quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Reflexão do dia - Carlos Drummond de Andrade - FELIZ NATAL


Este Natal

Carlos Drummond de Andrade

— Este Natal anda muito perigoso — concluiu João Brandão, ao ver dois PM travarem pelos braços o robusto Papai Noel, que tentava fugir, e o conduzirem a trancos e barrancos para o Distrito. Se até Papai Noel é considerado fora-da-lei, que não acontecerá com a gente?

Logo lhe explicaram que aquele era um falso velhinho, conspurcador das vestes amáveis. Em vez de dar presentes, tomava­os das lojas onde a multidão se comprime, e os vendedores, afobados com a clientela, não podem prestar atenção a tais manobras. Fora apanhado em flagrante, ao furtar um rádio transistor, e teria de despir a fantasia.

— De qualquer maneira, este Natal é fogo — voltou a ponderar Brandão, pois se os ladrões se disfarçam em Papai Noel, que garantia tem a gente diante de um bispo, de um almirante, de um astronauta? Pode ser de verdade, pode ser de mentira; acabou-se a confiança no próximo.

De resto, é isso mesmo que o jornal recomenda: "Nesta época do Natal, o melhor é desconfiar sempre”.Talvez do próprio Menino Jesus, que, na sua inocência cerâmica, se for de tamanho natural, poderá esconder não sei que mecanismo pérfido, pronto a subtrair tua carteira ou teu anel, na hora em que te curvares sobre o presépio para beijar o divino infante.

O gerente de uma loja de brinquedos queixou-se a João que o movimento está fraco, menos por falta de dinheiro que por medo de punguistas e vigaristas. Alertados pela imprensa, os cautelosos preferem não se arriscar a duas eventualidades: serem furtados ou serem suspeitados como afanadores, pois o vende­dor precisa desconfiar do comprador: se ele, por exemplo, já traz um pacote, toda cautela é pouca. Vai ver, o pacote tem fundo falso, e destina-se a recolher objetos ao alcance da mão rápida.

O punguista é a delicadeza em pessoa, adverte-nos a polícia. Assim, temos de desconfiar de todo desconhecido que se mostre cortês; se ele levar a requintes sua gentileza, o melhor é chamar o Cosme e depois verificar, na delegacia, se se trata de embaixador aposentado, da era de Ataulfo de Paiva e D. Laurinda Santos Lobo, ou de reles lalau.

Triste é desconfiar da saborosa moça que deseja experimentar um vestido, experimenta, e sai com ele sem pagar, deixando o antigo, ou nem esse. Acontece — informa um detetive, que nos inocula a suspeita prévia em desfavor de todas as moças agradáveis do Rio de Janeiro. O Natal de pé atrás, que nos ensina o desamor.

E mais. Não aceite o oferecimento do sujeito sentado no ônibus, que pretende guardar sobre os joelhos o seu embrulho.

Quem use botas, seja ou não Papai Noel, olho nele: é esconderijo de objetos surrupiados. Sua carteira, meu caro senhor, deve ser presa a um alfinete de fralda, no bolso mais íntimo do paletó; e se, ainda assim, sentir-se ameaçado pelo vizinho de olhar suspeito, cerre o bolso com fita durex e passe uma tela de arame fino e eletrificado em redor do peito. Enterrar o dinheiro no fundo do quintal não adianta, primeiro porque não há quintal, e, se houvesse, dos terraços dos edifícios em redor, munidos de binóculos, ladrões implacáveis sorririam da pobre astúcia.

Eis os conselhos que nos dão pelo Natal, para que o atravessemos a salvo. Francamente, o melhor seria suprimir o Natal e, com ele, os especialistas em furto natalino. Ou — idéia de João Brandão, o sempre inventivo — comemorá-lo em épocas incertas, sem aviso prévio, no maior silêncio, em grupos pequenos de parentes, amigos e amores, unidos na paz e na confiança de Deus.


(14-12-1966)

(Texto extraído do livro "Caminhos de João Brandão", José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1970, pág. 84.)

Merval Pereira:: Erros novos e antigos

DEU EM O GLOBO

O PSDB só não cometeu até agora os mesmos erros de 2006 porque Aécio Neves não é Geraldo Alckmin, e isso é um elogio a Aécio. E, do outro lado, está Dilma e não Lula, o que é uma vantagem para a oposição.

Mas está cometendo erros novos. O então governador de São Paulo insistiu em sua candidatura sem que tivesse qualquer indicação objetiva de que poderia ser melhor candidato que José Serra, que até fevereiro liderava todas as pesquisas de opinião.

Aécio, ao contrário, retirou-se da disputa para se tornar protagonista da decisão tucana

Assim como Aécio agora, naquela ocasião Alckmin diziase em melhores condições para atrair apoios fora do PSDB, e chegou a pedir prévias para a escolha.

Também ele dizia que já fora escolhido como o preferido pelas bancadas da Câmara e do Senado, e trabalhava as direções regionais do partido e os governadores.

Como agora, a cúpula do partido gostaria que não fosse preciso chegar a essa confrontação para definir o candidato.

No início de fevereiro, pesquisas já mostravam a recuperação de Lula, mas Serra ainda vencia no segundo turno, embora a diferença entre os dois estivesse se reduzindo àquela altura.

Havia também o cálculo sobre a atuação dos dois candidatos nos principais colégios eleitorais do país, São Paulo e Minas, dominados, como hoje, pelos tucanos.

Tanto Serra quanto Alckmin venciam Lula com facilidade em São Paulo, de acordo com as pesquisas de opinião da época.

Mas Alckmin demonstrava maior capacidade de somar votos do que Serra: recebia 2,5 vezes mais votos que Lula, enquanto Serra recebia 1,9 vezes.

A penetração de Alckmin em Minas também seria maior que a de Serra, além do que, ele contava com a simpatia de Aécio, registravam os jornais da época.

A cúpula do partido achava, no entanto, difícil abrir mão de um candidato que se mostrava competitivo para apoiar um outro que tinha apenas potencial de crescimento, e àquela altura perdia feio de Lula.

Como hoje, no entanto, o prefeito de São Paulo, José Serra, pedia tempo para se decidir e queria levar a escolha até março, prazo final da legislação eleitoral.

A diferença fundamental entre Aécio Neves e Geraldo Alckmin é que o governador mineiro, ao anunciar sua desistência da pré-candidatura, fez um movimento estratégico que o colocou como protagonista político da definição tucana, e não como o provocador de uma divisão partidária.

Enquanto Geraldo Alckmin aparentemente venceu a disputa com Serra em 2006, mas, na verdade, foi levado a se candidatar para perder para Lula quando Serra sentiu que não tinha condições de vencer, Aécio deixou o atual governador de São Paulo sozinho na raia com sua indefinição, praticamente obrigando-o a assumir a candidatura que queria manter em suspenso até março.

Assim como Lula encerrou o ano de 2005 praticamente derrotado e em dois meses mostrou uma recuperação que parecia impossível, também a candidatura de Dilma pode se firmar, a se confirmar as previsões do diretor do Datafolha, Mauro Paulino.

Segundo ele, há 15% dos pesquisados que ainda não sabem que ela é a candidata de Lula, mas que se dispõem a votar em quem ele mandar.

Seria justamente a diferença que hoje favorece Serra, a ser coberta por esse eleitorado, prioritariamente de baixa renda e baixa escolaridade, que votaria cegamente na candidata de Lula.

Seria exagero sem base acreditar que Dilma tivesse essa capacidade de superação em tão pouco tempo, e tudo indica que até março a vantagem de Serra será mantida nas pesquisas, o que só dificultará sua decisão.

Embora à frente, o governador de São Paulo terá que conviver com essa possibilidade de haver um grupo de eleitores que seguirão o que Lula disser, o que colocaria Dilma potencialmente empatada com ele em algum momento da disputa.

É claro que se se decidir mesmo a disputar a eleição, a partir de março Serra assumirá a campanha em termos nacionais e agirá para neutralizar esse grupo de eleitores, e para ampliar sua aceitação, que tem uma estabilidade admirável desde o segundo turno de 2002, entre 35% e 40% do eleitorado.

O que deixa o governador Aécio Neves como fiel da balança para uma decisão tucana é que seu peso político em Minas e em outras regiões do país como o Rio pode não ser suficiente para colocá-lo na liderança das pesquisas, mas é grande o bastante para definir uma eleição nacional.

O plano de entregar a ele como candidato a vice a coordenação da parte social de um futuro governo parece mais consistente do que a promessa de acabar com a reeleição.

Aprovar uma mudança das regras depois que o jogo foi jogado não é razoável, e o que seria possível Serra fazer se eleito presidente é aprovar o fim da reeleição e aceitar ficar apenas um mandato de quatro anos, o que não parece verossímil.

Para aumentar o mandato presidencial para cinco anos, com o fim da reeleição, seria preciso uma mobilização no Congresso ainda no primeiro semestre do próximo ano, o que soa difícil, pois a base governamental tem a maioria e não atuaria para facilitar a vida da oposição.

Uma possibilidade seria Aécio aceitar a vice-presidência, e a dupla tucana começar a promover negociações entre os partidos da base governista para aprovar o projeto, engrossando a base de apoio à candidatura tucana com partidos como o PP, o PTB, o PDT e parcela do PMDB.

Seria uma reviravolta completa na sucessão presidencial.

Mas arriscada para o governador mineiro, pois não há garantias de que a mudança seja aprovada.

De qualquer maneira, como advertiu o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, as negociações para atrair Aécio para a chapa tucana terão que ser feitas mais discretamente.

Caso contrário, o PSDB corre o risco de sair delas com a imagem de divisão que até agora foi evitada pela habilidade do governador de Minas.

Feliz Natal a todos

Dora Kramer:: Fator de risco

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Há um grupo de pessoas influentes que circulam na indústria, no comércio, no mercado financeiro, o mundo chamado genericamente de "negócios", muitas delas integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso. Umas por um tempo, outras durante todo o tempo.

Nem todas mantiveram com José Serra uma relação amistosa, até porque algumas eram alvos da crítica permanente por parte do então ministro do Planejamento e depois da Saúde.

Entre elas vigora um pensamento: José Serra é um homem público de preparo inequívoco para presidir a República e, a despeito das divergências, preferem vê-lo eleito à continuidade por intermédio de Dilma Rousseff.

Aqui, até mais por razões de ordem institucional, a fim de que a alternância preserve a diversidade partidária impondo obstáculos a projetos de hegemonia que asfixia o exercício do contraditório, reduz os espaços de oposição e consolida Lula como o líder carismático catalisador da política mesmo formalmente fora do poder.

Não concordam com a declaração do presidente Luiz Inácio da Silva de que a ministra Dilma representa a garantia da estabilidade na economia. Está fresco ainda na memória aquele momento em 2005 em que a chefe da Casa Civil "detonou" a proposta de se estabelecer em lei um limite para os gastos públicos.

Dentro do governo, além do ministro Antonio Palocci e da equipe da Fazenda, considerada de qualidade superior à atual, a sugestão contava com o apoio de Paulo Bernardo (Planejamento) e, segundo consta, com a simpatia - depois não confirmada - do presidente Lula.

De fora, ex-comandantes da Economia como Delfim Netto, Pedro Malan e Maílson da Nóbrega também deram seu aval. Dilma explodiu a iniciativa qualificada por ela de "rudimentar".

É um fato citado para acentuar as preocupações com a estabilidade frente à despreocupação com o aumento dos gastos públicos.

Muito bem. Apesar de tudo isso, esse grupo de pessoas influentes acha que Serra em algum momento, de preferência sem demora, deve se pronunciar sobre suas ideias na área. Admite que o governador resista e até aceita a alegação de que suas posições são muito bem conhecidas por quem transita por esse lado da vida.

Apoia a estratégia do governador paulista de não assumir desde já a candidatura, diz que ele está fazendo (pela primeira vez) tudo certo na política. Mas enxerga um nó na economia, um setor em que o silêncio só favorece o adversário.

No caso, o governo que pela voz do presidente da República explora e tenta ampliar a real desconfiança que existe em relação às posições de Serra. Tido como intervencionista.

Mas Lula não vai por aí, até porque o discurso da candidata oficial é assumidamente estatizante. Ele envereda pelo rumo do risco à estabilidade do País que representaria outro candidato que não o do atual governo.

Procura carimbar o oponente como um fator de instabilidade. Na realidade fria, uma ironia, já que foi no governo anterior que se instituiu o Plano Real, a noção de estabilidade da moeda, o fim da inflação e o conceito de responsabilidade fiscal.

O PT bateu-se contra essa política, só a adotou quando percebeu que era o caminho para ganhar a eleição e com ela prosseguiu porque sem ela não estaria até hoje no governo.

Falar e fazer

Na teoria soou sensata a reclamação do presidente Lula de que o PT troca muito de candidatos em São Paulo, dificultando a identificação de uma liderança junto ao eleitorado.

Na prática, soou incoerente. Uma vez que na condição de comandante supremo do partido Lula influiu em todas as escolhas e ao longo de sua trajetória sempre se notabilizou por não propiciar a emergência de figuras de muito destaque no PT.

Incentivou o rodízio e, no tocante à Presidência, não deixou prosperar as postulações de correligionários: Tarso Genro, Eduardo Suplicy e Cristovam Buarque, para citar os mais conhecidos.

Lula adotou a receita para si, mas não deixou que fosse aplicada a outrem.

Porta-vozes

Marta Suplicy, ao dizer que Ciro Gomes não tinha "nada a ver" com São Paulo e Aloizio Mercadante, ao apontar que o deputado pegou "o pau-de-arara" na direção errada quando mudou de Pindamonhangaba (SP) para o Ceará, foram obrigados a se desmentir.

Entretanto, vocalizam exatamente o que se escuta em rodas paulistanas "de raiz".

Senhor da razão

O governador Aécio Neves saiu do páreo da Presidência para não ficar refém do calendário de José Serra.

O presidente do PSDB interditou o debate público sobre a chapa puro-sangue a fim de que o partido não ficasse agora a reboque de uma decisão de Aécio.

Pausa

Feliz Natal e até o ano novo.

Clóvis Rossi:: 2010 já tem um vencedor

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

São Paulo - E o vencedor é um tal de Partido do Movimento Democrático Brasileiro, nome simpático para designar pouco mais que nada em termos ideológicos, políticos ou programáticos.

O PMDB nacional já tem um pré-acordo com as candidaturas Luiz Inácio Lula da Silva/Dilma Rousseff (a segunda só existe graças ao primeiro). O PMDB de São Paulo já tem um pré-acordo com a candidatura José Serra.

Se bobearem, o PMDB do Acre faz um pré-acordo com Marina Silva e o PMDB do Ceará com o irmão de Ciro Gomes, o governador Cid também Gomes, já que, segundo Aloizio Mercadante, o próprio Ciro tomou o "pau de arara" no sentido contrário, aliás duas vezes.

Não bastassem essas apólices de seguro, o PMDB lidera a corrida eleitoral em dois dos três Estados mais relevantes da pátria amada (Rio de Janeiro e Minas Gerais).

É natural, em se tratando de uma federação de caciques regionais, que o PMDB mais uma vez faça grandes bancadas no Congresso, talvez a maior, como muitas vezes ocorreu. O voto para deputados (estaduais e federais) é puxado muito mais por lideranças estaduais, de que dá prova o fato de que nem Fernando Henrique Cardoso nem Luiz Inácio Lula da Silva conseguiram bancadas para seus partidos suficientes para governar só com elas ou com uma aliança que dispensasse o PMDB.

É sempre bom lembrar que foram do PMDB ou por ele passaram todos os presidentes do período democrático, exceto Lula, que, no entanto, fez do que FHC chamava de "partido ônibus" o seu aliado preferencial: José Sarney, que teve FHC como líder, primeiro, e crítico impiedoso, depois, que namorou, mas não casou com Fernando Collor, o maior inimigo de Sarney, que teve em Itamar Franco o vice, primeiro, e o adversário, depois.

A patética ciranda em torno do PMDB continua em 2010, 11, 12...

Ricardo Vélez Rodríguez :: Kant e a república dos nossos sonhos

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A onda de cinismo e corrupção a que temos assistido ao longo dos últimos anos deixa transparecer uma coisa: estamos longe do ideal republicano que, na tradição liberal, encontrou em Immanuel Kant (1724-1804) um dos seus mais importantes formuladores. Direi, na parte final deste comentário, em que pontos o Brasil, em particular, e a América Latina, de um modo geral, se afastaram do ideal republicano apresentado pelo filósofo alemão. Primeiro, destacarei alguns dos seus conceitos básicos.

Immanuel Kant defendia a organização livre dos Estados como fundamento para a paz. Uma estrutura política, para ser sadia, pensava o mestre alemão, deveria se alicerçar no respeito à pessoa humana e ao seu mais prezado direito, a liberdade. Só a constituição do Estado como república garantiria essas duas exigências. Nem o despotismo de um nem o de vários poderiam ser aceitos, pois a vontade pública é, neles, utilizada como se fosse a vontade particular do governante. Nas formas despóticas de organização política, o governo trata o povo como se fosse a sua propriedade.

A Constituição republicana, segundo Kant, é aquela que se encontra estabelecida de conformidade com os seguintes três princípios:

Da liberdade dos membros de uma sociedade enquanto indivíduos;

da dependência de todos em relação a uma única legislação comum, enquanto súditos;

e de conformidade com a lei da igualdade de todos os súditos, enquanto cidadãos.

Essa forma de governo é a única que decorre da ideia do contrato imaginário e sobre a qual se devem fundar as normas jurídicas de um povo.

A Constituição republicana, ainda segundo o mestre alemão, além de ter nascido na pura fonte do conceito do direito, tem a vista posta na paz perpétua. Se o consentimento dos cidadãos é necessário para decidir se deve haver guerra ou não, nada é mais natural que eles pensem muito antes de começar um jogo tão maligno.

Para Kant, são essenciais à forma republicana de governo a representação e a separação entre os poderes Legislativo e Executivo. Duas formas de governo tornam impossível a república: o despotismo de um (tirania) e o de todos (democracia da vontade geral). Nessas duas formas de governo é a mesma pessoa que legisla e que executa a lei. Quanto mais reduzido for o número de pessoas do poder estatal e quanto maior for a representação das mesmas, tanto mais aberta estará a Constituição à possibilidade do republicanismo.

Ao longo da última década a maior parte dos países latino-americanos enveredou pelo duvidoso caminho dos "populismos constitucionais", que visam a instaurar regimes que se autoperpetuam com a bênção das suas respectivas sociedades, conduzidas ardilosamente pelos mandatários de plantão a fazer reformas plebiscitárias que garantam a hegemonia dos donos do poder, sem que haja a mínima possibilidade de alternância do mesmo e com a destruição das instituições republicanas - como o funcionamento da oposição, a preservação e o aperfeiçoamento do governo representativo e a liberdade de imprensa.

As estruturas políticas surgidas dessas reformas partiram para a ignorância em relação à pessoa humana e ao seu direito mais prezado - a liberdade -, como está ocorrendo na Venezuela, na Bolívia e na Nicarágua.

O centro motor dessa maré montante é o regime venezuelano, que estendeu os seus tentáculos sobre os quatro cantos da América Latina, financiando com os abundantes petrodólares o maluco modelo da "revolução bolivariana", que tem servido de inspiração para as mudanças que se apresentam aqui e acolá.

A Venezuela de Hugo Chávez transformou-se em foco irradiador da instabilidade regional, em decorrência da louca corrida armamentista desatada pelo truculento coronel. Ele é, atualmente, sem dúvida nenhuma, quem pauta a agenda política do nosso continente.

O Brasil terminou refém desse modelo, notadamente no que tange à escolha dos rumos da política externa, voltada para um populismo esdrúxulo que acaba sacrificando os interesses do nosso país nas fantasias terceiro-mundistas que levaram Lula a prestigiar o presidente iraniano num momento em que ele é seriamente questionado por ignorar as políticas antinucleares assinadas pelas Nações Unidas.

De Lula, de Chávez e dos demais líderes populistas latino-americanos poder-se-ia dizer o que Kant criticava como despotismo de um só ou de alguns, que utiliza a vontade pública como se fosse a vontade particular do governante e do seu séquito de bajuladores. Os vários chefes populistas latino-americanos se unificam nesta negativa caracterização: tratam o povo como se fosse a sua propriedade.

As Constituições republicanas e as práticas políticas que começam a pipocar na América Latina como fruto das "revoluções bolivarianas" em andamento estão sendo estabelecidas de acordo com três antiprincípios que reforçam a velha tradição patrimonialista de gerir o Estado como propriedade particular do governante e que se contrapõem diametralmente aos princípios republicanos apregoados por Kant.

Chávez e companhia partiram, nas suas reformas constitucionais "bolivarianas", da negação da liberdade dos membros da sociedade enquanto indivíduos; da não dependência de todos em relação a uma única legislação comum, enquanto súditos (pois os governantes de plantão não estão submetidos, nem os seus colaboradores, à lei vigente para todos); e de conformidade com a lei da desigualdade de todos os súditos, enquanto cidadãos (temos cidadãos de primeira, de segunda ou de terceira, dependendo da sua proximidade da esfera dos donos do poder).

Ricardo Vélez Rodríguez é coordenador do Centro de Pesquisas Estratégicas da Universidade Federal de Juiz de Fora.

Demétrio Magnoli :: O inimigo americano

DEU EM O GLOBO

Não é falsa, mas gera pouca luz a tese predominante sobre as motivações originais da política externa do governo Lula. Essa tese assegura que a política externa inaugurada na primeira posse de Lula foi concebida como uma compensação "de esquerda" à política econômica ortodoxa capitaneada por Antonio Palocci e Henrique Meirelles.

As coisas são mais complicadas. Numa ponta, a substituição de Palocci por Guido Mantega introduziu uma ambivalência na política econômica, que agora combina um núcleo ortodoxo com iniciativas orientadas pelo programa do capitalismo de Estado. Na outra, a política externa sofreu uma inflexão sutil, que acentua suas inclinações antiamericanas. A crise em Honduras, a visita do iraniano Mahmoud Ahmadinejad e a aprovação parlamentar do ingresso da Venezuela no Mercosul delineiam os contornos de um novo cenário.

Na montagem de seu primeiro governo, Lula entregou nove décimos da política econômica aos liberais ortodoxos, deixando apenas o feudo do BNDES ao grupo nacionalista ligado a Carlos Lessa, que teve vida curta. A política externa, em contraste, foi dividida equitativamente entre os ultranacionalistas, representados pelo secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, e a corrente majoritária petista inspirada pelo castrismo e personificada no assessor presidencial Marco Aurélio Garcia. O ministro Celso Amorim, um mestre da maleabilidade política, da dissimulação e do equívoco, ficou encarregado de administrar a coalizão de interesses, que só é estranha na superfície.

A ponte entre as visões de mundo dos dois grupos é constituída pelo antiamericanismo. A esquerda bafejada pelo castrismo norteia-se por uma caricatura da teoria do imperialismo que substitui o sistema de relações da economia mundial pelo "império americano". Os ultranacionalistas, cujas referências históricas formam um panteão que conecta Getúlio Vargas a Ernesto Geisel num mesmo "projeto nacional", encaram os EUA como a fonte principal dos valores odiosos de democracia política e liberdade econômica. Uma política externa consistente, mesmo se abominável, pode emanar de tal coalizão.

Lula, hoje todos sabem, não é uma rainha da Inglaterra. Ele arquitetou seu governo como um caleidoscópio de grupos de interesses, mas nunca renunciou ao exercício do comando efetivo. Amorim qualificou-o como o "Nosso Guia", lançando mão de um panegírico ridículo para produzir uma asserção verdadeira. O presidente, um provinciano incorrigível, jamais nutriu interesse pela política internacional, interpretando a política externa essencialmente como um instrumento para a edificação de sua imagem de estadista. No primeiro mandato, com essa finalidade, o "guia" definiu como meta prioritária a ascensão do Brasil à condição de membro permanente do Conselho de Segurança (CS) da ONU.

Lula cultivou uma relação pessoal com George W. Bush e o Brasil atendeu a um pedido expresso da Casa Branca para liderar a missão da ONU no Haiti, oferecendo uma solução à crise aberta por um gesto aventureiro dos neoconservadores americanos. O Itamaraty cuidou de amenizar a crítica brasileira à geopolítica de Bush no Oriente Médio e de não fazer nenhuma menção significativa aos escândalos de direitos humanos em Abu Ghraib e Guantánamo. O presidente e o ministro Amorim alimentavam a esperança de retribuição, na forma do apoio de Washington ao ingresso definitivo do País no CS. Mas, previsivelmente, os EUA decidiram não imolar sua política para a ONU no altar da obsessão do Brasil.

No segundo mandato, em virtude do fracasso daquela pleiteação, Lula afrouxou as rédeas que cerceavam o impulso antiamericanista da coalizão de política externa. A virulência desse impulso não diminuiu, mas cresceu, com a troca de comando na Casa Branca. O aparente paradoxo decorre de um temor fundamentado: enquanto as diretrizes de Bush serviam como contraponto ideal para as manifestações de apreço do Brasil a tiranos de diversos matizes, as de Obama tendem a restaurar a credibilidade dos valores políticos defendidos pelos EUA.

A alardeada "química pessoal" entre Lula e Bush deu lugar a uma crescente hostilidade retórica contra os EUA, expressa no tom arrogante das críticas à cessão do uso das bases militares colombianas, e a gestos antes impensáveis: a conversão da embaixada hondurenha em tribuna para Manuel Zelaya, o apoio explícito à duvidosa reeleição de Ahmadinejad e a proclamação de confiança no suposto caráter pacífico do programa nuclear iraniano. Nesse curso, pouco antes da visita de Arturo Valenzuela, novo secretário-assistente para as Américas, Marco Aurélio Garcia manifestou publicamente a "decepção" brasileira com a política de Obama para a América Latina - uma iniciativa que desafia as convenções da diplomacia entre países amigos.

O ato mais recente na escalada triunfante do antiamericanismo foi a admissão pelo Senado do ingresso da Venezuela no Mercosul, uma decisão de amplas repercussões, derivada de intensa pressão do Executivo sobre a sua base parlamentar. A presença de Hugo Chávez implicará a "morte" do Mercosul original, como anunciou certa vez o próprio venezuelano, e sua conversão numa plataforma de denúncia permanente do "império". Não é, obviamente, um cenário ideal para a parceria entre EUA e Brasil com a qual contava Obama na hora em que anunciou as grandes linhas de sua política latino-americana.

Política externa é a expressão internacional dos valores e dos interesses da sociedade nacional. Não é a esfera adequada para a veiculação de doutrinas partidárias ou de correntes ideológicas minoritárias. É o campo da unidade, não da confrontação interna. No primeiro mandato de Lula, a política externa brasileira oscilou no interior dos limites de uma tradição. No segundo, ela viola essa tradição, transformando-se aos poucos num pátio de folguedos de ideólogos irresponsáveis.

Demétrio Magnoli é sociólogo e doutor em geografia humana pela USP.

Lula repete Dilma e alerta para risco de estagnação se governo perder eleição

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Da Reportagem Local

Sem citar nome dos potenciais candidatos à Presidência, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alertou ontem, de forma velada, para o risco de estagnação de conquistas sociais caso a oposição vença as eleições do ano que vem.

O presidente disse que não se sabe o que acontecerá no Brasil, em referência a uma eventual vitória da oposição.

Ao discursar para moradores de rua e catadores de lixo, Lula recomendou pressa, por exemplo, no levantamento de prédios públicos que possam ser destinados aos sem-teto.

"A gente tem que se dedicar, porque não sabemos o que pode acontecer no país", disse.

Numa despedida, Lula acenou com a promessa de abrir os cofres -com a ampliação até do Programa Minha casa, Minha vida -em 2010.

"Vocês têm que aproveitar esse momento, que falta um ano. Por favor, não tenham medo do peso da caneta. Vamos fazer um levantamento, um pente fino das nossas necessidades, para colocar no papel, para ver se a gente, em um espaço mais curto possível, pode atender", disse Lula.

"É preciso que tudo aquilo que a gente não conseguiu fazer a gente deixasse preparado ou para começar já no ano que vem, ou para ser aprovado no PAC que vai ser feito, de 2011 a 2015", insistiu.

Também sem mencionar o nome de Dilma Rousseff, Lula apontou a ministra da Casa Civil, pré-candidata do PT, como promessa de continuidade. Segundo ele, se eleita, Dilma estará ao seu lado, em 2010, fazendo novas promessas ao movimento.

"Quando eu vier aqui, em dezembro do ano que vem, já tem outra pessoa eleita, já sou rei posto [morto], e rei posto [morto] não pode mais fazer promessa. Ou faço agora, que posso cumprir, ou não dá para fazer depois. De qualquer forma, se for quem penso que vai ser, podemos trazer junto aqui, para fazer promessas", disse Lula.

E em seguida, ressalvou: "Mas vocês já estão tão organizados que quem entrar aí vai ter que respeitar".

Na véspera, Dilma afirmou que sua derrota representaria um retrocesso para o país.

Ao determinar rapidez para elaboração de lista de prédios, Lula receitou 15 dias de férias para a secretária Nacional de Patrimônio da União, Alexandra Reschke. "Porque o ano que vem será pauleira".

Após o evento, em que anunciou a compra de 25 imóveis do INSS para atendimento de população de baixa renda, Lula se reuniu com o ministro Guido Mantega e o empresário Abílio Diniz (Grupo Pão de Açúcar).

Miriam Leitão:: Dentro dos números

DEU EM O GLOBO

Para que aconteça o cenário do Banco Central , de um PIB ligeiramente positivo em 2009, de 0,2%, é preciso que o PIB tenha dado um salto muito acima das previsões neste quarto trimestre. Pelos cálculos do economista Armando Castelar, um salto de 4,5%. Isso daria um crescimento anualizado de 20%.Se houver essa alta forte, o carregamento estatístico para o ano que vem será de 4,3%.

O Banco Central divulgou esta semana, no seu relatório de inflação, que o país ficará no positivo este ano 0,2% e que em 2010 crescerá 5,8%. O ano que vem vai ser realmente de crescimento forte, em parte por um efeito estatístico — a comparação com uma base fraca —, em parte por crescimento mesmo.

Mas esses números do BC destoam um pouco.

Até o último relatório, o BC registrava uma previsão de 0,8% de crescimento em 2009.

Irrealista diante dos indicadores parciais, mas mais coincidente com a aposta do Ministério da Fazenda, que no ano inteiro sustentou que o país teria crescimento de 1% este ano.

O terceiro trimestre foi uma decepção. O ministro Guido Mantega sustentou que o crescimento seria de 2%, e ele foi de 1,3%. Abaixo do desempenho da economia que é o epicentro da crise: os Estados Unidos, depois de duas revisões para baixo, divulgaram esta semana que tiveram crescimento de 2,2% no terceiro trimestre. Com desempenho abaixo do previsto nesse período, ficou mais difícil para o Brasil terminar 2009 com resultado positivo.

O BC saiu à francesa do seu número de 0,8%, dizendo que ele será 0,2%.

Mas, dado que o país está com uma queda acumulada de 1% nos últimos 12 meses terminados em setembro, para se chegar a um resultado de 0,2% em 2009, o crescimento do último trimestre do ano — que está acabando, mas cujo número só sai no ano que vem — terá que ser muito forte. Castelar calcula que será necessário um salto ornamental de cerca de 4,5% de crescimento do quarto trimestre sobre o terceiro. Se forem retirados os fatores sazonais, e o número for anualizado, daria um ritmo de 20%. Totalmente improvável.

Se ocorrer esse cenário de abrupta elevação do ritmo do crescimento no último trimestre, o carregamento estatístico do ano que vem será mais forte. O cálculo do PIB é a comparação da média de um ano contra a média do ano anterior. Como 2009 começou mal e foi melhorando, ele é uma reta que sobe. Imagine que o país fique sem acelerar mais em 2010.

Só a comparação da média do ano que vem contra a média deste ano já dará um resultado de crescimento. Isso é que se chama carry over, o carregamento estatístico. Se o PIB der esse salto no quarto trimestre, o efeito estatístico será maior. Pelo cenário do BC, Armando Castelar calcula que o carregamento será de 4,3%. Ou seja, dos 5,8% do crescimento previsto pelo Banco Central, 4,3% seria apenas desse efeito.

Os analistas estão prevendo para 2010 um crescimento acima de 5%. Há até bancos falando em números perto de 6%. Isso porque a economia vai entrar em 2010 acelerando, depois de ter subido no fim de 2009. Haverá efeito estatístico e crescimento de fato. A dúvida é só como se chegará a esse resultado: se com um forte crescimento agora no fim de 2009 e um carregamento estatístico maior, ou se com um número menor e mais crescimento no ano que vem. Se por acaso, o ano fechar em -0,3%, o efeito estatístico será de 2,5%.

O terceiro trimestre foi frustrante porque se esperava mais, confiando que quando o ministro Mantega falou em 2% sabia o que dizia. Dois dias depois, saiu 1,3%. O terceiro trimestre foi impactado negativamente pelo baixo desempenho da agricultura. O investimento e o consumo cresceram, mas houve queda das exportações e aumento das importações, o que significa que essa demanda foi atendida pelo produto importado.

Isso vai se aprofundar no ano que vem, na opinião de Castelar, produzindo um déficit em transações correntes do Brasil. Houve também no terceiro trimestre uma redução forte de estoques, o que significa que parte da demanda foi atendida com a venda do que já estava produzido. Isso indica uma boa notícia: a de que terá que ser produzido mais para repor estoques.

— O que vai acontecer com o déficit em transações correntes não é preocupante em si, o que preocupará será a dinâmica da entrada desse novo cenário de resultados negativos nas contas externas — diz Castelar.

Para o ano que vem, há muitas incertezas no mundo, diz o economista: — A Grécia já teve rebaixamento da sua avaliação de risco, a Espanha pode ter o mesmo rebaixamento.

A Inglaterra está enfrentando também uma deterioração das contas públicas grande. Os governos socorreram as empresas e bancos endividados, estatizando a dívida privada, fato semelhante ao que nos aconteceu no começo da década de 1980, na crise da dívida. Essa é uma herança que eles terão que resolver.

Ainda pesará sobre o ano de 2010 a grande dúvida: quando serão retirados os estímulos excessivos concedidos pela maioria das economias? Aqui, a dúvida é como o governo vai se comportar, em ano eleitoral, na área fiscal. Em 2009, o governo brasileiro aumentou muito o gasto em despesas que não poderá comprimir.

Se continuar aumentando essas mesmas despesas, a era Lula pode deixar uma herança pesada para o próximo governante.

Morte na Colômbia causa comoção

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

ONU diz que assassinato de governador é "crime de guerra"

Ruth Costas com AP

Diversos países, ONGs e organizações internacionais repudiaram ontem o assassinato atribuído às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) do governador Luis Francisco Cuéllar, do Departamento (Estado) de Caquetá. O crime foi condenado por Brasil, EUA, União Europeia, Organização dos Estados Americanos (OEA) e ONU. "Para o direito internacional humanitário, tomar reféns é crime de guerra e a morte do governador confere extrema gravidade à prática recorrente dessa infração por esse grupo guerrilheiro", diz o comunicado da ONU em Bogotá, que exorta as Farc a soltar seus reféns.

"Esta atrocidade e barbárie merece o rechaço da comunidade internacional, que apoia os esforços para a paz da Colômbia", disse o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza. Também se pronunciaram as ONGs Anistia Internacional e a Human Rights Watch.

Para o cientista político Pedro Medellín, a estratégia da guerrilha é contraditória. "Ela continua a reivindicar apoio internacional para seu projeto de ser reconhecida como um grupo beligerante, mas parece não entender que degolar um governador simplesmente para demonstrar força não é uma boa estratégia para conseguir isso", disse Medellín ao Estado.

Em entrevista ao jornal colombiano El Tiempo, Alfredo Rangel, da Fundação Segurança e Democracia, disse que o governo pode ter subestimado os resultados de sua política de segurança. "Eles baixaram a guarda por excesso de confiança", disse Rangel. Nos Departamentos de Caquetá, Nariño e Meta, as operações de segurança foram reduzidas em 30%.

Os analistas destacam a capacidade, comprovada historicamente, de as Farc se recuperarem após derrotas. O próprio movimento que deu origem à guerrilha nasceu em 1964, quando o Exército desmantelou um assentamento de camponeses e guerrilheiros na localidade de Marquetália.

Nos anos 80, novo golpe. Os guerrilheiros aderiram ao processo de paz do presidente Belisario Betancur (1982-1986) e formaram o partido União Patriótica. Nos anos seguintes, 3 mil políticos do grupo foram mortos por paramilitares.

Hoje, a capacidade de recuperação, segundo Medellín, deve-se à vantagem estratégica oferecida pela geografia da Colômbia e aos recursos do narcotráfico.