quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Hélio Schwartsman – Protestologia

- Folha de S. Paulo

Democracias têm mais dificuldade para conter os movimentos populares

Equador, Líbano, Chile. São países em que protestos com graus variados de violência estão tirando o sono de governantes. Qual é o próximo? Bolívia, Brasil? O que leva o povo às ruas para protestar?

Se há algo que as ciências sociais são ruins em explicar é a eclosão dessas manifestações. A literatura oferece apenas umas poucas pistas, que não permitem grandes voos de futurologia. O surgimento de revoltas populares já foi correlacionado à inflação, particularmente à inflação de alimentos, e, paradoxalmente, a crescimento econômico recente (que, por alguma razão, passa a ser visto como ameaçado).

Outro fenômeno interessante é que esse tipo de movimento pode ser transmitido de um país para outro, num modelo análogo ao de doenças contagiosas. Foram os casos das revoluções que derrubaram o comunismo no Leste europeu no final dos anos 80 e, com resultados menos duradouros, da Primavera árabe.

A grande verdade, porém, é que os gatilhos para a revolta são bastante aleatórios. Pode ser um aumento específico de preço (caso dos três países em questão), um suicídio público (Primavera árabe) ou um discurso mal interpretado (queda do Muro de Berlim).

Se é difícil determinar o que causa os protestos, descobrir formas de pará-los é um pouco menos complicado. A maneira mais óbvia é fuzilar manifestantes, como fez a China no massacre da praça da Paz Celestial. De forma menos funesta, um major americano conseguiu eliminar protestos violentos na cidade de Kufa, no Iraque, apenas retirando os vendedores de comida da praça central. Sem ter como saciar sua fome, as pessoas não permaneciam por tempo suficiente na praça para formar a multidão necessária para dar início às manifestações.

Ao fim e ao cabo, são as democracias que têm mais dificuldade para conter os movimentos populares. Na França, por exemplo, os coletes amarelos se tornaram um problema crônico.

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