domingo, 27 de outubro de 2019

Bernardo Mello Franco - A escolha do pastor

- O Globo

O governo entregou a Casa de Rui Barbosa a uma afilhada do pastor Feliciano. Ela promete “humanizar” a instituição: “Lá é mais que uma casa, é um lar”

A Casa de Rui Barbosa vai começara semana comum anova presidente. Os servidores haviam indicado a filóloga Raquel Valença, que dedicou 33 anos à fundação. O governo preferiu nomear Letícia Dornelles, escolhida pelo deputado Marco Feliciano.

A afilhada do pastor tem planos imodestos. Autora de novelas do SBT e da Record, quer ser conhecida como “embaixadora da cultura no Rio”. “Queriam achar uma função pra mim em Brasília. Aí eu falei: ‘Não, deixa eu ficar no Rio’.

A fundação foi o que encontramos para eu poder ajudar”, ela me explicou, na sexta-feira. Letícia vai cuidar de uma instituição nonagenária, que guarda os arquivos do jurista baiano e de grandes escritores. Ela se disse animada com o desafio. “O Carlos Drummond de Andrade foi meu vizinho, então eu tenho um amor por ele que você não tem noção. É afeto mesmo, sabe?”, empolgou-se.

A nova dirigente também é escritora. Assinou obras como “Como enlouquecerem dez lições” e “As a venturas de Patrick na fazenda”, inspirada no filho de 9 anos. Além disso, foi repórter de TV e roteirista dos humorísticos “Partiu Shopping” e “Treme Treme”.

Em janeiro, ela entrou nora dardo governo ao defender o presidente no Facebook. “O Carlos Bolsonaro repostou e o texto viralizou”, orgulha-se. Depois disso, ela virou uma conselheira informal do poder. “Converso com algumas pessoas, dou ideias. Às vezes fico triste com alguma coisa que acontece e falo: ‘Poxa, gente, não faz isso...’”, contou. Letícia promete “humanizar” a Casa Rui

.“Lá é mais que uma casa, é um lar. Então tem que ter esse aconchego”, explicou. “Quero que todo mundo me dê amã opara a gente dar um grande abraço naquela casa.” Quando perguntei sobre a futura gestão, ela não citou metas muito específicas .“Por exemplo, você entra no site atual e ele é muito parado”, disse. “

Quero acelerar as palestras, que hoje são muito acadêmicas”, prosseguiu. “Tem o setor de arquivo, o setor de museu... quero unificar tudo”, acrescentou. A nomeação de Letícia chocou os servidores da fundação, que sempre tiveram chefes de perfil acadêmico. Na entrevista, ela pediu ajuda para tranquilizá-los.

“Sou bem pacificadora, sou libriana”, disse. “Não tenho mestrado, mas também sou pesquisadora. Não estou caindo de paraquedas. Passei por entrevistas, foi quase um reality show.”

A nova presidente contou que já sabia da nomeação há quatro meses, quando começou ase preparar pela internet. “Ainda tenho que fazer contato coma direção, mas já conheço tudo virtualmente ”, disse. Sobre os critérios usados na nomeação, ela afirmou: “O que eu sei é que as pessoas são indicadas por políticos.

Não tô sabendo de eleição, não”. Letícia também desconversou sobre a ligação com Feliciano: “Nem sei de onde saiu essa notícia. Agora, se ele me indicou, eu agradeço”. O pastor me contou outra história.

“Encaminhei para o ministro Osmar Terra avaliar. Ele achou formidável, e aconteceu a nomeação ”, confirmou, abordo do avião presidencial. De acordo com Feliciano, “a Fundação Rui Barbosa (sic) não precisa de mais um acadêmico, já tem muitos. Precisa de sangue novo”. “Letícia vai surpreender”, prometeu.

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