combustível e aposta no nacionalismo para mascarar negligência

Depois de instalar uma política de negligência no meio ambiente, Jair Bolsonaro redobrou a aposta no discurso da soberania nacional. A denúncia de interesses estrangeiros sobre a Amazônia carrega uma dose de lógica, mas serve principalmente para mascarar o desmonte dos órgãos de fiscalização e uma retórica que estimula o desmatamento.

A pressão internacional sobre o Brasil se alastrou com velocidade proporcional às provocações de Bolsonaro. Quando o país perdeu os milhões do Fundo Amazônia, ele deu de ombros e mandou Angela Merkel pegar o dinheiro para reflorestar a Alemanha. "Lá está precisando muito mais do que aqui", disse.

O presidente gostou de bancar o valentão. Depois, criticou também a Noruega e reforçou suas acusações contra ONGs que atuam na região.

Disposto a explorar a ameaça estrangeira, Bolsonaro ganhou um presente nesta quinta-feira (22). O presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou que as queimadas na Amazônia eram uma "crise internacional" e convocou uma discussão de emergência sobre o assunto no G7, grupo de países desenvolvidos.

O francês deu combustível aditivado à plataforma nacionalista de Bolsonaro. Usou um pronome possessivo em primeira pessoa ("nossa casa está queimando") e, de quebra, ainda publicou uma foto antiga, que ajudou o brasileiro a reforçar suas queixas de manipulação de informações sobre a devastação.

Bolsonaro respondeu que Macron reproduzia uma "mentalidade colonialista" ao chamar outros países para discutirem o assunto. "O governo brasileiro segue aberto ao diálogo, com base em dados objetivos e no respeito mútuo", afirmou. Nada disso foi marca do presidente até aqui. Ele preferiu questionar estatísticas oficiais e insultou seus pares.

O Brasil percebeu que, por trás do discurso dos europeus, há ameaças de punições econômicas. A questão na Amazônia vai acelerar o reposicionamento do país no mundo. Bolsonaro, até aqui, preferiu o isolamento e o alinhamento único com os EUA.

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