quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Hélio Schwartsman - Não é só a polarização

- Folha de S. Paulo

Grupos têm o péssimo hábito de promover a animosidade

Parece haver um consenso entre os analistas de que a saída de Lula da prisão tende a acirrar a polarização. Interessa tanto ao ex-presidente quanto ao atual promover uma escalada retórica, na qual um identificaria o outro como o inimigo a derrotar, reduzindo assim o espaço para discursos e candidaturas alternativos.

Não discordo dessa avaliação. Apenas gostaria de ressaltar que a polarização, definida como a tendência de grupos a adotar posições que são mais extremas do que a inclinação inicial de seus membros, não é o único problema. Ela muitas vezes se faz acompanhar de outras patologias do pensamento de grupo que também deixam mortos e feridos. Convém dar uma espiadela em algumas delas.

Grupos têm o péssimo hábito de promover a animosidade. Se pusermos um corintiano e um palmeirense juntos para discutir se o lance envolvendo o zagueiro foi pênalti, eles jamais concordarão, mas poderão se tratar com alguma urbanidade. Entretanto, se colocarmos na mesma sala cem corintianos e cem palmeirenses para debater o mesmo tema, o mais provável é que haja uma batalha campal.

Próxima à animosidade está a tendência de grupos a assumir comportamentos mais arriscados do que a disposição individual de seus integrantes. Isso pode estar relacionado à diluição de responsabilidades.

Outra característica perniciosa é a conformidade. Definida uma posição, grupos farão de tudo para calar as vozes dissonantes internas. Um traço também marcante é a tendência de grupos de homogeneizar o pensamento dos que pertencem a outros grupos, não raro os reduzindo a caricaturas.

Nada disso ajuda muito a democracia. Mas, como limitar aquilo que indivíduos podem dizer ajuda ainda menos, essas patologias do pensamento de grupo são um problema com o qual precisamos conviver. Até existem antídotos, mas as pessoas raramente se veem como presas do grupo e por isso resistem a experimentá-los.

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