sábado, 23 de novembro de 2019

João Domingos - A antítese do PT

- O Estado de S.Paulo

Até por falta de tempo, falta medir o tamanho do partido de Bolsonaro

O partido que o presidente Jair Bolsonaro está criando, do qual é presidente da comissão provisória, e o filho, o senador Flávio Bolsonaro (RJ), é o vice, surge como a antítese do PT.

E, como o PT, provavelmente será falado, estudado e dissecado. Luiz Inácio Lula da Silva foi o sindicalista que ganhou notoriedade na segunda metade dos anos 1970 e fundou o PT no início dos 80, ainda na ditadura militar. Tal partido, que depois chegaria à Presidência da República e só sairia com o processo de impeachment de Dilma Rousseff, nasceu da junção do pensamento da elite sindical, do clero progressista, de acadêmicos de esquerda que rejeitavam o PCdoB e o antigo PCB, por tê-los como inviáveis, retrógrados e dogmáticos, e de trotskistas fundamentalistas.

Jair Bolsonaro fundou o Aliança pelo Brasil (APB) a partir do próprio clã familiar, de parlamentares que foram eleitos em sua onda política e de adeptos de uma linha de pensamento da direita que ainda não é possível definir muito bem. Só já se sabe que está se acostumando a misturar política com religião, é conservadora ao extremo e confia na tese de Bolsonaro de que uma pessoa pode se armar para se defender de quem estiver armado e ameaçar a sua segurança ou a de seus familiares. Um grupo que até pouco tempo não costumava aparecer nem expor suas ideias.

Não expunham suas ideias nem apareciam porque, também até pouco tempo, era vexatório e até se arriscava a levar uma vaia quem ousasse falar que era de direita.

Bolsonaro disputou a Presidência da República como o anti-PT, o anti-Lula. A partir de seu gesto, conseguiu despertar essa direita envergonhada e uni-la em torno dele. A ponto de por ela ser chamado de “mito” e de ganhar outdoors por todo o Brasil de 2016 para cá sem que nem ao menos soubesse quem é que mandou fazer a propaganda.

O PT, o Brasil já sabe o tamanho que tem. Sabe que é um partido de tendências hegemônicas, que não gosta muito de dividir, que numa autocrítica que fez em maio de 2016, logo depois da abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, se disse descuidado por não ter reformado o Estado, “o que implicaria impedir a sabotagem conservadora nas estruturas de mando da Polícia Federal e do Ministério Público Federal; modificar os currículos das academias militares; promover oficiais com compromisso democrático e nacionalista; fortalecer a ala mais avançada do Itamaraty e redimensionar sensivelmente a distribuição de 5 verbas publicitárias para os monopólios da informação”.

Caso fosse fazer uma autocrítica, o partido de Bolsonaro se queixaria de ter sido descuidado quando esteve no governo, como o PT se queixou? É possível que sim. Ninguém que planeja ficar no poder gosta de descuidos, principalmente quando podem atrapalhar seus planos. O próprio Bolsonaro já deu mostras de sobra de que quer tudo sob seu controle. Já negou verba publicitária para meios de comunicação dos quais não gosta, já escolheu o chefe do Ministério Público que melhor se enquadrava em seu estilo, já determinou o fim da prática ideológica no Itamaraty, já exigiu a demissão de quem considerou sem comprometimento consigo ou vinculado a partido ou movimento que, no entender do presidente da República, é adversário do seu governo.

Até por falta de tempo, falta medir o tamanho que o partido de Bolsonaro tem. Isso poderá acontecer quando o APB estiver regularizado. Os institutos de pesquisa acham que os bolsonaristas podem ser uma parcela de 15% da população. Se tal porcentual se confirmar, o partido de Bolsonaro já nasce grande. É de fato um fenômeno a ser muito bem estudado. E dissecado.

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