quarta-feira, 2 de outubro de 2019

Ricardo Noblat - Crônica de um desastre anunciado

- Blog do Noblat

Vitória com gosto de derrota

Bastavam 49 votos de um total possível de 80 (o presidente do Senado só vota em caso de empate) para que a reforma da Previdência fosse aprovada pelo Senado em primeiro turno.

Mas o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (PMDB-PE), apostava que ela seria aprovada com 61 a 63 votos. E mesmo quando o placar registrou 56 votos a favor, ele dobrou a aposta.

Se dependesse de Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, a sessão só seria retomada hoje com a votação dos artigos destacados pela oposição. Teria sido mais seguro.

Mas Bezerra Coelho insistiu em votar os destaques de imediato. Votou o primeiro e ganhou – o destaque foi derrubado. Por um problema de redação, os dois seguintes ficaram para depois.

Então foi posto em votação o quarto destaque – o artigo que criava regras mais duras para o pagamento do abono salarial a trabalhadores de baixa renda com carteira assinada.

Aconteceu o que até a oposição duvidava que fosse possível: faltaram seis votos ao governo para manter o artigo. Alguns senadores já tinham ido embora. O quórum baixara.

“Eu avisei a ele para não votar o destaque, eu avisei” – comentou, aflito, um assessor de Bezerra Coelho antes de aconselhar o senador a propor o encerramento da sessão.

O desastre previsto pelo assessor reduzirá a economia com a reforma da Previdência em R$ 76,4 bilhões em 10 anos. Agora será de R$ 800,3 bilhões – se nada mais for mudado no texto original.

Lula no olho da rua

O jogo começa a virar
O jogo só acaba quando o juiz apita – e, pelo menos no Supremo Tribunal Federal, o jogo para Lula só acabará quando os ministros decidirem se a prisão em segunda instância continuará valendo ou não. Dias Toffoli, presidente do tribunal, pretende pôr a matéria em discussão ainda este mês.

Hoje, quando for retomada a sessão suspensa na semana passada, o jogo recomeçará com ampla maioria de votos favorável ao entendimento de que réu delatado deve ser ouvido nas alegações finais de um processo só depois do réu delator. Afinal, a última palavra sempre cabe à defesa.

A ser assim, a decisão beneficiará Lula e outros réus. Lula, no caso do processo do sítio de Atibaia reformado para ele de graça pelas construtoras Odebrecht e OAS. Lula já foi condenado em primeira instância. Mas como foi ouvido antes do réu que o delatou, a condenação deixaria de valer.

Se nas próximas semanas o tribunal mudar de posição e cassar o direito da segunda instância de prender quem condenou, Lula sairá de Curitiba direto para casa, livre, leve e solto. Foi por 6 votos contra 5 que o tribunal concedeu à segunda instância o direito que agora poderá subtrair por 6 votos contra 5 ou por 7 contra 4.

É nisso que aposta Lula quando se recusa a pedir a progressão de pena para o regime semiaberto no processo do triplex do Guarujá. Ele já cumpriu um sexto da pena e poderia sair para trabalhar durante o dia recolhendo-se à prisão à noite. Bastaria que respeitasse as condições estabelecidas para isso pela Justiça.

Uma das condições foi anunciada ontem: a de que pague uma multa de R$ 4,9 milhões. Com seus bens bloqueados como estão ele não tem condições de pagar. Se alguém quisesse pagar por ele Lula não aceitaria. Lula insiste que é inocente. O pagamento da multa seria interpretado como um reconhecimento de culpa.

O jogo parece estar virando a favor dele. Mas para que vire de todo, Lula espera que até novembro o tribunal vote a ação de sua defesa que pede a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro no caso do tríplex do Guarujá. Se isso acontecer e se o pedido for aceito, seria anulada a condenação que levou Lula a ser preso.

É possível? Em tese, sim. Mas difícil que aconteça. Outros condenados poderiam se beneficiar da mesma decisão. Na prática, isso significaria o fim da Lava Jato.

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