domingo, 2 de outubro de 2011

Opinião do dia – Roberto Freire: política e vida concreta

"O desafio colocado pela atual conjuntura é o de encontrarmos vias e formas para aproximar a política da vida concreta das pessoas, em um momento em que grassa o desencanto e mesmo um sentimento refratário, mormente entre os jovens, da capacidade de a política ser um instrumento efetivo de transformação e mudança da sociedade, quando assistimos todos os dias exemplos nada edificantes de representantes da sociedade, seja nos parlamentos, seja nos executivos, envolvidos com graves denúncias de corrupção."

Roberto Freire, deputado federal (SP) e presidente do PPS, no artigo Sinal verde para São Paulo. Brasil Econômico, 30/9/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Prefeitura ameaça invadir 421 imóveis com focos de dengue
'Metrópole de assentados' ameaça floresta

FOLHA DE S. PAULO
Para Peluso, CNJ precisa investigar corregedorias
Dilma recua e muda modelo de concessão de rodovias

O ESTADO DE S. PAULO
Arrecadação cresce e carga tributária deve bater recorde
Dilma quer baixar juro básico para 9%
"PSDB precisa assumir-se como partido de centro-direita"
Ministério Público pede fim do auxílio-paletó

CORREIO BRAZILIENSE
Dilma viaja à Bulgária em busca de suas origens
Governo barra esvaziamento do BB em Brasília
Magistrados se dividem sobre CNJ

ESTADO DE MINAS
Faculdades nota zero
Parentes de Dilma na Bulgária esperam pela presidente

ZERO HORA (RS)
30% dos prefeitos já admitem concorrer
O risco de perder a Copa existe
Fissuras abertas pela insurreição

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
SUS salva plano de saúde

Dilma recua e muda modelo de concessão de rodovias

O governo mudou o modo de privatização de rodovias executado por Dilma Rousseff quando chefiava a Casa Civil, em que os preços dos pedágios eram baixos, e os prazos das obras, curtos.

O vencedor da concessão da BR-101 no Espírito Santo, por exemplo, lançada neste mês, terá 23 anos para duplicar 418 km.

Dilma recua e muda concessão de rodovia

Presidente modifica modelo criado por ela quando ministra; prazo de obra em estrada privatizada será mais longo

Os novos editais eliminam grandes obras obrigatórias nos primeiros anos; pedágio sobe o dobro da inflação

José Ernesto Credendio, Dimmi Amora e Renato Machado

BRASÍLIA - O governo federal modificou o modelo de privatização de rodovias executado pela presidente Dilma Rousseff quando ela era ministra da Casa Civil, em 2007.

A então ministra conduziu a privatização de sete lotes de estradas -a chamada 2ª fase da desestatização.

O modelo Dilma, explorado fartamente na campanha eleitoral de 2010, conseguiu obter contratos com baixos preços de pedágio e cronogramas curtos na entrega de grandes obras.

Mas a fórmula não deu certo e resultou em sucessivos atrasos nas obras obrigatórias, protestos de usuários e ações do Ministério Público Federal contra a demora na melhoria das estradas.

A mudança veio neste mês, quando a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) lançou a concessão dos 475,9 km da BR-101 que cortam o Espírito Santo.

Ao contrário dos editais anteriores, o da BR-101/ES elimina grandes obras nos primeiros anos de concessão. A concessionária terá até 23 anos para entregar a duplicação de 418 km da estrada.

Até 2022, precisam ficar prontos somente 207 km de duplicação. Um trecho de 35 km só precisa estar concluído por volta de 2035.

Na rodada anterior dos leilões, os prazos eram bens mais enxutos. O prazo para o contorno de Florianópolis (SC) foi de quatro anos. Porém, até hoje a obra não saiu.

Outras três estradas em Minas Gerais (BR-040, 116 e 381) também fazem parte da nova fase, mas seus editais estão travados no TCU (Tribunal de Contas da União), que encontrou problemas como prazos excessivos para a conclusão das obras.

PEDÁGIO POLÍTICO

No início das concessões (anos 1990), o pedágio ficou caro, mas as obras eram feitas rapidamente.

Na campanha eleitoral, a comparação das tarifas das rodovias privatizadas por Dilma e das estaduais paulistas, mais caras e parecidas com as da primeira fase do governo federal, foram tema de ataques do PT.

No mercado se diz que as empresas que venceram as concessões da segunda etapa não arrecadam o suficiente para fazer obras de grande porte e que o prazo para a emissão de licenças ambientais foi subestimado.

O TCU, segundo a Folha apurou, já constatou graves problemas na execução desses contratos.

Em um dos casos, o da BR-101 em Santa Catarina, o Ministério Público Federal obteve liminar contra o reajuste do pedágio, pois obras emergenciais não foram feitas. Outras ações do órgão tramitam na Justiça pelo não cumprimento do contrato.

"Todos os anos eu entro com ação, porque mando fazer perícia e verifico que não foram feitas obras previstas para aquele período", disse o procurador Mário Sérgio Ghannagé Barbosa.

Já houve adiamentos também em obras da BR-101 no Rio de Janeiro e na BR-116 entre Curitiba e a divisa de SC/RS nos últimos dois anos.

Outro atraso significativo está nas obras de duplicação da Serra do Cafezal, na rodovia Régis Bittencourt (BR-116), entre São Paulo e Paraná. Pelo cronograma original, a duplicação já deveria estar concluída, mas a parte mais difícil está sendo iniciada somente agora.

Pelo atraso, a ANTT ameaçou multar as concessionárias e incluir o descumprimento no cálculo dos reajustes da tarifa.
Mas o pedágio do modelo Dilma subiu quase o dobro da inflação no período. Na Régis e na Fernão Dias, o pedágio aumentou 25% e 30%, respectivamente; a inflação do período foi de 19,3%.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Deter inflação é prioritário, afirmam 54% dos deputados

Só a bancada petista prioriza crescimento

Valdo Cruz

BRASÍLIA - A maioria dos integrantes da Câmara dos Deputados defende que o controle da inflação seja a prioridade da política econômica do governo.

Levantamento do Instituto FSB Pesquisa mostra que 54% dos deputados querem que o controle da inflação seja prioridade nos próximos meses, enquanto 33% priorizam o crescimento da economia.

A análise partidária revela que o PT tem pensamento contrário ao da maioria.

Entre os deputados petistas, 49% optam pelo aquecimento da economia como prioridade. Só 24% dizem que o controle da inflação deveria ser o foco do governo.

"Os petistas estão mais preocupados com o impacto de uma retração econômica na popularidade do governo Dilma e seus reflexos na reeleição da atual presidente", analisa o diretor do instituto, Wladimir Gramacho.

Parceiro principal da gestão Dilma, o PMDB não se alinha aos petistas. Entre os peemedebistas, 63% dizem optar pelo controle da inflação.

Na oposição, a opinião majoritária é pelo controle da inflação. O DEM é o que mais escolhe esse caminho: 89%, seguidos pelos tucanos (67%).

Desde que o Banco Central surpreendeu e reduziu os juros, economistas têm apontado que o governo Dilma passou a se preocupar mais com o ritmo da economia do que em conter a alta dos preços.

A inflação está em 7,23% no acumulado dos últimos 12 meses, acima do teto da meta, que é de 6,5%. O BC reduziu sua previsão de crescimento da economia brasileira de 4% para 3,5% em 2011.

A presidente Dilma tem repetido que a meta de seu governo é buscar um crescimento do PIB na casa dos 4%. A pesquisa ouviu 217 dos 513 deputados, distribuídos proporcionalmente.

A maioria dos deputados, 66%, espera que o BC continue reduzindo os juros. A taxa básica está em 12% ao ano.

Petistas são os maiores defensores da redução dos juros (81%). Tucanos (57%) e democratas (53%) aparecem no final da lista, mas com posição majoritária pela queda.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Titular das Cidades é excluído de decisões de sua própria pasta

Negromonte não é convidado para discutir programas do ministério e recebe menos recursos que colegas

Único representante do PP na Esplanada e alvo de acusações, ministro quase perdeu o cargo por pressão do partido

Dimmi Amora e Natuza Nery

BRASÍLIA - O ministro das Cidades, Mário Negromonte, passou a ser tratado na Esplanada dos Ministérios como se fosse um fantasma.

Ele deixou de ser chamado para reuniões sobre os preparativos para a Copa 2014, tem recebido menos recursos do que outros grandes ministérios e não influi mais no desenho dos principais programas da sua área, como o Minha Casa, Minha Vida.

Negromonte nem sequer foi informado quando a presidente Dilma Rousseff convocou três outros ministros para discutir os projetos de transporte associados à Copa, antes do feriado de Sete de Setembro.

A ausência de Negromonte, cuja pasta é responsável por analisar e aprovar essas ações, foi estranhada pelos outros ministros, que viram ali um sinal de esvaziamento do poder do colega, que na época era alvo de várias acusações de irregularidades.

Dias depois, quando as mudanças nos projetos foram anunciadas, Negromonte foi questionado pela imprensa sobre os efeitos das desapropriações para as obras. Ele não soube o que responder.

MINISTRA DE FATO

No programa Minha Casa, Minha Vida, carro-chefe do Executivo, tudo é tratado com a secretária Nacional de Habitação, Inês Magalhães.

Da cota do PT e no cargo desde a gestão Lula, a subordinada de Negromonte atua com amplo aval de Dilma e é vista dentro e fora da pasta como a verdadeira ministra.

Segundo servidores da pasta, ajustes no atual programa de transportes públicos também não são comandados por Negromonte.

Eles são feitos diretamente pela ministra do Planejamento, Miriam Belchior, com funcionários do segundo e terceiro escalões.

Os sinais de desprestígio de Negromonte se refletem também na liberação de recursos. Parlamentares de seu partido, o PP, reclamam que não têm suas emendas liberadas na própria pasta.

Em um levantamento das emendas individuais do Orçamento de 2010 já pagas, o PP aparece atrás do PPS, partido de oposição.
Na mais recente leva de emendas pagas, não foram repassados recursos das Cidades aos projetos dos pepistas.

Das seis áreas campeãs em gastos com obras (Transporte, Educação, Cidades, Defesa, Saúde e Integração Nacional), o ministério de Negromonte foi o que menos recebeu dinheiro.

Entre as despesas previstas com obras neste ano (excluídas as dívidas), o Planalto só autorizou o pagamento de 4% do que o ministério previa gastar. A média dos outros cinco é de 12%, e a dos demais ministérios, 7%.

DESPRESTÍGIO NO PP

Negromonte é o único titular do PP na Esplanada e comanda o terceiro Orçamento do governo para investimentos (R$ 7,6 bilhões).

Ele assumiu o cargo por pressão da legenda, mesmo sem contar com o entusiasmo da presidente. Dilma preferia manter Márcio Fortes no posto, mas a sigla preferiu mudar o nome.

Em oito meses de gestão, o ministro quase perdeu o cargo por pressão do próprio partido. O argumento era que ele não representava mais a legenda. A divisão foi contida às pressas quando o PP viu que Dilma poderia repetir o que fez com o PR no caso dos Transportes: trocá-lo por um técnico de sua confiança.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Arrecadação cresce e carga tributária deve bater recorde

A carga tributária brasileira deve fechar esse ano em 36,5% do PIB, pelos cálculos dos economistas José Roberto Afonso e Marcia Monteiro Matos. Outros levantamentos apontam em direção semelhante. Esse resultado será um recorde, o que parece contraditório em relação ao momento de redução de ritmo na economia, impactada pela crise internacional, e com a proposta do governo de reduzir impostos para fortalecer a competitividade das empresas. Segundo es¬pecialistas, a alta pode ser explicada pelo aumento dos ganhos e arrecadação em dez setores da economia, principalmente dos bancos

Arrecadação cresce e deve levar carga tributária a recorde de 36,5% do PIB

Concentração de ganhos pode explicar crescimento; grupo de dez segmentos, liderado pelo setor financeiro, é responsável por 72% do aumento

Irany Tereza

RIO - A carga tributária - relação entre arrecadação de impostos e a produção econômica - deve fechar o ano em 36,5% do Produto Interno Bruto (PIB), calculam os economistas José Roberto Afonso e Marcia Monteiro Matos no estudo "Termômetro Tributário Brasileiro", concluído esta semana. Trata-se de um recorde. Pela mesma base de cálculos, em 2010, quando a economia e a arrecadação cresceram muito, a carga ficou em 35,16% em 2010. Em 2009, havia sido de 34,68% do PIB.

O recorde parece contraditório com o atual momento de esfriamento da economia, quando muitas empresas diminuem a produção, os ganhos e a arrecadação de impostos. E vai na contramão do discurso governamental, de cortar impostos para elevar a competitividade das empresas e reduzir a alta carga de tributos que pesa sobre os consumidores.

A alta da carga tributária pode ser explicada em grande parte por um crescimento excepcional dos ganhos de dez segmentos que respondem, este ano, por 72% do aumento da receita de arrecadação federal de impostos. O grupo inclui comércio atacadista e varejista, fabricação de veículos, construção de edifícios e telecomunicações.

No topo da lista, está o setor financeiro (bancos, seguradoras e entidades de previdência privada), que, sozinho, explicou 27,5% do ganho total de receita. O segundo setor que mais contribuiu, o de extração mineral, chegou a recolher na primeira metade deste ano o dobro do que fez no início do ano passado, mostra o levantamento. Juntos, os dez setores cresceram 26%, contra 8% nos demais segmentos.

"Este desempenho tão díspar da arrecadação federal refletiria uma economia dual: um lado cresce em ritmo chinês, outro cresce em padrão latino tradicional", diz o trabalho. Excetuando-se o grupo dos "dez mais", a grande maioria dos contribuintes teve crescimento de receita em torno de metade da expansão geral.

"O que está puxando a carga tributária em 2011 é a receita federal clássica. Mas não é uma coisa homogênea, igualmente distribuída na economia", diz Afonso, especialista em finanças e economista do BNDES. O "termômetro tributário" foi elaborado com base em estatísticas de arrecadação, até agosto, divulgadas pela Receita, pela Previdência e pelo Confaz, e no acompanhamento do PIB pelo Banco Central.

O resultado se aproxima do que está sendo calculado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), que aponta para uma relação entre arrecadação e PIB de 36,04%. "Estamos caminhando para um recorde, sem dúvida", diz Gilberto Luiz do Amaral, coordenador de estudos do IBPT.

Ele lembra que, apesar de o peso das pessoas físicas representar apenas 25% do recolhimento de tributos, é sobre o consumidor que recai o maior ônus da carga tributária. "As empresas são arrecadadoras, mas repassam os custos ao consumidor", comenta.

Marca histórica. O IBPT calcula, para a Associação Comercial de São Paulo, o Impostômetro, acompanhamento diário de quanto o brasileiro paga de impostos. Desde meados do mês passado, o valor ultrapassa a marca histórica de R$ 1 trilhão no ano. O instituto utiliza o mesmo princípio do "termômetro tributário", que considera royalties, juros de mora e dívida ativa como tributos.

A diferença de metodologia entre os cálculos oficiais e medições paralelas provocam disparidades. Afonso ressalta que, mais importante do que a dimensão da carga tributária, é a evolução retratada. E esta caminha de forma bem semelhante, qualquer que seja o procedimento adotado.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

No palco do Rock, o grito de Dinho Ouro Preto pela liberdade de imprensa

Experiente líder do Capital Inicial revitaliza debate sobre a politização dos joven

Julia Duailibi

Em 1985, o Brasil assistia à primeira edição do festival de música Rock in Rio. No quinto dia do encontro, 15 de janeiro, enquanto bandas como AC/DC e Barão Vermelho se revezavam no palco da Cidade do Rock, o País vivia um momento de otimismo: Tancredo Neves e José Sarney eram eleitos pelo Colégio Eleitoral presidente e vice-presidente do País, depois de duas décadas de ditadura.

Passados quase trinta anos e seis eleições diretas para presidente, José Sarney voltou a aparecer como protagonista político na quarta edição brasileira do festival. Mas, dessa vez, as menções ao presidente do Senado ocorreram em contexto menos elogioso e de maneira mais direta.

"Essa daqui, velho, é para as oligarquias, cara, que parecem ainda governar o Brasil. Que conseguem deixar os grandes jornais brasileiros censurados durante dois anos, como o Estado de S. Paulo. Cara, coisas inacreditáveis... Essa daqui é para o Congresso brasileiro. Essa daqui é em especial para o José Sarney. Isso daqui se chama Que País é Este", anunciou o vocalista do Capital Inicial, Dinho Ouro Preto, para uma multidão de cem mil pessoas, no dia 24.

Expoente da geração dos anos 80 do rock nacional, que usou a música como forma de protesto político, Dinho referia-se à censura de 793 dias a que o Estado está submetido desde que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal proibiu o jornal de divulgar informações sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investigou o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado.

Aos 47 anos, o músico cantou o clássico de Renato Russo, escrito em 1978, época em que o País vivia uma asfixia política e se preparava para ingressar no cenário de instabilidade econômica dos anos 80. Na plateia do Rock in Rio, milhares de jovens de uma outra geração. Pessoas que nasceram quando já se podia votar para presidente. Jovens que ouviram falar de "plano econômico", "Cruzeiro" ou "Cruzado" pelos livros escolares e que usam as mídias sociais como forma de protesto, principalmente em questões comportamentais. Enquanto Dinho cantava para essa plateia, a multidão gritava: "Ei, Sarney, vai tomar...".

Dinho, que diz já ter cogitado se candidatar e conta preferir ler a cobertura jornalística nacional à cultural, conversou sobre política com o Estado na sexta-feira, no Rio: "Está se caminhando para um Brasil moderno enquanto formas muito arcaicas de fazer política continuam enraizadas. Não é possível que o Brasil moderno possa coexistir com o Brasil desses coronéis e oligarcas neandertais". Em seguida, ponderou: "Neandertais no sentido antigo, não no cerebral".

Ele diz que são "alarmantes" as agressões à liberdade de imprensa na América Latina. "Quando se resumia a países menores, você conseguia caracterizar como, talvez, um espasmo patrocinado pelo Hugo Chávez (presidente da Venezuela)", disse. "Mas fica mais grave quando você pega um país com as proporções da Argentina, país que até há pouco tempo era o mais desenvolvido da América do Sul. Aí começo a ficar preocupado. E o mais grave é que a Cristina (Kirchner, presidente) vai se reeleger", completou.

Para o músico, "historicamente a América Latina tende a caminhar em manada". "O que acontece num país frequentemente acontece nos outros: o regime militar, a redemocratização e até os movimentos de independência, se quiser ir mais longe", avaliou. "Congressos do PT falando em controle da imprensa, em regulamentar a imprensa... Não sei o que eles têm em mente, se é algo à la Stalin. O que querem exatamente? A mim parece que as leis existem para coibir abusos: se você se sentir insultado, afrontado ou lesado por alguma notícia", completou.

Geração. O jornalista e crítico musical Arthur Dapieve diz que a politização foi um marco da geração de Dinho, a dos anos 80, principalmente entre bandas como Legião Urbana e Plebe Rude. "A politização caiu muito com a democratização. Mais fácil ser politizado quando há um antagonista claro, como os militares, a ditadura", disse. "Os jovens da atualidade não passaram por hiperinflação, por privações maiores, grande crises econômicas. E aquela coisa: se a economia vai bem, eles não veem maiores razões para protestar. Mesmo que façam coro com o Dinho na hora que toca Que País é Este. Há um certo entorpecimento que a boa fase econômica cria. Não só nos jovens, mas com boa parte da população", avalia.

Para a secretária nacional de Juventude, Severine Macedo, ligada à Presidência da República, não dá para fazer uma comparação entre as gerações. "Hoje a juventude tem um conjunto de pautas, e os grupos se articulam em favor das suas demandas. Não são bandeiras únicas. Então, aparentemente, dá a impressão de que há um processo de desmobilização", afirmou.

"Há jovens que não se organizam mais pelo sistema tradicional de partidos, sindicatos ou movimento estudantil. Mas a partir de seu grupo cultural, de sua comunidade, do movimento de periferia, nos grupos GLBT", declarou.

Líder do movimento estudantil dos caras-pintadas, que foi às ruas pedir a queda de Fernando Collor em 1992, o senador Lindberg Farias (PT-RJ) diz que a geração dele "não era melhor" do que a atual: "Essa é uma geração mais antenada, que aceita mais diversidade e tem mais senso ético. Não é correto dizer que está na rua ou é alienada. Para aglutinar, precisa de crise. Felizmente, não temos mais isso", afirmou.

As conjunturas econômica, política e até educacional pesaram em outros lugares do mundo e levaram, neste ano, milhares de jovens, de realidades díspares, às ruas da Grécia, da Espanha, do Chile e, inclusive, em Wall Street, coração financeiro dos Estados Unidos. A "primavera árabe", que derrubou ditadores do Oriente Médio, tornou-se símbolo político desses movimentos. Em reportagem publicada na semana passada, o New York Times disse que os jovens desta geração vão para as ruas porque não têm fé nas urnas e porque veem com "desconfiança e até desprezo os políticos tradicionais e o processo político democrático".

O sociólogo Gabriel Milanez, da empresa de tendências Box 1824, coordenou a pesquisa O Sonho Brasileiro, com pessoas entre 18 e 24 anos, concluída em 2011 (leia acima). "Hoje a noção de política do jovem é menos partidária. Ele não pensa política pelo viés do partido ou da política institucional de Brasília. Expandiu a noção política para outras esferas."

Veterano. Dinho Ouro Preto também acha que os jovens hoje são mais "despolitizados". "Eles cresceram num País muito diferente do nosso. Isso favorece um distanciamento, ao menos dos garotos de classe média. Aliado ainda à percepção de que o País está crescendo, talvez os torne mais egoístas", afirmou o músico. Ainda assim, ele diz que, como "veterano", leva para a plateia "os temas políticos da semana".

Foi o que fez no Rock in Rio, sábado passado. "Mas você pensa em falar alguma coisa e na hora não sai como você quer. Você está emocionado, tem muita gente gritando. Então, você acaba não sendo tão eloquente quanto gostaria de ter sido", afirmou.

"Gostaria de ter dito mais. Você acaba soltando um apanhado do que gostaria de dizer. Não consegue o mesmo foco que seria necessário. Mas é um show de rock, não é um comício. O seu coração vai a 180 batimentos por minuto, sei lá a quanto vai", contou.

As declarações do músico lhe renderam críticas. No Maranhão, Estado de Sarney, o deputado estadual Magno Bacelar (PV) disse que pedirá uma moção de repúdio contra Dinho. "Muitos dos metaleiros vão ali drogados, maconhados", declarou o parlamentar.

Dinho disse ter achado o episódio "engraçadíssimo. "O cara que falou isso é do PV! O PV, na verdade, não é nada do que eu achava. É do Zequinha (Sarney), filho do cara. Me interessei pelo PV por causa do Gabeira, mas percebi que é um partido muito heterogêneo", afirmou. O músico conta que votou na última eleição em Marina Silva, do PV. No segundo turno, anulou o voto. "Sempre votei no Lula. Parei depois do mensalão. Não acho o Lula corrupto, eu faço uma boa avaliação do governo dele. Mas o grande erro foi a condescendência com aliados e com a coalizão que o sustentou", disse.

Dinho diz que o próximo CD do Capital terá conteúdo político. A riqueza das Nações, em referência ao pai do liberalismo, Adam Smith, trará o verso "vamos fazer uma revolução". Tema atual, com certa dose de saudosismo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

FHC apoia opinião de pesquisadora

Convidado na quinta-feira a comentar as avaliações da pesquisadora Frances Hagopian - que, em palestra, insistiu que o PSDB deve mostrar de maneira mais clara, aos eleitores, como as suas propostas se diferenciam das do PT - o ex-presidente Fernando Henrique deu uma resposta muito rápida: "Não foi provocação. Ela disse a verdade".

A convidada havia mencionado, a uma plateia que lotou o auditório do Centro Ruth Cardoso, as realizações dos tucanos na Presidência, a aliança com partidos de centro-direita, o combate ao clientelismo, o enxugamento do Estado e o início das ações de transferência de renda. Também comentou que, na eleição de 2010, as propostas do PT e as do PSDB pouco se diferenciavam.

Em abril, FHC já havia criado polêmica com o ensaio O Papel da Oposição, quando propôs que seu partido desse maior atenção à nova classe média. / R.A. e G.M.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

‘PSDB precisa assumir-se como partido de centro-direita’, diz pesquisadora de Harvard

Frances Habopian, do Centro de Estudos David Rockefeller, diz que a própria legenda fez essa escolha nos anos 90 e que retomá-la seria um bem ao debate político

Gabriel Manzano e Roldão Arruda

SÃO PAULO - No momento em que o senador Aloysio Nunes Ferreira (SP) expõe publicamente, via Twitter, a carência de um rumo claro para o seu PSDB, a professora americana Frances Hagopian, uma estudiosa dos partidos brasileiros, se arrisca a oferecer um norte aos tucanos: ocupar o espaço da centro-direita no espectro ideológico.

Para a professora Hagopian, se tucanos tiverem coragem podem se destacar na centro-direita

Hagopian não está sozinha. "Ela disse a verdade", endossou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao ser informado pelo Estado da entrevista concedida pela americana.

"Acredito que eles (os tucanos) podem se destacar nesse espaço de centro-direita, se tiverem coragem para fazer isso", afirma a professora da Universidade Harvard. "Precisam mostrar o que fizeram, ser fiéis a si mesmos", completa ela, referindo-se às transformações capitaneadas pela PSDB na gestão FHC (1995-2002)

A receita, no entanto, não é nova, avisa ela. "Na Inglaterra, Tony Blair levou os trabalhistas para o centro e deixou os conservadores sem chão. No Chile, a Concertación criou uma ampla agenda que confundiu os partidos."

Em São Paulo, onde participou com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso de um debate no Centro Ruth Cardoso, ela falou ao Estado semana passada: "Por toda parte há muita insatisfação com a política, mas isso é parte do jogo. As coisas ficaram assim por causa da rapidez da globalização. Não temos um governo mundial, mas temos uma economia mundial, em que as soluções nacionais são lentas e ineficazes".

Há uma grande insatisfação, no Brasil, com os partidos e os políticos. O governo tem uma aliança de 14 partidos, manda demais, domina o Legislativo...

É a mesma queixa que se faz no Chile, em países da Europa, até nos Estados Unidos. Lá a Casa Branca envia uma reforma da saúde, ou leis para o meio ambiente, e elas ficam 18 meses, até mais, encalhadas. Isso de fato complica a democracia, pois os governos acabam não dando respostas a questões urgentes da sociedade. Mas acho que, no geral, a democracia amadureceu por aqui, está melhor do que há 20 anos. Os partidos, pelo menos os grandes, se fortaleceram. Refiro-me a dois ou três, os âncoras, com grandes bancadas e com presidenciáveis.

Um desses âncoras, o PSDB, vive um momento difícil. O PT incorporou as bandeiras da social-democracia e ele perdeu espaço, votos e o discurso. De que modo deveria reagir?

Nos anos 90, na Inglaterra, ocorreu o mesmo. Tony Blair levou o Partido Trabalhista para o centro e os conservadores ficaram sem chão – e isso durou 15 anos. Também no Chile se fez a Concertación e foi a mesma coisa. Isso é parte do jogo.

Mas aqui o PSDB precisa encontrar um rumo. De que modo?

O que a democracia social viveu aqui foi interessante. Por razões ideológicas, que eu entendi, o partido deu um primeiro passo à direita, para reformar o Estado. Perceberam que não dava para avançar em saúde ou educação com um Estado desestruturado, na bancarrota. Precisavam recuperar a solvência fiscal, vender as empresas de aço, depois outras, fazer uma reforma administrativa, a previdenciária. E veja, foi o PSDB que deu essa guinada para a centro-direita. Pois agora devia assumir o que fez, valorizar metas como os investimentos na infraestrutura, sanear o sistema fiscal. Acredito que eles podem destacar-se nesse espaço, de centro-direita, se tiverem coragem para fazer isso.

Mas uma guinada para a direita, por menor que seja, é política e eleitoralmente arriscada. No Brasil "é proibido" ser de direita...

Não estou dizendo que um partido da social-democracia deva "se reinventar" como partido de direita. A coragem de que falo é para debater metas concretas, ousadas. Seria um bem para o País. O debate político aqui tem áreas de consenso, como melhorar a educação, que é tarefa urgente para se chegar à justiça social. Mas você pode ter um grande projeto, que inclua novas reformas, modernizar portos, atacar de fato toda a infraestrutura. Isso pode ser feito de diferentes maneiras, e uma delas é diminuindo o tamanho do Estado, para recuperar recursos e destiná-los, aí sim, às urgências sociais. Como se vê, estas são causas da social-democracia. Sei que isso nos leva a outra questão, que é a de definir o que é uma social-democracia em 2012. É um bom debate. Sabemos que ela é certamente diferente dos anos 90 ou dos anos 70. O País teria muito a ganhar abrindo essa discussão.

Como fica o PT nesse cenário?

O problema das esquerdas, como já se viu na Europa, sempre foi descobrir como se manter fiel às suas bases e moderar o discurso para ganhar eleições. O PT fez isso em 2002. No longo prazo, esse movimento para o centro pode matar sua identidade como partido de esquerda. Se isso se agravar, aparece outro partido de esquerda e lhe toma o lugar. A propósito, lembro-me de um artigo do Thomas Friedman, que veio ao Brasil e escreveu que Lula e FHC faziam uma dança do tipo nado sincronizado. E atribuiu essa dança à globalização.

Marina Silva tentou criar uma alternativa, em 2010, e chegou aos 20% do eleitorado. Há os indignados na Espanha e protestos de jovens por toda parte. Para a sra., o que isso representa?

Não acho que a crise seja no modelo político. Eu não ligaria os votos de Marina aos indignados da Espanha. Se há uma crise, é econômica, uma crise de globalização. Não temos um governo mundial, mas sim uma economia mundial. A economia muda mais rápido do que os governos conseguem regular. Pactos vão caindo e as pessoas se sentem inseguras. Mas não vejo como superar isso com políticas nacionais ou de partidos.

Enfim, a sra. acha que a insatisfação política no Brasil é apenas parte de uma crise maior?

Eu não acho que o Brasil esteja vivendo uma crise. Há diferenças de opinião, dentro da normalidade. E olhe que, hoje, a normalidade não é pouca coisa.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Incertezas:: Fernando Henrique Cardoso

Para quem já sofreu as consequências de várias crises financeiras internacionais, não chega a ser surpreendente o que ocorre nos países mais desenvolvidos da Europa, contagiados pela crise financeira que tem origem nos menos desenvolvidos da região.

No passado recente, Bancos Centrais e ministros de finanças dos primeiros procuravam mostrar que não havia como equiparar a situação de seu país com a tragédia que ocorrera noutro. As situações fiscais não seriam as mesmas, a proporção da dívida com relação ao PIB não era tão grande assim, num caso a dívida interna estava nas mãos de agentes financeiros internacionais e se denominavam em dólares, noutros, ao contrário, eram os poupadores nacionais que emprestavam aos governos locais em moeda do país, etc. Mas, quase sempre, havia uma variável crítica: o mutável estado de confiança dos agentes do mercado financeiro internacional. Quando se instalava a desconfiança quanto à solidez das contas fiscais e/ou externas de um determinado grupo de países de alguma maneira correlacionados, os argumentos sobre as diferenças perdiam força. E viravam pó, se surgisse o fantasma do default – da moratória, como se dizia.

O receituário do FMI tampouco era atento às diferenças. Exigia sempre mais do mesmo, às vezes não sem alguma razão: ajuste fiscal, reforma patrimonial do Estado etc. Mas fazia ouvidos moucos à demanda por maior regulação do mercado financeiro internacional. Era o que pedíamos à comunidade internacional os que dirigimos os países naquela época de aflições.

Reclamávamos maior regulação internacional para conter a especulação contra as moedas nacionais, ou seja: a criação de fundos de socorro maiores e de mais fácil acesso, o fortalecimento da base financeira do FMI e o aperfeiçoamento de suas práticas. Era preciso maior rapidez no atendimento dos países com crise de liquidez e menos "condicionalidades", ou seja, as imposições restritivas à política econômica e fiscal dos países devedores, pois se o ajuste fiscal passasse de certo ponto impediria a retomada de crescimento econômico. Para financiar os novos fundos, alguns de nós relançamos a ideia de uma Taxa Tobin, apesar dos reclamos contínuos dos especialistas quanto aos efeitos desse tipo de imposto.

Alguns países emergentes tiveram melhores condições para negociar com o FMI, como foi o caso do Brasil, que havia realizado o Plano Real por sua conta e risco, sem o aval do Fundo. Com o Plano Real modificamos drasticamente as bases da política fiscal, saneando as finanças da União e as dos estados, impusemos regras severas ao sistema financeiro, seguindo as recomendações de Basileia para controlar a "alavancagem", isto é, os empréstimos sem uma base adequada de capital próprio nos bancos. Ao mesmo tempo não descuidamos de, ao privatizar, ampliar a concorrência e manter ativos os instrumentos públicos de crédito no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e no Banco do Brasil, tornando-os aptos a reestruturar empresas nacionais ou localizadas no país. Ao lado disso, desde 1994 até hoje, os diferentes governos sustentaram um aumento constante do salário mínimo real e, a partir de 2000, foi possível criar uma rede de proteção social, da qual as Bolsas Família, iniciadas com nomes diferentes, se tornaram símbolo de inclusão social, diminuindo a pobreza e reduzindo um pouco as desigualdades.

Pela primeira vez, os países mais desenvolvidos sentem as consequências da falta de regulação do sistema financeiro. Olhando agora o que ocorre na economia global deparamo-nos com uma situação incerta. A regulação financeira proposta nas reuniões do G-20 encontra dificuldades para se efetivar dada a diversidade de interesses nacionais. Cada banco central opera como melhor lhe parece. O Fed inunda os Estados Unidos e o mundo com dólares e faz operações típicas de bancos comerciais sem se preocupar com a ortodoxia. Os responsáveis pelos desmandos financeiros não são punidos, recebem bônus (ao contrário do que ocorreu com o programa brasileiro de saneamento do sistema financeiro, que puniu os banqueiros) e o desemprego não cede porque não há consumo nem investimento. O Banco Central Europeu e o FMI exigem dos países em bancarrota virtual sacrifícios fiscais que impossibilitam a retomada do crescimento e, portanto, a volta à normalidade. As taxas de juros se mantêm próximas de zero, sem previsão de mudança, e as economias não reagem. Na Europa cada país faz a política fiscal que deseja, não há mecanismos de unificação. O desemprego e o mal-estar político minam esses países, e a ameaça de default é seu parceiro constante.

Desse quadro escapam as economias emergentes, China à frente de todas. Até quando? É óbvio que uma recessão prolongada ou uma grande contração, como diz Kenneth Rogoff, transmitirá às economias emergentes seus maus fluídos pelo conduto do comércio internacional. É preciso, antes que isso ocorra e o desastre seja maior, que haja um entendimento global. Este deveria partir do reconhecimento de que as dívidas de alguns dos países europeus são impagáveis. Com o nome de reestruturação ou outro qualquer, à la Brady, é preciso aliviar já a situação da Grécia, de Portugal e eventualmente da Espanha e da Itália. Suas dívidas internas e externas e a penúria de seus bancos cheios de títulos de qualidade desconhecida não lhes dão alternativas de retomada do crescimento sem uma redução substancial dos valores de seus passivos.

Não haverá condições político-morais para proceder a tais reestruturações sem, ao mesmo tempo, distribuir melhor o custo da "socialização das perdas". O grito de Warren Buffet, seguido por milionários de outros países, mostra o descalabro do Tea Party ao querer impor mais ônus aos mais pobres, com responsabilidade zero na crise. Por fim ou o euro se derrete pela falta de unificação fiscal, ou esta se faz, ou a União Europeia se encolhe, autorizando alguns de seus membros a desvalorizar e usar outra vez uma moeda nacional.

Nada disso pode ser feito sem lideranças políticas fortes, dispostas a redistribuir o poder global e reorganizar suas bases decisórias. Terão força para tanto? Eis o enigma.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, ex-presidente da República

FONTE: O GLOBO

Linha dura no PSDB:: Merval Pereira

A Comissão Executiva Nacional do PSDB resolveu interferir diretamente na escolha dos pré-candidatos a prefeito nas eleições municipais do próximo ano, reservando para si aúltima palavra nos municípios com mais de 200 mil eleitores.

Ainda na próxima semana deverá ser divulgada resolução informando que, “conforme o caso”,poderá “orientar e intervir na escolha de pré-candidatos”, resguardando-se o direito de até mesmo “proibir” o pré-lançamento de candidaturas nos municípios.

A ideia central da decisãoé que as discussões sejam ampliadas para que se possa buscar novas alianças, estabelecendo que não prevaleça apenas o controle local do diretório. Na nota, a Comissão Nacional informará que vai avaliar a viabilidade política eeleitoral dos pré-candidatos, levando em conta a capacidade de fazer alianças novas, agregar apoio da sociedade. Para que não reste dúvida sobre adisposição da direção do partido de ter um papel ativo e decisivo na escolha dos candidatos, a nota explicitará que, em caso de desobediência, poderá intervir ou até mesmo dissolver os órgãos municipais.

Essa decisão e outras mais, como ade centralizar todas as campanhas partidárias na figura do senador e ex-governador de Minas Aécio Neves, transformando-o no virtual candidato da legenda para 2014, têm a ver com as constantes pesquisas que estão sendo realizadas para basearem um reposicionamento do partido. Na nota sobre as candidaturas municipais, haverá inclusive uma orientação para que, nos municípios onde haja propaganda eleitoral gratuita no rádio ena televisão, os pré-candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador difundam as diretrizes programáticas do partido. O que o sociólogo Antonio Lavareda fez foi oque classifica de “auditoria de marketing”, que, mais que uma pesquisa, é um diagnóstico pós-eleitoral com o objetivo de fornecer subsídios para a reestruturação do organograma partidário de um modo geral e, em especial, da parte de marketing e comunicação.

Esse estudo mostra que há grande relação entre as eleições para prefeitos e vereadores e as das bancadas de deputados estaduais e federais subsequentes, por isso a decisão de unificar a linguagem política e de marketing, para colher os frutos dessa unidade mais adiante. Nos governos estaduais há claro perfil ascensional do partido, mas para deputados estadual e federal tem havido declínio, assim como nas eleições para vereadores e prefeitos,o que se constitui na grande preocupação do partido, sendo necessário grande esforço para reverter o quadro já nas eleições 2012. Num balanço das eleições 2008,o PSDB vem em segundo lugar,com 784 prefeitos eleitos. Em comparação com o primeiro turno de 2004, o PSDB perdeu 77 prefeituras. Em 2000, ainda no segundo mandato do governo de Fernando Henrique Cardoso, o PSDB elegeu 992 prefeitos. A situação mudou em 2004, já com Lula no Palácio do Planalto, com o PSDB iniciando sua trajetória de declínio, elegendo 870 prefeituras. Hoje o PMDB éo partido que tem mais prefeitos, com 1.177 em seus quadros, contra 788 do PSDB, o 2º colocado.

Quanto aos deputados federais, a bancada do PSDB é a terceira do Congresso, com 53 deputados. Desde a reeleição presidencial de Fernando Henrique, em 1998, o númerode deputados federais eleitos pelo PSDB foi de 99 parlamentares para os 53 da última eleição, e pode passar a ser a quarta bancada, pois o novato PSD, que já surgiu com 50 deputados federais, está ainda aceitando adesões. A direção nacional do PSDB considera que, embora cada estado seja uma realidade diferente, naqueles em que há um governador do partido,as negociações são mais autônomas, enquanto em estados como o Rio de Janeiro há uma preocupação devido à fraqueza institucional do partido e à importância que a política local tem no cenário nacional. A aposta do partido era o atual prefeito carioca, Eduardo Paes, que chegou a ser secretário-geral nacional do PSDB até se transferir para o PMDB,com o apoio do governador Sérgio Cabral. A direção nacional já interveio no diretório estadual para levantar uma ação local que pretendia punir os remanescentes da família do prefeito de Caxias, Zito, que deixou o partido.

Mas sua filha Andreia Zito e sua ex-mulher são deputadas bem votadas do partido estavam sendo perseguidas pela direção local. Há também a disputa pela candidatura à prefeitura do Rio, com a direção local querendo impor onome do deputado federal Otavio Leite, e a vereadora Andrea Gouveia Vieira, sentindo-se alijada do processo, ameaçando sair do partido para o PV de Fernando Gabeira.

Em dois estados em que há governadores seus, as questões regionais também estão dificultando a unidade do partido. No Paraná, o ex-deputado federal Gustavo Fruet, que era um dos novos líderes da legenda, tendo se destacado na CPI dos Correios sobre o mensalão, acabou deixando o PSDB porque o governador Beto Richa não o apoiou para a prefeitura. E, em São Paulo, a solução deve ser uma prévia entre os diversos candidatos, para cerca de 20 mil filiados do partido, embora o governador Geraldo Alckmin prefira lançar o deputado estadual Bruno Covas, neto de Mario Covas, dentroda disputa de caras novas que já tem o ministro da Educação, Fernando Haddad, candidato que Lula está impondo ao PT, e o deputado federal do PMDB Gabriel Chalita.

Mas as disputas não param por aí. O senador Aloysio Nunes reclamou pelo Twitter que o PSDB paulista o ignorou na campanha política que está sendo veiculada pela TV, embora ele seja o primeiro senador do partido há quase uma década. Ereclamou também que o ex-governador José Serra foi outro deixado fora da propaganda do partido. Como se vê, a direção nacional do PSDB terá muito trabalho para unificar o partido na preparação para tentar retornar ao poder em 2014. Mas pelo menos, após muitos anos, continua sem unidade, mas tem uma estratégia.

FONTE: O GLOBO

Em outras palavras:: Dora Kramer

Em boa hora a presidente Dilma Rousseff corrigiu o que pareceu - em princípio - ter sido uma precipitação da ministra das Relações Institucionais, que explicitou com todos os efes e erres a intenção do governo de criar um novo imposto para financiar a ampliação dos recursos a serem aplicados na saúde pública.

Ideli Salvatti marcou até data para o governo enfrentar a questão no Congresso: 2012, em pleno ano eleitoral, segundo a concepção da ministra a época ideal para se falar em tirar mais algum do bolso do eleitor.

Dilma correu para tentar consertar o estrago. Aproveitou uma entrevista a um programa popular em emissora de TV aberta para recuperar o discurso do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, de que o governo fará primeiro a sua parte, melhorando o serviço, para só então falar em imposto novo.

Note-se, porém, que a presidente não desmentiu totalmente a ministra. Descontado o prazo, na verdade, confirmou com outras palavras a declaração de Salvatti. Dilma disse que "a própria população" vai aceitar colaborar para o aumento da arrecadação quando começar a notar as melhorias.

Quais sejam? Na visão da presidente, o aumento da oferta de médicos e a melhor distribuição dos profissionais pelo País afora.

Quando, como e mediante o atendimento de quais critérios de desempenho a população seria chamada a se manifestar a respeito da conveniência da criação de mais um imposto?

A presidente não esclarece, assim como não deixa claro se haveria metas a serem cumpridas, se há um prazo para o governo justificar a cobrança com fatos e dados muito bem objetivos.

Deixou no ar apenas a vaga ideia de que haverá um momento em que os cidadãos acabariam por compreender que precisam de "mais coisas" e que, para dá-las, o governo também precisa de mais dinheiro.

Dilma não disse se a população terá a prerrogativa de avaliar negativamente o desempenho e se, nesse caso, o governo recuaria. Não, só pediu que o brasileiro faça o favor de não aceitar "em hipótese alguma" a tese de que a saúde não precisa de mais dinheiro.

Ora, disso todos sabem. Da mesma forma como é sabido que o governo dispõe de instrumentos para, amanhã ou depois, inundar o País com propaganda tão milionária quanto enganosa para convencer a população de que é chegada a hora de fazer a sua parte.

É claramente o que se engendra do Planalto. Não só para arrecadar mais. A motivação de fundo é política: para que não restem dúvidas de que governo do PT não deixa derrota (a perda da CPMF em 2007) sem revanche.

Entre Poderes. A emenda constitucional do senador Demóstenes Torres, que assegura os poderes do Conselho Nacional de Justiça, hoje tramita no Senado em regime normal.

Caso o Supremo decida nesse meio tempo votar a ação da Associação Brasileira dos Magistrados propondo, na prática, a extinção do conselho ou firmar qualquer acordo que represente perda de prerrogativas, há disposição de que a tramitação ultrapasse a urgência e passe a ser em regime de "fulminância".

À moda antiga. A observância a alguns princípios anda meio fora de moda e por isso mesmo vale o registro da alegação do senador Aloysio Nunes Ferreira para não querer disputar a Prefeitura de São Paulo, mesmo sob o argumento dos correligionários tucanos de que não teria "nada a perder", pois tem sete anos de mandato no Senado pela frente.

A recusa baseou-se justamente no fato de que Aloysio teria a perder a confiança do eleitorado paulista que há menos de um ano o elegeu para representá-lo no Congresso. Por oito anos.

Fica o tema para reflexão de parlamentares que dão mais importância a postos (eletivos ou não) no Executivo e tratam a função legislativa como matéria de segunda, contribuindo para que a baixa qualidade da representação seja um caminho sem volta.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O petróleo é de quem mesmo? :: Eliane Cantanhêde

Os Estados produtores e não produtores vivem uma guerra pelos royalties do petróleo que o Planalto cansou de mediar e que deverá ser decidida no Senado nesta semana. Mas e o povo com isso?

Tudo indica que a guerra é pela quantidade, não pela qualidade dos recursos, não exatamente pelo bem-estar que podem levar às populações mais pobres de uns e de outros.

Senão, vejamos o que a consultoria Macroplan apurou num passeio pelos dados e pelas ruas de cidades que foram beneficiadas diretamente com o petróleo jorrando em forma de reais e dólares.

Macaé, conhecida como a capital do petróleo brasileiro, de fato cresceu e apareceu, com um pulo populacional de 65 mil para 200 mil habitantes desde os anos 1970 até agora e com um PIB per capita de R$ 42 mil, em valores de 2008, que corresponde ao dobro da média do Estado do Rio e o triplo da nacional. Mas só 17% dos domicílios têm saneamento básico, os índices de educação são baixos e os de homicídios, muito altos.

Presidente Kennedy (ES) também recebe grande volume de royalties, com o segundo maior PIB per capita do Estado e uma das maiores taxas de crescimento do país. Mas... tem resultados do Ideb muito inferiores à média estadual, 17% de analfabetos e só 38% dos domicílios com saneamento básico. Está na 62ª posição entre 78 municípios pelo Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal e no 2.688º lugar no ranking nacional.

A conclusão é que royalties são bons e todo mundo gosta -especialmente governadores e prefeitos, sobretudo em ano eleitoral-, mas não garantem em si distribuição de renda, educação, saúde, saneamento, bem-estar e segurança.
Logo, a guerra "de cima" para atrair os recursos deveria ser acompanhada de uma outra guerra, "de baixo", para garantir a aplicação devida e a distribuição necessária. Do contrário, o petróleo é nosso, mas não chega a quem mais precisa.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A primavera brasileira :: Alberto Dines

No Velho Testamento aparecem como líderes, sábios, depois foram substituídos pelos reis e três mil anos depois, neste esplêndido pedaço do mundo chamado Brasil, juízes estão na berlinda. E, se a pendência entre a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acirrar-se, a toga corre o risco de perder a aura de solenidade que a envolve.

A administração da Justiça contém ritos fascinantes, a submissão ao poder das leis produz um dos mais belos espetáculos que a sociedade humana já inventou, mas um júri começa a empolgar o País e ele não favorece a AMB no seu pleito contra a independência do CNJ.

O confronto doutrinário que a entidade dos juízes pretendia provocar já não consegue esconder uma inequívoca motivação corporativista. O estado de direito que pretende aperfeiçoar está negando um dos princípios básicos da mecânica democrática: cada poder deve ser equilibrado por um contra-poder. O Estado moderno é necessariamente descentralizado. A bandeira do "controle externo" embutida na criação do CNJ é herdeira de outra, veneranda, a do equilíbrio entre os poderes para acabar com o absolutismo.

A ação de inconstitucionalidade impetrada pela AMB contra as prerrogativas constitucionais do CNJ desvenda um dos nossos paradoxos nucleares: aqueles que deveriam zelar pela aplicação das leis estão em pé de guerra contra os que pretendem cumprir as leis investigando e punindo juízes acusados de desvios de conduta.

A prepotência insurge-se contra a coerência. A investida da corregedora nacional de justiça, Eliana Calmon, contra aqueles que deslustram a toga é quixotesca, mas não é fantasiosa, seria inacreditável se não representasse a pura verdade: tramitam na Corregedoria 115 processos contra juízes de primeira instância e 35 contra desembargadores. A presidente do Tribunal de Justiça do Tocantins está sendo acusada de pertencer a um esquema de venda de sentenças que ficará impune caso a AMB consiga cercear o CNJ.

Em seis anos de existência, o CNJ e sua corregedoria puniram 49 juízes por desvios de conduta, enfrentaram o nepotismo, extinguiram benefícios abusivos e, sobretudo, estabeleceram metas de desempenho para acabar com a lentidão judicial, a grande cúmplice da impunidade. Segundo denúncia do Estado de S.Paulo dessa sexta-feira, 18 dos 29 corregedores de tribunais respondem ou já responderam a processos do próprio órgão. Em 2011, no Tribunal de Justiça de São Paulo foram punidos apenas seis magistrados, 460 denúncias foram arquivadas.

A OAB insurgiu-se contra o corporativismo da AMB, também a Procuradoria-Geral da República, também os senadores da situação e da oposição que apresentaram uma Proposta de Emenda Constitucional mantendo os poderes do CNJ garantidos desde 2004 pelo artigo 103-B. Não é de hoje que a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) acusa o Judiciário de ser a grande fábrica de mordaças e atos censórios da República. O mesmo Estadão está obrigado há mais de dois anos pelo Tribunal de Justiça de Brasília a silenciar sobre a Operação Boi Barrica da Polícia Federal que investiga os negócios do clã Sarney. As provas coletadas nesta operação pela Polícia Federal foram consideradas nulas por outro tribunal.

A querela transcende ao Judiciário. O Estado brasileiro parece aturdido, perplexo, ofuscado por luzes antigas, porém potentes. O espírito das leis começa a impor-se à letra da lei. Este é o espírito da primavera brasileira empurrada por duas destemidas juízas: Patrícia Acioly fuzilada em Niterói pelos policiais corruptos que investigava e a brava corregedora nacional de justiça que teve a suprema ousadia de lembrar que bandidos também usam togas.

Alberto Dines é jornalista

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Crimes bem aceitos:: Janio de Freitas

Se as práticas de repressão contra greves usam de violência desumana e criminosa, no Estado de Direito devem ser tratadas como tais

O ressurgimento das greves e outras manifestações reivindicatórias traz também de volta a vulgarização de uma prática inadmissível no Estado de Direito: a violência da repressão policial, executada com características criminosas. E impune, portanto. Mais ainda: como representação do Estado. Logo, Estado policial.

A ferocidade descarregada pela polícia do Ceará contra professores que pretendiam acompanhar, na Assembleia Legislativa, uma votação do seu interesse, não deveu nada, no propósito e na violência armada contra indefesos, à sanha da polícia, da soldadesca e de seus chefetes na ditadura. Pessoas arrastadas pelos cabelos, espancadas, chutadas no chão, feridas -cenas assim voltam a repetir-se com frequência. E não suscitam, da parte dos meios de comunicação em geral, mais do que registros banais, quando existem. Da sociedade, organizada ou dispersa, apenas a indiferença abobalhada.

A tucanice já debitou a Dilma Rousseff o ressurgimento e as próprias greves. Mas só a dos Correios é federal, as várias outras são estaduais. Dessa divisão decorre um reflexo agravante. As vítimas costumeiras da repressão criminosa são grevistas e manifestantes de atividades estaduais ou municipais.

A menos que se excedam muito, servidores federais são mais poupados pelos governantes regionais para evitar problema com o governo central. É uma prova a mais do comprometimento desses governantes com a violência criminosa de suas polícias.
A desculpa é sempre a mesma: os grevistas ou manifestantes iniciaram o conflito. Os uniformes e equipamentos atuais das PMs, porém, estão aptos a suportar ilesos e a reprimir sem violência criminosa o que civis desarmados, e expostos na indumentária singela, podem fazer.

A repressão que extravasa perversidade é criminosa. Não pode representar o Estado de Direito, pela simples e forte razão de que o trai. Nega-o. A sempre citada necessidade de formar policiais avessos à corrupção e ao bandidismo é um problema funcional. Há também, no entanto, o problema nunca citado e maior do que qualquer outro, porque na raiz de todos: o problema institucional da falta de civilidade das polícias. Carência básica da seleção, formação e atividade dos policiais.

Carência equivalente existe fora das polícias e em relação a seus métodos: se as práticas de repressão usam de violência perversa, desumana, criminosa, no Estado de Direito devem ser tratadas como tais. Sob leis condenatórias com peso idêntico ao aplicado a civis e até, às vezes, a crimes de policiais fora de serviço.

O "excesso", como dizem, só é excesso em regime policialesco. No Estado de Direito é crime, e ao processo respectivo devem submeter-se os acusados de praticá-lo e de autorizá-lo. Então, estará dado um passo para a democracia.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Clientelismo corporativo: Suely Caldas

A crise de conflito no Poder Judiciário, que quase inutilizou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) - único e solitário órgão que tenta, e às vezes não consegue, punir juízes que praticam o que a presidente Dilma Rousseff chama de "malfeitos" -, é mais uma expressão da fragilidade do nosso sistema de defesa e preservação da ética na função pública.

Os "bandidos de toga", denunciados pela corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, não agem só no Poder Judiciário. À paisana, sem toga, eles estão espalhados também pelos Poderes Legislativo e Executivo Brasil afora - nos governos federal e estaduais, nas prefeituras, nas Assembleias Legislativas, nas Câmaras Municipais e, obviamente, no Congresso Nacional, onde sua ação é mais escancarada e condenada pela opinião pública.

Criado em dezembro de 2004, o Conselho Nacional de Justiça é o caçula da turma. No Executivo federal há a Comissão de Ética Pública, vinculada à Presidência da República e nascida em 1999, com a missão de instituir regras de conduta para o funcionalismo público e sugerir providências ao presidente quando essas regras são violadas. Mas não tem poder de investigar e punir, como tem o CNJ. O Poder Legislativo também tem o seu Conselho de Ética, o mais antigo dos três órgãos, o que mais trabalha (afinal, deputados e senadores dão muito trabalho nessa área) e o que menos pune.

Além disso, nos três Poderes há as chamadas corregedorias nas diversas unidades do Legislativo, do Judiciário e em determinados órgãos do Executivo, como a polícia. O sistema é completado pela Controladoria-Geral da União (CGU), com poder de investigar e sugerir punição a funcionários fraudadores do bem público, e pelo Tribunal de Contas da União (TCU), cuja função é zelar pela aplicação do dinheiro dos impostos pagos pela população.

Órgãos de controle existem, mas muito raramente funcionam porque carregam o erro de nascença de companheiros investigarem companheiros. Ou seja, em todos eles o corporativismo está impregnado, fingem que investigam, mas estão ali é para barrar punições, proteger seus pares fraudadores. Afinal, quem sabe, o julgador de hoje será o réu de amanhã?

Foi o que ocorreu há dias na Câmara dos Deputados, que absolveu a deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF), flagrada em vídeo recebendo dinheiro do delator do mensalão do DEM de Brasília, Durval Barbosa. A defesa de Jaqueline argumentou que ela recebeu propina antes de se eleger deputada e que a cassação de seu mandato criaria um precedente perigoso para todos os presentes naquele plenário. Como a maioria ali tem rabo preso no passado, Jaqueline foi absolvida (em votação secreta, escondida do eleitor) por 265 votos a favor, 166 contra e 20 abstenções.

Na mira da opinião pública, o Poder Legislativo é o mais exposto, até porque seus representantes são campeões em irregularidades, além de exímios pizzaiolos. Na quarta-feira, o Conselho de Ética da Câmara arquivou acusação contra o deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), envolvido em fraudes no Ministério dos Transportes, sem sequer abrir investigação.

Reincidente, Costa Neto é réu no processo do mensalão e foi um de seus principais atores. Renunciou ao mandato para não ser cassado e voltou triunfante à Câmara dos Deputados, com todos os poderes no Ministério dos Transportes, que o ex-presidente Lula entregou ao seu partido. Em defesa de Costa Neto, o relator do processo, o deputado do PT Amauri Teixeira, argumentou: "Não se pode banalizar o Conselho de Ética". Ou seriam os deputados que banalizaram a corrupção depois que Lula instituiu o perdão para os corruptos?

O mais corporativo - Embora o Legislativo seja o mais exposto, o Judiciário é o mais corporativo dos três Poderes. A reação imediata e indignada do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, à denúncia da corregedora Eliana Calmon contra os "bandidos de toga" é o retrato vivo desse corporativismo.

A disposição da corregedora de investigar e punir juízes que vendem sentenças e praticam outras irregularidades assustou Peluso, que viu nela um risco real de punição da classe e de tornar públicas ações suspeitas dos companheiros de toga. Ele propôs ao STF voltar às corregedorias dos tribunais a responsabilidade de investigá-los e puni-los. Com isso esvaziava e tirava o poder do CNJ, no qual Eliana Calmon atua como corregedora nacional.

E como as corregedorias dos tribunais brincam de investigar, tudo ficaria como dantes no quartel de Abrantes. Mas a pronta reação da opinião pública e do Congresso Nacional - que se sente injustiçado por carregar o peso maior da história - levou Peluso e o STF a recuarem.

Em seis anos de existência, o CNJ efetuou 50 condenações e a pena máxima tem sido a aposentadoria compulsória. Ou seja, o juiz é afastado, não trabalha nem profere mais sentenças, mas continua recebendo salário. É o caso do juiz Abrahão Lincoln Sauáia, do Maranhão, acusado de proferir sentenças estranhas, como a que obrigou a Vasp a pagar indenização de R$ 1,7 milhão a um passageiro que teve sua mala extraviada.

No Poder Executivo, a Comissão de Ética Pública tem sua ação limitada a fiscalizar o cumprimento de regras de conduta dos funcionários, mas não investiga nem pune.

Em 2007, a comissão sugeriu ao ex-presidente Lula que demitisse o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, caso ele insistisse em acumular o cargo de presidente do PDT, incompatível com a função de ministro. Lupi deixou apenas formalmente a presidência do partido, mas continua participando das reuniões e aparelhou o Ministério do Trabalho com muitos filiados ao PDT. E tudo ficou como dantes no quartel de Abrantes.

Mais recentemente, a mesma comissão recusou avaliar o rápido enriquecimento do patrimônio do ex-ministro Antônio Palocci. Seu presidente, Sepúlveda Pertence, considerou isso desnecessário.

A Controladoria-Geral da União tem poder de investigar fraudes, mas concentra a sua apuração em casos menores. Naqueles que envolvem ministros e funcionários poderosos a CGU só age (e quando age) provocada pela imprensa.

Em recente declaração, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse temer a substituição do clientelismo político pelo corporativismo que impeça o Estado de defender o interesse da população para se concentrar nos interesses de grupos organizados. Ele foi generoso. Há muito tempo clientelismo e corporativismo convivem no poder público.

Jornalista, professora de comunicação da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Tudo dominado:: Míriam Leitão

A Controladoria-Geral da União é órgão de assessoramento da Presidência da República, tem recursos definidos pelo governo, está proibida de investigar ministros. Não audita algumas áreas do governo. O Conselho Nacional de Justiça chegou a apoiar uma proposta que em última instância reduz seus poderes. Não há um corrupto preso. O Brasil está sem ferramentas para combater a corrupção.

O movimento social está quase todo dominado. A UNE não representa os estudantes, mas sim o PC do B que faz parte da base política do governo, recebe uma enorme mesada, e entre seus tristes papéis está de vez em quando sair em defesa de acusados de corrupção, quando isso é do interesse do governo. As centrais sindicais também vivem de dinheiro público e dos projetos políticos de seus dirigentes. Muitas ONGs, até as que defendem a ética, recebem recursos públicos.

O Brasil tem poucos mecanismos e instituições para o combate à corrupção. Alguns se esforçam, mas nada vai muito adiante. Já foram demitidos nos últimos oito anos, segundo o secretário-executivo da Controladoria-Geral da União (CGU), Luiz Navarro, 3.500 funcionários, 70% por corrupção. Mas, como ele lembra, "ninguém está preso". A Polícia Federal faz operações em que revela fatos estarrecedores, mas o que incomoda o governo e mobiliza a cúpula do Judiciário é se as pessoas devem ou não ser algemadas. Além disso, a prisão, como se sabe, é breve porque é apenas para o levantamento de provas. Depois, entra-se num processo longuíssimo que a opinião pública não consegue acompanhar nem entender. A impunidade se instala como um vírus que vai corroendo a confiança nas instituições democráticas.

A declaração da ministra Eliana Calmon repercutiu porque é verdadeira. Obviamente num país onde a corrupção avança tanto não há um poder blindado contra o mal: há bandidos de toga, com mandato, com ministério, com farda. Eles se infiltraram em todos os poderes, ministro Cezar Peluso, infelizmente. O alerta da corregedora nacional de Justiça fortalece o Judiciário e não o expõe como pensaram os críticos da ministra. Protege-se a integridade de um poder combatendo os que não merecem fazer parte dele, e não com o costumeiro espírito de corpo que acontece, com frequência, no Legislativo.

Num programa que fiz esta semana na Globonews sobre corrupção, o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, falou de um estudo da Fiesp, feito recentemente, que quantifica o custo da problema. Do programa, participou também Luiz Navarro, da CGU.

- É difícil quantificar porque corrupto não dá recibo, nem nota fiscal, mas o cálculo é que o custo fique entre R$50 bilhões e R$84 bilhões. No menor cálculo, é o que o governo arrecadaria com uma nova CPMF - diz Gil Castello Branco.

O Contas Abertas estabeleceu como princípio não receber recursos públicos. Por isso não faz convênio nem com órgãos do executivo que trabalham na mesma direção, de aumento da transparência do gasto público, como a CGU. A Controladoria, pelo seu lado, tem inúmeras limitações exatamente por não ser aquilo que o PT, como lembrou Gil, propunha na campanha: uma agência independente com orçamento próprio. A CGU é órgão da Presidência, não pode investigar a Presidência. O Itamaraty e o Ministério da Defesa estão fora da sua alçada. O Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que os ministros não podem responder a sindicâncias, nem podem ser auditados pela CGU, porque exercem cargos políticos e não administrativos.

- A CGU audita, investiga, e forma o conjunto de elementos para que a Polícia Federal ou o Ministério Público possam propor a ação. Até o momento em que a ação é ajuizada tudo vai bem, depois, há uma quantidade incrível de recursos e prazos. O STJ tomou a decisão de não aceitar interceptação telefônica de juiz de primeira instância alegando que antes é preciso esgotar todas as instâncias de investigação. Isso põe em derrocada um instrumento importante - diz Navarro.

A CGU tem feito um trabalho importante, mas seus poderes, recursos e área de atuação são insuficientes. Há também restrições incompreensíveis.

Por outro lado, as ONGs que deveriam fiscalizar o governo são muito dependentes do próprio governo: R$3 bilhões foram transferidos para instituições sem fins lucrativos. O Orçamento é difícil de ser entendido e há ainda zonas de sombra, explica Gil: o Sistema de Convênios onde está o dinheiro para as ONGs, os gastos das estatais têm pouca transparência. As informações sobre aditivos aos contratos não podem ser acessadas. O Sindec, onde estão os aditivos aos contratos do Ministério dos Transportes, também não estão disponíveis.

Neste contexto, a melhor notícia que surgiu recentemente foram as manifestações espontâneas como as do 7 de setembro, que, em Brasília, levaram 25 mil pessoas às ruas, e não por convocação de sindicato ou partido político. O movimento na mídia social é mais intenso, lembrou Navarro. Uma proposta no site do Senado para que corrupção seja considerado um crime hediondo recebeu 450 mil acessos. No Congresso, lembrou Gil, há 100 projetos engavetados que combatem a corrupção. Com tantas teias prendendo o avanço institucional do Brasil, a grande esperança é de fato o movimento emergente e espontâneo contra a corrupção.

FONTE: O GLOBO

A volta da aliança inflacionária:: José Roberto Mendonça de Barros

O Imposto de Produtos Industrializados (IPI) dos carros importados foi recentemente elevado em 30 pontos porcentuais. Os carros pequenos que pagam 7% vão pagar 37%, e os de 25% serão tributados em 55%, um pesadíssimo aumento. O anúncio foi feito perante uma animada plateia de industriais e sindicalistas, perante os quais utilizou-se o argumento de que é preciso proteger a produção e o emprego nacionais. Será?

Não parece ser necessariamente o caso, uma vez que, dados acordos existentes, os carros produzidos no Mercosul e no México (em sua imensa maioria pelas montadoras já no Brasil há muito tempo), não serão atingidos. As importações dessas regiões correspondem a mais de 70% do total de veículos trazidos do exterior. Assim, o grosso do impacto será sobre os coreanos e chineses, e o efeito sobre o emprego e a produção no Brasil será muito modesto. O efeito maior é limitar a concorrência e não proteger a produção nacional e, portanto, permitir a elevação de preços. O peso de 30% de impostos adicionais certamente será distribuído ente redução de margens e elevação de preços ao longo do tempo.

Além do efeito concorrência, pode ser dito que:

1 - O consumidor será prejudicado pela redução das oportunidades de escolha e porque a maioria dos carros aqui produzida é bem antiga e de pior qualidade. A classe média vai pagar a conta.

2 - O impacto líquido no emprego (resultado de eventual maior produção local, depois de descontada a importação do México e do Mercosul, e considerando o menor crescimento dos sistemas de distribuição dos veículos que vão pagar mais imposto) deve ser modestíssimo, se positivo. Até onde sei, a produção do México é a mais beneficiada porque, pelo acordo atual, os carros lá produzidos podem ter até 30% de conteúdo local e não os 60% aplicados no acordo do Mercosul para Brasil e Argentina. No caso do Uruguai, o conteúdo é de 50% (decreto 4458, de 5/11/2002).

3 - O investimento em novas fábricas de montadoras que aqui ainda não produzem fica prejudicado, porque para não pagar o imposto será preciso utilizar pelo menos 65% de componentes nacionais. Ora, acho que desde a instalação da indústria automotiva no Brasil nunca uma planta começou a produzir com tal grau de nacionalização. É mais uma razão para se limitar a concorrência.

Na verdade, o que temos é a reedição de um movimento antigo, dos tempos da superinflação pré-Real, que foi batizado de coalizão inflacionária. Este termo foi cunhado e utilizado pelo economista argentino José Luiz Machinea para entender a inflação daquele país; Machinea argumentava que as indústrias mais fortes se entendiam com os sindicatos mais poderosos, especialmente no ramo automotivo, par a conceder generosos acordos salariais, que depois eram repassados aos preços, movimento possível dado o fechamento da economia ante a competição internacional.

O mesmo argumento passou a ser utilizado na explicação da nossa inflação dos anos 80, agravado pelo fato de que as usinas de aço, estatais na época, eram levadas a não elevar o preço das chapas para não pressionar a inflação, distorcendo ainda mais os preços relativos. A correção monetária generalizada e políticas expansionistas contribuíam para realimentar a alta dos preços. Foi essa situação que acabou levando à ideia de que a abertura à concorrência externa seria uma precondição essencial para um ataque bem-sucedido ao processo inflacionário. Da mesma forma, a privatização seria indispensável para melhorar a política fiscal (por exemplo, o subsídio ao aço custou ao Tesouro mais de US$ 20 bilhões nos anos 80) e elevar a eficiência da economia como um todo, o que acabou ocorrendo no Plano Real.

O novo plano automotivo lembra muito o passado. Permite entender porque os acordos salariais recentes na indústria automotiva foram tão generosos, variando de 14 a 20%, quando se consideram o reajuste geral e os valores fixos em reais a propósito de distribuição de resultado, bônus e outros esquemas. A maior diferença em relação ao passado está na elevação de tributos ao invés da concessão de subsídios diretos e indiretos. Entretanto, a pressão inflacionária subsequente é a mesma.

Câmbio. O real se desvalorizou forte nestes dias. Enquanto escrevo este artigo está em R$ 1,86 por dólar.

Várias são as razões para este movimento, a primeira delas a recente valorização do dólar lá fora, resultado da chamada fuga para a qualidade. Reforça esse movimento uma elevação das remessas de filiais brasileiras de empresas internacionais para as matrizes, evidentemente uma decorrência da piora da situação econômica, especialmente na Europa. Adicionalmente, a grande alteração das regras cambiais produziu uma mudança forte nas operações das tesourarias e de arbitragem. Isso decorreu menos do imposto de 1% sobre derivativos, mas muito mais por conta do enorme grau de arbítrio que agora dispõe o Conselho Monetário Nacional (CMN) para alterar, de um dia para o outro, regras sobre as alíquotas do IOF, margens etc. Basta pensar que o imposto pode, por exemplo, subir de 1% para 5% ou 10%, impondo perdas enormes nas operações. Com este grau de risco, muitos aplicadores deixaram de operar; outros alteraram a estrutura das operações, ficando comprados no Brasil e vendidos no balcão no exterior, ao contrário do que se fazia antes; por sua vez, as tesourarias logo perceberam que a ausência de vendedores criou oportunidades lucrativas na compra de dólares. Hoje apenas os exportadores e o Banco Central são vendedores, o que torna a moeda brasileira leve para depreciar, mas com maior grau de incerteza.

Prever o curso do dólar é sempre atividade de elevadíssimo risco, especialmente com o mercado manco, ou seja, com a ausência de vendedores regulares fora os exportadores. Entretanto, creio que pode ser dito que, enquanto a incerteza for tão elevada quanto a atual, nossa moeda seguirá mais desvalorizada. Apenas com uma eventual regularização do movimento de investimentos internacionais é que o real poderia voltar para uma faixa de R$ 1,70 por dólar.

Isto nos leva, mais uma vez, a dizer que os riscos para a inflação estão muito elevados. Aos efeitos do novo protecionismo e das pressões vindas do câmbio (nos preços de alimentos e nos custos industriais), devemos adicionar a força do mercado de trabalho, o reajuste do salário mínimo, as elevações contínuas dos preços de serviços e a expansão dos gastos públicos no próximo ano (inclusive pela anunciada contratação de mais 55 mil funcionários pelo governo).

Será preciso um derretimento de proporções bíblicas na economia mundial, incluindo Índia, China e toda a Ásia, para que o cenário no qual as autoridades apostam possa ocorrer. A alternativa possível é que o governo esteja disposto a conviver com a inflação mais elevada, independentemente de seus custos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO