quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Fábio Alves* || Pé no freio

- O Estado de S.Paulo

IBC-Br aponta para recessão ao registrar queda de 0,13% no segundo trimestre do ano

O desempenho da economia no segundo trimestre deste ano decepcionou até os mais pessimistas e agora até o crescimento do PIB em 2019 corre o risco de ficar abaixo do consenso das projeções dos analistas, de 0,81%.

A crise na Argentina, com a forte turbulência nos mercados deflagrada após o resultado das prévias das eleições presidenciais, deve dificultar mais a recuperação da economia brasileira.

Os indicadores de atividade em junho ficaram, em sua maioria, muito aquém do esperado. O volume de serviços prestados, por exemplo, recuou 1,0% em junho ante maio, enquanto os analistas esperavam uma queda menor, de 0,20%. No segundo trimestre, os serviços encolheram 0,6%. A queda na indústria brasileira foi de 0,7% entre abril e junho deste ano. E o comércio recuou 0,3% no período.

Já o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), divulgado nesta semana, apontou para uma recessão técnica no Brasil ao cair 0,13% no segundo trimestre, após já ter registrado uma retração de 0,52% no primeiro trimestre. O IBC-Br é considerado uma prévia do PIB, cujo resultado para o segundo trimestre será divulgado pelo IBGE no dia 29 deste mês.

Por que a atividade econômica surpreendeu negativamente nos últimos meses?

“Diversas incertezas têm permeado o ambiente econômico, principalmente com relação às reformas (conteúdo e ‘timing’ de aprovação), o que inibe consumo e investimento”, diz a economista-chefe da Icatu Vanguarda, Ana Flávia Soares dos Santos Oliveira.

Segundo ela, o setor público tem sido um peso constante sobre a atividade e vai levar tempo até o setor privado substituir o espaço que a demanda pública deixou. “O setor externo não tem contribuído dada a fraqueza da demanda global e dos nossos principais parceiros”, explica. “Nesse sentido, os eventos na Argentina só pioram as perspectivas nessa frente.”

Além disso, com o acirramento da guerra comercial entre EUA e China, várias instituições financeiras passaram a revisar para baixo suas estimativas de crescimento para o PIB mundial neste ano e em 2020. Assim, sem uma contribuição mais significativa da demanda externa, de onde virão os gatilhos para a economia brasileira acelerar sua expansão no curto prazo?

“Para assegurar nossa projeção de crescimento de 0,8% da economia este ano, contamos com uma aceleração do PIB neste segundo semestre”, diz o economista-chefe do banco Safra, Carlos Kawall, em relatório. “Além de incorporarmos o impulso positivo da liberação dos saques do FGTS a partir de setembro, acreditamos que a atividade responderá positivamente às taxas de juros mais estimulativas e ao ambiente mais favorável em meio à aprovação da reforma da previdência e andamento das demais agendas do governo.”

As projeções sobre o impacto à economia da liberação de saque de R$ 500 das contas ativas e inativas do FGTS variam de 0,1 ponto porcentual até 0,3 ponto. Não à toa, muitos analistas consideram como estímulo mais importante o ciclo de corte de juros pelo Banco Central. O consenso das apostas dos analistas aponta para uma taxa Selic a 5,0% no fim deste ano, dos atuais 6,0%, mas já há quem acredite que o BC reduzirá os juros abaixo de 5,0%.

Ana Flávia, da Icatu Vanguarda, se diz “bastante cética” com a possibilidade de uma aceleração expressiva do crescimento. “Certamente a queda de juros terá um efeito positivo sobre a economia”, observa. “Não é a solução para os problemas estruturais de crescimento que o Brasil enfrenta, mas ajudará a dar um impulso no curto prazo.”

Ela estima um crescimento do PIB de 0,6% neste ano e de 1,7% em 2020, abaixo até da mediana das estimativas na pesquisa Focus, de expansão de 2,10%. Com ainda quase 13 milhões de desempregados, fica difícil ver um dinamismo maior do consumo das famílias e do investimento no curto prazo.

A esperança é que a agenda de reformas do governo - como a da Previdência, tributária e a MP da Liberdade Econômica - consiga melhorar o ambiente de negócios, aumentado a confiança de empresários e consumidores. “Todas essas medidas microeconômicas que estão sendo feitas pelo governo em diversas frentes serão positivas para a produtividade, mas os efeitos serão vistos com clareza mais à frente”, acrescenta Ana Flávia. Até lá, a sensação é de que a economia brasileira está com o pé no freio.

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