domingo, 10 de outubro de 2010

Sem telefone

Do ex-presidente do PSDB, deputado José Aníbal, irritado com o discurso do PT:

"Tinha que tirar os celulares deles que ficam reclamando das privatizações".

A maldição :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC do Rio, tem uma visão bastante cética em relação à possibilidade de a senadora Marina Silva se transformar em uma liderança de peso na política nacional a partir da votação que obteve no primeiro turno da eleição presidencial.

Ele chama de “maldição do terceiro colocado” o que tem acontecido com os candidatos que a cada eleição surgem como novidade, mas não se firmam como alternativa de uma terceira via eleitoral que se contraponha à polarização entre PT-PSDB.

Um trabalho da equipe da PUC do Rio que Romero Jacob coordena mostra que, até agora, a terceira via não se mostrou possível, pois não se observa nada em comum, do ponto de vista eleitoral ou geográfico, entre os terceiros colocados nas eleições anteriores: Brizola (1989), Enéas (1994), Ciro (1998), Garotinho (2002) e Heloísa Helena (2006).

A candidata do Partido Verde, senadora Marina Silva, poderia vir a ser uma terceira via, na análise de Romero Jacob, se fosse adotada pelos evangélicos pentecostais, sendo ela evangélica.

Nesse caso poderia crescer na periferia, um dos três pilares das “estruturas de poder” que viabilizam a disputa eleitoral: as oligarquias nos grotões, os pastores pentecostais e os políticos populistas na periferia, e a classe média urbana escolarizada.

Mas, ressalva Romero Jacob, Marina Silva nunca fez política usando a religião, e mais uma vez nesta eleição presidencial teve o mesmo comportamento.

Ela provavelmente se beneficiou do debate em torno do aborto, mesmo sem estimulá-lo. Em contrapartida, teria muita dificuldade de ter voto no interior do país, onde os ruralistas têm muita força.

Na classe média urbana, Marina pode tanto tirar voto do governador José Serra quanto de Lula (Dilma), por razões diferentes, analisa Romero Jacob.

Não é por outra razão que ela foi tão bem no Rio, em Belo Horizonte, e em Brasília, onde foi a mais votada. Um estudo sobre as religiões feito pelo grupo de Romero Jacob, na PUC do Rio, mostra claramente que no entorno das capitais, nos cinturões de miséria, os pastores evangélicos pentecostais têm uma força muito grande.

O Instituto de pesquisas GPP fez uma pesquisa do voto evangélico no Rio e constatou que Dilma caiu de 53,6% para 38,9% dos votos nesse segmento, enquanto Marina saiu de 18,5% para 41,9%.

Mas, como Romero Jacob tem ressaltado, a influência do voto religioso, incluindo aí o dos católicos que também se mobilizaram contra o aborto, tem que ser relativizada e incluída como um dos vários fatores que influíram no resultado final, impedindo que a eleição fosse resolvida no primeiro turno.

Segundo Romero Jacob, a “maldição” pode ser medida pelo retrospecto dos candidatos que chegaram em terceiro lugar nas recentes eleições presidenciais depois da redemocratização.

Ninguém emplacou na eleição seguinte.

Brizola, em 1989, teve 16% dos votos, quase foi para o segundo turno contra Collor. Em 1994, teve apenas 3%, e em 1998 foi vice de Lula, e terminou a carreira política sendo derrotado para senador.

Enéas teve 7% de votos em 1994, caiu para 2% em 1998 e em 2002 se candidatou a deputado federal. Ciro Gomes teve 11% em 1998, 12% em 2002, mas em 2006 se candidatou a deputado federal, e este ano não se candidatou a nada.

Garotinho teve 18% dos votos em 2002, na eleição seguinte o PMDB não lhe deu legenda para concorrer e este ano teve que se candidatar a deputado federal e depende de uma decisão do Supremo, já que está enquadrado na Lei da Ficha Limpa.

A senadora Heloisa Helena teve 6% dos votos em 2006 e agora não se elegeu senadora em Alagoas.

O fato de alguém se constituir em uma grande novidade em uma eleição não quer dizer que terá fôlego mais adiante, conclui Romero Jacob, para lembrar que até agora não existe uma base estruturada de terceira via, e a senadora Marina Silva, entrando em choque com o Partido Verde na negociação sobre quem apoiar no segundo turno, pode estar perdendo um canal de atuação política que poderia viabilizar uma futura disputa presidencial.

Na verdade, cada uma das situações que levaram um candidato ao terceiro lugar foi pontual, não tem o mesmo peso de PSDB e PT, que há cinco eleições estão disputando o voto pau a pau.

Os outros surgem por circunstâncias de momento, lembra Romero Jacob, o que não quer dizer que a Marina não possa vir a ser uma grande liderança, mas para disputar com possibilidade em 2014 ela teria que se estruturar dentro da realidade político-partidária que vivemos.

Como o voto da Marina nesta eleição foi muito fragmentado, um estuário de muitas insatisfações, e de esperança na despolarização, ela não tem como liderar as decisões da maioria desses 20 milhões de eleitores.

Romero Jacob diz que nos seus estudos só há um registro de transferência de votos no segundo turno, que é de Brizola em 1989, que transferiu para Lula seus votos integralmente.

Em 2002, por exemplo, Ciro Gomes teve 12% dos votos e Garotinho 18%, e os dois propuseram um apoio ao Lula, mas os votos foram meio a meio para Lula e Serra.

Isso porque os votos de Ciro, na Bahia, não eram dele, mas do Antonio Carlos Magalhães que estava em dissidência, os votos no Maranhão eram de Sarney.

Assim como Garotinho, que não tinha votos na Amazônia, onde sua força vinha da Assembleia de Deus, cujo voto ele não decidia.

Marina Silva, por exemplo, não tem nem mesmo os 30% de votos próprios que Lula e o PT sempre tiveram em várias eleições.

Se os 18% de votos dela fossem de ambientalistas convictos, a bancada do Partido Verde teria aumentado, mas permaneceu praticamente do mesmo tamanho: tinha 15 deputados federais e ficou com 16. A excepcional votação que Marina teve no Rio só resultou na eleição de Alfredo Sirkis para deputado federal pelo Partido Verde.

Escravos de Jó:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O ministro-chefe da Secretaria de Comunicações da Presidência, Franklin Martins, foi à Europa conhecer o que há por lá sobre controle de veículos de comunicação. De Londres, avisa que nos próximos três meses, até o fim do ano, o governo vai concluir uma proposta para regulamentação dos meios eletrônicos.

Isso quer dizer que deixa tudo pronto para Dilma Rousseff, se eleita, tocar o assunto, dado que a candidata se apresenta ao eleitorado como uma continuação sem modificações do governo Luiz Inácio da Silva.

O ministro Franklin Martins avisa mais, que na concepção dos atuais - e, por suposto, daquela que se candidata à continuidade - ocupantes do Palácio do Planalto, não há que se impor qualquer restrição à imprensa no Brasil, pois está bem assim, livre. "O que não significa que seja boa", acrescenta.

De onde se depreende que Franklin considera que, mediante uma regulamentação bem feita, poderá até chegar a ser. Faltou apenas uma definição do que o ministro entende por "imprensa boa".

E aí é que mora o xis da questão. Se não foi apenas um jogo de palavras para sair pela tangente, a declaração dá margem à interpretação de que o qualificativo está diretamente ligado à defesa da necessidade de regulação.

Portanto, é de se acreditar que junto com a proposta de renovação das normas para o sistema de radiodifusão, internet e celulares sejam apresentadas sugestões para "melhorar" a imprensa adequando-a aos padrões tidos como aceitáveis pelos proponentes.

Mera suposição? Não, conclusão lógica com base em dois fatos: a conferência sobre comunicações realizada no ano passado sob patrocínio governamental que propôs o controle dos meios de comunicação por parte do Estado; o programa de governo apresentado pelo PT à Justiça Eleitoral encampando as propostas da conferência.

O item sobre o controle da mídia não foi retirado da versão modificada do programa e registrada no TSE.

Depois o PT divulgou que mais uma vez reformularia o programa para incluir propostas dos partidos aliados; recuou e, com a realização do segundo turno, voltou a anunciar para os próximos dias a divulgação de uma nova versão: os 13 compromissos de Dilma.

Como a candidata já se pronunciou contra o controle e o principal parceiro, o PMDB, também, é de se imaginar que a questão não esteja entre os 13 pontos.

Então não há compromisso com a proposta que o governo Lula apresentará ao fim do mandato? Ou há, mas não convém incluir no programa de governo por uma questão eleitoral?

Esse tira, põe, deixa ficar, ao molde da cantiga infantil, não soa salutar e pode acabar minando a credibilidade do programa de governo de Dilma Rousseff.

Por ausência de firmeza, clareza e, sobretudo, de comprometimento a respeito do que pensa mesmo a candidata. Seja sobre descriminalização do aborto ou controle estatal do conteúdo do que divulgam os meios de comunicação.

Na prática. O levantamento é do jornal Folha de S. Paulo: dos 208 candidatos vetados pela aplicação da Lei da Ficha Limpa no Tribunal Superior Eleitoral, mas ainda "pendurados" na indecisão do Supremo Tribunal Federal, 157 (75%) não conseguiram se eleger.

Em favor do eleitorado note-se ainda que a lei foi aprovada há pouco tempo e sua aplicação está em suspenso. Além disso, falta traquejo às pessoas que não estavam acostumadas a examinar vidas pregressas. Mesmo assim foi alto o índice do veto na urna.

Magoou. Geddel Vieira Lima no Twitter: "Hoje (sexta-feira) recebemos Michel Temer em Salvador para ratificar nossa posição de apoio ao seu nome."

Considerando que o PMDB não precisa "ratificar" apoio ao presidente do partido, o PMDB da Bahia - deixado ao sol e à chuva na eleição estadual pelo governo federal e, consequentemente pela campanha presidencial do PT - arrumou um jeito indisciplinado de manifestar disciplina: vai só de vice.

Crença religiosa e manipulação política :: Sergio Fausto

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Já na etapa final do primeiro turno e mais ainda neste início de segundo turno, há uma corrida para tranquilizar os eleitores evangélicos e católicos que temem a descriminalização do aborto. Fala-se em defesa dos "valores da vida", expressão enigmática que visa a estigmatizar quem ouse pôr em dúvida um dogma religioso segundo o qual a vida tem início no ato da fecundação do óvulo por um espermatozoide.

Em nome desse dogma, produziu-se uma chantagem eleitoral: quem não rezar o credo da criminalização do aborto será punido com a perda de uma fatia de eleitores que pode ser decisiva para a vitória ou a derrota. Em cena patética, candidatos desdizem o que disseram ou se esmeram em reforçar supostas credenciais conservadoras na matéria. Um dos partidos, segundo a imprensa, se dispõe a rasgar parte do programa de sua candidata. Todos amedrontados pela ameaça do voto religioso, mais temível do que as próprias labaredas do inferno. Covardia cívica de quem anonimamente alimenta as baterias do dogmatismo e de quem se dobra e se desdobra para se ajustar ao figurino conservador, mesmo que lhe caia mal.

A manipulação de crenças religiosas para fins político-eleitorais é um veneno para a democracia e uma ameaça ao Estado laico. Crenças religiosas fundam-se em dogmas e sustentam valores absolutos. A liberdade humana, nessa esfera, restringe-se a aderir, pela fé, aos valores professados ou rejeitá-los. Se a religião é uma esfera de verdades absolutas, a democracia é um espaço de verdades parciais, sujeitas ao contraditório e ao compromisso entre valores e interesses distintos. O debate público democrático é permeado pela emoção, mas não se fecha à análise racional dos dilemas que surgem quando valores absolutos abstratos se chocam contra o chão duro da realidade. No caso em pauta, se, de um lado, não há evidência de que a descriminalização aumente o número de abortos realizados, de outro, sobram evidências de que os abortos feitos em clínicas clandestinas ou por conta própria são causa importante de morte, doença e esterilidade entre as mulheres mais pobres. De que lado estão os "valores da vida"?

A relativa separação entre a esfera da religião e a da política é uma conquista da civilização ocidental. Acreditava-se que estivesse consolidada na maioria dos países do Ocidente, mas a História recente mostrou que não, em especial nos Estados Unidos. Lá, a partir dos anos 80 do século passado, cresceram e organizaram-se politicamente as denominações evangélicas não tradicionais. Multiplicaram-se os "pastores eletrônicos" e seus programas nos meios de comunicação de massa. Os novos evangélicos passaram a representar cerca de 30% da população, com um peso ainda maior no eleitorado, dado o seu maior comparecimento às urnas.

Conquistaram o Partido Republicano e elegeram um dos seus, George W. Bush, para a presidência da República. Na Casa Branca, ele congelou as verbas federais para pesquisas com células-tronco embrionárias, defendeu a reza na escola pública, atacou o casamento entre pessoas do mesmo sexo, lançou o país a uma aventura no Iraque como se fosse um cruzado liderando a civilização cristã. Vinte anos antes, as denominações evangélicas fundamentalistas pareciam ser um fenômeno politicamente inofensivo...

No Brasil, é crescente a proporção de pessoas que se declaram evangélicas. Além de conforto espiritual, elas encontram na igreja uma comunidade religiosa que lhes oferece proteção contra as adversidades e as ajuda a progredir materialmente na vida, pela rede de relações que estabelecem. E isso é muito bom. Tenha-se ou não crença religiosa, nenhum de nós pode dispensar algum tipo de espiritualidade e inserção comunitária. Marx dizia que "a religião é o ópio do povo", mas completava: "O suspiro da criatura oprimida, o calor de um mundo sem coração."

Esse é o lado bom da história. O lado menos bom é o fato de que, ao contrário do catolicismo brando e sincrético da tradição brasileira, há maior fervor e dogmatismo religioso entre os evangélicos, em alguns casos com intolerância em relação às religiões afro-brasileiras, vistas como demoníacas. Pior ainda é o fato de que parte das igrejas evangélicas se tornou um obscuro e lucrativo empreendimento comercial, em que se misturam religião, política e negócio, em especial no setor dos meios de comunicação de massa.

Nos muitos programas evangélicos de televisão e rádio se ensina que o mundo se divide entre Deus, representado por Jesus, e o demônio, tão onipresente quanto aquele. Num mundo divido entre o Bem e o Mal, não há liberdade de escolha possível para as pessoas de bom caráter. Afinal, quem será pelo demônio? Só os maus.

Em matéria de liberdade de escolha, a Igreja Católica não fica atrás. Basta pensar na longa lista de interditos: preservativos, sexo antes do casamento, para não falar em casamento entre pessoas do mesmo sexo. Tudo isso em nome dos "valores da vida e da família", como se vida e família não fossem construções humanas que admitem grande variação na forma como são vistas e vividas. O Estado laico e democrático existe para assegurar essa pluralidade e para permitir a convivência entre crenças e preferências diferentes.

O tema do aborto não foi trazido ao debate político para ser esclarecido e debatido a sério. Ninguém o propôs abertamente. Surgiu sub-repticiamente, por oportunismo eleitoral. E tem merecido uma resposta não menos oportunista. Pode ser que renda os frutos eleitorais pretendidos, pode ser que não. Substantivamente, trata-se de muito barulho por nada, já que nenhum presidente ou presidenta da República, não importa quão grande seja sua maioria no Congresso, terá condições de impor a sua opinião em matéria tão sensível.

Não quer dizer que ela não deva ser discutida. Mas não agora, não desse jeito.



Diretor Executivo do IFHC, é ,e,bro do GACINT-USP

Diálogo de surdos? :: Pedro S. Malan

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O presidente Lula, com uma arrogância por vezes excessiva, tentou transformar em plebiscito o primeiro turno desta eleição. Como se o que estivesse em jogo fosse seu próprio terceiro mandato (ainda que por interposta pessoa), um referendo sobre seu nome, uma apoteose que consagraria seu personalismo, seu governo e sua capacidade de transferir votos. Mas cerca de 52% dos eleitores votaram em José Serra e Marina Silva, negando a Lula a tão esperada vitória plebiscitária no domingo passado.

Não é de hoje o desejo presidencial: "Lula quer uma campanha de comparação entre governos, um duelo com o tucano da vez. Se o PSDB quiser o mesmo... ganharão os eleitores e a cultura política do País." Assim escreveu Tereza Cruvinel, sempre muito bem informada sobre assuntos da seara petista, em sua coluna de janeiro de 2006. Não acredito que a "cultura política" do País e seus eleitores tenham muito a ganhar - ao contrário - com essa obsessão por concentrar o debate eleitoral de 2010 numa batalha de marqueteiros e militantes.

Afinal, na vida de qualquer país há processos que se desdobram no tempo, complexas interações de continuidade, mudança e consolidação de avanços alcançados. O Brasil não é exceção a essa regra. Como escreveu Marcos Lisboa, um dos mais brilhantes economistas de sua geração: "Não se deve medir um governo ou uma gestão pelos resultados obtidos durante sua ocorrência e, sim, por seus impactos no longo prazo, pelos resultados que são verificados nos anos que se seguem ao seu término. Instituições importam e os impactos decorrentes da forma como são geridas ou alteradas se manifestam progressivamente..."

Ao que parece, Lula e o núcleo duro à sua volta discordam e estão resolvidos a insistir numa plebiscitária e maniqueísta "comparação com o governo anterior". Feita por vezes, a meu ver, com desfaçatez e hipocrisia. Um discurso primário que, no fundo, procura transmitir uma ideia básica (e equivocada) ao eleitor menos informado: o que de bom está acontecendo no País - e há muita coisa - se deve a Lula e ao seu governo; o que há de mau ou por fazer - e há muita, muita coisa por fazer - representa uma herança do período pré-2003, que ainda não pôde ser resolvida porque, afinal de contas, apenas em oito anos de lulo-petismo não seria mesmo possível consertar todos os erros acumulados por "outros" governantes ao longo do período pré-2003.

Mas talvez seja possível, por meio do debate público informado, ter alguns limites para a desfaçatez e a mentira. Exemplo desta última: a sórdida, leviana e irresponsável acusação de que "o governo anterior" pretendia privatizar a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, entre outros. Algo que nunca, jamais, esteve em séria consideração. Mas a mentira, milhares de vezes repetida, teve efeito eleitoral na disputa pelo segundo turno em 2006 - por falta de resposta política à altura: antes, durante e depois.

Exemplos de desfaçatez: o governo Lula não "recebeu o País com a inflação e o câmbio fugindo do controle", como já li, responsabilizando-se o governo anterior. A inflação estava sob controle desde que o Real foi lançado no governo Itamar Franco, com Fernando Henrique Cardoso na Fazenda, e se aumentou para 12,5% em 2002 foi porque o câmbio disparou, expressando receios quanto ao futuro. Receios não sem fundamento, à luz da herança que o PT havia construído para si próprio, até o começo de sua gradual desconstrução, apenas a partir de meados de 2002. O PT tinha e tem suas heranças.

O governo Lula não teve de resolver problemas graves de liquidez e solvência de parte do setor bancário brasileiro, público e privado. Resolvidos na segunda metade dos anos 90 pelo governo FHC. Ao contrário, o PT opôs-se, e veementemente, ao Proer e ao Proes e perseguiu seus responsáveis por anos no Congresso e na Justiça. Mas o governo Lula herdou um sistema financeiro sólido que não teve problemas na crise recente, como ajudou o País a rapidamente superá-la. Suprema ironia ver, na televisão, Lula oferecer a "nossa tecnologia do Proer" ao companheiro Bush em 2008.

O governo Lula não teve de reestruturar as dívidas de 25 de nossos 27 Estados e de cerca de 180 municípios que estavam, muitos, pré-insolventes, incapazes de arcar com seus compromissos com a União. Todos estão solventes há mais de 13 anos, uma herança que, juntamente com a Lei de Responsabilidade Fiscal, de maio de 2000 - antes, sim, do lulo-petismo, que a ela se opôs -, nada tem de maldita, muito pelo contrário, como sabem as pessoas de boa-fé.

As pessoas que têm memória e honestidade intelectual também sabem que as transferências diretas de renda à população mais pobre não começaram com Lula - que se manifestou contra elas em discurso feito já como presidente em abril de 2003. O governo Lula abandonou sua ideia original de distribuir cupons de alimentação e adotou, consolidou e ampliou - mérito seu - os projetos já existentes. O que Lula reconheceu no parágrafo de abertura (caput) da medida provisória que editou em setembro de 2003, consolidando os programas herdados do governo anterior.

Outros exemplos. Sobre salário mínimo: não é verdade que tenha começado a ter aumento real no governo Lula, como quer a propaganda. Sobre privatização: o discurso ideológico simplesmente ignora os resultados para o conjunto da população - e, indiretamente, para o atual governo.

O monólogo do "nunca antes" não ajuda o diálogo do País consigo mesmo. O ilustre ex-ministro Delfim Netto bem que tentou: "A eleição de 2010 não pode se fazer em torno das pobres alternativas de ou voltar ao passado ou dar continuidade a Lula. A discussão precisa incorporar os horizontes do século 21 e a superação dos problemas que certamente restarão de seu governo."

Economista, foi Ministro da Fazenda no governo FHC

Não é preciso crer, bruxarias existem:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL (ONLINE)

O segundo turno, seja qual for a circunstância política, não é e dificilmente chegará um dia a ser eleição. Está mais para plebiscito, no bom sentido etimológico. Quem insinua, com jeito e paciência, é o deputado Roberto Freire, agora por São Paulo, ao examinar a configuração do processo eleitoral em curso. Na História do Brasil, a função do plebiscito tem sido a de guarda-costas do presidencialismo, em prejuízo da democracia.

Se há um vencedor no primeiro turno da sucessão presidencial em curso, alongada pelo surpreendente resultado das urnas, só pode ser a oposição, que não tinha lugar certo quando o segundo turno não passava de hipótese e as pesquisas de opinião pública eram levadas ao pé da letra. Já o governo Lula e os seus agregados, apanhados de surpresa, não têm como não se sentir um pouco derrotados e obrigados a assimilar os efeitos da frustração.

No contrapé da vitória preliminar, o PT procedeu como derrotado desde antes. Passou recibo pelo insuficiente saldo eleitoral nos pontos de maior prestígio no mapa da Federação, os estados de maior peso político. Nem se lembrou de afogar a amargura com as vitórias socialista em Pernambuco e petista no Rio Grande do Sul.

O presidente Lula, no que lhe diz respeito, não crê em bruxarias que não sejam de procedência sindical mas, em caso de eleições, sabe perfeitamente que elas marcam presença sempre que possível. Será conveniente, porém, considerar que o segundo turno se dará exatamente no dia 31 de outubro, que é a data em que as bruxas se soltam. O Halloween já é por si mesmo um segundo turno. Não se trata de mera coincidência, já que o elemento sobrenatural não brinca em serviço.

Não foi por acaso que em 2002 Lula escreveu uma carta endereçada à burguesia brasileira como proposta irrecusável, e então se elegeu, na quarta tentativa de chegar ao Planalto.

Nunca, antes, desde Caminha e depois Getulio Vargas, uma carta foi tão importante na História do Brasil. Era de supor que Lula tivesse aprendido a relacionar- se com derrotas, a julgar pelo obsequioso silêncio que guardou Mas, pelo visto, ainda não se refez, pois o apóstolo da pacificação escolhido para o segundo turno ficou a uma distância superior à dúvida: por que o embaixador da boa vontade teria de ser logo Ciro Gomes, que anda com bombas de efeito retardado no bolso como um cavaleiro no deserto de homens e ideias? O feitiço virou contra o feiticeiro, que se esqueceu das condições em que havia chegado ao poder, numa onda de cortesia e bons modos. Se não era este o momento, por que valer-se dos trunfos ameaçadores que o distanciaram da vitória em três eleições? Assustar a classe média é mais imprudente do que contraproducente, a esta altura em que se torna conveniente distinguir o que é duradouro e o que não passa de fogo de artifício.

Dona Dilma Rousseff não chega ao fim das frases lançadas em público quando enuncia alguma coisa que não sabe bem o que seja, e deixa subentendido o que não queria dizer. A candidata pode se preparar para enfeitar, com voz pausada e sem tempero emocional, versão palatável para o episódio da demissão de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente, no qual Lula fez o papel de Pilatos ao lavar as mãos em público, e coube a Dilma Rousseff a função do carrasco. O espetáculo vai ser contado com teor apropriado aos autos de fé e percorrerá a Wilson Figueiredo escreve nesta coluna aos domingos e terças-feiras.

Se há um vencedor no primeiro turno da sucessão presidencial, só pode ser a oposição campanha no segundo turno como se fosse Semana Santa. E ainda fica devendo a inesgotável questão de ser ou não ter sido a favor nem contra a legalização do aborto.

Esta eleição não fugiu à norma: o pessoal do PT (no PMDB é diferente) e seus candidatos, mais do que ninguém, falaram no primeiro turno como se tivessem autorização da vitória.

O grande mistério de Lula, que não se expõe sob resultados insatisfatórios, é evitar a relação entre o que disse e o que as urnas disserem depois.

Bancou várias vitórias frustradas no primeiro turno mas nada pode garantir que será diferente no segundo. Está cada dia mais próxima de Lula a hora de passar a limpo, não seus dois mandatos, mas ele próprio, para entrar na história em condições apresentáveis e retribuir com o respeito devido aos que o elegeram e reelegeram. Cada dia que encurta a distância entre Lula com o pós-Lula deve ser um ato de mortificação à medida que for percebendo que são múltiplas as vias que levam a 2014. Afinal, não há seguro de candidatura capaz de compensar insucesso em eleição.

Democracia e democratização:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A democracia do Brasil não é a dos nossos sonhos, mas já obriga políticos a pensar nas demandas dos pobres

O primeiro turno das eleições presidenciais foi mais uma bela confirmação de que a democracia está consolidada no Brasil. Não é a democracia dos nossos sonhos, não é simplesmente o governo do povo, mas é uma democracia que já obriga os políticos a pensar nas demandas dos pobres e a procurar atendê-las.

Nem sempre com o mesmo empenho, nem sempre com a mesma competência. Mas o fato é que durante os 25 anos de nossa jovem democracia o povo foi ouvido, a desigualdade diminuiu, e os pobres melhoraram de vida.

Isto não significa que os pobres sempre ganhem com a democracia. Nos países ricos, durante os 30 Anos Neoliberais do Capitalismo (1979-2008), foram os muito ricos que ficaram ainda mais ricos.

Os pobres e a classe média viram seus rendimentos estagnar, não obstante continuassem a ocorrer progresso tecnológico e crescimento econômico.

Embora o neoliberalismo falasse sempre em nome da democracia era na verdade contra ela, como vimos no caso extremo da Guerra do Iraque e hoje vemos na Guerra do Afeganistão.

Sem dúvida, era um autoritarismo contra outro autoritarismo, mas o dos dois países invadidos ocorria dentro de sua própria casa, enquanto que o outro confundia-se com o imperialismo.

As elites econômicas sempre se opuseram à democracia. Só a aceitaram porque não puderam mais resistir à pressão dos pobres e da classe média. Mas sempre com reservas. Sempre temendo a "ditadura da maioria", sempre temendo a expropriação pelos pobres.

Só aceitaram a democracia quando perceberam que esse perigo não existia. Que, pelo contrário, em uma sociedade que já havia realizado sua revolução capitalista e contava com uma grande classe média, a democracia era mais segura que o voto censitário do autoritarismo liberal.

O Brasil completou sua revolução capitalista em meados dos anos 1970. Desde então a apropriação do excedente econômico deixou de depender do controle direto do Estado para ocorrer no mercado.

Por isso a transição democrática foi inevitável; por isso a democracia brasileira está consolidada. Mas há ainda muito por fazer para melhorar a qualidade da democracia, para prosseguir na democratização.

Nesse campo, o principal desafio é crescer mais rapidamente, porque é o desenvolvimento econômico que abre oportunidade para a melhoria dos padrões de vida, a diminuição da desigualdade e a proteção do ambiente; a principal dificuldade é a tendência à sobreapreciação cíclica da taxa de câmbio; e a principal tarefa é sempre a da educação, porque ela é condição do próprio desenvolvimento econômico, da continuidade da democratização, e da afirmação da cidadania.

O Brasil caminhou nessa direção desde o governo Itamar Franco. Depois do Plano Real poderia ter crescido muito mais se tivesse combinado responsabilidade fiscal com cambial; se tivesse adotado a estratégia novo-desenvolvimentista baseada nessas duas responsabilidades, como fazem os países asiáticos dinâmicos.

Os dois candidatos ao segundo turno prometem que o farão. Construir em conjunto com a nação uma estratégia nacional de desenvolvimento não é tarefa fácil, mas creio que o povo brasileiro e sua democracia estão prontos para isso.

Emoções mais fortes, enfim :: Clóvis Rossi

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Marquei minhas férias para a partir da semana que vem, no pressuposto de que a eleição seria liquidada no primeiro turno, com a vitória de Dilma Rousseff. Errei, portanto, o que o leitor atento já terá percebido, dado que pus no papel o meu palpite, como sempre faço.

Esse erro até me perdoo, porque na reta final da campanha entrou o imponderável, na forma de escândalos de vários calibres e da intrigalhada em torno do aborto. É razoável supor que esses fatores tenham contido a onda Dilma.

O erro mais grave, no entanto, é outro: acreditar que, no segundo turno, Dilma daria um passeio. A pesquisa Datafolha que sai hoje mostra que não é bem assim.

Continua favorita, continua à frente, fora da margem de erro, mas a evolução dos dois finalistas é bem diferente: em votos válidos, Dilma subiu apenas 15% (dos praticamente 47% que obteve no primeiro turno para os 54% da pesquisa).

Já José Serra deu um salto de 44%, batendo em 47% contra apenas 32,61% nas urnas.

Uma primeira explicação, também presente na pesquisa, está dada pela maior porcentagem de eleitores de Marina que estão preferindo Serra (51% contra apenas 22% que cravam Dilma).

Mas é uma explicação insatisfatória: metade dos quase 20% que Marina teve dá apenas 10%, quando Serra cresceu 44%.

Talvez continue valendo o que "El País" e "Le Monde" escreveram sobre o primeiro turno: o eleitorado recusou-se a dar um cheque em branco a Lula. Ou, então, o poder de transferência de votos de Lula para Dilma bateu no teto. Ainda é suficiente para lhe dar a vitória, mas vai ter que suar a camisa bem mais do que o padrinho imaginava.

Saio de férias arrependido por perder emoções mais fortes que antevistas e torcendo para que ambos os candidatos tirem Deus da campanha. Ele não merece.

Jogo ficou duro para o PT:: João Bosco Rabello

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O segundo turno trouxe vantagens a José Serra e problemas a Dilma Rousseff, o que explica o abatimento da candidata e o clima de prostração na sua base, conforme admitiu o presidente do PT, José Eduardo Dutra. Do lado tucano, o resultado abriu a campanha aos políticos liderados pelos vitoriosos no primeiro turno, como Aécio Neves, Aloysio Nunes e Jorge Bornhausen - este apontado como um dos fatores da eleição do governador do DEM Raimundo Colombo, em Santa Catarina, onde Lula pediu ao eleitor que "extirpasse" o partido.

O PT luta para levantar o ânimo, mobilizando governadores e estimulando a militância. Mas também já vive o clima de disputa interna com o PMDB que cobra sua exclusão nas decisões de campanha e se vê obrigado a conviver com Ciro Gomes que classificou o partido como "um ajuntamento de assaltantes", chefiados por Michel Temer, o vice da aliança governista.

O que concentra mais a atenção do PSDB agora não é o debate sobre o aborto ou a conquista de Marina Silva, embora sejam importantes, mas os acordos internos, como o compromisso de Serra de não disputar a reeleição, abrindo caminho para Aécio Neves e Geraldo Alckmin em 2014.

Ambos têm força para dar a vitória a Serra em seus colégios eleitorais nos índices idealizados pelo tucano para o primeiro turno, quando a popularidade de Lula impôs um engajamento menor. O cenário indica que Minas já divide com São Paulo o poder político no PSDB.

Faltou sinceridade

Aceitar o debate plebiscitário sobre o aborto foi o grande erro cometido por Dilma Rousseff, na avaliação de políticos e analistas. Refém do sim ou do não, a candidata foi flagrada em contradição, o que se tornou mais importante eleitoralmente que o tema. "A verdade não dá voto, mas a mentira tira", resumiu um experiente político, ao referir-se à afirmação de Dilma de que sempre foi contra o aborto. Para a maioria, no mínimo, a candidata não passou sinceridade ao eleitor.

Ficha Limpa

O Supremo Tribunal Federal tende a concluir o julgamento da lei da Ficha Limpa fazendo prevalecer a decisão do Tribunal Superior Eleitoral pela sua vigência imediata. Mas não será surpresa se um ministro mudar seu voto a favor da lei, que já gerou seus efeitos para a presente eleição.

Sangria eleitoral

No primeiro turno, Dilma Rousseff (PT) resistiu ao uso de sua imagem com o neto Gabriel, no colo, no horário eleitoral. Na ocasião, apenas uma foto registrada pela equipe da campanha foi liberada para divulgação. O critério mudou, porém, com a inserção do tema aborto na pauta eleitoral. A imagem do neto foi ao ar no primeiro programa da candidata no segundo turno, para reforçar o discurso em defesa da vida. O PT se convenceu de que, mais que o escândalo da Casa Civil, o aborto provocou uma sangria na candidatura.

Sem telefone

Do ex-presidente do PSDB, deputado José Aníbal, irritado com o discurso do PT: "Tinha que tirar os celulares deles que ficam reclamando das privatizações".
Concentração

A candidata Dilma Rousseff está desde sexta-feira sob treinamento intensivo para o debate de hoje, o primeiro apenas entre ela e Serra. Com ela, José Eduardo Dutra, Ciro Gomes e o ministro Alexandre Padilha.

Entrevista - Itamar Franco: Lula é um mito, mas mitos e muros são derrubados

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Eleito senador pelo PPS de Minas, Itamar ataca o presidente e afirma que Serra precisa parar de elogiá-lo se quiser vencer

Eliane Cantanhêde

Um dos articuladores do voto "Lulécio" em 2002, a favor do petista Lula para a Presidência e do tucano Aécio Neves para o governo de Minas, o ex-presidente da República Itamar Franco (1992-1994) agora critica duramente Luiz Inácio Lula da Silva e diz que ele tem de parar de falar "nunca antes neste país": "O Lula não é dono do Brasil e não inventou o Brasil".

Segundo ele, "Lula não é democrata": "Um presidente que vai a Minas dizer que não pode ter um senador de oposição, que zomba da imprensa, que zomba da Constituição, não é democrata."

Ex-senador (1975-1990), Itamar, 80, volta à Casa pelo PPS com a língua afiada. Ao lembrar de Getúlio Vargas, diz que "Lula tornou-se um mito, mas mitos e muros também são derrubados".

Folha - Por que Serra e não Dilma?

Itamar Franco - Porque ela tem um discurso monotemático. Se fosse uma estudante, seria uma aluna boa para decorar as lições, não para fazer cálculos. Ela vem com um discurso preparadinho que o presidente ensinou. Já o Serra tem pensamento próprio. Mas, se não mudar o discurso, vai perder.

Mudar em quê?

Tem de parar de elogiar ou de ser condescendente com o Lula. Imagine o cidadão que está em casa ouvindo isso: "Puxa, se o candidato da oposição elogia tanto o presidente, para que mudar?"

E o argumento que Lula tem 80% de popularidade e não dá para bater nesse muro?

Ele tornou-se um mito, mas mitos e muros também são derrubados.

Não foi o sr. que criou o voto "Lulécio" de 2002?

Procurado pelo Zé Dirceu, desisti da disputa e apoiei o Aécio para o governo e o Lula para presidente. Daí surgiu o voto Lula-Aécio.

O que aconteceu depois?

Sabe o que o Lula fez em 2006? Foi na minha terra, levou todo mundo e subiu no palanque até com o Celso Amorim, que também foi meu chanceler, para falar mal de mim. Fiquei triste. Agora o Lula fez uma campanha muito violenta em Minas contra a gente de novo, uma campanha que raiou o imoral, agredia os princípios democráticos. Bem, um presidente que faz no Senado o que ele faz, que nem presidente militar fez...

O que foi imoral?

Teve nove pessoas presas, distribuindo santinhos apócrifos com as maiores aleivosias contra nós. Saíam de onde? De um comitê do PT.

Se Aécio, Anastasia e o sr. foram eleitos, por que o Serra perdeu em Minas?

Nós trabalhamos pelo Serra, mas ele não teve organização nenhuma em Minas.

E o PSDB mineiro?

Nós fazíamos um discurso afirmativo, falávamos o que o povo queria ouvir, e o povo mineiro gosta de pegar no candidato, gosta de alisar a gente, e nós atendíamos isso. Serra, não. E até nos debates ele perdeu boas chances de chutar em gol, como quando a Marina levantou uma bola para ele contra a Erenice e ele deixou passar. Foi falar em assunto técnico, oras!

O sr. votou mesmo no Serra?

Votei no Serra por causa da coligação, mas muitos amigos votaram na Marina Silva e queriam que eu ficasse com ela. Não fiquei.

Como vê o segundo turno?

Em toda a minha vida só vi um homem transferir maciçamente os votos do seu partido: Leonel Brizola para Lula, no segundo turno de 1989. Então, não sabemos. Depende muito da Marina e dos votos dela, mas esse eleitorado é muito disperso e múltiplo.

A Dilma saiu com 14,3 pontos na frente. É possível virar?

Isso dá uns 13 milhões de votos e, mais um pouquinho, Serra chega lá. Possível é, e já vimos viradas duas vezes em Minas. Mas ele precisa ser mais afirmativo no campo social, econômico, político.

Como enfrentar Lula?

Ele tem de mostrar que o Lula não é dono do Brasil e não inventou o Brasil. Do jeito que as coisas vão, o Lula vai dizer que quem abriu os portos foi ele, não d. João 6º. Tudo é ele, é ele. Por que não dizer o que o Real fez pelo país? Por que não dizer que o pãozinho custava um preço de manhã, outro preço à tarde, outro preço à noite?

Como está a sua relação com Fernando Henrique Cardoso?

Não está. Mas se eu defendo escondê-lo? Não defendo. Apesar das minhas desavenças com ele, acho um absurdo escondê-lo. Se não aparece, batem nele de qualquer jeito. Então ele deve aparecer, rebater, xingar.

Como o sr. imagina um Senado com três ex-presidentes?

Eu fico olhando o Sarney dizer que o melhor presidente que ele já teve foi o Lula, e penso: sim, senhor, hein, presidente Sarney?

E o Collor?

Prefiro falar da chuva.

Que Senado vai encontrar?

Um Senado subjugado pelo Executivo. A interferência do presidente é a todo instante, em tudo, até em questões internas. Uma das coisas mais sagradas do Congresso são as CPIs. Pois eu era de oposição e fui presidente da CPI das "polonetas" no governo Geisel e depois da CPI das diretas. E, agora, o presidente diz que não pode ser e não é. Onde já se viu isso? O Senado diz amém, amém.

Em 2011, a bancada lulista vai ser um rolo compressor. Como furar o bloqueio?

Fácil não é, mas não é impossível. A ditadura durou 20 anos, mas ela se tornou frágil e caiu. Hoje, se há essa ditadura que o PT quer impor ao país, se acha que só ele sabe o que é bom para o país, é preciso reagir. Quando o Lula diz que "nunca antes neste país", eu penso: o que que é isso? Como é que o sr. Sarney aceita isso? Então, ninguém fez nada? Ao longo do processo, cada um de nós, o Sarney, eu, o Fernando Henrique, foi passando o bastão.

Com maioria lulista, é possível o Aécio presidir o Senado?

O Aécio hoje é a maior liderança nacional.

Mais do que o Lula?

Mais do que o Lula, porque o Aécio é democrata.

O Lula não é democrata?

Não, basta ver as ações dele todos os dias. Um presidente que vai a Minas dizer que não pode ter senador de oposição, que zomba da imprensa, que zomba da Constituição, não é democrata.

Qual sugestão o sr. daria a Lula para o pós-Presidência?

O Lula gostou do poder, mas ele vai ver o que é bom depois, quando deixar o poder. Não se pode acostumar com os palácios, os aviões, os helicópteros, com o sujeito que carrega a sua mala, porque isso não é o dia a dia do homem simples, que nós todos somos. O Lula deve saber que, um dia, tudo isso acaba. O poder não é eterno. Nós já tivemos no Brasil um grande presidente que era também o "pai dos pobres" e que depois foi derrubado, não é?

Entrevista. Carlos Guilherme Mota: ''O caminho é republicanizar a república''

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Historiador vê no debate sobre aborto sinais de uma "grande viragem", a valorização do voto moral. E avalia que o Brasil não cabe mais dentro do seu atual modelo político

Gabriel Manzano

Há alguma coisa muito errada quando, numa campanha presidencial, o que os candidatos mostram na TV não interessa ao eleitorado e o que o eleitorado discute não está no programa de partido nenhum. "Todo esse barulho que se faz a respeito do aborto é só um sintoma", diz o historiador Carlos Guilherme Mota. "Sintoma de um conservadorismo na sociedade, mas é muito mais que isso. Reflete um movimento profundo, uma insatisfação contra a crise de valores que impregnou o País."

E que movimento é esse? "É uma reação ao que eu chamaria de morte das utopias. As recentes "utopias" brasileiras, o PSDB e o PT, estão ficando superadas, cada uma por diferentes motivos. O Brasil não cabe mais dentro do modelo político que eles utilizam. Acho que estamos assistindo a uma grande viragem, a valorização do voto moral."

Autor de cerca de 30 livros, entre eles Ideologia da Cultura Brasileira, e estudioso há décadas da história social do País, o professor Guilherme Mota entende que, no debate religioso a que se assiste hoje, cujos estilhaços atingem a candidatura da presidenciável Dilma Rousseff (PT), "o importante não é debater a sua natureza conservadora - mas o vem lá do fundo. O embrião de uma nova sociedade civil". Nesta conversa com o Estado, ele afirma: "A polêmica sobre aborto é uma questão interna desses grupos religiosos. O que os candidatos têm de fazer é deixar claro que pretendem ser presidentes de um Estado que é laico. O caminho é republicanizar a república."

Este início de segundo turno parece dominado por uma onda conservadora, o debate sobre o aborto. Por que isso vem tão forte?

Isso reflete um movimento mais profundo, uma mudança de mentalidade. Todo esse barulho que se faz sobre o aborto é só um sintoma. Resumir a isso o conservadorismo é reduzir demais o fenômeno. Na perspectiva do historiador, acredito que estamos vivendo uma grande viragem de mentalidade. Pode-se dizer que conservador, no caso, é todo um sistema político dentro do qual o Brasil não cabe mais.

O que significa isso?

Que se não for a briga pelo aborto o problema vai aparecer por outra fresta. E os políticos ficam aí discutindo coisas tópicas na propaganda, deixando de lado o que interessa: qual o projeto de nação que oferecem? Aliás, já notou como a palavra "nação" desapareceu da paisagem política?

Mas o sr. não vê, por trás dessa polêmica religiosa, onde católicos e evangélicos estão juntos, um conflito entre conservadorismo e algo mais atual?

Pode ser, mas o essencial é que essa polêmica é uma coisa estranha à política, estranha a uma campanha presidencial. O que tem de ser enfatizado é que o Estado brasileiro é laico. O que os dois candidatos à Presidência têm de fazer é deixar clara sua disposição de, uma vez eleitos, atuarem com presidentes de um Estado que é laico. O caminho é republicanizar a república."

Por que ela foi desrepublicanizada?

Isso vem lá de trás. Temos um modelo republicano mal acabado, que ignora, como já disse, que religião não deve fazer parte de suas cogitações. Assim como esses grupos não têm de palpitar, ficar impondo seus paradigmas. Para seus fiéis, tudo bem. Mas cabe ao Estado se preservar contra ingerências descabidas. É uma repetição de fenômenos antigos de nossa história.

De quais fenômenos o sr. fala?

Dos que ocorreram, por exemplo, lá pelos anos 70, quando a Igreja assumiu um papel de destaque na política, na defesa de alguns princípios. Eu já debatia isso na época, em pleno período militar, perguntando como se pode parir uma sociedade civil com uma alavancagem eclesiástica. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil tinha um peso grande fora de seu universo religioso. Depois veio o PT e se mirou no modelo do sindicato Solidariedade, de Lech Walesa, na Polônia, que é um país bastante conservador. Ora, uma sociedade que se organiza a partir de diretrizes religiosas não é civil.

O que seria, na prática, republicanizar a republica?

Aí é preciso olhar o todo. Comecemos com uma questão: é possível fazer política num País com uma educação tão primitiva? Acabamos de viver uma eleição presidencial na qual, como o proprio Estado informou, 64 milhões de eleitores, quase metade, são analfabetos ou têm primeiro grau incompleto. O historiador britânico Eric Hobsbawn já costumava definir o Brasil como "um monumento à irresponsabilidade social". Somem-se às velhas questões da inclusão social, não resolvidas, que o Brasil duplicou sua população em 40 anos, de 90 para 180 milhões de pessoas. É uma tarefa gigantesca planejar saúde, educação, cidadania para tanta gente. O previsível era que os desajustes se agravassem. Republicanizar é reordenar as tarefas.

Quais tarefas?

Cadê a discussão sobre reforma política na campanha? Cadê a política universitária, sem a qual não daremos o salto tecnológico que permita ao Brasil tornar-se uma grtande nação? Por que não se discute a defesa? E a questão urbana? Os candidatos estão cientes de que se vive uma guerra civil nas cidades? Alguém está disposto a avaliar o risco ambiental do pré-sal? É proibido falar da cultura, dos rappers, dos grafitti, que gritam por uma sociedade fora do sistema? Podia dizer muitas outras coisas, mas fico nessas e fecho com mais uma: os candidatos deveriam é propor medidas para coibir a mercantilização da fé e contra a manipulação e exploração da credulidade popular. Mas sei que é difícil falar disso, num País que assiste à morte das utopias.

De que utopias o sr. fala?

Das duas utopias políticas, , o PSDB e o PT. Ambos estão envelhecidos, porque assimilaram demais as velhas heranças, os modos antigos de comandar, com que se administrava um país injusto. Um desses modos, um modelo social-democrata que desidratou, não formou bases sociais. O que se propunha como uma realização liberal deu em fracasso. O lulismo, que veio depois, também se ajustou demasiado a um sistema que já não serve e não dá as respostas que o futuro exige. Um resultado de tudo isso: não conseguem explicar convincentemente ao distinto público e que o aborto é uma questão de saúde pública, e pronto.

O sr. falou no início em viragem moral. Isso não lembra o moralismo da velha UDN, nos anos 50?

Não, porque o de agora não é um moralismo colocado como valor ideológico por um partido. Temos uma parcela de pequena burguesia ascendente, e crítica, em busca desse um modelo social que nem tucanos nem lulismo oferecem. Olhand0 lá atrás, também não é a sociedade civil dos tempos de JK, nem do período militar, que era extremamente despolitizada, nem a do início da redemocratização.

Nessa sociedade a que o sr. se refere, qual o papel das novas classes ascendentes, C, D, ou E, que se fortaleceram com os programas sociais?

Acho que há um certo problema em se chamar de A, B, C, D. Prefiro dizer, no geral, que há uma ascensão de uma pequena burguesia, num setor de serviços, por exemplo, com outros valores, com mais exigências, e isso impacta a vida política. Mas impacta de maneira perversa, pois ao lado desses novos quadros surgem os Tiriricas. O que se percebe de bom, no meio disso, é o efeito Marina Silva. Não tanto por sua candidatura, por sua pessoa, mas porque ela representou na eleição um símbolo disso tudo que desponta, essa viragem de que falei no começo. Ela traz essa mensagem: temos é que olhar para o futuro. Lembrou que partidos precisam ter valores e coerência ideológica. E que precisamos do meio-ambiente para deixar para futuras gerações.

Podemos resumir, enfim, que conservadora é a política e o País não cabe mais no aparato político atual.

Nem no político, nem no institucional. No vazio, acabam aparecendo frentes novas, gente sem os velhos vícios. O pessoal das ONGs, os ativistas da cultura, promotores e juízes. Mas é tudo muito lento e, na política, mais difícil. Lembro aqui uma frase de William Faulkner: "O passado nunca morre. Ele nem é passado." Eu diria que, no Brasil, ainda muito mais. Esse é o desafio.

Atuação de Lula na campanha abre discussão

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Cientistas políticos se dividem sobre a proposta, defendida por José Serra, de regulamentar a participação dos chefes do Executivo nas eleições

Lucas de Abreu Maia

A atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha à sua sucessão tem sido tema recorrente nas eleições deste ano. Dois fatos na última semana reacenderam a discussão: na terça-feira, Lula e correligionários reuniram-se no Palácio da Alvorada para debater os rumos da campanha de Dilma Rousseff (PT) e foram acusados pelo PPS de conduzir evento eleitoral em edifício público; no dia seguinte, o tucano José Serra prometeu que regulamentará, se eleito, a atuação dos chefes do Executivo nas eleições.

"Com o apoio do Congresso, vamos aprovar um marco para regulamentar a participação dos chefes de Executivo nas campanhas eleitorais", disse Serra a uma plateia composta por aliados.

Mas será que a legislação atual de fato precisa de revisão? O Congresso apoiaria a regulamentação de uma medida que poderá restringir a atuação de políticos?

Para o cientista político Fábio Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é "incoerente" discutir a regulamentação da participação dos chefes do Executivo em campanhas. "É incoerente discutir a atuação dos governantes nas eleições depois da aprovação da reeleição, quando esta questão não foi suscitada. Se o presidente pode fazer campanha em nome próprio, por que imaginar que ele não pode fazer a campanha de um companheiro de partido?", questiona o professor, que chama a proposta de Serra de "oportunismo".

Ele afirma que "certamente houve destemperos e excessos" na atuação de Lula na campanha, mas defende que a legislação atual é suficiente para coibir estas manifestações.

"Que a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral se faça com maior eficácia, com instrumentos mais adequados, mas, em princípio, acho que tem que haver ampla liberdade para que a campanha se desenvolva", diz. "Acho, sim, que tem ampla pitada de briga eleitoral nesta proposta."

Esta é a mesma posição de Ricardo Ismael, cientista político da PUC do Rio. Para ele, "há de fato um problema nesta campanha no entusiasmo que ele (Lula) quer levar a candidata Dilma à vitória", mas, afirma, cabe à Justiça coibir os excessos.

"Talvez o Tribunal Superior Eleitoral tenha receado, em alguns momentos, estabelecer limites, tanto na pré-campanha quanto na campanha", diz o cientista político.

Segundo ele, uma das irregularidades cometidas pelo presidente foi a antecipação da campanha - Lula foi multado diversas vezes por propaganda eleitoral extemporânea. "Eu só tenho dúvidas se é necessária uma nova legislação. Acho que o fundamental é que a Justiça tenha uma posição mais clara", defende Ricardo Ismael.

Falhas na lei. Sílvio Salata, presidente da comissão de direito eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo, defende mudanças na norma atual. "Acho que existem algumas falhas na lei no que tange à questão das condutas vedadas aos agentes políticos nas campanhas", opina.

Para ele, a legislação "ainda não tem efetividade", já que se tem usado "bem público em favor de candidato".

Salata cita como exemplos a reunião de terça-feira no Palácio da Alvorada e a presença do presidente Lula e de Dilma Rousseff nos festejos do dia 1.º de Maio deste ano.

"Isso é um equívoco, porque quebra efetivamente o princípio da igualdade de condições entre todos os candidatos", diz. Ele defende, porém, que as mudanças na legislação eleitoral aconteçam no âmbito de uma reforma política.

Congresso. Fábio Wanderley Reis acredita que, se eleito, Serra deverá ter dificuldade em aprovar mudanças na legislação eleitoral no Congresso. Ele diz ver "chances pequenas" de aprovação, já que o tucano não deve ter maioria nem na Câmara nem no Senado - PT e PMDB elegeram as maiores bancadas nas duas Casas no último domingo.

Já Ricardo Ismael classifica como "furada" a hipótese de que Serra não terá maioria no Congresso, caso seja eleito. Em sua opinião, só é possível falar em maioria quando o presidente for eleito.

"Não tenho a menor dúvida de que o Serra vai ter maioria nas duas Casas. Porque há uma tendência natural de certos partidos de se manterem próximos ao poder", avalia.

Escândalos rondam empresa no governo Lula

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Leandro Cólon e Karla Mendes

O esforço do novo comando dos Correios para contratar e pagar R$ 2,8 milhões a mais para uma empresa aérea é um novo capítulo na vida de uma empresa estatal que tem sido palco de irregularidades e escândalos em sequência no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Foi na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) que começou o escândalo do mensalão, em 2005 - crise que derrubou o ministro José Dirceu da Casa Civil e até ameaçou o cargo do presidente da República.

Cinco anos depois, a novela se repete, pelo menos na Casa Civil. Lula e a então ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, prometeram fazer uma limpeza nos Correios, dominado majoritariamente por grupos do PMDB nos últimos anos.

Trocaram o presidente e alguns diretores, mas não mudaram os métodos. Davi de Matos foi nomeado para a presidência. Meses antes, uma filha dele ganhou um emprego de assessora de Erenice - um dos filhos da ministra, Israel Guerra, era funcionário fantasma da Terracap, órgão do governo do Distrito Federal que já teve Davi de Matos como presidente.

Erenice nomeou para a Diretoria de Operações o coronel Artur Rodrigues, testa de ferro do empresário argentino Alfonso Rey na Master Top Linhas Aéreas (MTA). O jovem Israel Guerra, filho de Erenice, é investigado por suspeita de cobrar propina para ajudar a MTA no governo antes da chegada do coronel Artur aos Correios.

Por trás dos acertos estava a ideia de montar e dirigir a empresa de logística (sociedade mista entre governo e capital privado) do governo Lula - uma promessa de Erenice dentro do Planalto.

O argentino Alfonso, que vive em Miami, já havia sido consultado pelo coronel Artur sobre uma possível aliança com a Total Linhas Aéreas. O dono da Total, Alfredo Meister, é amigo pessoal do coronel. Pediu a ajuda dele em dezembro para solucionar um impasse dentro do governo sobre uma inspeção antirruído nos aviões. O coronel caiu no mês de setembro.

Erenice pediu demissão para evitar desgaste político na campanha de Dilma Rousseff e a MTA está à beira da falência. Por enquanto, Total Linhas Aéreas e Davi de Matos estão a salvo.

Nomeado de Erenice nos Correios fecha contrato superfaturado em R$ 2,8 mi

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Relações suspeitas. Documentos obtidos pelo Estado mostram que a nova direção da estatal, escolhida pela então ministra da Casa Civil, manobrou para ressuscitar uma licitação que havia sido cancelada três meses antes pelo comando demitido da estatal

Leandro Cólon e Karla Mendes

O presidente dos Correios, David José de Matos, e a diretoria da estatal aprovaram um contrato superfaturado em R$ 2,8 milhões para favorecer uma empresa de carga aérea. Documentos obtidos pelo Estado mostram que a nova direção da estatal, nomeada pela então ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, manobrou para ressuscitar, em agosto, uma licitação que havia sido cancelada três meses antes pelo comando demitido da estatal.

Os documentos da presidência dos Correios e os registros dos pregões revelam o esforço da nova diretoria, que assumiu no dia 2 de agosto, para, duas semanas depois da posse, entregar à Total Linhas Aéreas um contrato de R$ 44,3 milhões.

A licitação foi concluída em meio à crise que derrubou Erenice da Casa Civil. Coube ao presidente Davi de Matos e seus diretores aprovarem no dia 15 de setembro, um dia antes da demissão da ministra, a contratação da Total, como mostra a ata da 36.ª reunião interna do comando da estatal. O contrato foi publicado no Diário Oficial da União de 4 de outubro, um dia depois do primeiro turno eleitoral. No período de um ano, a Total vai transportar cargas dos Correios no trecho Fortaleza-Salvador-São Paulo-Belo Horizonte.

Alerta. Tudo começou no dia 2 de junho, quando um pregão foi feito para o serviço pelo preço limite de R$ 41,5 milhões. A Total entrou sozinha no leilão e ofereceu R$ 47 milhões. A proposta foi recusada pelos Correios. "Solicito a redução do último valor proposto ao preço de referência, sob pena de ter sua proposta desclassificada do certame", disse o pregoeiro, segundo registro eletrônico. A empresa não mudou o preço e a licitação foi anulada.

Para conseguir o contrato de R$ 44,3 milhões, na licitação de agosto - com posterior aprovação da manobra pela diretoria, em setembro -, a Total contou com o apoio de outro personagem central da crise dos Correios, o coronel Eduardo Artur Rodrigues Silva, então nomeado diretor de Operações.

Em agosto, o coronel foi procurado pelos donos da Total para tentar reverter juridicamente o pregão revogado em junho. A empresa MTA, que ganhara na Justiça uma licitação dos Correios, foi consultada sobre a possibilidade de orientar a Total a conseguir fechar esse contrato. O objetivo, naquele momento, era tentar transformar as duas empresas de carga aérea no embrião da unidade de logística que o governo pretende criar em 2011 - uma sociedade mista entre governo e empresas privadas avaliada em US$ 400 milhões.

A solução dada foi fazer uma nova licitação no dia 19 de agosto. Dessa vez, os Correios subiram de R$ 41,5 milhões para R$ 42 milhões o preço máximo para contratação. Mais uma vez, só a Total participou dos lances.

Chegou ao preço de R$ 44,3 milhões e avisou que não poderia mais reduzir o valor, apesar dos alertas do pregoeiro: "Solicitamos que a arrematante faça mais uma revisão em sua planilha de custos, reduzindo sua proposta para, pelo menos, o valor estimado da contratação."

O artigo 48 da Lei de Licitações é claro. Diz que serão desclassificadas "propostas com valor global superior ao limite estabelecido". Já o artigo 40 veda faixas de variação em relação a preços de referência. Diante do conflito legal, o resultado do pregão foi remetido ao coronel Artur, que era o diretor de Operações.

"Excepcional". Num relatório de 13 páginas, a que o Estado teve acesso, ele deixa de lado os alertas no pregão e justifica a contratação da Total Linhas Aéreas por um preço R$ 2,8 milhões acima do valor estipulado na licitação revogada em junho e R$ 2,3 milhões superior ao preço definido no edital da segunda concorrência. Segundo ele, os métodos dos Correios para chegar a uma estimativa "não são absolutamente precisos". "Fato este que permite a homologação excepcional de licitações por valor acima do previamente estimado em decorrência da variação normal de mercado e desde que haja interesse público", diz.

O parecer do ex-diretor foi então submetido em 15 de setembro ao comando dos Correios. David José de Matos, amigo e colega de Erenice desde os tempos em que trabalharam na Eletronorte, dirigiu a reunião que aprovou a contratação da Total por R$ 44,3 milhões, vigorando por 12 meses. O contrato foi publicado na semana passada. Na ata estão os nomes dele, do coronel Artur e dos diretores Décio Braga d Oliveira, Ronaldo Takahashi de Araújo, José Osvaldo Fontoura e Nelson Luiz de Freitas. No dia seguinte, Erenice Guerra pediria demissão da chefia da Casa Civil, em meio ao escândalo envolvendo assessores e parentes dentro do governo.

O coronel Artur demitiu-se no dia 19 de setembro, depois de o Estado revelar que era testa de ferro de um empresário argentino na MTA, outra empresa contratada pelos Correios e personagem da queda de Erenice Guerra da Casa Civil. Um filho de Erenice, Israel, fez lobby e cobrou propina para ajudar a MTA.

'Sou ambientalista', diz Serra em SC

DEU EM O GLOBO

Tucano defende flexibilização no Código Florestal para respeitar diferenças regionais

Juraci Perboni* e Adauri Antunes Barbosa**


CHAPECÓ (SC) e BLUMENAU (SC). De olho nos votos de Marina Silva, do PV, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, defendeu ontem bandeiras ambientais.

Em entrevista a uma rádio de Chapecó, Santa Catarina, ele disse ser um ambientalista.

— Sou ambientalista, defendo muito o patrimônio florestal.

Serra sustentou uma flexibilização no projeto do Código Florestal, de forma a respeitar as características de cada região.

— Sem dúvida, o problema da Amazônia é diferente do de Santa Catarina, que é de pequenas e médias propriedades e que já estão ocupadas há muitas décadas, para não dizer séculos. A questão do Código Florestal tem de permitir algum peso às condições regionais — afirmou.

Para ele, a votação do projeto no Congresso não pode coincidir com a disputa eleitoral: — O projeto não pode ser votado agora, ano de eleição. Nós vamos pegar isso no ano que vem e discutir com todo mundo.

E ter em mente a necessidade de preservar e de ter incentivos econômicos para o desenvolvimento do país. Acho perfeitamente possível compatibilizar.

Em Chapecó, Serra desfilou em carro aberto com o governador Leonel Pavan (PSDB), o governador eleito, Raimundo Colombo (DEM), e os senadores eleitos Luiz Henrique da Silveira (PMDB) e Paulo Bauer (PSDB).

Em seguida, fez comício para cerca de três mil pessoas, segundo a Guarda Municipal.

Depois, Serra participou, em Blumenau, do desfile de abertura da Oktoberfest, a tradicional festa do chope realizada anualmente.

Ele pedalou por 1,3 quilômetro em uma “centopeia”, brinquedo que combina trenzinho com bicicleta, e comentou os esforços que os partidos que o apoiam estão fazendo para obter o apoio de Marina Silva.

— Ela (Marina) tem lá seus elementos de julgamento. Não faço qualquer espécie de constrangimento e ela tomará a decisão que achar melhor.

Serra disse que suas prioridades de governo, caso seja eleito, serão saúde, segurança, educação e obras de infraestrutura.

— Acima de tudo, mudar o estilo, fazer um governo com valores, honestidade, verdade, solidariedade, liberdade e justiça social — disse.


* Especial para O GLOBO e ** Enviado especial

Líderes estaduais serão trunfo de Serra

DEU EM O GLOBO

Aliados de diferentes regiões do país ficarão responsáveis por levar às ruas a campanha presidencial tucana

Silvia Amorim

SÃO PAULO. Com a agenda de viagens do candidato à Presidência José Serra (PSDB) mais enxuta no segundo turno, o engajamento dos aliados nos estados passa a ter peso maior na estratégia da campanha, em comparação à primeira fase da disputa.

Em várias regiões do país, esses apoios serão os responsáveis por levar a campanha de Serra às ruas. Esta semana, estão previstas mobilizações em Minas, para um encontro com prefeitos capitaneados pelo senador eleito Aécio Neves, e em Santa Catarina, onde DEM e PMDB prometem um ato pró-Serra.

Por isso, o presidenciável dedicou a maior parte da primeira semana a conversas com lideranças estaduais e fez uma reunião, em Brasília, com apoiadores de sua candidatura. Os tucanos não querem cometer o mesmo erro do primeiro turno, quando aliados queixaram-se de falta de organização da candidatura para promover um trabalho conjunto de mobilização.

Serra teve 33,1 milhões de votos contra 47,7 milhões de Dilma Rousseff (PT). Se a taxa de abstenção e de votos nulos e em branco se repetir no dia 31, vencerá a eleição quem tiver conquistado mais de 50 milhões de eleitores. Os votos válidos no primeiro turno somaram 101 milhões.

Numa autoanálise feita pela oposição, após o resultado das urnas, a articulação política local foi apontada como um dos pontos fracos da candidatura de Serra. Uma das faces visíveis do problema foi a falta de material publicitário nos estados. Por restrições de orçamento e por desorganização, a produção de folhetos, adesivos e santinhos deu-se a conta-gotas nos primeiros dois meses de campanha.

É outra falha que a campanha correu para evitar que se repita.

Minutos após a confirmação do segundo turno, a área responsável pela infraestrutura encomendou nova remessa de material de propaganda. Na terça-feira, protótipos com o novo slogan “Serra é do bem” já circulavam pelo comitê, em São Paulo, para análise dos coordenadores.

— Distribuiremos de forma proporcional o material para todos os estados. Todo mundo vai receber — explica o coordenador de infraestrutura da campanha, Sérgio Kobayashi.

'Lula já não assombra mais nossos aliados'

DEU EM O GLOBO

Para equipe tucana, candidatos ao governo assumirão apoio a Serra

SÃO PAULO. Nos cinco estados em que o PSDB disputará segundo turno para governador haverá um investimento maior e folhetos exclusivos com a imagem de Serra junto à do candidato ao governo estadual. A campanha tucana também aposta numa redução do efeito Lula nos estados como um fator positivo para Serra no segundo turno.

— As coisas que ele podia fazer no primeiro turno já não pode fazer no segundo turno.

Lula já não é mais um fantasma assombrando nossos aliados — afirma o coordenador da campanha, senador Sérgio Guerra (PE).

No primeiro turno, muitos aliados esconderam Serra nas campanhas locais, gesto de sobrevivência diante da popularidade de Lula. Agora, com a eleição encerrada para deputados e senadores em todo o país e para governadores em 18 estados, a cúpula da campanha avalia que os aliados estarão mais à vontade para pedir voto para Serra.

O trabalho de cabo eleitoral por parte dos aliados é considerado estratégico, pois Serra não terá condições de cumprir agenda de viagens tão intensa como no primeiro turno. Primeiro, porque o tempo de campanha é menor. Segundo, porque Serra terá que destinar boa parte da agenda à gravação do horário eleitoral. O marqueteiro Luiz Gonzalez já pediu ao menos três dias por semana para as gravações.

No primeiro turno, Serra gravou de madrugada.

Uma das preocupações foi colocar já no programa de estreia de Serra na TV depoimentos dos principais apoiadores. Apareceram Aécio, o governador reeleito de Minas, Antonio Anastasia; e o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Porém, o apoio mais esperado é o do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas nenhuma gravação foi feita até agora.

No programa de TV inaugural do segundo turno, imagens de FH foram usadas. Numa, ele e Serra estão lado a lado. A presença do líder tucano na TV é um indicativo de que a campanha incorporou de vez ajustes reivindicados há tempos pelos aliados de defesa do legado de Fernando Henrique.

No evento que reuniu os apoiadores de Serra, em Brasília, temas como as privatizações e o Plano Real foram amplamente citados nos discursos.

Não estão previstas mudanças bruscas nos programas, que devem manter o tom propositivo.

Há a preocupação do marketing com discursos agressivos e ataques a Dilma. A avaliação é a de que criam uma antipatia no eleitor. Por isso, ainda no final do primeiro turno, a campanha tirou do ar referências ao escândalo da violação de sigilo fiscal de parentes de Serra e pessoas ligadas ao PSDB, e as denúncias sobre a Casa Civil. Outra novidade será a aparição de Serra fora do estúdio, estratégia muito usada por Dilma no primeiro turno.

Ela apresentou o programa de diversos estados. Já o tucano falou, na maior parte do tempo, de um escritório cenográfico.

Ex-assessora de Dilma acusada de rombo milionário


DEU EM O GLOBO

TCU investigou contrato do Ministério de Minas e Energia sem licitação

SÃO PAULO. Maria Cristina de Castro, companheira de cela da candidata à Presidência, Dilma Rousseff, nos tempos do regime militar e mais tarde nomeada assessora especial do Ministério de Minas e Energia, quando Dilma comandou a pasta, foi investigada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo próprio ministério por conduta imprópria ao fechar um contrato, sem licitação, do órgão com o CPqD (fundação privada com sede em Campinas) para a coordenação de um projeto de modernização da área de informática da pasta, em 2003.

A denúncia foi publicada ontem pela revista “Veja”. A reportagem afirma que a fundação recebeu R$ 14 milhões pelo negócio, mas o serviço foi prestado apenas parcialmente.

Pontos do projeto, como um “sistema de acompanhamento” que custou R$ 4,8 milhões, sequer saíram do papel. O ministério instaurou sindicância interna, mas a assessoria jurídica da pasta, então chefiada pela ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra, não deu seguimento às investigações.

A investigação levou anos até que, há algumas semanas, o ministro do TCU Raimundo Carreiro, levou o caso a plenário, reconheceu as irregularidades, mas isentou Maria Cristina de Castro de culpa.

Lula desabafa: disputa ficou mais difícil

DEU EM O GLOBO

Presidente e cúpula petista demonstram apreensão com o rumo da campanha de Dilma no segundo turno

Gerson Camarotti e Maria Lima

BRASÍLIA. A realização do segundo turno levou a campanha de Dilma Rousseff (PT) para o divã. Na primeira semana da disputa polarizada com o tucano José Serra, a cúpula petista demonstrou insatisfação com o rumo da campanha — desde a dificuldade de Dilma em encontrar um discurso para reassumir o protagonismo da agenda à incorporação, às vezes atabalhoada, de aliados no comando da campanha.

Até mesmo o presidente Lula demonstrou forte apreensão com o rumo da campanha de Dilma no segundo turno.

Nas conversas que teve esta semana, Lula desabafou para um interlocutor que a disputa ficou mais difícil e que o desafio agora é reverter o quadro político de adversidade da campanha.

Na sexta-feira, o clima era de preocupação com o fato de que pesquisas internas indicavam uma redução na diferença entre Dilma e Serra.

Como parte da estratégia de campanha na primeira semana pós-primeiro turno, o presidente Lula foi poupado e evitou aparecer em eventos ao lado da sua candidata, Dilma Rousseff. O objetivo foi preservar o capital político de Lula do ambiente de derrota da campanha petista, por causa do anticlímax do segundo turno. Já esta semana, Lula pode voltar a aparecer ao lado de Dilma, para influir como cabo eleitoral decisivo.

Na campanha, há o entendimento de que Dilma se cobrou muito por não ter vencido a disputa no primeiro turno, e isso mexeu com seu estado de espírito. Coordenadores da campanha tentaram, ao longo da semana, dar uma nova motivação à candidata e demovêla da ideia de que foi a responsável por isso. Mesmo assim, a cúpula petista ainda não conseguiu encontrar uma nova linha de atuação.

Existe um forte desconforto do núcleo duro petista com a presença de novos coordenadores, como o deputado e ex-ministro Ciro Gomes (PSB-CE) e o ex-governador Moreira Franco (PMDB-RJ).

Tanto que, na semana passada, houve reuniões reservadas sem que os dois tivessem sido chamados.

Datafolha: Serra herda 51% dos votos de Marina

DEU EM O GLOBO

Pesquisa Datafolha, a primeira do segundo turno, indica que Dilma Rousseff (PT) tem 48% dos votos, contra 41% de José Serra (PSDB).

Considerando apenas os votos válidos, o resultado foi de 54% a 46%.

Serra herdou 51% dos quase 20 milhões de votos de Marina Silva (PV), e Dilma ficou com 22%.

Datafolha: Dilma tem 48% e Serra, 41%

Primeira pesquisa do 2º - turno mostra que tucano herdou a maioria (51%) dos votos de Marina; petista ficou com 22%

SÃO PAULO e BLUMENAU (SC). - Se o segundo turno das eleições para a Presidência fosse hoje, a candidata Dilma Rousseff, do PT, venceria com 48% dos votos, contra 41% de José Serra, do PSDB. Considerando apenas os votos válidos (sem brancos e nulos), o resultado seria 54% a 46%. É o que indica nova pesquisa Datafolha, encomendada pelo jornal “Folha de S.Paulo” e pela Rede Globo, e feita na última sextafeira com 3.265 eleitores em 201 cidades. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

O Datafolha comparou esses resultados com o cenário que antecedeu o primeiro turno das eleições, domingo passado. Numa simulação de segundo turno feita nos dias 1º e 2 de outubro, Dilma aparecia com 52% e Serra, com 40%. Por essa comparação, Dilma perdeu quatro pontos e Serra avançou um ponto.

Segundo o Datafolha, os pontos perdidos por Dilma foram incorporados ao contingente de votos em branco ou nulos e de indecisos, que chega agora a 11%. Em 2002 e 2006, o percentual de brancos e nulos foi de 6% e 5,5%, respectivamente. Em avaliação publicada pela “Folha”, o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, diz que se esse nível de brancos e nulos se repetir nestas eleições, existiriam 5% de eleitores que ainda seriam alvo de Dilma e Serra. E, mesmo que todos migrassem para o tucano, ele ainda ficaria atrás da petista (46% a 48%).

Pela pesquisa, Serra herdou 51% dos quase 20 milhões de votos dados a Marina Silva (PV), enquanto Dilma teve 22%. Entre os eleitores de Marina, 18% se declararam indecisos e 9% disseram que pretendem anular o voto ou votar em branco.

Serra evitou fazer comentários sobre o Datafolha: — Não comento pesquisas.

Já o coordenador da campanha de Serra, senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), disse que o resultado é “o melhor possível”.

Para ele, a posição do candidato tucano é de crescimento: — A maioria dos eleitores de Marina rejeita Dilma. Acredito que o número de votos em Marina que passará para Serra será muito maior.

Aliados de Dilma minimizaram o crescimento de Serra. Para o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), o resultado é semelhante ao primeiro Datafolha do segundo turno de 2006, quando o presidente Lula enfrentou Geraldo Alckmin: — O resultado está bom. Como daquela vez, a tendência é que Dilma comece a ampliar a vantagem.

Nordeste assegura dianteira de Dilma

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Petista tem 62% na região, o dobro de Serra, que está numericamente à frente em todas as outras regiões do país

A única vantagem do tucano fora da margem de erro acontece no Sul, onde lidera com 48% contra 43% da petista

DE BRASÍLIA - A grande vantagem de Dilma Rousseff (PT) sobre José Serra (PSDB) no Nordeste garante a atual dianteira à petista na disputa do segundo turno à Presidência.

Dilma tem 62% de intenções de voto no Nordeste. É o dobro dos 31% obtidos por Serra na região -na qual se concentra o maior número de beneficiários do Bolsa Família e onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem suas maiores taxas de aprovação.

Em todas as outras regiões, Serra está numericamente à frente, às vezes empatado com Dilma na margem de erro da pesquisa, que é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Há empate técnico no Sudeste, onde o tucano tem 44% contra 41% da petista. O mesmo ocorre nas regiões Norte e Centro-Oeste combinadas, com Serra registrando 46% contra 44% de Dilma.

A única dianteira fora da margem de erro do tucano é no Sul, onde ele obtém 48% contra 43% da petista.

Nessa região, aliados de Serra venceram as eleições para governador em dois dos três Estados -no Paraná e em Santa Catarina, com Beto Richa (PSDB) e Raimundo Colombo (DEM). No Rio Grande do Sul ganhou Tarso Genro (PT), que apoia Dilma.

INTERIOR

Se no passado o PT era um partido que se dava melhor nas grandes cidades, onde se concentram os trabalhadores organizados, com Dilma vale lógica inversa: ela vai melhor no interior do que nas regiões metropolitanas.

Segundo o Datafolha, em capitais de Estado e em regiões metropolitanas, a petista tem 44% contra 41% do tucano. Estão tecnicamente empatados, na margem de erro do levantamento realizado anteontem. Já no interior, Dilma lidera com 50% sobre os 41% de Serra.

As outras marcas de destaque da candidata governista são os eleitores menos escolarizados (ela tem 54%), os homens (52%) e aqueles com renda mensal de até dois salários mínimos (52%).

Já Serra registra seu melhor desempenho entre os que têm renda familiar maior do que 10 salários mínimos (58%) e entre os que têm nível superior (50%).

DECISÃO DO VOTO

Segundo o Datafolha, 89% dos eleitores já se dizem totalmente decididos em relação ao candidato que escolheram. Só 10% admitem ainda mudar o voto.

A cristalização do voto é maior no Sul (93%), onde Serra tem sua melhor marca.

A faixa em que há menor taxa de certeza (87%) sobre o voto é a dos que têm renda média mensal de dois a cinco salários mínimos.

Mas Dilma e Serra têm poucas chances de tirar eleitores um do outro. É que 90% dos eleitores de ambos se dizem totalmente decididos.

De acordo com o Datafolha, 79% acertam os números dos candidatos, contra 19% que dizem não saber. Outros 2% erram a resposta. Entre os eleitores de Dilma, 86% acertam o 13. Já entre os de Serra, 74% citam o 45. (FR)

Quadrilha:: Carlos Drummond de Andrade

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o
convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto
Fernandes
que não tinha entrado na história.