sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Bruno Boghossian – O dono do passe

- Folha de S. Paulo

Presidente tenta atordoar personagem que enxerga como ameaça, mas pode irritar sua base

Jair Bolsonaro e Sergio Moro nunca estiveram tão próximos de um curto-circuito político. Apesar das eventuais homenagens de um e das recorrentes mesuras de outro, presidente e ministro parecem cada vez mais dispostos a mergulhar numa disputa de poder inevitável.

Ainda que tenha sido divulgada apenas como uma ideia em estudo, a redução dos atributos de Moro com a possível recriação do Ministério da Segurança mostra que Bolsonaro está disposto a enfrentar o integrante mais popular de seu governo.

O presidente faz questão de turbinar a propaganda oficial que ostenta as estatísticas de redução de crimes violentos, mas indicou claramente que poderia tirar esse brinquedo das mãos do subordinado.

Empacado na pauta anticorrupção (sabotada pelo presidente, aliás), Moro abraçou a bandeira da segurança. Bolsonaro poderia ter dito apenas que as coisas vão bem. Preferiu participar ativamente das discussões e dar combustível ao plano encampado por secretários estaduais.

Embora o ministro seja considerado intocável por parte considerável da base bolsonarista, o presidente não demonstrou nenhum receio em contrariá-lo. “Lógico que o Moro deve ser contra”, antecipou-se.

Desde que Moro disse “sim” e entrou no governo, Bolsonaro insiste em dar sinais de que é o dono do passe do subordinado. Disse haver um compromisso para indicar o ministro à primeira vaga aberta no STF em seu governo, mas recuou. Depois, tascou um “quem manda sou eu” ao ameaçar demitir o chefe da Polícia Federal, atropelando o auxiliar.

O presidente quer manter Moro na rédea curta. Ora sinaliza que o ex-juiz seria um vice dos sonhos em 2022, ora indica que ele pode ser seu sucessor em 2026, mas dá outros recados quando o ministro demonstra estar confortável no mundo político.

Bolsonaro age para atordoar um personagem que o ameaça, mas esses choques também desgastam sua imagem entre os seguidores de Moro. Se o ministro decidir enfrentar o chefe, o presidente terá problemas.

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