Merval Pereira
DEU EM O GLOBO
A expressão em inglês "Catch-22", que dá nome ao livro de Joseph Heller - "Ardil-22" no Brasil -, é um termo militar que significa que você está diante de uma situação paradoxal, sem saída, uma armadilha. É nessa situação que se encontra a oposição brasileira. Nos bastidores da disputa interna do PSDB pela definição não apenas do nome do candidato da oposição, mas, sobretudo, do momento mais propício para apresentá-lo oficialmente ao eleitorado, está a dificuldade dos tucanos de assumir um discurso oposicionista que se apresente como alternativa, diante da popularidade do presidente Lula e de seus métodos populistas de governar, especialmente na crise econômica que o mundo vive.
Os dois estados governados pelo PSDB que têm no comando candidatos potenciais à Presidência, Minas Gerais e São Paulo, são também dos que mais sofrem com a redução de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) em consequência da queda de consumo.
Houve queda de arrecadação do imposto em nove estados em outubro, em 12 em novembro e em 16 em dezembro, segundo o Ipea, o que mostra um quadro de gravidade crescente da crise. O governador de São Paulo, José Serra, preocupado com os efeitos da crise no seu estado, prefere despender suas energias políticas na administração das dificuldades, sem antecipar atritos com o governo federal.
Já o governador Aécio Neves, atrás nas pesquisas eleitorais, prefere abrir o debate público dentro do partido, chama Serra para o embate, embora também não se disponha a bater de frente com o governo federal.
Como Serra ressaltou ontem em Curitiba, antecipar a campanha presidencial seria atrapalhar a necessária colaboração entre as três esferas de governo - federal, estadual e municipal - numa das piores crise econômicas que o mundo já viveu.
Ao mesmo tempo em que os governadores têm que manter o relacionamento com o governo federal, a oposição parlamentar encontra muita dificuldade para "colar" a crise em Lula, que até o momento está escapando de ser identificado pela população como responsável pelos problemas econômicos que estão surgindo, como o desemprego crescente ou os juros altos que impedem os financiamentos e reduzem o crédito, já diminuído pela própria crise internacional.
O Planalto tem uma pesquisa que mostra que 70% da população compraram até o momento a versão governista de que a culpa da crise é dos países ricos, e que o Brasil está recebendo estilhaços dessa bomba mais ou menos como uma pessoa é atingida por uma bala perdida por estar no lugar errado no momento errado.
Embora a versão seja aparentemente correta, pois os problemas internos que nas crises anteriores levavam o país a quebrar não existem mais - temos reservas suficientes para garantir nossa dívida externa, a inflação está sob controle, a dívida interna está sendo reduzida em relação ao PIB -, as consequências da crise estão atingindo nossa economia por problemas ainda não superados.
A Bolsa brasileira foi das mais atingidas do mundo, e as exportações brasileiras caíram bastante porque nossa economia está baseada em commodities, que dependem do mercado importador.
Apesar de todos os avanços, o real foi das moedas mais desvalorizadas no mundo. O desemprego poderia ser mitigado por uma legislação trabalhista mais aberta, que permitisse acordos salariais provisórios.
E o governo finge que vai combater a crise com um forte programa de investimentos em infraestrutura, mas não tem capacidade de investir porque os gastos públicos estão mais altos do que nunca, direcionados para aumentos salariais do funcionalismo público, programas sociais assistencialistas e aposentadorias.
O programa habitacional que nasceu para criar empregos mais rapidamente com a construção civil acabou se transformando em um projeto megalômano de 1 milhão de casas populares a custo zero que ficará na promessa.
O problema é que a oposição sente-se incapaz de denunciar esses populismos no pressuposto de que o eleitorado não entenderá sua posição.
Quem pode ser contra aumentos salariais, casas populares, concursos públicos, empréstimos consignados? Mesmo que a economia não suporte esses gastos, ou que o estímulo ao consumo popular através de crediários a perder de vista possa prejudicar a longo prazo o cidadão comum, no curto prazo ajudam a impulsionar a economia e, sobretudo, dão popularidade ao presidente.
Há ainda uma diferença de visão de mundo entre o DEM e o PSDB, que se reflete em linguagens políticas distintas em vários momentos.
O DEM, por exemplo, defende a posição conservadora do Banco Central, enquanto o governador José Serra tem nos juros altos seu maior ponto de crítica à política econômica do governo.
Mesmo dentro do próprio PSDB, há quem defenda a atuação do Banco Central, que, nessa visão, tem conseguido conter os efeitos da gastança governamental sobre a inflação, até que a crise mesma neutralizou os efeitos inflacionários com a queda da demanda, o que permitiu o corte de juros mais forte na última reunião.
Um exemplo típico de armadilha populista no caminho da oposição são as votações de propostas do governo para aumentos do funcionalismo público entrando pelo próximo governo.
Ou projetos como o do senador da base do governo Paulo Paim, aprovando o fim do fator previdenciário, uma maneira encontrada pelo governo de Fernando Henrique para reduzir os rendimentos da aposentadoria de acordo com a idade.
Os parlamentares oposicionistas se sentem constrangidos a apoiar essas iniciativas, mesmo sendo contrários a elas, para não perder votos às vésperas das eleições.
O DEM, que tem uma postura mais agressiva na oposição, cobra do PSDB uma posição de confronto aberto com o governo Lula, e aproveita esse momento de definição das candidaturas para se colocar como fiel da balança, coisa que os tucanos não aceitam.
DEU EM O GLOBO
A expressão em inglês "Catch-22", que dá nome ao livro de Joseph Heller - "Ardil-22" no Brasil -, é um termo militar que significa que você está diante de uma situação paradoxal, sem saída, uma armadilha. É nessa situação que se encontra a oposição brasileira. Nos bastidores da disputa interna do PSDB pela definição não apenas do nome do candidato da oposição, mas, sobretudo, do momento mais propício para apresentá-lo oficialmente ao eleitorado, está a dificuldade dos tucanos de assumir um discurso oposicionista que se apresente como alternativa, diante da popularidade do presidente Lula e de seus métodos populistas de governar, especialmente na crise econômica que o mundo vive.
Os dois estados governados pelo PSDB que têm no comando candidatos potenciais à Presidência, Minas Gerais e São Paulo, são também dos que mais sofrem com a redução de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) em consequência da queda de consumo.
Houve queda de arrecadação do imposto em nove estados em outubro, em 12 em novembro e em 16 em dezembro, segundo o Ipea, o que mostra um quadro de gravidade crescente da crise. O governador de São Paulo, José Serra, preocupado com os efeitos da crise no seu estado, prefere despender suas energias políticas na administração das dificuldades, sem antecipar atritos com o governo federal.
Já o governador Aécio Neves, atrás nas pesquisas eleitorais, prefere abrir o debate público dentro do partido, chama Serra para o embate, embora também não se disponha a bater de frente com o governo federal.
Como Serra ressaltou ontem em Curitiba, antecipar a campanha presidencial seria atrapalhar a necessária colaboração entre as três esferas de governo - federal, estadual e municipal - numa das piores crise econômicas que o mundo já viveu.
Ao mesmo tempo em que os governadores têm que manter o relacionamento com o governo federal, a oposição parlamentar encontra muita dificuldade para "colar" a crise em Lula, que até o momento está escapando de ser identificado pela população como responsável pelos problemas econômicos que estão surgindo, como o desemprego crescente ou os juros altos que impedem os financiamentos e reduzem o crédito, já diminuído pela própria crise internacional.
O Planalto tem uma pesquisa que mostra que 70% da população compraram até o momento a versão governista de que a culpa da crise é dos países ricos, e que o Brasil está recebendo estilhaços dessa bomba mais ou menos como uma pessoa é atingida por uma bala perdida por estar no lugar errado no momento errado.
Embora a versão seja aparentemente correta, pois os problemas internos que nas crises anteriores levavam o país a quebrar não existem mais - temos reservas suficientes para garantir nossa dívida externa, a inflação está sob controle, a dívida interna está sendo reduzida em relação ao PIB -, as consequências da crise estão atingindo nossa economia por problemas ainda não superados.
A Bolsa brasileira foi das mais atingidas do mundo, e as exportações brasileiras caíram bastante porque nossa economia está baseada em commodities, que dependem do mercado importador.
Apesar de todos os avanços, o real foi das moedas mais desvalorizadas no mundo. O desemprego poderia ser mitigado por uma legislação trabalhista mais aberta, que permitisse acordos salariais provisórios.
E o governo finge que vai combater a crise com um forte programa de investimentos em infraestrutura, mas não tem capacidade de investir porque os gastos públicos estão mais altos do que nunca, direcionados para aumentos salariais do funcionalismo público, programas sociais assistencialistas e aposentadorias.
O programa habitacional que nasceu para criar empregos mais rapidamente com a construção civil acabou se transformando em um projeto megalômano de 1 milhão de casas populares a custo zero que ficará na promessa.
O problema é que a oposição sente-se incapaz de denunciar esses populismos no pressuposto de que o eleitorado não entenderá sua posição.
Quem pode ser contra aumentos salariais, casas populares, concursos públicos, empréstimos consignados? Mesmo que a economia não suporte esses gastos, ou que o estímulo ao consumo popular através de crediários a perder de vista possa prejudicar a longo prazo o cidadão comum, no curto prazo ajudam a impulsionar a economia e, sobretudo, dão popularidade ao presidente.
Há ainda uma diferença de visão de mundo entre o DEM e o PSDB, que se reflete em linguagens políticas distintas em vários momentos.
O DEM, por exemplo, defende a posição conservadora do Banco Central, enquanto o governador José Serra tem nos juros altos seu maior ponto de crítica à política econômica do governo.
Mesmo dentro do próprio PSDB, há quem defenda a atuação do Banco Central, que, nessa visão, tem conseguido conter os efeitos da gastança governamental sobre a inflação, até que a crise mesma neutralizou os efeitos inflacionários com a queda da demanda, o que permitiu o corte de juros mais forte na última reunião.
Um exemplo típico de armadilha populista no caminho da oposição são as votações de propostas do governo para aumentos do funcionalismo público entrando pelo próximo governo.
Ou projetos como o do senador da base do governo Paulo Paim, aprovando o fim do fator previdenciário, uma maneira encontrada pelo governo de Fernando Henrique para reduzir os rendimentos da aposentadoria de acordo com a idade.
Os parlamentares oposicionistas se sentem constrangidos a apoiar essas iniciativas, mesmo sendo contrários a elas, para não perder votos às vésperas das eleições.
O DEM, que tem uma postura mais agressiva na oposição, cobra do PSDB uma posição de confronto aberto com o governo Lula, e aproveita esse momento de definição das candidaturas para se colocar como fiel da balança, coisa que os tucanos não aceitam.