terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Maia: Economia fraca se deve em parte a insegurança gerada por Bolsonaro

Presidente da Câmara disse ainda que entregará texto da reforma administrativa ‘independente da proposta do governo

Por Gabriel Vasconcelos | Valor Econômico

RIO - O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou ter convicção de que o fraco desempenho da economia brasileira neste ano se deve, em parte, à insegurança gerada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Maia criticou o governo mais de uma vez durante gravação do podcast "Ao ponto”, do Jornal O Globo, hoje no Rio de Janeiro.

"Tenho convicção que o crescimento [da economia] projetado no final do ano passado, de 2,5%, caiu para 1% muito em função dessa insegurança que o governo gerou nos primeiros seis, sete ou oito meses de governo", disse Maia.

Segundo o deputado, parte da equipe do governo, inclusive da área econômica, "mistura liberdade com libertinagem" e "trabalha sempre com a tese de tirar o Estado completamente da vida das pessoas".

"A gente sabe que não é isso. O que a sociedade quer é outro Estado, um Estado regulador que fiscalize e garanta serviços de qualidade, mas aí se mistura isso com uma certa libertinagem."

Ele citou o projeto da liberdade econômica enviado pelo governo ao Congresso. "Se fosse aprovar tudo que eles queriam, não ia ter mais fiscalização para nada no Brasil. Nesse extremo também não dá", disse.

A caminho da planície, Maia reforça pregação reformista
Questionado sobre os atritos entre os membros do PSL, antigo partido de Bolsonaro, Maia disse se tratar de uma briga por poder. "É uma briga pelo tempo de TV e pelo fundo partidário. Uma briga que acontece em todos os partidos, mas, como eles são o partido das redes sociais, é uma briga explícita, bem explícita mesmo. Todo mundo nu e se matando."

Sem citar nomes, ele disse que novos eleitos chegam a Brasília com uma expectativa da política sempre muito negativa e equivocada. "A pessoa vai para lá, acha que ninguém trabalha, que ninguém tem preparo, que você passa três dias lá à toa e depois vem pra cá na quinta-feira e fica na praia. Quando chegam lá, veem que não é isso. [A política] é a representação da sociedade. Tem gente boa, gente ruim, mas um ambiente de muito trabalho", afirmou.

Para o deputado, as propostas polêmicas do governo atendem nichos de opiniões mais radicais. Esses nichos foram a base da vitória de Bolsonaro nas eleições. Assim, na prática, o presidente "defende o que ele representa da forma que ele acha correta". Essa forma, disse, é "trabalhar com o micro", respondendo de forma objetiva ao anseio de determinados setores.

Nesse sentido, ele citou caminhoneiros, trabalhadores rurais, motociclistas e garimpeiros como os alvos de ação do presidente, ao responder esses anseios. “Quando a gente vai falar de caminhoneiro, vai dizer que o caminhoneiro precisa de infraestrutura, de um marco [regulatório] de trabalho correto e que a economia cresça para contratar frete. O presidente Bolsonaro pensa diferente. O 'tratar o caminhoneiro' dele é reduzir o preço do óleo diesel e aumentar a pontuação da carteira de motorista. Ele vai nos pontos objetivos e a gente fica no abstrato. E é por isso que ele mantém popularidade junto a um terço da população."

De forma análoga, Maia disse que a solução de Bolsonaro para os agricultores passa por armá-los para evitar invasões e, para motociclistas, acabar com o seguro DPVAT. "Se acaba o DPVAT e não coloca nada no lugar, quem é que vai pagar por acidentes contra terceiros, que acontecem todo dia? Mas o cara que tem a moto olha e acha que é bom. Esse formato dele trabalhar em termos micro dá resultado. Não sei se a médio e longo prazo, mas no curto prazo, dá resultado", analisou.

Reforma administrativa
O presidente da Câmara afirmou ainda ao participar das gravações do podcast que vai entregar uma proposta de reforma administrativa independente da proposta do governo - e disse esperar "tramitação fácil" da reforma tributária em 2020.

"Independente da proposta do governo, a gente vai ter a nossa, para enxugar isso [carreiras do funcionalismo], construir novas carreiras com o salário inicial mais baixo para chegar ao teto ao longo de 20 ou 25 anos. Porque não dá mais para isso acontecer da noite para o dia como é hoje nos três poderes".

Segundo Maia, uma consultoria contratada, a Falcone, entregará, na semana que vem, relatório com a análise das carreiras do poder Legislativo.

Maia disse que só não entregou a proposta ainda porque está discutindo a legalidade de legislar sobre a estrutura do Executivo e Judiciário. "Tenho conversado com a ministra Cármen Lúcia [do Supremo Tribunal Federal] porque tem uma dúvida constitucional, no caso de tratar da carreira de outro poder, se posso usar uma emenda constitucional de parlamentar. Uma parte dos ministros diz que não posso e a outra [parte], até por casos já julgados, diz que posso. Independente do governo eu acho que a gente pode avançar nesse tema", disse.

Ele ponderou, no entanto, que o melhor seria harmonizar a reforma entre os três poderes, que apoiariam as mudanças conjuntamente. Nesse sentido, convocou o governo a encaminhar seu pacote e o Judiciário a "vir junto".

"A reforma administrativa reduz a desigualdade porque, hoje, os recursos estão concentrados na atividade meio e não há recursos para investimento. Em 1993, o Brasil tinha uma capacidade de investimento de 30% do orçamento. Nossa capacidade de investir hoje é de 2% [do orçamento], mas, na verdade, é negativa porque você tem déficit", afirmou.

Na visão do deputado, fala-se muito na possibilidade de protestos de rua, como os que têm acontecido no Chile. Para ele, o meio de evitar que o Brasil caminhe para isso é, justamente, reorganizando o orçamento para reduzir desigualdades. Para tanto, disse, um primeiro passo já foi dado com a reforma da Previdência - e seguirá, agora, com a reforma administrativa. "Na Câmara existem 4 mil funções, até para colocar o broche tem uma pessoa", reclamou.

Ao falar sobre reformas, o deputado afirmou ainda que a tributária tem um "apelo muito forte" dentro da Câmara como uma proposta da Casa. "A origem é nossa, o trabalho foi feito junto com os quadros técnicos na área tributária e acho que ela vai caminhar com muita facilidade. Esse é o meu sentimento", disse.

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