segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Andrea Jubé - Agenda social aproxima Maia do ‘centro progressista’

- Valor Econômico

Presidente da Câmara encampa pacote elaborado por parlamentares ligados a movimentos

Fiador da agenda de reformas e do ajuste fiscal, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), investe agora em uma pauta frequentemente associada à esquerda - o combate à pobreza e à desigualdade social. O recente lançamento da agenda social de desenvolvimento, na prática, o aproxima do centro, ao mesmo tempo em que faz aceno relevante aos parlamentares estreantes, egressos dos movimentos de renovação política.

O pacote de propostas para a área social também afina o diálogo de Maia com o apresentador Luciano Huck, com quem o integrante do DEM se encontrou algumas vezes, e que tem sustentado em palestras pelo país que o ajuste fiscal, necessário ao desenvolvimento econômico, não pode vir dissociado do combate à desigualdade social.

“Cresceu entre congressistas a compreensão muito evidente de que só fazer reformas de cunho fiscal não resolve o problema do Brasil”, disse o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) ao Valor. Ele reconhece que o pacote é a primeira iniciativa legislativa de expressão, com efetivo potencial de aprovação no plenário, do grupo de parlamentares eleitos a partir dos movimentos de renovação política, apoiados por Luciano Huck.

O movimento de Maia rumo a um “centro progressista” ocorre a um ano das eleições e na metade do segundo mandato de presidente da Casa, com chances remotas de reeleição. A agenda social tem apelo eleitoral maior que a agenda econômica, baseada principalmente nas reformas da Previdência e do sistema tributário.

Há uma preocupação da cúpula do DEM com a expansão eleitoral da sigla, que perderá protagonismo quando encerrarem os mandatos de Maia e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), no início de 2021. Não há ambiente político para eventual emenda constitucional autorizando a reeleição dos dirigentes das Casas no meio da legislatura.

Sem o comando da Câmara, Maia tem planos de continuar viajando pelo país para viabilizar uma candidatura presidencial - com a qual ele flertou em 2018 - ou uma vaga de vice. Projeto amparado em sua interlocução com o mercado e no eventual legado da agenda social. Até lá, Maia tem mantido um canal de diálogo aberto com o PSDB do governador João Doria, com o PDT do presidenciável Ciro Gomes e até mesmo com o PSL de Luciano Bivar.

Em abril, a deputada Tabata Amaral (PDT-SP) alertou Maia que o governo do presidente Jair Bolsonaro era omisso na área social e, diante dessa lacuna, caberia ao Congresso protagonizar o debate sobre o combate à desigualdade social numa realidade de 15 milhões de novos pobres e miseráveis a partir de 2014 - número equivalente a três Dinamarcas -, 12,5 milhões de desempregados e a estratégia do governo de taxar os desempregados para gerar novas vagas de trabalho.

Então Maia encomendou a Tabata propostas para a área social. O presidente da Câmara liberou consultores de seu gabinete para atuar junto com os assessores do gabinete compartilhado dos parlamentares do movimento Acredito, grupo formado por Tabata, pelo senador Alessandro Vieira e pelo deputado Felipe Rigoni (PSB-ES).

Após quase oito meses de trabalho, o resultado é um pacote de projetos formado por uma proposta de emenda constitucional (PEC) que transforma o programa Bolsa Família em política de Estado e pelo menos sete projetos de lei. O primeiro PL, protocolado na semana passada, inclui 3,2 milhões de crianças na primeira infância ao Bolsa Família - é o único com impacto fiscal, estimado em R$ 9 bilhões.

A pauta tem sintonia fina com o discurso político de Huck e de seu conselheiro econômico, o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga. Ambos sustentam que não existe conflito entre crescimento econômico, distribuição de renda e proteção social.

Na incursão por Brasília há duas semanas, antes da finalização dos projetos, Huck se reuniu, separadamente, com Rodrigo Maia, e também com os parlamentares do Acredito: Tabata, Rigoni e Vieira.

Questionado se Huck colaborou no projeto, Alessandro Vieira diz que foram discutidas apenas “superficialmente” com o apresentador, que desponta como presidenciável em 2022.

Por meio de sua assessoria, Huck disse que vê “com excelentes olhos o Congresso se movimentando no sentido de entender que não adianta fazer o bolo crescer para depois dividi-lo”. “Ou ele cresce alimentando a todos ou teremos a perpetuação da pobreza. E o Brasil irá mergulhar definitivamente no abismo social que nos divide”, disse o apresentador ao Valor. “De nada adianta um Estado eficiente se ele não for afetivo. Está claro que se não cuidarmos das nossas contas, não cuidaremos das nossas pessoas. A nossa responsabilidade é do tamanho dos nossos privilégios”, acrescentou.

Alessandro Vieira relata que antes do lançamento da agenda social, o trio fez reuniões com lideranças do PP, DEM, PSC, MDB, que se mostraram receptivos à ideia. Cada projeto será discutido em uma comissão especial a ser criada por Rodrigo Maia, e a meta é aprovar a maioria das propostas no primeiro trimestre de 2020.

Nesta semana será protocolado o segundo lote de projetos da agenda social. Um deles contempla alterações na Lei do Jovem Aprendiz: o tempo que o aluno passa dentro da empresa, trabalhando, passaria a contar como crédito no ensino médio; e o limite de dois anos no contrato do jovem aprendiz deixaria de existir.

Um dos projetos em gestação, dentro do pilar de políticas para boa governança, propõe uma Lei de Responsabilidade Social, inspirada na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 2000, um dos marcos da gestão de Fernando Henrique Cardoso. A LRF impôs o controle dos gastos da União, Estados, Distrito Federal e municípios, condicionando-os às respectivas capacidades de arrecadação fiscal.

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