terça-feira, 22 de outubro de 2019

Andrea Jubé - Sempre ao seu lado

- Valor Econômico

Amigo de Bolsonaro desde a juventude, Alberto Fraga é um dos integrantes do núcleo mais restrito do entorno presidencial e é cotado para entrar no governo

Em tom saudosista, ele sacou o aparelho do bolso do paletó e exibiu a tela do celular com as imagens do grupo de rapazes bronzeados, na faixa dos vinte e poucos anos, com o mar da Urca ao fundo, calções de banho vintage e desafiou: “ache o presidente aqui na foto”.
Não era difícil: o rapaz esguio de cabelos muito lisos e sorriso largo na extremidade direita era o futuro presidente da República, companheiro de juventude do ex-deputado e ex-secretário de Transportes Alberto Fraga.

Jair Bolsonaro, 64 anos, e Alberto Fraga, 63, foram contemporâneos na Escola de Educação Física do Exército (Esefex) que funciona até hoje no Forte de São João no Rio de Janeiro. Naquela época, início dos anos 80, Bolsonaro participou de um dos episódios mais dramáticos da vida do então tenente da Polícia Militar.

Num dia de folga, Fraga caminhava com a família pela Rua Sá Ferreira, em Copacabana, com o filho Diego no colo, quando foram assaltados. Um deles - que depois Fraga identificaria como “Galo Cego”, por causa da mancha no olho - apontou-lhe uma arma, indiferente ao bebê de duas semanas que tinha nos braços.

Os bandidos fugiram, mas Fraga voltou nos dias seguintes ao local do crime até reencontrar o bando e persegui-los até o esconderijo.

Depois Fraga pediu reforçou aos colegas da turma da Esefex para capturá-los. O único dos 45 que se voluntariou, segundo Fraga, foi Bolsonaro.

Como ele era militar do Exército, Fraga o dispensou, argumentando que era uma missão policial. Ao fim, Fraga acompanhado de soldados da Polícia Militar capturou os agressores e os levou presos, até o “Galo Cego”.

Fraga rememora o episódio como uma das primeiras demonstrações de amizade de Bolsonaro. Passados 38 anos, Fraga - mesmo sem cargo no governo - é um dos integrantes do núcleo mais restrito do entorno presidencial. Ele é um dos responsáveis pela indicação de Augusto Aras para a Procuradoria Geral da República.

No cenário de faroeste em que se transformou a política brasileira, Bolsonaro cercou-se de amigos longevos para se aconselhar e reagir nas crises e traições. Os integrantes desse núcleo o acompanham há mais de dez anos. Fraga é um dos mais antigos.

Outro companheiro de longa data é o ministro da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira, que começou a trabalhar com ele há 16 anos. “Jorginho”, como é chamado pelo presidente, deu continuidade a uma amizade iniciada pelo seu pai, o capitão do Exército Jorge Francisco, morto em abril de 2018 e que foi por mais de 20 anos chefe de gabinete de Bolsonaro.

O ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, foi colega de turma de Bolsonaro na década de 70 na Escola Preparatória de Cadetes do Exército. Foram contemporâneos na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) e conviveram na Câmara, o general como assessor parlamentar do Exército. Hoje aceleram juntos as Harley Davidson.

Ainda de seu tempo na Câmara, Bolsonaro levou para a chefia do gabinete presidencial o major reformado Pedro César Sousa, e para sua assessoria especial o ex-assessor da Marinha Célio Faria Júnior.

Depois da Esefex, Bolsonaro e Fraga se reencontraram na Câmara no começo dos anos 90. Anos depois, seriam correligionários. Em 2003, durante a discussão do Estatuto do Desarmamento, Fraga era pró-comercialização de armas e enfrentava a oposição interna de Renan Calheiros no PMDB.

Bolsonaro o levou para o PTB, de onde saíram em 2005 para ingressar no PFL, hoje DEM. É o partido até hoje de Fraga, mas Bolsonaro trocou a sigla naquele mesmo ano pelo PP, depois migrou para o PSC, depois para o PSL e agora vigora a incerteza.

No ano passado, dias antes do segundo turno, Bolsonaro apresentou Fraga aos jornalistas como futuro ministro. “Anuncio aqui que quem vai coordenar a bancada, lá do Planalto, vai ser o Fraga”, disse o então candidato em 24 de outubro de 2018.

Exatamente um ano depois, o nome de Fraga voltou à baila como aposta na anunciada reforma ministerial. Há um mês, os desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) absolveram Fraga, à unanimidade de votos, de uma condenação na primeira instância pelo suposto uso do cargo de secretário de Transportes para obter vantagens indevidas.
Fraga sempre alegou que a acusação era infundada, mas a condenação constrangeria a eventual nomeação. No início deste ano, o mesmo TJDFT também o absolveu de uma condenação de posse ilegal de arma.

Em 2011, a Polícia Civil apreendeu um revólver e 289 munições de uso restrito em um apartamento atribuído a ele. Mas os desembargadores alegaram que uma resolução do Exército sobre posse de arma gera a absolvição.

Agora, livre de embaraços legais - e a depender do arbítrio presidencial - Fraga pode ser alçado do posto de amigo e conselheiro para ministro, seguindo a trilha Jorge e Ramos.

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Único dos três senadores da Bahia que não integrou a comitiva do Senado com recursos públicos ao Vaticano para a solenidade de canonização da Irmã Dulce (1914-1992), o líder do PSD, Otto Alencar, então professor na Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA), foi o cirurgião ortopedista recrutado pela religiosa nos anos 70 para operar os seus doentes. Alencar se lembra que a religiosa capturava as “vítimas” com o olhar. “Ela tinha olhos magnéticos, era impossível negar um pedido dela”. Ele reservou as quintas-feiras, durante 12 anos, para operar no Hospital Santo Antônio, que ela fundou. Quando ele trocou a missão de caridade pela política ela o recriminou. Mas em 1990, reeleito deputado estadual, foi nomeado secretário de Saúde pelo então governador Antônio Carlos Magalhães. Ele afirma que, no cargo, destinou recursos para aquisição de equipamentos e contratação de mão de obra para o hospital. Alencar conta que quinze dias antes de falecer, Dulce mandou chamá-lo e pelo modo como ela lhe dirigiu o olhar, ele diz que se sentiu “perdoado” por ter escolhido a política.

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