segunda-feira, 2 de setembro de 2019

O que pensa a mídia – Editoriais

Mais reprovado: Editorial | Folha de S. Paulo

Parcela dos que consideram Jair Bolsonaro péssimo ou ruim sobe de 33% para 38%

Na primeira pesquisa Datafolha para avaliar seu desempenho, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) colheu números relativamente modestos. No início de abril, 30% dos brasileiros consideravam o governo ruim ou péssimo, fatia semelhante à daqueles que o estimavam como regular e como ótimo ou bom.

Tratava-se, para o período, da pior avaliação de um presidente eleito em início de mandato desde a redemocratização do país.

A seguir, após o sexto mês, o instituto captou uma ligeira piora dos números da popularidade de Bolsonaro. Os que consideravam o governo ruim ou péssimo passaram a 33%, e os que o viam como regular caíram de 33% para 31%.

O que poderia ter sido uma oscilação ocasional na margem de erro revelou-se, no mais recente levantamento do instituto, como um ponto numa curva de deterioração.

A taxa de reprovação subiu ao final de agosto para 38%, num avanço significativo. A parcela mais inclinada a apoiar o presidente, não desprezível, está em 29%, ante 33% apurados no início de julho.

Alguns fatores parecem contribuir para tal situação, que não pode ser considerada surpreendente.

Bolsonaro tem insistido num comportamento político e institucional tumultuoso, a buscar conflitos em variadas frentes —do Judiciário ao Legislativo, passando por educação, política externa, ambiente e produção cultural.

São raros os dias em que a nação é poupada de declarações estapafúrdias ou medidas questionáveis do chefe de Estado, empenhado em disputar consigo mesmo uma maratona de insensatez.

Não espanta que apenas 15% dos entrevistados julguem o comportamento de Bolsonaro compatível com o de um presidente da República em todas as ocasiões —e 32% opinem que em nenhuma.

Ao mesmo tempo, apesar de medidas acertadas no terreno da economia, seu governo não conseguiu até aqui mostrar-se efetivo naquilo que afeta mais diretamente a maioria da população. O Datafolha mostra que áreas fundamentais para a vida dos brasileiros, como saúde, emprego e educação, estão entre as mais mal avaliadas.

É fato que pesquisas do gênero traduzem momentos determinados vividos por governantes. As inclinações, sabe-se, podem mudar.

Bolsonaro atravessa ainda os primeiros meses do mandato e pode evitar que no futuro se veja sustentado apenas por seu núcleo eleitoral mais rígido. A economia tende a ser decisiva nesse processo.

A seu favor, o levantamento revela que 45% acreditam que o governo vai melhorar. Entretanto essas expectativas, diga-se, já foram bem mais favoráveis —em abril eram 59% os otimistas com o desempenho vindouro do presidente.

Senado avança, com habilidade, na Previdência: Editorial | O Globo

Mudanças em projeto aprovado na Câmara poderão proporcionar economia de mais de R$ 1 trilhão
Relator da reforma da Previdência no Senado, Tasso Jereissati (PSDB-CE) propôs supressões no texto aprovado pela Câmara. Entre outras coisas, sugeriu mudar as novas regras da pensão por morte, para assegurar que o valor do beneficio não fique inferior a um salário mínimo para todos, e retirou a ideia de incluir na Constituição o critério de renda para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Também propôs uma transição para a idade mínima de aposentadoria no caso de trabalhadores em atividades potencialmente arriscadas à saúde.

A perda de receita decorrente dessas mudanças seria compensada, segundo Jereissati, pela cobrança previdenciária obrigatória de entidades filantrópicas, com exceção de santas casas e de assistência social, e com o fim da isenção nas exportações. Isso seria implementado de forma gradual, durante cinco anos.

O resultado, nas estimativas do Senado, seria economia superior a R$ 1 trilhão em um decênio, mais vantajosa em relação ao texto aprovado na Câmara, cujo impacto nas contas fiscais foi estimado em R$ 933,5 bilhões no período de dez anos.

Pode-se discordar de aspectos pontuais da proposta de Jereissati, mas é preciso reconhecer o resultado de um hábil trabalho legislativo. As mudanças ficarão concentradas numa outra Proposta de Emenda Constitucional.

Assim, pretende-se avançar na reforma da Previdência com dois projetos em tramitação paralela, ou simultânea, no Congresso.

Um é a PEC aprovada na Câmara. Outro reúne as supressões feitas pelo relator no Senado, que abre a possibilidade de alinhamento do sistema previdenciário de estados e municípios, institui a contribuição previdenciária de filantrópicas e modifica as regras da pensão por morte.

Trata-se de uma engenharia política com objetivo de circunscrever o debate sobre aspectos mais polêmicos a um só texto, aplainando a tramitação daquele cujo conteúdo foi aprovado por consenso na Câmara.

Ao mesmo tempo, transfere aos governadores e prefeitos a responsabilidade da aprovação da reforma nas assembleias e câmaras municipais, conforme as peculiaridades e o calendário político regional.

Não haverá prazo para que mudanças sejam decididas nos estados. Na prática, o calendário será determinado pela situação de insolvência de cada governo estadual e municipal.

Porém, uma vez aprovada a reforma pela assembleia estadual, haverá adesão automática dos municípios. A partir daí, se desejar, cada prefeitura terá quase um ano (exatos 360 dias) para rejeitar a adesão do seu município às regras da previdência estadual, que na essência devem estar alinhadas às do governo federal.

Esta será uma batalha particular do prefeito, porque precisará aprovar uma lei ordinária específica na Câmara de Vereadores.
Nada mais democrático.

A demografia e o capitalismo: Editorial | O Estado de S. Paulo

Em artigo publicado na revista Foreign Affairs (The Population Bust: Demographic Decline and the End of Capitalism as We Know It), Zachary Karabell analisa as possíveis consequências sociais e econômicas das atuais mudanças demográficas. “A maior parte do mundo está sofrendo fortes e bruscas contrações nas taxas de natalidade ou em sua população absoluta”, escreve.

O fenômeno das mudanças demográficas drásticas ocorre também aqui. É global. Por exemplo, no ano passado, o IBGE anunciou que, diante da diminuição da taxa de fertilidade e do aumento da expectativa de vida, o bônus demográfico do País terminava não mais em 2023, como estava previsto, mas em 2018. O bônus demográfico é a situação em que o número de habitantes em idade ativa, entre 15 e 64 anos, supera o total de pessoas consideradas dependentes – os idosos e as crianças.

Apesar dos enormes efeitos que as mudanças demográficas podem ter, por exemplo, sobre o clima, a geopolítica e o capitalismo, o assunto é muito pouco discutido. “Se o mundo no futuro tiver menos pessoas, será possível ter algum crescimento econômico real? Não apenas estamos despreparados para responder a essa pergunta, não estamos nem começando a nos perguntar”, afirma Zachary Karabell.

O assunto é complexo a começar pela própria dificuldade de traçar projeções seguras. A ONU prevê, por exemplo, que a população global chegará a quase dez bilhões em 2050. Mas estudiosos em demografia acham que os números podem estar superestimados. Quase sempre as expectativas da população feitas no passado não se concretizaram. Para o pesquisador Paul Morland, do Birkbeck College, é irracional atribuir um caráter de certeza às tendências futuras sobre a população.

Mesmo que não se saiba com segurança o que ocorrerá no futuro, os dados atuais já revelam, no entanto, que o paradigma de expansão da população utilizado nos dois últimos séculos não serve mais. “Chama a atenção que o declínio da população esteja se tornando um fenômeno global quase tão rapidamente quanto o boom populacional do século 20. As taxas de fecundidade na China e na Índia, que juntas respondem por quase 40% das pessoas do mundo, estão agora no nível de reposição ou abaixo dele. O mesmo acontece com as taxas de fecundidade em outros países populosos, como Brasil, Malásia, México e Tailândia.”

Zachary Karabell lembra que a deflação demográfica pode ter um efeito positivo sobre o aquecimento global. “Dado que as emissões de carbono são resultado direto de mais pessoas necessitando e exigindo mais material – de comida e água a carros e entretenimento –, se houver menos pessoas, haverá menor demanda.”

Mas se a diminuição da população mundial é positiva para o clima, ela pode ser profundamente desafiadora para o sistema capitalista – e aqui está o cerne da reflexão do artigo de Zachary Karabell. “O capitalismo é, essencialmente, um sistema de maximização – mais produção, mais bens e mais serviços. (...) Se a população global parar de se expandir e começar a diminuir, o capitalismo – um sistema que está implicitamente baseado em um número cada vez maior de pessoas – provavelmente não será capaz de prosperar em sua forma atual. O envelhecimento da população elevará o consumo de certos bens, como os cuidados com a saúde, mas, em geral, o envelhecimento e a diminuição da população acarretarão uma diminuição do consumo”, afirma Zachary Karabell.

Se essa mudança de paradigma é por si só desafiadora, ela traz ainda maiores desafios para países como o Brasil, que não conseguiram, nem mesmo no paradigma demográfico anterior – de população crescente e jovem –, alcançar um patamar mínimo de riqueza e de produtividade. Agora, com uma população mais velha e menos jovens, tudo indica que será ainda mais difícil. Como alerta Zachary Karabell, “se não estamos bem preparados para um mundo com mais pessoas, estamos totalmente despreparados para um mundo com menos gente”. É urgente abrir os olhos para a realidade.

Crédito segue expansão e sustenta a economia: Editorial | Valor Econômico

O crédito segue como um dos poucos fatores de sustentação da economia, que se recupera em ritmo lento. As concessões de empréstimos voltaram a crescer em julho, e o mercado de capitais ganha protagonismo como fonte de financiamento às empresas. São sinais de que, pelo menos por esse canal, os estímulos monetários estão se transmitindo da forma esperada - e poderão ser potencializados com a redução da incerteza e recuperação da confiança.

As concessões de crédito bancário dessazonalizadas registraram uma expansão de 1,8% em julho, na comparação com junho. O crédito livre, que é mais sensível à instância da política monetária, avançou 2%. A alta foi particularmente mais forte nas operações com pessoas físicas, que tiveram um incremento de 3,3% no período.

O crédito vem se acelerando desde o ano passado, quando o Banco Central reduziu os juros básicos ao menor patamar da história. Mais recentemente, a partir de junho, ganhou um novo impulso, depois que a autoridade monetária passou a sinalizar que retomaria os cortes dos juros básicos da economia. Mesmo antes de o BC baixar a meta Selic de 6,5% ao ano para 6% ao ano, em fins de julho, os juros futuros apresentaram uma expressiva queda, reduzindo os custos de captação dos bancos.

Até agora, os bancos repassaram para os clientes apenas uma parte da queda dos juros básicos. No crédito livre, os custos de captação dos bancos caíram 0,8 ponto percentual ente maio e junho, mas os juros efetivamente cobrados dos clientes recuaram 0,5 ponto percentual. Dessa forma, os bancos ainda têm uma gordura para queimar nas taxas, o que tende a favorecer a tomada de crédito nos próximos meses.

O crédito ampliado ao setor não financeiro apresenta crescimento expressivo, sobretudo nos títulos privados. Esse indicador permite uma análise mais abrangente do mercado de crédito, já que empresas estão trocando captações bancárias e no exterior pela venda de papéis no mercado de capitais doméstico.

Nesse caso, o BC não divulga dados sobre concessões, que têm um vínculo mais próximo com a atividade econômica, mas o aumento dos estoques dão uma boa ideia do dinamismo deste mercado. Em julho, houve uma alta de 3,4% no estoque de debêntures, notas comerciais e papéis securitizados. Em 12 meses, o aumento é de 33,2%.

De forma similar ao que ocorre no crédito bancário, o mercado de capitais está sendo impulsionado pelos baixos juros da economia. Investidores estão migrando de títulos públicos para títulos privados em busca de retornos mais altos. A Selic em níveis mais baixos também tende a estimular demanda por financiamentos, na medida em que muitos projetos se tornam viáveis com as taxas de desconto mais baixas. Esse último efeito, deve-se ponderar, tem sido mais fraco no momento atual, em virtude dos altos níveis de ociosidade da economia e das oscilações na confiança do empresariado.

No total, o crédito ampliado a empresas e famílias cresceu 10,1% no período de 12 meses até julho, incluídos títulos privados, empréstimos bancários e captações no exterior. É uma taxa mais moderada do que os percentuais de alta de até 30% ao ano no crédito bancário no começo dessa década. Mas o ciclo atual tende a ser mais sustentável. O último foi liderado pelos empréstimos direcionados e pelos bancos públicos - e foi interrompido pela grave crise fiscal.

Hoje, o setor privado está liderando. Desde dezembro de 2017, a participação do crédito direcionado no crédito total caiu de 49% para 44%. Na direção inversa, o crédito livre aumentou de 46% para 51% dos empréstimos. Os bancos privados, que em 2016 viram a sua presença no mercado de crédito ser reduzida a 43%, atualmente respondem por 51% da carteira de empréstimos do sistema.

A maior participação de bancos privados no crédito, por si só, não é garantia de que o ciclo de crédito será sustentável. Nos Estados Unidos e Europa, créditos mal gerados pelo setor privado levaram a uma crise financeira de grandes proporções em 2008, que só foi solucionada com dinheiro público. Para reduzir esses riscos, o Banco Central deve seguir com a sua tradição de exigir capitalização adequada e de fiscalização intrusiva.

A agenda de reformas do BC também deve ajudar, ao ampliar as informações sobre tomadores de crédito, aperfeiçoar garantias e aprofundar a competição no sistema. São medidas que devem ser adotadas ainda no início do ciclo de expansão de crédito, para evitar o acúmulo de desequilíbrios.

Nenhum comentário: