segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

OPINIÃO DO DIA – Alain Touraine: Democracia

"(...) nos tempos modernos, com a complexidade de sua organização, de sua rede de comunicação e seu aparato produtivo, a liberdade e a democracia só podem ser fundadas no reconhecimento do universalismo dos direitos individuais (...).

(...)Uma ditadura política não pode criar uma democracia social ou econômica (...).

(...) A melhor defesa contra regimes totalitários é a afirmação da consciência moral e dos direitos de cada indivíduo e de cada coletividade (...)."

Alain Touraine, sociólogo francês. In Merval Pereira. Democracia e riscos. O Globo, 4/12/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Cai o sétimo ministro de Dilma
Mais R$ 40 bi para bancos públicos
Um penta para o Doutor

FOLHA DE S. PAULO
Lupi é sexto ministro de Dilma a cair sob suspeita
73% das vagas cortadas em faculdades pelo MEC são ociosas

O ESTADO DE S. PAULO
Carlos Lupi pede demissão e PT já disputa o ministério
Itália aumenta imposto e corta benefícios para fugir da crise

VALOR ECONÔMICO
Indenização a elétricas pode custar R$ 47 bilhões
Baixar o juro é prioridade de Dilma
Lupi deixa o Ministério do Trabalho
Cândido, uma estrela em ascensão no PT
Inadimplência no crédito a veículos sobe para 4,7%

CORREIO BRAZILIENSE
Caso Lupi - Demissão por justa causa
Como cresce o ensino superior

ESTADO DE MINAS
Lupi pede para sair
Multa baixa incentiva reincidência
Trem vai apitar novamente nas estações

ZERO HORA (RS)
Lupi pede para sair após um mês de agonia política

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Lupi, finalmente, resolve sair do governo
Menor aprendiz é oportunidade para os jovens

Dia 4 de dezembro de 2011:: Juca Kfouri

O dia em que uma das maiores torcidas do mundo acordou chorando de dor e foi dormir chorando de alegria.

Uma confusão de sentimentos como provavelmente jamais houve na história do futebol.

Às quatro e meia da manhã morria Sócrates Brasileiro, o Doutor, o Magrão, o Magro, o mago dos calcanhares geniais, o mais original de todos os jogadores da história centenária do Corinthians.

Às sete horas da noite esta história era enriquecida com seu quinto título brasileiro e a Fiel torcida que acordara deprimida comemorava eufórica a façanha do pentacampeonato.

Alguém já disse que o futebol imita a vida, e vice-versa.

É fato.

E se o cumpridor time alvinegro tinha pouca chance de se tornar inesquecível, eis que agora ficará para sempre na memória de todos como o time que foi campeão no dia em que Sócrates morreu.

E ele que já era inesquecível, acrescentará à sua história ter morrido no dia em que seu time o homenageou sendo campeão.

O que, convenhamos, é uma história bonita, linda mesmo.

E triste, profundamente triste.

FONTE: Comentário para o Jornal da CBN desta segunda-feira, 5 de dezembro de 2011.

Cai o sétimo ministro de Dilma

Desgastado por denúncias de corrupção no Ministério do Trabalho, o ministro Carlos Lupi se antecipou a presidente Dilma - que, pressionada pela Comissão de Ética da Presidência, anunciaria hoje a saída do pedetista da pasta - e entregou ontem o cargo. Ele resistiu por apenas 28 dias, após afirmar que só sairia "abatido a bala". O secretário-executivo Paulo Roberto Pinto assumiu o ministério, pelo menos até a reforma prometida para janeiro. No entanto, não é certa a permanência do PDT no comando da pasta, e Dilma já pensa em fundir a Previdência e o Trabalho e entregá-los ao PMDB. Em nota, Lupi atribuiu sua saída a "perseguição política e pessoal da mídia". E reclamou do que chamou de condenação sumária da Comissão de Ética

Após 28 dias, Lupi joga a toalha

Ministro pede demissão depois de dizer que só sairia "abatido à bala"; secretário-executivo assume

Diana Fernandes, Fábio Fabrini

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, pediu demissão na noite de ontem, desgastado por denúncias de corrupção em sua pasta. Com a decisão, ele se antecipou à presidente Dilma Rousseff, que anunciaria sua saída hoje, pressionada por recomendação da Comissão de Ética da Presidência, que sugeriu, na quarta-feira passada, a exoneração do ministro. O secretário-executivo Paulo Roberto Pinto assumirá o cargo ao menos até a reforma ministerial prometida para janeiro, após a presidente voltar de dez dias de férias, emendadas com o Natal e o réveillon. Não é certa a permanência do PDT no comando da pasta, tampouco o retorno do PT, que o antecedeu no primeiro mandato do ex-presidente Lula.

Lupi, que se agarrou à cadeira de ministro e chegou a declarar que só a deixava "abatido à bala", despediu-se com uma nota, divulgada no site do ministério após reunião de meia hora com a presidente no Palácio da Alvorada. No comunicado, ele atribuiu sua saída à "perseguição política e pessoal da mídia". E à divulgação do parecer da Comissão de Ética, que chamou de condenação sumária, "com base no mesmo noticiário".

"Faço isto para que o ódio das forças mais reacionárias e conservadoras deste país contra o trabalhismo não contagie outros setores do governo", justificou.

Lupi é o sexto ministro de Dilma a tombar este ano por denúncias de irregularidades. Foi um dos mais longevos, ficando 28 dias no cargo desde que O GLOBO e a revista "Veja" publicaram, em 6 de novembro, reportagem sobre irregularidades no Trabalho.

Dilma pretende unir dois ministérios

Em nota, a presidente disse que Lupi apresentou seu pedido de demissão em "caráter irrevogável" e agradeceu "a colaboração, o empenho e a dedicação" do pedetista, acrescentando ter certeza de que "ele continuará dando sua contribuição ao país". Ontem mesmo, o Planalto anunciou o secretário-executivo como interino.

Com a reforma ministerial, uma das ideias da presidente é fundir os ministérios da Previdência e do Trabalho, criando, assim, uma pasta mais robusta para atender o PMDB, maior partido aliado e que se considera pouco favorecido no 1º escalão do governo Dilma. O próprio Planalto reconhece que a representação do partido na Esplanada é menor do que o poder de fogo que ele tem no Congresso.

A ideia da fusão resolveria outro problema: acabaria com a disputa entre PT e PDT, que comandam as principais forças sindicais do país, pelo poder na pasta. Mas não é ainda uma decisão tomada por Dilma.

A expectativa de setores do PDT era de que a presidente Dilma tomasse a iniciativa de demitir Lupi, e eles acreditavam que ela deveria ter feito isso quando a Comissão de Ética recomendou a exoneração. Muitos dirigentes do partido pressionaram para que Lupi saísse e chegaram a sugerir isso. Falaram com ele o presidente da sigla, André Figueiredo, e o secretário-executivo, Manoel Dias, ambos lupistas.

O fato de a presidente ter pedido mais esclarecimentos à Comissão de Ética sobre o processo de Lupi teve o objetivo de ganhar tempo, para não decidir em cima de uma sugestão do grupo. Dilma considera que, se assim o fizesse, ficaria a reboque de um grupo auxiliar da Presidência. Lupi pediu mais tempo à comissão para se explicar, não porque acreditava que teria chance de permanecer no cargo, mas para ganhar fôlego e não sair com a "marca de corrupto", como ele mesmo alegou aos colegas do PDT.

O processo de fritura de Lupi provocou muito desgaste político para todas as partes: a presidente Dilma, o próprio ministro e o PDT, que estava cada vez mais rachado.

Colaborou: Gabriela Valente

FONTE: O GLOBO

Ministro diz que foi perseguido pela imprensa

Leia a íntegra da nota.

BRASÍLIA - "Tendo em vista a perseguição política e pessoal da mídia que venho sofrendo há dois meses sem direito de defesa e sem provas; levando em conta a divulgação do parecer da Comissão de Ética da Presidência da República -que também me condenou sumariamente com base neste mesmo noticiário sem me dar direito de defesa- decidi pedir demissão do cargo que ocupo, em caráter irrevogável.

Faço isso para que o ódio das forças mais reacionárias e conservadoras deste país contra o trabalhismo não contagie outros setores do governo.

Foram praticamente 5 anos à frente do Ministério do Trabalho, milhões de empregos gerados, reconhecimento legal das centrais sindicais, qualificação de milhões de trabalhadores e regulamentação do ponto eletrônico para proteger o bom trabalhador e o bom empregador, entre outras realizações. Saio com a consciência tranquila do dever cumprido, da minha honestidade pessoal e confiante por acreditar que a verdade sempre vence."

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Carlos Lupi pede demissão e PT já disputa o ministério

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, pediu demissão ontem, depois de se encontrar com a presidente Dilma Rousseff. Envolvido em uma série de denúncias, Lupi perdeu o apoio do PDT, entrou em rota de colisão com o PT e não conseguiu explicar à Comissão de Ética os casos de cobrança de propina na pasta. Na sexta-feira, a presidente, em viagem à Venezuela, avisou que decidiria o caso "na segunda". Para se antecipar ao gesto presidencial, Lupi retornou ontem à tarde a Brasília e apresentou sua carta de demissão. Ele é o sexto ministro a cair sob acusação de corrupção em menos de um ano de governo. O PT já negocia nos bastidores para retomar o domínio da pasta

Sem apoio, Lupi se antecipa e pede demissão; PT mira Ministério do Trabalho

Presidente Dilma já havia selado o destino do ministro, que perdeu apoio do próprio PDT e não conseguiu explicar as denúncias de corrupção

Vera Rosa

BRASÍLIA - Vinte e sete dias após dizer que só sairia da Esplanada "abatido à bala", o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, antecipou-se neste domingo, 4, à demissão iminente – já decidida pela presidente Dilma Rousseff – e entregou o cargo. Trata-se do sétimo ministro que cai em quase um ano de governo.

Enredado em uma teia de denúncias, Lupi perdeu o apoio do PDT, entrou em rota de colisão com o PT – que está de olho na vaga – e não conseguiu explicar à Comissão de Ética da Presidência acusações de cobrança de propina na pasta.

Na tarde deste domingo, Lupi se encontrou com Dilma, no Palácio da Alvorada. A presidente havia chegado na véspera de uma viagem a Caracas, na Venezuela, e o ministro já recebera recados de que sua demissão eram "favas contadas". Para se antecipar ao gesto, acertou com Dilma a saída antes mesmo da reunião da Executiva Nacional do PDT, marcada para esta segunda-feira, 5. Os termos da carta foram combinados com auxiliares da presidente.

"Tendo em vista a perseguição política e pessoal da mídia, que venho sofrendo há dois meses sem direito de defesa e sem provas; levando em conta a divulgação do parecer da Comissão de Ética (...) – que também me condenou sumariamente (...), sem me dar direito de defesa – decidi pedir demissão do cargo que ocupo, em caráter irrevogável", escreveu Lupi. "Faço isto para que o ódio das forças mais reacionárias e conservadoras deste país contra o trabalhismo não contagie outros setores do governo."

Foi o passivo de escândalos que selou o destino de Lupi e nem mesmo as juras de amor a Dilma adiantaram. Depois de desafiar a Comissão de Ética, que na quarta-feira recomendou a dispensa, ganhar tempo e anunciar que faria uma "análise objetiva" do caso, Dilma chegou à conclusão de que não seria possível segurar o auxiliar até a reforma ministerial, prevista para ocorrer no fim de janeiro de 2012.

O secretário executivo do ministério, Paulo Roberto dos Santos Pinto, assumirá o comando da pasta, interinamente, até o início do ano que vem. Ele é filiado ao PDT, mas não tem a simpatia do partido. Dilma, porém, não quer que o PDT indique um novo ministro agora. Motivo: ela pretende fazer um rodízio na partilha dos cargos e tirar o Trabalho do controle pedetista, na reforma da equipe.

Lupi é o sexto ministro que cai sob denúncia de corrupção. Pesaram contra ele, ainda, acusações de repasse de dinheiro do ministério para abastecer o caixa do PDT e patrocinar ONGs de fachada. Até agora, dos nomes abatidos na Esplanada, apenas Nelson Jobim (Defesa) não integrou a lista da "faxina". Foi dispensado por ter dado declarações consideradas "inconvenientes" sobre o governo.

A cúpula do PDT vai se reunir na tarde desta segunda, em Brasília, para discutir o day after da crise e há quem defenda a saída do partido da base aliada. "Para mim, o PDT não deve ter nenhum cargo no governo Dilma", afirmou senador Cristovam Buarque (PDT-DF). "Nós vamos continuar no governo, mesmo não sendo nesse ministério", resumiu o deputado André Figueiredo (CE), presidente interino do PDT.

Lupi conversou ontem com amigos, por telefone, e avisou que desocuparia a cadeira, porque sua família não estaria aguentando a pressão. "A cúpula do governo mandou o Lupi resistir e pôs o PT para bater nele. Foi assim com o PC do B também", disse o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), presidente da Força Sindical, numa referência à crise que derrubou o ministro do Esporte, Orlando Silva.

O Ministério do Trabalho foi um feudo petista no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Por lá passaram Jaques Wagner (hoje governador da Bahia), Ricardo Berzoini (atualmente deputado federal) e Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo do Campo. Agora, petistas agem para retomar o domínio da pasta, em 2012.

Fusão. Sem ceder às pressões, Dilma analisa a possibilidade de resgatar um desenho antigo da Esplanada e fundir Trabalho com Previdência. Nesse cenário, o PDT poderia ficar com a Agricultura, hoje comandada pelo PMDB. O nome mais cotado para o posto, nesse caso, seria o do ex-senador Osmar Dias (PDT-PR), que também não tem chancela oficial do partido.

O presidente do PT, Rui Falcão, negou que a legenda tenha agido para desbancar Lupi. "A minha preocupação sempre foi com o aparelhamento e com a chamada política de porteira fechada, de ocupar determinados postos com pessoas que só representam uma central sindical", disse Falcão.

A briga entre a CUT, braço do PT, e a Força Sindical, ligada ao PDT, foi um importante ingrediente da crise política. Na guerra pelo poder, integrantes da Força contavam que Dilma desidratou o Trabalho, levando as principais negociações para a Secretaria-Geral da Presidência.

Com a saída de Lupi, o PDT espera reverter a pecha de corrupção do partido. "Temos que lutar para tirar essa imagem de que o partido teve envolvimento em um esquema de arrecadação para pagar campanhas eleitorais", disse o secretário-geral do PDT, Manoel Dias.

Colaborou Eugênia Lopes

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Dilma orienta Pimentel a explicar consultorias

Ministro alega que serviços pelos quais recebeu R$2 milhões entre 2009 e 2010 estão dentro da lei

Regina Alvarez

BRASÍLIA. O governo reagiu ontem à denúncia publicada no GLOBO de que o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, recebeu R$2 milhões em serviços de consultoria entre 2009 e 2010. A presidente Dilma Rousseff recomendou a Pimentel que retornasse a Brasília ainda no domingo e se explicasse, apresentando documentos, para mostrar transparência e que não tem nada a temer. O objetivo do governo é destacar que a situação de Pimentel é diferente da situação do ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci, demitido por Dilma em meio à pressão para explicar a multiplicação de seu patrimônio.

- A presidenta me orientou a agir com transparência e tranquilidade. Não tenho nada a esconder, tudo que fiz foi dentro da lei - disse Pimentel.

Segundo o ministro, que recebeu O GLOBO em seu gabinete ontem à tarde em Brasília, pouco depois de chegar de Belo Horizonte, a orientação de Dilma foi a seguinte, após ler a reportagem: "Responda de forma transparente, seja objetivo e bastante explícito, mostre tudo para dirimir qualquer dúvida, porque você não tem nada a esconder, não tem nada de errado nisso".

Ele disse que seu rendimento líquido com as consultorias foi entre R$1,2 milhão e R$1,3 milhão, menos do que os R$2 milhões brutos, considerando o desconto dos impostos e os gastos administrativos da empresa. E apresentou cópias dos contratos assinados com a Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) e com a QA Consulting, uma empresa de informática,

- Não embolsei R$2 milhões. Entrou mesmo R$1,2 milhão, R$1,3 milhão que dividido por 24 (meses) equivale a R$50 mil mensais. Estamos falando de uma remuneração absolutamente compatível com o mercado de executivos hoje no Brasil.

- Foi a forma que eu tive de ganhar dinheiro e sobreviver. Não tem nada de irregular, nada de ilegal. Foi um trabalho de consultoria com notas fiscais emitidas. Uma empresa de consultoria na qual trabalhei em 2009 e 2010 e da qual me afastei no fim de 2010 - disse.

O ministro negou que tenha influenciado o resultado de licitação na prefeitura de Belo Horizonte, para favorecer o grupo Convap, para o qual prestou consultoria em 2010, como mostrou a reportagem. Pimentel disse que, em conversa por telefone com o secretário de Obras da prefeitura, Murilo Vasconcellos, fora informado de que o consórcio do qual participa a Convap ganhou a licitação para uma das obras mencionadas na reportagem, a Via 210, mas foi desabilitado e só conseguiu assinar o contrato depois de ganhar uma liminar na Justiça.

- O governo de Marcio Lacerda é um governo de frente. Tem gente do PT, do PSB e do PSDB. Concluir que houve qualquer interferência minha nos contratos públicos é uma afirmação totalmente descabida.

Pimentel apresentou o contrato com a Fiemg, destacando que os serviços de consultoria foram prestados ao Centro de Indústrias de Minas Gerais (Ciemg) - que está explícito no documento -, o que justificaria o fato de outros integrantes da Federação terem declarado que desconheciam o trabalho prestado por Pimentel à entidade.

- Fiz uma consultoria direta à direção do Ciemg, ao Olavo e ao Robson Andrade .

Olavo Machado é ex-presidente do Ciemg e atual presidente da Fiemg. Robson Andrade é ex-presidente da Fiemg e atual presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Andrade assina os dois contratos de Pimentel com a entidade em 2009, que somam R$1 milhão.

No contrato com o Ciemg, uma das atribuições da consultoria de Pimentel é "elaborar estudos e pareceres relativos a propostas que serão apresentadas aos órgãos de gestão pública". Segundo o ministro, ele ajudou na elaboração de propostas, avaliação de programas e avaliação econômica, e todo o eixo de atuação do Ciemg teria sido influenciado pela consultoria que prestou aos dois empresários.

- Não tive contato com ninguém da Fiemg além dos dois.

Andrade confirmou as explicações de Pimentel. Quanto à consultoria contratada pela Convap, Pimentel disse que tem relações de amizade com o empresário Flávio Lima Vieira, dono do grupo ao qual a construtora pertence.

FONTE: O GLOBO

Para oposição, há indícios de tráfico de influência

Líderes querem que Pimentel se explique no Congresso; para Planalto, cifras não são "tão astronômicas assim"

Mônica Tavares, Fábio Fabrini e Thiago Herdy

BRASÍLIA e BELO HORIZONTE. Os partidos de oposição querem que o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, explique ao Congresso os contratos de sua empresa, a P-21 Consultorias e Projetos Ltda. Como revelou O GLOBO ontem, o escritório de Pimentel faturou ao menos R$2 milhões em 2009 e 2010, período entre ele deixar a Prefeitura de Belo Horizonte e assumir o ministério, tendo atuado ainda como um dos homens-fortes da campanha da então candidata à Presidência Dilma Rousseff. Para parlamentares, suas atividades de consultoria têm indícios de tráfico de influência, e Pimentel precisa dissipá-los.

No Palácio do Planalto, a avaliação foi que a atividade de consultor de Pimentel é de amplo conhecimento e foi empreendida quando ele não ocupava cargo público. As cifras também não foram consideradas "tão astronômicas assim", não havendo razão para suspeitas.

Esta semana, o líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA), vai discutir com os demais líderes oposicionistas a apresentação de um pedido de convocação de Pimentel. O líder do PPS, Rubens Bueno (PR), disse que vai fazer um requerimento de informações ao ministro. Para ele, o caso sugere que a expectativa de nomeação de Pimentel servia como "cartão de visitas para arregimentar clientes".

- O caso parece ter muita similitude com o do ex-ministro Palocci. Mostra que as pessoas do PT que teriam influência num eventual governo Dilma, enriqueceram e usaram dessa posição para isso - acusou ACM Neto, afastando a hipótese de investigação por improbidade administrativa, a exemplo do que ocorreu com Palocci, porque Pimentel não tinha cargo público à época das consultorias.

Porém, tanto ACM Neto quanto o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) acreditam que o MP deveria investigar a possibilidade de tráfico de influência:

- Óbvio que Pimentel precisa dar explicações convincentes, a consultoria foi em um período complicado e o que parece é que ele estava negociando com o poder público, que o cliente era o poder público - disse Torres.

O líder do PSDB na Câmara, deputado Duarte Nogueira (SP), destaca que a construtora mineira Convap, uma das clientes de Pimentel, assinou dois contratos, no valor de R$95,3 milhões, com a Prefeitura de Belo Horizonte, da qual o ministro é aliado e onde mantém influência, especialmente na Secretaria de Obras Públicas:

- Pimentel foi prefeito e mantém pessoas de sua confiança na administração de Belo Horizonte. Ele precisa vir a público para que não pairem dúvidas.

O presidente do PSDB em Minas, deputado federal Marcus Pestana, cobra explicações:

- Temos uma relação de respeito com o ex-prefeito e ministro, mas aguardamos esclarecimentos. As pessoas têm o direito de trabalhar e ganhar dinheiro, mas é preciso ver se há conflito de interesses.

O líder do bloco governista na Assembleia Legislativa de Minas, deputado estadual Bonifácio Mourão (PSDB), pretende pedir ao MP que investigue as circunstâncias em que foram prestadas as consultorias e o sucesso de clientes de Pimentel em contratos com a Prefeitura de Belo Horizonte.

FONTE: O GLOBO

Dilma planeja reforma ministerial mais enxuta e rodízio

Mudança deve atingir 9 das 38 pastas; presidente pode adotar alternância de partidos no comando de alguns ministérios

BRASÍLIA - Depois de demitir sete ministros, a presidente Dilma Rousseff planeja fazer uma reforma mais enxuta da equipe, no início de 2012. Por enquanto, ela pretende mexer em apenas 9 dos 38 ministérios e promover um rodízio de partidos no comando de algumas pastas. Mas Dilma ainda quer consultar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva antes de bater o martelo.

Enquanto a reforma não vem, o PT faz o inventário dos cargos e traça estratégias para a campanha municipal de 2012. A cadeira mais cobiçada é a do ministro da Educação, Fernando Haddad (PT), que sairá do governo para disputar a Prefeitura de São Paulo. Correntes do PT também querem retomar antigos feudos, como os ministérios do Trabalho e das Cidades, duas pastas alvejadas por acusações de corrupção.

Além de mexer em Educação e Trabalho - que estava com o PDT -, Dilma deve trocar Mário Negromonte (Cidades), Ana de Hollanda (Cultura), Iriny Lopes (Mulheres) e Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário). Não é só: pretende fundir os ministérios de Agricultura e Pesca e pode substituir o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho.

O vistoso orçamento do Ministério das Cidades, por outro lado, é considerado "muito grande" para um partido do tamanho do PP e abre o apetite do PT.

Em jantar promovido há uma semana pela chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, ministros petistas manifestaram preocupação com a divisão da base aliada nas principais capitais e com as "travessuras" do PSB.

Haddad trabalha para que o seu substituto na Educação seja o secretário executivo, José Henrique Paim Fernandes, filiado ao PT. O argumento é que ele representa a continuidade de um trabalho iniciado na gestão Lula. Dilma gosta de Paim, mas ainda não tomou uma decisão.

Um grupo do PT pressiona o governo para que a cadeira de Haddad fique com Aloizio Mercadante, ministro da Ciência e Tecnologia. Mercadante está de olho em um ministério com mais holofotes porque deseja concorrer ao governo de São Paulo, em 2014.

Mesmo antes de Dilma definir o novo mapa do primeiro escalão, os petistas já traçam planos. Dizem que, se Mercadante for para Educação, o Ministério de Ciência e Tecnologia pode ser ocupado pelo deputado Newton Lima (PT-SP), ex-reitor da Universidade Federal de São Carlos.

Nesse caso, seria aberta uma vaga de deputado federal para José Genoino, hoje assessor especial do Ministério da Defesa. No Planalto, porém, o comentário é o de que a reforma ainda está apenas "na cabeça de Dilma". / V.R.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Crise ameaça meta de Dilma de crescer 5%

Perda de dinamismo da economia brasileira com a crise externa torna difícil alcançar objetivo traçado pelo governo

Bancos e consultorias dizem que recuperação só deverá ganhar impulso na segunda metade do próximo ano

Mariana Carneiro, Mariana Schreiber

SÃO PAULO - A perda de dinamismo da economia brasileira neste fim de ano deve contaminar seu desempenho em 2012 e atrapalhar os planos da presidente Dilma Rousseff para fazer o país voltar a crescer a uma taxa próxima de 5% ao ano.

A anemia do setor industrial no início do quarto trimestre, revelada na semana passada pelo IBGE, reforçou o diagnóstico de que a economia caminha lentamente.

O retrato oficial do que ocorreu com a economia no terceiro trimestre será conhecido amanhã, quando o IBGE divulga o PIB (Produto Interno Bruto) do período. Projeção do Banco Central sugere que houve contração de 0,3% entre julho e setembro.

Para o quarto trimestre, instituições como a consultoria LCA projetam resultado próximo de zero. Outras, como o banco Itaú, estão revendo suas previsões.

"Não quero exagerar nas cores, mas não se pode afastar totalmente o risco de uma recessão técnica [dois trimestres seguidos de contração]", diz o economista Marcelo Carvalho, do banco BNP Paribas.

O resultado ruim neste fim de ano pode retardar uma recuperação mais forte para o segundo semestre de 2012.

"Como a economia termina 2011 mais fraca do que começou o ano, ela começa 2012 em um patamar relativamente mais deprimido", explica ele. "Isso puxa para baixo a média do ano que vem".

Carvalho integra um pequeno mas crescente grupo de analistas que prevê que o país crescerá menos em 2012 do que em 2011. Ele estima que o Brasil crescerá 2,8% neste ano e 2,5% no próximo, metade da meta do governo.

A OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) projeta expansão de 3,4% neste ano e de 3,2% em 2012.

As ambições do governo Dilma são maiores. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou várias vezes que trabalha para que o país cresça em média 5% ao ano entre 2012 e 2014. Seria mais do que a média dos governos Lula (4%) e FHC (2,3%).

Mas o crescimento deste ano já vai ficar bem abaixo da projeção inicial da Fazenda, de 4,5%. O principal motivo foram as medidas tomadas pelo próprio governo no início do ano para esfriar a demanda e segurar a inflação.

Depois de um ano eleitoral em que o governo botou o pé no acelerador e entregou um crescimento de 7,5%, foi preciso pisar no freio para evitar descontrole dos preços.

Na última semana, para atenuar o impacto da crise externa sobre o país, o governo voltou a anunciar medidas para estimular o consumo.

Mas para o economista Thovan Tucakov, da LCA, os efeitos devem ser modestos.

Ele observa que a indústria tem estoques elevados, o que desestimula a produção, e que a desoneração de apenas quatro produtos (fogão, geladeira e máquinas de lavar) pode não ser suficiente.

A LCA prevê crescimento de 2,8% neste ano, com leve aumento para 3,1% no próximo. Mas, se a redução dos estoques não se confirmar, a retomada será mais demorada e a expansão em 2012, menor.

O economista-chefe do Bradesco, Octávio de Barros, está mais otimista e prevê crescimento de 3,7% em 2012.

"O impulso combinado de juros em queda, reversão de restrições ao crédito e aumento dos investimentos públicos trará impacto forte na economia."

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Ação do governo sugere que 2012 pode ser pior que 2011

Érica Fraga

SÃO PAULO - A rapidez com que o governo federal anunciou na última semana reduções de impostos para tentar reanimar a economia parece confirmar o risco apontado por alguns: 2012 poderá ser tão ruim quanto 2011, ou ainda pior.

Ninguém bota fé na previsão do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que as medidas apresentadas na quinta-feira garantirão crescimento de 5% em 2012.

Na verdade, pouca gente parece acreditar que o governo realmente aposte nesse prognóstico, dado o cenário sombrio da economia mundial, com a União Europeia à beira do precipício e os Estados Unidos se recuperando lentamente.

A desoneração tributária dos setores beneficiados pelo pacote da semana passada vai ajudar a frear o enfraquecimento do consumo das famílias brasileiras. O reajuste de 14,6% do salário mínimo previsto para 2012 também dará a sua contribuição.

Mas a principal causa da desaceleração econômica no país até agora não parece ser o consumo interno.

Pelo contrário, o Brasil é um dos poucos países grandes que contam com certo dinamismo da demanda doméstica, ainda que haja evidência de desaceleração.

O problema é que a indústria nacional não tem conseguido tirar proveito disso.

Um índice que mede o desempenho do setor industrial no Brasil e em vários outros países -calculado pelo banco HSBC em parceria com a consultoria Markit- mostra que a indústria brasileira foi a primeira do mundo emergente a começar a se contrair, em junho deste ano.

Embora o setor exiba sinais de fraqueza na maioria dos países emergentes, o Brasil é um dos que apresenta pior desempenho.

O dado mais recente indica que o índice caiu por seis meses consecutivos até novembro.

E não há muito o que o governo possa fazer no curto prazo para melhorar a competitividade do setor industrial.

O risco é que a crise mascare esse sintoma e nada de significativo seja feito para atacar os problemas que ameaçam a indústria brasileira no longo prazo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Mais R$ 40 bi para bancos públicos

O governo prepara uma capitalização de R$ 40 bilhões nos bancos públicos para aumentar a oferta de crédito e aquecer a economia. Só o BNDES vai receber R$ 25 bilhões. Serão destinados recursos ainda para Caixa, BB e Banco do Nordeste

Governo quer injetar R$40 bi em bancos públicos

Ideia da capitalização é dar condições para que instituições ampliem concessão de crédito e ajudem a turbinar economia

Geralda Doca, Martha Beck

BRASÍLIA. A equipe econômica já prepara uma nova capitalização dos bancos públicos, que pode chegar a R$40 bilhões, para que eles abasteçam a economia com crédito. O temor dos técnicos é que a desaceleração da atividade e o agravamento da turbulência global provoquem, em 2012, um quadro semelhante ao de 2008, quando a oferta de recursos secou no país. Naquele momento, foram justamente os bancos públicos que supriram o espaço deixado pelas instituições privadas e ajudaram a turbinar a economia.

A injeção de recursos - que pode ser um mix entre dinheiro do Tesouro Nacional, lançamento de ações e captações externas - será necessária pois as instituições federais estão num ritmo acelerado de expansão das suas carteiras e caminham rapidamente para os limites de segurança, o chamado índice de Basileia. O índice define que para cada R$100 emprestados, o banco precisa de reserva própria de ao menos R$11.

Outro fator de pressão é que o Banco Central vai colocar em consulta pública este mês regras de controle mais duras para os bancos, que vão exigir um esforço maior de capitalização para que as instituições fiquem enquadradas. Com a mudança, que entra em vigor em janeiro, os bancos não poderão mais considerar bens intangíveis, como marca ou créditos tributários, no cálculo de seu capital próprio.

A situação é mais crítica hoje na Caixa, mas também afeta o Banco do Brasil. Segundo técnicos, mantidos os parâmetros atuais, os dois bancos precisarão de pelo menos R$15 bilhões, valor semelhante às capitalizações realizadas em 2009 e 2010. Numa proporção menor, o Banco do Nordeste, que já recebeu cerca de R$1 bilhão, também poderá necessitar de novos aportes. O BNDES, por sua vez, deverá receber R$25 bilhões.

Depois de ter elevado sua carteira de crédito em 40% entre setembro de 2010 e setembro deste ano, a Caixa viu seu índice de Basileia cair de 17,04% para 13,45%, percentual próximo aos 11% exigidos. Para 2012, a meta da instituição é crescer entre 30% e 35%. No BB, o crédito subiu 20% no terceiro trimestre, e o índice se manteve em 14%.

Levantamento da USP revela que a situação da Caixa e do BB já é preocupante, quando se compara a proporção do patrimônio líquido em relação às operações de crédito, que são de 9% e de 15%, respectivamente. A média dos maiores bancos privados (Itaú Unibanco, Bradesco, Santander e HSBC) está em 22%.

Para o professor Alberto Matias, se quiser repetir a estratégia de 2008, o governo terá mesmo que fazer novos aportes. Ele lembra que a própria crise externa, com problemas nas matrizes dos bancos privados, vai aumentar a pressão sobre os bancos públicos. Os técnicos da equipe econômica também reconhecem a necessidade de aportes.

- Já contamos com essa possibilidade (capitalização). No caso da Caixa, o valor não é tão alto. No BB, a conta é dividida com os acionistas - disse um técnico.

Segundo o vice-presidente de Novos Negócios de Varejo do BB, Paulo Rogério Caffarelli, com a entrada do Banco Postal em janeiro (parceria com Correios), a ideia é atuar forte para oferecer crédito a oito milhões de consumidores das classes C, D e E, que já são clientes, mas pegam financiamentos na concorrência. Ao todo, o plano é pôr na praça R$52 bilhões, com aumento de limite para cheque especial, CDC, imóveis, veículos e desconto em folha:

- Com base no comportamento dos clientes, estamos expandindo o crédito de forma expressiva e consciente.

Segundo o presidente do BNB, Jurandir Santiago, com novas empresas no Nordeste, cresceu a demanda por financiamentos de infraestrutura, e o Fundo Constitucional, com R$10 bilhões, é insuficiente. Para ter fonte de recursos, o BNB quer captar no exterior entre R$500 milhões e R$600 milhões. Sobre aporte do Tesouro, Santiago disse:

- Essa porta está aberta.

Desde a última crise, o banco que mais recebeu do Tesouro foi o BNDES. Foram R$100 bilhões em 2009 e R$80 bilhões em 2010. Isso sem contar com R$30 bilhões para ajudar na capitalização da Petrobras. Este ano, o governo capitalizou o BNDES em R$30 bilhões, com autorização para que o total do ano ficasse em R$55 bilhões. A diferença deve ser repassada em breve.

No caso da Caixa, foram feitas duas capitalizações desde 2009, que somaram R$8,2 bilhões. Já o BB captou recursos por meio de uma oferta pública de ações, que ficou em R$9,7 bilhões.

FONTE: O GLOBO

A candidatura do dr. Vulpiano em Natal:: Cláudio de Oliveira

Contavam os antigos militantes que o Partido Comunista Brasileiro preparava a candidatura do médico Vulpiano Cavalcanti à Prefeitura de Natal. Era o ano de 1964 e discutia-se a sucessão do então prefeito Djalma Maranhão. Nascido no Ceará a 15 de março de 1911, dr. Vulpiano radicou-se em Natal nos anos 40, depois de concluir o curso de medicina no Rio de Janeiro. Como se sabe, o golpe de Estado de 1964 interrompeu a processo democrático. O dr. Vulpiano foi uma de suas primeiras vítimas. Preso, teve seus direitos políticos suspensos.

Aquela não teria sido a primeira candidatura frustrada do dr. Vulpiano. Em fins dos anos 1950, o PCB debatia lançar seu nome a deputado estadual. Ocorreu que o professor Luiz Maranhão, também dirigente partidário, fora chamado para uma conversa com uma autoridade religiosa. O clérigo teria sido direto: se o candidato fosse ele, Luiz Maranhão, os religiosos não seriam a favor, mas também não fariam campanha contra. Se o candidato fosse o dr. Vulpiano, sua congregação se oporia. O Comitê Estadual reuniu-se e decidiu então lançar Luiz Maranhão a deputado, afinal eleito em 1958.

Talvez o dr. Vulpiano estivesse identificado com os tempos duros do PCB, quando o partido adotara posições anti-clericais e de extrema-esquerda. Enquanto Luiz Maranhão representaria a nova política, favorável a um diálogo com amplos setores da sociedade. Já em 1955, o PCB apoiara a candidatura de Juscelino Kubystchek, do PSD, à Presidência da República. Em março de 1958, manifestava-se a favor da democracia representativa e de um caminho pacífico das transformações sociais. Todavia, quem o conhecia de perto, sabia que as posições políticas do dr. Vulpiano eram as mesmas do seu correligionário professor. Ambos formavam internamente no PCB a ala dos renovadores.

Naqueles dias agitados de 1964, Djalma Maranhão, Luiz Maranhão e Vulpiano Cavalcanti se colocavam contra o processo de radicalização política em curso no país. Veio o golpe e como é sabido Djalma Maranhão foi deposto da Prefeitura e preso juntamente com os principais líderes esquerdistas da cidade. Inicialmente ficaram detidos no berçário do Hospital da Polícia Militar. Um dos últimos a chegar, o dr.Vulpiano disparou com o seu habitual bom humor:

- Viram no que deu a doença infantil do comunismo?

Vulpiano Cavalcanti assistira estudante no Rio de Janeiro a derrota dos rebeldes de 1935 da Aliança Nacional Libertadora, de cujo lançamento participou no Teatro João Caetano. Assim, refutou a tese da luta armada contra o regime de 1964. Optou pela chamada resistência democrática, política aprovada no congresso do PCB em 1967.

Obrigado à clandestinidade, Luiz Maranhão transfere-se para São Paulo, onde fará parte da comissão do PCB responsável pelas articulações na Frente Ampla. A proposta, reunindo João Goulart, Juscelino Kubystchek e Carlos Lacerda, além de Ulyssses Guimarães, Tancredo Neves, Franco Montoro, Itamar Franco, Aluízio Alves e outros, uniu a oposição ao autoritarismo.

Tal articulação será a base para a fundação do MDB, que imporá em 1974 e 1978 duas fortes derrotas eleitorais ao regime. Ante a derrota nas urnas e a pressão da opinião pública, o regime se vê forçado à abertura. A Anistia é aprovada, os exilados retornam ao país, os presos políticos são libertados e o dr. Vulpiano tem os seus direitos políticos de volta. Mas ele ainda não terá sua cidadania plenamente restituída. Seu PCB continuará proibido.

Numa tarde ensolarada, visitei o dr. Vulpiano em sua casa em Petrópolis. Contou-me do telefonema que recebera de Luiz Carlos Prestes convidando-o a abrir uma dissidência no PCB. O legendário "Cavaleiro da Esperança" voltara do exílio e acreditava que era hora de fundar uma frente unicamente de esquerda, dela excluindo os setores democráticos-liberais. O dr.Vulpiano discordou de Prestes e mostrou-se favorável à união de todos os setores da oposição como melhor caminho para superar o regime. E assim, emprestará seu apoio à campanha de Tancredo Neves, do PMDB, cuja vitória enterrou duas décadas de autoritarismo.

Morreu em novembro de 1988, vítima de pneumonia, quando visitava suas irmãs em Fortaleza,. Mas viveu o tempo suficiente para ver seu partido legalizado em 1985 e promulgada a nova Constituição, na qual foram estabelecidas não só as liberdades políticas, como também garantias sociais que melhoraram a vida de milhões de brasileiros. Confirmou-se o seu prognóstico segundo o qual a liberdade era a condição necessária para a construção de um Brasil assentado nos valores da igualdade e da fraternidade.

Cláudio de Oliveira, jornalista e cartunista

FONTE: TRIBUNA DO NORTE (RN)

As duas Dilmas:: Ricardo Noblat

"Eu não sou propriamente uma adolescente, eu diria também uma romântica". (Dilma, sobre o "Eu te amo" dito por Lupi)

A saída de Carlos Lupi do governo reforça a impressão de que temos duas Dilmas em cena. Dilma Furacão é intolerante com subordinados lerdos, pouco criativos e que têm medo dela. Dilma Eu Te Amo é tolerante com subordinados autores de malfeitos que envolvem o dinheiro público. Uma é rapidíssima no gatilho. A outra, devagar quase parando.

Dilma Eu Te Amo estava convencida de que conseguiria empurrar com a barriga a demissão de Lupi. Só queria executá-la quando promovesse em janeiro próximo a primeira reforma do seu ministério. Cada nova denúncia contra Lupi ela imaginava que seria a última. Vá lá: a penúltima. Avaliava os estragos e tocava adiante.

De público, jamais respondeu à pergunta que não queria calar: por que tendo trocado cinco ministros em menos de 10 meses preferia arcar com o desgaste de conservar Lupi ao seu lado? Mediante o anonimato, porta-vozes informais de Dilma ensaiaram respostas por ela. As razões para sustentar Lupi seriam duas, pelo menos.

A primeira: ele ficaria até janeiro para que a imprensa não sentisse o gosto de ter derrubado mais um ministro. De fato, os caídos devem sua desgraça à imprensa. Foi ela que descobriu seus malfeitos. O governo sempre soube o que se passava em cada um dos ministérios, mas hesitava em agir. Sabe como é: a corrupção, infelizmente...

Alguns dos caídos foram embora por conta própria e à revelia da vontade de Dilma. Um deles: Alfredo Nascimento, ministro dos Transportes. O PR de Alfredo faturou uma nota preta cobrando comissão por negócios fechados no âmbito do ministério. A ter que demitir Alfredo, Dilma ofereceu-se para ser a sua babá. Alfredo não aguentou o tranco.

A segunda razão: caso Lupi fosse despachado já, o PDT não abriria mão de indicar um nome para sua vaga. Assim como o PC do B indicou um nome para a vaga de Orlando Silva, ex-ministro do Esporte, e o PMDB um nome para a vaga de Wagner Rossi, ex-ministro da Agricultura. Dilma quer liberdade para em janeiro embaralhar as cartas.

Ministros perderão o emprego com uma tapinha nas costas. Partidos perderão os atuais ministérios e ganharão outros. Partidos perderão os atuais ministérios e não ganharão outros. Há quem acredite até na hipótese de Dilma diminuir o tamanho do governo extinguindo ministérios. Anotem aí: os partidos, seus aliados, não deixarão. Nem a pau.

Parecia haver certa resignação com a transferência para janeiro da saída de Lupi. Até que... Até que a Comissão de Ética da Presidência da República concluiu que ele não deu respostas satisfatórias às acusações. E aconselhou que fosse demitido. O tempo fechou. Dilma só faltou escalar parede tamanha foi sua revolta com o ato da comissão.

Esbravejou por não ter sido avisada de que a comissão se reuniria para tratar do Caso Lupi. Esbravejou por ter a comissão lhe sugerido que demitisse Lupi. Esbravejou por só ter sido informada a respeito da decisão da comissão depois de a imprensa tê-la noticiado. Sentiu-se atingida em sua autoridade. E empurrada contra a parede.

Se não lhe faltasse juízo, engoliria a raiva e faria o que a comissão sugeriu. O contrário seria impensável. Foi a primeira vez em 12 anos de funcionamento que a Comissão de Ética apontou a porta da rua para um ministro. Que tal seria Dilma passar à História como a presidente em cujo mandato a comissão se autodissolveu?

Para mandar e ser obedecido você não precisa gritar com subordinados, dar murros na mesa ou fazer ameaças. Nem desprezar o bom-senso, deixando no seu posto quem dele já deveria ter sido afastado em nome da decência. Se Dilma tinha poder para segurar Lupi também tinha para substituí-lo sem dar explicações a partidos. "Eu não sou propriamente uma adolescente, eu diria também uma romântica". (Dilma, sobre o "Eu te amo" dito por Lupi)

Foi o que acabou por ocorrer ontem à tarde e com enorme atraso. Quanto ao ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, que faturou R$ 2 milhões como consultor de empresas em Minas... Bem, fica para outra ocasião. O espaço acabou.

FONTE: O GLOBO

Loteamento fechado :: Melchiades Filho

Não há garantia de que a reforma ministerial, programada para o começo de 2012, terá o tamanho e o impacto especulados.

Dilma tem quatro motivos para mexer na equipe: substituir os candidatos a prefeito, esterilizar as pastas atingidas por denúncias de corrupção, trocar os fracos e calibrar a participação dos partidos aliados.

Fala-se, ainda, em tirar proveito e enxugar repartições -um jeito de tornar positivo algo que nasceu como resposta ao noticiário negativo.

Desses cinco fatores, porém, apenas um exige resposta rápida de Dilma. Os candidatos precisam sair até abril, prazo da Justiça eleitoral.

Nada impede que o Planalto prefira diluir as demais mudanças. Carlos Lupi (PDT), servidor-fantasma e ministro-zumbi do Trabalho, por exemplo, acaba de dançar.

Ou pegue o caso do Desenvolvimento Agrário, cujo titular, Afonso Florence (PT), tem sido regularmente incluído na lista da degola.

Ele de fato teve ano discreto, mas porque acatou a ordem superior de frear a indústria da desapropriação: desistiu das metas de assentamento, reduziu a autonomia do Incra e pediu o cadastro de terrenos.

Dilma não vilaniza ruralistas nem subestima a importância do agronegócio. Considera a terra um dos principais ativos do país e por isso só defende uma reforma agrária bem planejada, com logística para o combate eficiente à pobreza rural.

Por que, então, tirar Florence agora? Para agradar a ala petista mais estridente e próxima dos movimentos sem-terra? Faz pouco sentido.

O troca-troca nos ministérios, além disso, requer muita energia. Vide a demora de todo presidente para pôr de pé o seu time de largada. Alojar fulano implica desalojar beltrano.

Dilma, que não tem inclinação para a micropolítica e até hoje nunca delegou a alguém esse tipo de operação, anda mais preocupada com as perspectivas de desaceleração da economia, no que tem toda a razão.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Escravos do sucesso:: José Roberto de Toledo

A quantidade de prefeitos eleitos por um partido está correlacionada ao que acontece com sua bancada de deputados federais dois anos depois. Em 2008, os principais partidos de oposição ao governo federal elegeram menos prefeitos. Não por coincidência, viram suas cadeiras federais minguarem quase na mesma proporção em 2010.

No sentido inverso, o ciclo eleitoral passado favoreceu petistas e aliados: ganharam prefeitos e, na eleição seguinte, deputados. Mas também aumentou a dispersão partidária. Mais legendas conquistaram espaço nas prefeituras e isso levou à pulverização ainda maior do poder na Câmara dos Deputados. A base de sustentação do governo federal ficou mais fluida, movediça.

Só por isso, o governo Dilma Rousseff já teria muito interesse no que vai acontecer nas eleições de 2012. Mas não fica aí. O pleito será o primeiro teste real de popularidade da presidente. Mesmo que os problemas locais sejam mais relevantes na decisão do voto de prefeito do que as ações federais, o resultado das urnas será creditado ou debitado parcialmente na conta de Dilma. Sua imagem sairá fortalecida ou enfraquecida. É uma prévia de 2014.

O governo federal influencia a eleição de prefeitos com transferências preferenciais de verbas, priorizando obras, alimentando ONGs - como fazem também os governos estaduais. Mas Brasília tem um poder a mais, o de influir no clima geral da opinião pública, pelo que faz com a economia. Otimismo ou pessimismo nascem no bolso e dali se espalham até chegar ao dedo que tecla "confirma" na urna eletrônica.

Um eleitor otimista é mais propenso a reeleger seus governantes. O pessimista é mais aberto a mudanças. Portanto, é do interesse geral dos prefeitos candidatos à reeleição que a economia esteja aquecida no próximo ano. Assim como é do interesse de Dilma.

É difícil encontrar algo que se correlacione mais com a popularidade do presidente no Brasil do que a confiança do consumidor. Se esse índice sobe, a avaliação do governo federal tende a melhorar, e vice-versa. Dentre os itens que compõem a versão do índice divulgada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), dois têm correlação ainda maior: a situação financeira do entrevistado hoje (comparada ao período imediatamente anterior), e a expectativa do que deve acontecer com essa mesma situação financeira no futuro próximo.

A combinação desses dois indicadores, pesquisados mensalmente em sondagem CNI/Ibope, tem um coeficiente de correlação de 0,9 com o saldo de aprovação do governo federal. Grosso modo, é possível antecipar com 90% de acerto a tendência da popularidade de um presidente a partir desse índice composto - que poderia ser batizado de "bolso eleitoral".

O mais surpreendente é o quão mais forte é essa correlação entre o bolso e a popularidade presidencial do que entre a imagem do governo e os outros indicadores que compõem o índice de confiança do consumidor. O medo do desemprego tem correlação, mas significativamente mais fraca do que o "bolso eleitoral". E a expectativa de inflação simplesmente não se correlaciona com a popularidade presidencial. Oscilam frequentemente em direções opostas.

É mais um sinal de que o discurso da estabilidade econômica perdeu para o do crescimento. Talvez porque os últimos oito anos mostraram ser possível crescer sem perder o controle da inflação. Mais do que isso, esses anos de bonança criaram na opinião pública uma expectativa de que a capacidade de consumo não só pode como deve aumentar continuamente.

Quando o governo reativa o crédito, corta impostos sobre operações de financiamento e diminui a taxa de juros básica ele está tomando medidas para tentar reaquecer a economia e gerar mais consumo. O eventual aumento da atividade tem vários efeitos positivos para o próprio governo: aumenta a arrecadação de impostos e a disponibilidade de recursos para gastar.

Mas não dá para ignorar que a retomada do ritmo da atividade econômica também paga bônus eleitoral aos governantes ao elevar o nível de confiança do consumidor. Toda ação governamental gera uma reação na opinião pública. Não existe o ato de governar exclusivamente técnico. Quem governa são os políticos, não os tecnocratas.

Nem toda medida com impacto eleitoral é ruim em si. A adaptação da política econômica às circunstâncias é do jogo. Entre as circunstâncias estão o ambiente político e a opinião pública. Um governo com popularidade em baixa perde sustentação política e, por tabela, graus de liberdade para determinar sua própria política econômica.

O problema acontece quando os interesses eleitoreiros de curto prazo se chocam com o que é melhor para o País no longo prazo. Por ora, o governo Dilma tem espaço para administrar as contradições entre a pressão inflacionária e o ritmo do consumo. Mas nem sempre é assim.

Logo após o massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, Fernando Henrique Cardoso experimentou seu único momento de impopularidade durante o primeiro mandato presidencial. Logo que as mortes saíram das manchetes, FHC recuperou a boa imagem conquistada pela estabilidade econômica. Reelegeu-se meses depois. Porém, ele nunca recuperou a popularidade perdida pela desvalorização abrupta do real, logo no início do segundo mandato.

Os governantes se tornam escravos do próprio sucesso. Quando não o seguem, pagam por isso.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Democracias fazem guerra a democracias?:: Renato Janine Ribeiro

Em fevereiro de 1979, a China, comunista, invadiu o Vietnã, também comunista. Quatro anos antes, o Vietnã tinha vencido os Estados Unidos após um conflito de duas décadas - a única derrota deste último país em sua história. O mundo se surpreendeu com o fato de dois Estados marxistas entrarem em guerra. Muitos disseram: em compensação, democracias não fazem guerra a democracias. Essa seria uma de suas grandes qualidades.

Mas será verdade? Na Grécia, onde começou o governo pela maioria do povo, Atenas guerreou várias outras cidades que eram igualmente democráticas. É possível que sua derrota na longa guerra do Peloponeso (431-404 antes de Cristo) - que coincidentemente é seguida pela execução de Sócrates, o modelo dos filósofos, e pela decadência da cidade-Estado - se deva em larga parte ao que hoje chamamos de "dupla moral": para os nossos tudo, para os outros, nada. O caso de Roma é ainda mais flagrante. Foi durante séculos uma república poderosa, em que o povo tinha voz, ainda que limitada, perante os aristocratas. Mas jamais soube - ou quis - reconhecer aos povos que conquistou fora da Itália os mesmos direitos que tinham os cidadãos romanos. Daí que fosse, como explicou Hobbes, uma democracia para uso interno, e uma monarquia (diríamos hoje: uma ditadura) na relação com os países colonizados.

Modernamente, é verdade que nenhum país democrático invadiu outro que também o fosse. Mas a questão ateniense e romana continua presente: várias democracias adotam um padrão para uso interno e outro, bem diferente, para uso externo. Todo o colonialismo e, por que não dizer, imperialismo modernos assim se explicam. No século XIX, a Grã Bretanha, a França e os Estados Unidos já eram Estados democráticos - menos do que hoje, mas bastante. No entanto, negavam a outros países os direitos de seus cidadãos. Há coisa pior, porém.

Refiro-me às intervenções de alguns desses países para eliminar movimentos democráticos em nações subdesenvolvidas. O caso talvez mais grave, até porque o feitiço se virou contra o feiticeiro, é o do Irã. Em 1953, o primeiro-ministro Mossadegh, favorável a uma democracia em estilo ocidental, é deposto por um golpe promovido pela CIA. O episódio é bem estudado por Stephen Kinzer, em seu excelente "All the Shah"s Men". O xá volta ao poder, reprime ferozmente os rebeldes, prende Mossadegh (não ousa executá-lo) e - um quarto de século depois - é deposto por uma oposição religiosa que sequer existiria, caso a oposição leiga dos anos 50 tivesse podido se expressar. O que se segue - a teocracia islâmica - é pura culpa dessa agressão de um país democrático a um que tentava tornar-se democrático.

Ou pensemos no apoio dos Estados Unidos ao golpe contra João Goulart, presidente do Brasil, ou Salvador Allende, do Chile. Nos dois casos, tratava-se de países democráticos, com governos escolhidos segundo a Constituição em eleições limpas. Ora, subverter um regime, apoiar a deposição de um governo não são formas de fazer guerra? Então um regime democrático, o americano, guerreou outros, o brasileiro e o chileno, para não falar em muitos mais. Portanto, democracias fazem sim, na Antiguidade ou na era moderna, guerras umas a outras.

Que consequências podemos tirar desse fato? Primeira, se isto é um consolo, que entre si as democracias não fazem guerras explícitas, declaradas, como invasões. Se é verdade que "a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude", porque o desonesto se envergonha de sua desonestidade, então - pelo menos - os governantes democraticamente eleitos sabem que é feio atacar um regime democrático ou que se está democratizando. Faz alguma diferença, mas talvez seja pouca, porque a hipocrisia não impede o delito.

A segunda consequência é mais complicada. Digamos que a democracia é contagiosa, no melhor sentido do termo. Ela atrai. Então, quando uma democracia se fecha sobre si e nega direitos - seja a negros, a árabes, a mulheres, a quem for - ela se torna vulnerável e, pior, começa a sabotar a si mesma. Parece que uma democracia tende a ser aberta, integral, em expansão: não só amplia os direitos de quem a integra como, também, alarga o número dos que reconhece como pessoas, titulares de direitos. Aqui entra em cena o cosmopolitismo: a ideia, que vem do filósofo grego Diógenes, o Cínico, de que existe algo como um "cidadão do mundo", um "kosmopolites". Uma polis confinada em si mesma não faz sentido. Indo mais longe: é ou deveria ser da natureza das polis, dos Estados democráticos, serem amigos.

Não vivemos num mundo de conto de fadas, onde todas as democracias são gentis entre si. Mas a história mostra que os regimes populares do mundo antigo - a democracia ateniense e a república romana - sucumbiram por não saber integrar o dentro e o fora, os direitos reconhecidos a seus membros e o desprezo e exploração votados ao estrangeiro. Se a democracia é atraente e por isso tende a se hiperpovoar, isso não se resolve fechando-se suas portas ou, pior, reprimindo-se outros povos para que não a ameacem. Até porque novas democracias podem ser diferentes das que já existem. A democracia brasileira, sustento há tempos, coloca a necessidade de um afeto político democrático que rompa com uma tradição nossa do afeto autoritário, que até poucos anos prevalecia em nosso país. As democracias árabes, que poderão existir ou não, formulam novas perguntas. Não temos ainda as respostas mas - com toda a certeza - ela não virá negando-se o que conseguiram de democracia, porém somente o aumentando. Mesmo que isso implique riscos.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Ela voltou :: Elena Landau

Sou tucana, e como tal, reflito, repenso e volta e meia critico meu próprio partido. Às vezes, confesso, me dá vontade de dar uma de petista, ter opinião formada sobre tudo, mas não tem jeito: sou uma metamorfose ambulante, como diria Raul Seixas.

Meu maior desconforto com o PSDB sempre foi a tibieza do partido na defesa da privatização. Até muito recentemente, e após três campanhas presidenciais, o PSDB não apoiava abertamente o processo de desestatização nem defendia como deveria as grandes contribuições tucanas para a virada econômica que o país vivenciou nos últimos 15 anos. Na verdade, foi essa postura vacilante que permitiu ao PT usurpar a agenda tucana, a ponto de ignorar o Plano Real e criar o bordão lulista: "Nunca antes na história desse país..."
Mas as coisas parecem estar mudando. Em recente seminário realizado no Rio de Janeiro pelo Instituto Teotônio Villela, instituto de formação política do PSDB que agora entra em nova fase sob comando de Tasso Jereissati, foi apresentada uma nova agenda de discussão com temas sociais e econômicos. A tônica foi a má gestão de recursos públicos e a defesa da reestatização do Estado brasileiro. Economistas e políticos em suas falas fizeram uma diferenciação fundamental: são contra a privatização do Estado, hoje aprisionado pelos lobbies partidários e corporativos, ao mesmo tempo em que defendem claramente a privatização das empresas estatais. Aleluia, ela está de volta!

Nem poderia ser diferente. Na telefonia temos mais celulares que brasileiros. O celular, que já foi um bem de luxo, hoje é instrumento de trabalho e de inclusão social. No setor elétrico as evidências também são claríssimas. Uma visita ao site da Aneel, agência reguladora do setor elétrico, mostra que indicadores de qualidade e universalização melhoraram em todo país, inclusive no Nordeste, desde a privatização, enquanto no Norte, onde as empresas permanecem sob controle estatal, continuam péssimos, em total desrespeito ao usuário dessa região.Nenhum esforço para mudar esse quadro é feito, e a agência reguladora é inoperante frente às pressões políticas. Enquanto isso, para as empresas privadas, a mesma agência fiscaliza, pune e impõe multas para assegurar mais eficiência e qualidade, procurando cumprir seu papel. Melhor estaria o consumidor se as estatais deixassem de ser intocáveis e fossem punidas, como acontece no mundo privado. Outro caso a lamentar é o do saneamento, onde a privatização ainda nem chegou perto: 134 milhões de brasileiros não têm os esgotos de suas casas tratados e, pasmem, 8 milhões não têm sequer banheiros! O Brasil ocupa o 104º lugar no ranking de competitividade mundial da infraestrutura. Nos setores privatizados essa posição muda para 69º . em eletricidade e 57º em telefonia fixa. E mesmo em ferrovias, onde há muito a fazer ainda - e não é o trem-bala - estamos em 91º lugar. Mas o pior é na competitividade dos aeroportos, onde emplacamos uma lamentável 122ª posição!

A situação dos aeroportos é tão caótica que o governo petista, sem metáforas, anunciou a primeira privatização no setor. Mas para fazer tem que ser bem feito. A experiência petista com a concessão de rodovias é desastrosa: investimentos não foram realizados e o número de vítimas não diminuiu. Em geral, o modelo que eles usam é o de privatizar as obras, mas manter a gestão das empresas com o governo. Se a gestão caótica da Infraero for mantida o usuário vai ser beneficiado? É preciso transferir a gerência para o setor privado, livrando as empresas das pressões políticas e da ineficiência natural que elas impõem às estatais brasileiras. Daí a agenda: estatizar o Estado e privatizar as empresas.

Elena Landau é economista.

FONTE: O GLOBO

Transposição tem prejuízo de R$ 8,6 milhões

Última auditoria do TCU foi concluída em maio, e nenhuma medida corretiva foi implementada

Vannildo Mendes

BRASÍLIA - Superfaturamento de preços, fiscalização omissa e atraso injustificável nas obras foram os principais problemas encontrados na última fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) no eixo leste do projeto de transposição do Rio São Francisco. A auditoria foi feita de junho/2010 a maio/2011 e os problemas, relatados ao Ministério da Integração Nacional, que até agora não adotou providências para ressarcir os prejuízos, estimados em R$ 8,6 milhões à época.

Principal vitrine do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que turbinou a votação da presidente Dilma Rousseff no Nordeste, o projeto exibe sinais de abandono em vários trechos, com estruturas de concreto estouradas, rachaduras e vergalhões de aço retorcidos, como mostrou reportagem do Estado ontem. Este é o quinto ano seguido em que o TCU encontra graves problemas na obra, que já excedeu o orçamento original em mais de 30% e, na melhor das hipóteses, será concluída com cinco anos de atraso.

O relatório do tribunal, entregue há seis meses, também determinava que o Ministério obrigasse as empreiteiras do consórcio encarregado por cinco trechos licitados no eixo leste a retomar imediatamente as obras. Como isso não ocorreu, o desgaste dos trechos aumentou e o prejuízo ao erário, também. O Ministério informou que a conservação do que já foi feito é responsabilidade das empresas e que já as acionou para refazer o que está se deteriorando.

O eixo leste, visitado pelo Estado, abrange uma população de 4,5 milhões de habitantes em 168 municípios de Pernambuco e da Paraíba. A integração do velho Chico às bacias dos rios temporários do semiárido nordestino será possível com a retirada de 26,4 m3 de água por segundo, ou 1,42% da vazão medida na barragem de Sobradinho. Desse total, 10 m3 vão para o eixo leste.

Entre os problemas detectados, um britador foi instalado a 4 km da pedreira, encarecendo desnecessariamente o custo de transporte das pedras para processamento. Constatou-se ainda que um desvio de 30 metros no traçado original do canal encareceu o custo das desapropriações. Problemas na área de fiscalização geraram, além de danos ao erário, baixa qualidade nos serviços, o que favoreceu a rápida deterioração das estruturas.

Conforme o relatório, houve superfaturamento em alguns itens em razão de quantitativos inadequados e ausência de planejamento eficiente das obras para minimizar custos, como o do transporte de materiais. Essa etapa da obra, iniciada em 2008, está orçada em R$ 1,3 bilhão, dos quais R$ 609 milhões estão inseridos no Orçamento de 2011.

As obras vistoriadas apresentavam, em média, cerca de 57% de execução, quando deveriam ter 97%. Além dos atrasos, foi observada a paralisação de lotes à revelia do governo, sem que fossem adotadas medidas contratuais pelo Ministério. "Trata-se de irregularidade grave, que vem ocorrendo desde o início do Projeto", anota o relatório.

Apesar da gravidade dos achados, o TCU não determinou a paralisação das obras, permitindo que os trabalhos prossigam enquanto o Ministério adota as medidas corretivas, até agora não implementadas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Poema em linha reta :: Fernando Pessoa

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Álvaro de Campos