terça-feira, 22 de outubro de 2019

O que a mídia pensa - Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

A reação dos oportunistas – Editorial | O Estado de S. Paulo

Surgidos a partir de 2012, os diversos movimentos dedicados à capacitação de quadros políticos, como Raps, RenovaBR, Livres e Agora!, vêm desde então oxigenando a política, seja por meio de debates, seja pela atuação dos líderes por eles formados. São organizações em geral apartidárias, sustentadas com recursos de seus integrantes e com aportes de patrocinadores privados. Os bons resultados desse trabalho não tardaram: desses movimentos saíram 54 políticos eleitos no ano passado, dos quais 30 para o Congresso. Diante dessa força, não demorou para que partidos pouco expressivos, política e doutrinariamente, começassem a se mobilizar para questionar os movimentos de renovação, como mostrou reportagem do Estado.

Tal reação era esperada. Os partidos contestadores são justamente aqueles que se notabilizam pela defesa exclusiva dos interesses de seus caciques, e não de ideias para a sociedade. Essas legendas não se fazem reconhecer por programa político, mas pela capacidade de fazer da atividade parlamentar um meio de parasitar o Estado. São, em resumo, representantes de tudo o que os movimentos de renovação da política combatem.

A estratégia desses partidos é questionar o financiamento dos movimentos. Em ofício ao Tribunal Superior Eleitoral, o deputado Fausto Pinato (PP-SP) pôs em dúvida a legalidade daquelas organizações, em particular no que diz respeito a doações de instituições privadas. “Se essas fundações podem receber doações, por que os partidos não podem?”, argumentou o deputado na petição. Santa ignorância, pois são justamente doações privadas que os partidos podem receber – à parte as escandalosas quantias provenientes dos fundos partidário e eleitoral, que são públicos.

Para o presidente do partido Solidariedade, deputado Paulinho da Força (SP), isso caracteriza violação da lei eleitoral, que proíbe doações de pessoas jurídicas a partidos – como se os movimentos fossem partidos. Na interpretação de Paulinho da Força, esses movimentos “agem como partidos paralelos” e, além disso, “pregam a destruição dos partidos”. O deputado informou que tem apoio de outros 11 líderes partidários para elaborar um projeto de lei que limite as doações a esses movimentos.

Muitos partidos políticos no País estão sendo destruídos, mas não pelas organizações dedicadas à renovação da política, e sim pelos desmandos de seus dirigentes. O desprestígio dos partidos é resultado de sua incapacidade de representar os anseios da sociedade. Os movimentos que pretendem oxigenar a política surgiram justamente para atender a uma crescente demanda pelo resgate da atividade política, sequestrada por políticos oportunistas. Se os partidos estivessem funcionando a contento, cumprindo seu papel na democracia, não haveria necessidade de organizar grupos de formação política.

Uma das tarefas dos partidos é oferecer a seus filiados oportunidades de formação e capacitação. Mas raras são as legendas que realizam esse trabalho – afinal desnecessário para os propósitos de partidos que só existem para engordar seus chefes.

Habituados a viver de dinheiro público, os partidos deveriam empenhar-se para voltar a ser relevantes, de modo a convencer os eleitores a financiar seu funcionamento. É isso que tornou os movimentos de renovação da política tão relevantes em pouco tempo: independentemente da ideologia que representem, esses grupos apresentam genuíno interesse em interferir no debate nacional e em proporcionar atmosfera civilizada para o diálogo, oferecendo ao País jovens quadros políticos com boa formação para fazer esse trabalho.

A questão central é que esses movimentos só terão razão de existir se os quadros por eles formados se abrigarem nos partidos políticos existentes e contribuírem, dessa maneira, para o arejamento do ambiente político-partidário. É preciso lembrar que não há democracia sem partidos políticos sólidos. É nas legendas que representam interesses legítimos a serem defendidos na arena parlamentar que a política madura se realiza. Assim, fazem muito bem os movimentos de renovação, colaborando para democratizar e ilustrar ainda mais os partidos e induzi-los à modernização – processo contra o qual se insurgirão somente os partidos que, dirigidos como empreendimentos familiares, se tornaram meros apêndices do Estado.

A grave crise do Chile – Editorial | O Estado de S. Paulo

Ela há de soar como alerta para o Brasil, que padece com desigualdade crônica, pobreza renitente e alto desemprego

Estável politicamente, graças à pacífica alternância de poder desde a redemocratização no início da década de 1990, e detentor de respeitáveis indicadores sociais e macroeconômicos, o Chile destoava como uma rara ilha de tranquilidade em meio às crises que, em diferentes graus, desafiam outros países da América Latina.

Sob esse manto de estabilidade política e econômica havia tensões latentes em segmentos da sociedade chilena que irromperam no país após o presidente Sebastián Piñera decretar o aumento de 3,75% na tarifa do metrô da capital Santiago, que passou de 800 para 830 pesos – o equivalente a R$ 4,80. O anúncio da medida desencadeou uma violenta onda de protestos que em três dias deixou 11 mortos, milhares de feridos e cerca de 1,5 mil detidos.

Desde o final da ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990), não se tinha notícia de manifestações tão sangrentas no Chile. A virulência dos protestos levou o presidente Piñera a decretar estado de emergência no sábado passado. Na noite de domingo, em pronunciamento à nação, ele afirmou que seu país está “em guerra contra um inimigo poderoso, implacável, que não respeita nada nem ninguém e que está disposto a recorrer à violência e à delinquência sem limites”. Piñera estava ao lado do general de Exército Javier Iturriaga, comandante das forças de segurança em Santiago. O presidente chileno não especificou que “inimigo” seria esse. Cerca de 9,5 mil homens da polícia e do Exército guardam as ruas da capital.

Indagado por jornalistas em Tóquio, onde se encontra para acompanhar a cerimônia de coroação do imperador Naruhito, o presidente Jair Bolsonaro disse estar preocupado com a escalada das tensões no Chile. “Tudo o que acontece na América do Sul preocupa (o Brasil)”, disse o presidente.

Há razões para preocupação, e não só pelo agravamento da crise na nação amiga, mas também pela similitude entre os protestos no Chile e os havidos no Brasil em junho de 2013, quando teve início uma série de manifestações em diversas cidades do País após o anúncio do aumento das tarifas de ônibus no Rio e em São Paulo. Logo se viu que o aumento das tarifas foi apenas o estopim para a eclosão de reivindicações muito mais amplas, até então recônditas, cujas repercussões sociais, políticas e econômicas ainda hoje se fazem sentir.

O mesmo parece estar ocorrendo no Chile. Diante da violência desenfreada dos protestos, o presidente Sebastián Piñera voltou atrás e suspendeu o aumento da tarifa do metrô de Santiago. O recuo, no entanto, não arrefeceu os ânimos dos manifestantes. No fim de semana passado, após a decisão do presidente chileno, houve novos episódios de saques a lojas e supermercados, depredação de prédios e estações de metrô, incêndios de veículos e furiosos confrontos entre policiais e manifestantes em várias cidades chilenas.

Setores da sociedade não alcançados pelos benefícios políticos e econômicos tomaram o aumento da tarifa de metrô como um toque de união contra tudo e todos que consideram responsáveis por mantê-los alijados dos ganhos de uma economia que crescerá 2% neste ano, uma realidade peculiar no continente. “Muitas demandas estavam latentes e não haviam sido respondidas (pelo governo).

Acumulou-se a tensão, a frustração que se reforça a cada dia com a vida cotidiana”, disse o sociólogo e analista político Octavio Avendaño, da Universidade do Chile.

O Chile tem a maior renda per capita da América Latina (mais de US$ 20 mil). Embora não seja um país pobre, padece da desigualdade. Os altos gastos com saúde e educação, além da pressão imobiliária, levam as camadas menos abastadas da população a um estado de permanente endividamento. Um terço dos chilenos com mais de 18 anos não pode arcar com suas despesas básicas contando com a própria renda, segundo estudo da Universidade San Sebastián y Equifax.

O sismo no país andino há de soar como um alerta para o Brasil, que padece não apenas com a desigualdade crônica, mas com a pobreza renitente e o alto desemprego.

Jornadas chilenas – Editorial | Folha de S. Paulo

Onda de protestos é teste inédito para o país que é modelo liberal na região

É inevitável associar os grandes e violentos protestos que tomam as ruas de cidades do Chile desde a semana passada às jornadas de junho de 2013 no Brasil —cujas motivações e efeitos permanecem motivo de especulação e debate.

Lá, como aqui, o estopim das manifestações foi um aumento aparentemente banal de tarifa de transporte público. Do mesmo modo, a sublevação logo transcendeu a causa original, sugerindo origens mais difusas para a insatisfação.

Tudo começou após o governo do presidente conservador Sebastián Piñera anunciar que o bilhete de metrô seria reajustado em 3,75% no horário de pico, passando de 800 (cerca de R$ 4,63) para 830 pesos (R$ 4,80).

Os protestos, inicialmente pacíficos, logo descambaram para o enfrentamento com as forças de segurança, deixando um rastro de caos, destruição e mortes.

Estações de metrô acabaram depredadas; automóveis e ônibus foram queimados; ataques incendiários atingiram prédios da companhia de eletricidade e do Banco do Chile, além de uma sede do jornal El Mercurio. Uma onda de saques a estabelecimentos comerciais se disseminou, e ao menos 11 pessoas morreram nos distúrbios.

Diante da situação, o governo apelou para uma medida radical: decretou estado de emergência e instituiu um toque de recolher. O Exército ocupou ruas do país pela primeira vez desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).

A repressão não intimidou os manifestantes, e a fúria prosseguiu mesmo após Piñera voltar atrás no aumento da passagem —o que provoca a busca por explicações.

Modelo de reformas liberais na América Latina, o Chile apresentou nas últimas três décadas o melhor desempenho econômico entre os principais países da região. Sua renda média por habitante, de US$ 25,7 mil (em valores ajustados pelo poder de compra da moeda), é a maior da vizinhança.

Não será difícil, contudo, apontar no país mazelas terceiro-mundistas, a começar pela alta desigualdade social e deficiências nos serviços públicos de saúde e educação.

O Estado chileno é pequeno, consumindo um quinto da renda do país em impostos —no Brasil, a carga se aproxima de um terço do Produto Interno Bruto. Do mesmo modo, gasta-se pouco, o que também gera tensões, como no caso do sistema de aposentadorias.

Especificidades à parte, os atos no Chile se inserem num quadro de turbulências recentes no continente, como no Equador e no Peru.

De imediato, trata-se de má notícia para o brasileiro Jair Bolsonaro (PSL), que, após a derrocada política de seu congênere argentino Mauricio Macri, vê mais um aliado na região entrar em apuros.

Difícil imaginar, afinal, que Piñera vá conseguir em pouco tempo uma resposta satisfatória ao levante. A notável estabilidade institucional e econômica do Chile dos últimos anos passa por um teste inédito.

Os árduos caminhos para a redução da desigualdade – Editorial | Valor Econômico

A desigualdade tem várias causas e uma delas é certamente a educação

A desigualdade aumentou na sociedade brasileira em 2018, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os pobres ficaram mais pobres ainda ou aumentaram pouco sua renda, enquanto os ricos enriqueceram mais, ampliando a distância entre os extremos. Segundo o IBGE, a renda dos 5% mais pobres caiu 3,2% e a dos 50% mais pobres aumentou 2%, enquanto a do 1% mais rico cresceu 8,2%. Ou seja, os mais ricos ganharam quase 34 vezes mais do que os 50% mais pobres.

Medida pelo índice de Gini do rendimento médio mensal real domiciliar per capita de todas as fontes de renda, a desigualdade cresceu para o maior patamar da série histórica iniciada em 2012. Levando em conta o salário obtido do trabalho, aposentadorias, pensões, aluguéis, programas de transferência de renda e outros rendimentos, o índice de Gini ficou em 0,545 no ano passado, o maior nesses seis anos. Quanto mais perto de 1, maior a desigualdade. De 2012 a 2015, o índice de Gini mostrou tendência de redução, passando de 0,540 para 0,524. Mas essa trajetória foi revertida a partir de 2016, quando o índice aumentou para 0,537, ficando praticamente estacionado em 0,538 em 2017. O índice de Gini médio entre os países da OCDE é de 0,36.

O levantamento do IBGE também joga luz na pobreza, que diminuiu ligeiramente no ano passado enquanto a extrema pobreza teve pequeno aumento. Usando o mesmo critério do Banco Mundial, que considera pobre quem vive com até US$ 5,50 por dia, o IBGE calculou esse segmento da população brasileira em 52,8 milhões de pessoas, 1,4 milhão a menos (2,4%) do que os 54,1 milhões de 2017. Já a pobreza extrema, que engloba quem vive com US$ 1,90 por dia, aumentou em 363 mil (2,7%) para 13,6 milhões de pessoas.

O aumento da desigualdade no ano passado não é novidade. Isso só não ocorreu em 2017 porque os mais ricos pouco avançaram. Segundo o especialista Marcelo Neri, diretor da FGV Social, é o ciclo mais longo de aumento da desigualdade registrado no país. De 2015 a 2017, nada menos que 8,3 milhões de pessoas engrossaram o número de pobres. O crescimento do desemprego é o principal responsável pelo aumento da concentração de renda nos últimos quatro anos.

A deterioração do mercado de trabalho vem na esteira do enfraquecimento da economia, iniciado no quarto trimestre de 2014, que reduziu o Produto Interno Bruto (PIB) em pouco mais de 7% entre 2015 e 2016. A ligeira recuperação de 1,1% em 2017 e mais 1,1% em 2018 foi quase imperceptível, dada a inanição do mercado de trabalho. Mesmo a recente recuperação do emprego não deve reduzir a desigualdade uma vez que ocorre principalmente no segmento informal, cujos salários são menores. Isso se reflete na renda de todos os trabalhos, calculada pelo IBGE, que melhorou no ano passado, mas está abaixo do pico da década. A renda per capita de todos os trabalhos ficou em R$ 2.234 no ano passado, acima dos R$ 2.183 de 2017 e dos R$ 2.197 de 2016. Mas abaixo dos R$ 2.279 de 2014.

Há economistas que apostam na melhoria da economia para reduzir a desigualdade. “Crescimento é (quase) tudo”, escreveram os professores da Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV, Pedro Ferreira e Renato Fragelli, no Valor (17/10), defendendo que “não há substituto melhor para o crescimento” quando se pretende reduzir sustentavelmente a pobreza. Os professores mostram como a expansão econômica reduziu a pobreza em países como a China e a Índia. Mas não teve efeito igual na desigualdade, especialmente pela falta de preparo da mão de obra nesses países. A desigualdade tem várias causas e uma delas é certamente a educação.

Em outro artigo, o professor Francisco Tavares e a procuradora Élida Graziane Pinto, também em artigo para o Valor (18/10), mencionam estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI), que avalia que o sistema tributário brasileiro é dos menos eficientes na redução do Índice de Gini e ressaltam a necessidade de revisão das renúncias fiscais e da regressividade tributária.

Outro ponto importante é a manutenção das políticas sociais. A instituição do 13º salário para o Bolsa Família foi uma ação positiva, mas não compensa o fato de o benefício não ter sido reajustado. A mudança de regra de correção do salário mínimo, que deixará de ter ajuste real, é necessária, mas terá impacto negativo, por seu efeito nas rendas da aposentadoria e pensões, que representam 20,5% do rendimento médio das pessoas, em comparação com os 72,4% provenientes do trabalho. Combater a desigualdade exige ação simultânea em muitas frentes.

Ineficiência estatal e concentração da renda provocam revolta chilena – Editorial | O Globo

O desafio imediato do presidente Sebastián Piñera é pacificar a sociedade

Parece contraditório que no Chile, país conhecido pelo seu avanço econômico, ocorra uma revolta de grandes proporções, tendo levado a que o governo de Sebastián Piñera, de centro direita, lançasse mão de medidas excepcionais, previstas na Constituição, para tentar conter saques e depredações em Santiago e outras cidades.

Pela primeira vez desde a ditadura de Pinochet, em 1990, os militares voltaram às ruas, a pedido do governo. Decretou-se toque de recolher. Até ontem, contavam-se 11 mortos. O metrô de Santiago teve 75 estações depredadas.

A centelha da revolta foi o aumento de tarifas subsidiadas do metrô. Seguiu-se infeliz comentário do ministro da Economia, Juan Andrés Fontaine, que sugeriu aos habitantes de Santiago acordar ainda mais cedo para pagar tarifas mais baixas nos horários de fim da madrugada. Foram destampadas tensões acumuladas no subsolo social, à semelhança do que ocorreu no Equador há duas semanas com o corte de subsídios aos combustíveis.

Guardadas as diferenças, lembra episódios no Brasil em meados de 2013, quando um reajuste da tarifa de ônibus em São Paulo funcionou como ignição de protestos, que se espalharam pelo país. A mobilização foi feita por redes sociais, sem o controle de máquinas sindicais e partidárias. O governo do PT à época, de Dilma Rousseff, ficou atônito diante de um sentimento de exasperação que não havia sido detectado pela elite política — como ocorreu no Equador e, agora, no Chile. Nos três casos o centro das queixas coletivas esteve na má qualidade dos serviços públicos.

No Brasil, a “classe média emergente”, citada pelos governos petistas como produto do êxito das políticas distributivistas do partido, foi para as ruas. Às vésperas do período de desaceleração e estagnação econômica que se aprofundaria a partir 2014, jovens começavam a se frustrar.

São inegáveis os avanços chilenos. A hiperinflação foi debelada, a renda per capita subiu para US$ 25 mil, maior que a da China e a do Brasil. Porém, a renda ficou mais concentrada.

O desafio imediato do presidente Piñera é pacificar a sociedade, até porque nas próximas semanas o Chile vai sediar uma série de grandes eventos, como a Conferência de Mudanças Climáticas da ONU, a reunião de cúpula dos países do Pacífico e a final da Copa Libertadores da América. Depois, será necessário encaminhar reformas para melhorar a distribuição da renda e aumentar a eficiência do gasto público. Piñera vai precisar de maioria parlamentar, que hoje não possui.

O preço a pagar pela leniência com a corrupção – Editorial | O Globo

Dúvidas sobre o combate à lavagem de dinheiro podem afetar nota de crédito do país

Mesmo que ainda precise ser mais aberto e conectado ao mundo, o Brasil tem uma indiscutível relação de interdependência com o exterior. Isso fica mais evidente no mercado financeiro, em que bolsa e câmbio oscilam em função dos humores nas grandes praças de Nova York, Londres e Frankfurt, entre outras. Mesmo com todas as dificuldades econômicas dos últimos anos, o PIB nacional está entre os dez maiores do mundo, e o país é um forte competidor em matérias-primas, principalmente nas commodities alimentícias. Não há, portanto, como evitar que fatos internos sejam avaliados no exterior e possam ajudar ou prejudicar a imagem do país, com implicações na diplomacia e nos negócios.

Sem avaliar o mérito da decisão, ainda a ser discutido no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), a liminar concedida pelo presidente da Corte, Dias Toffoli, a pedido de advogados do senador Flávio Bolsonaro, que dificultou o relacionamento operacional entre o Coaf, rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira (UIF), e o Ministério Público, desencadeia desdobramentos negativos.

O que parecia ser apenas um pedido para que os direitos individuais do filho do presidente fossem respeitados na investigação que estava em curso sobre movimentações financeiras atípicas do senador, quando era deputado na Alerj, e seu braço direito, Fabrício Queiroz, se transformou em um problema com implicações amplas.

A suspensão, por decisão judicial monocrática de Dias Toffoli, da investigação sobre Flávio e, por decorrência de uma infinidade de outros casos semelhantes, teve grande repercussão no Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e do Financiamento do Terrorismo (Gafi), entidade multilateral com sede em Paris, da qual o Brasil é membro.

Em comunicado, o Gafi formalizou a preocupação com a possibilidade de o ato do presidente do STF prejudicar o combate a crimes financeiros, por afetar o compartilhamento de informações da UIF com procuradores, responsáveis pelo encaminhamento de acusações à Justiça.

Em princípio, o julgamento do mérito da liminar foi marcado para o fim de novembro. Mas há no Congresso projeto para separar, por lei, auditores fiscais e o MP, também de conhecimento do Gafi.

Existe um movimento no Legislativo e no Judiciário para conter os excessos da Lava-Jato. Mas é preciso ter consciência das repercussões do que poderá vir a ser decidido sobre, por exemplo, a definição de notas de crédito do país por agências avaliadoras, que se valem de entidades como o Gafi para definir suas notas.

O Brasil também é signatário da Convenção Antissuborno da OCDE, organização que congrega os países ricos. Também ela divulgou nota sobre a “preocupação” com o ato do presidente do STF. O projeto do país de entrar na OCDE poderá ser prejudicado. Não se trata de interferência externa, apenas a contrapartida de uma positiva internacionalização do país.

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