segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

OPINIÃO DO DIA – Luiz Werneck Vianna – presidenciáveis

A oposição mal começa a reunir forças, não conhece um comando único, nem sequer são enunciadas as linhas gerais do seu diagnóstico sobre o estado social da Nação, sobretudo o seu programa alternativo de governo ao que aí está. Sabe-se, de certo, do seu empenho em elucubrações em matéria de análise econômica, trincheira em que é agente passivo, mera observadora dos fatos que, mantidos na toada atual, principalmente quanto à inflação, poderiam fazer a roda da fortuna girar a seu favor.

Se os eventuais candidatos à Presidência, nem todos vinculados à oposição formal, tal como a reconhecemos no momento atual, preferem atuar em surdina, esperando os prazos rituais, quais as razões da pressa no partido hegemônico no poder, em que já se ultimam preparativos de caravanas nos moldes de campanhas eleitorais do ex-presidente Lula, hoje condestável da presidente Dilma?

In. Luiz Werneck Vianna, sociólogo, professor-pesquisador da PUC-Rio. ‘2014 à vista’, O Estado de S. Paulo, 16/2/2013

Manchetes de alguns dos principais jornais do país

O GLOBO
Sem competitividade - Indústria do país perde US$ 14 bi em exportações
Depois do show de Ivete, o desabamento
Loucura atrás das grades: Sinais de tortura em manicômios
Correa se reelege com 61% dos votos

FOLHA DE S. PAULO
Rafael Correa vence eleição com folga no Equador
Bando com 18 veículos invade centro logístico e leva celulares
Brasil registra três incidentes aéreos a cada quatro dias
No submundo da internet, mercado fatura com drogas
Governo do Rio oculta 35 dias de viagens de Cabral

O ESTADO DE S. PAULO
TRE paga R$ 5,3 milhões em bônus a 41 servidores
Crise ameaça usinas de cana do País
Governador de SC admite erros antes de ataques

VALOR ECONÔMICO
Saldo comercial deixa de cobrir déficit de serviços
Ibama notifica construtoras de Belo Monte
Investidor em título público agora perde
Duplicação de rodovias terá R$ 7 bilhões

BRASIL ECONÔMICO
Fundos de pensão poderão entrar nos novos leilões de aeroportos
Possível alta dos juros básicos tira ações de bancos do marasmo
Belo Horizonte busca empresa para gerir parque tecnológico

CORREIO BRAZILIENSE
A escalada do tráfico de drogas no Plano Piloto
Duro golpe na violência doméstica
Orgia de gastos na Câmara
As estratégias de Dilma contra os potenciais rivais

ESTADO DE MINAS
Custo de vida no interior já é maior que em BH
Lei Seca tira seguro de carro em acidente
A morte lenta do Velho Chico: Veneno desce pelo Rio

O TEMPO (MG)
Bairros no limite de cidades viram "terra de ninguém"
Base e oposição em Minas disputam o comando da AMM
Crise atinge quase 20% das usinas de de açúcar e etanol

GAZETA DO POVO (PR)
Paraná tem 209 bombeiros para fiscalizar 399 municípios
Congresso vai decidir nesta semana como votar 3 mil vetos
TC quer “pente fino” em gastos com publicidade
Blogueira cubana consegue viajar ao Brasil
Cartilha tira dúvidas sobre relacionamento com bancos

ZERO HORA (RS)
Os próximos passos da guerra ao crime em SC
Mensalidades escolares sobem acima da inflação

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Aposentadoria pode mudar de novo
Novo partido

Planalto se arma na volta do Congresso

Governo quer evitar derrubada de vetos, e Orçamento pode ter votação adiada

Cristiane Jungblut

BRASÍLIA - Depois de quase duas semanas de "férias" sem votações, e com o feriado prolongado do carnaval, o Congresso retoma hoje os trabalhos com o impasse em relação à votação do Orçamento da União de 2013 e dos três mil vetos presidenciais. A votação do Orçamento, marcada inicialmente para amanhã à noite, corre o risco de ser adiada pela própria operação do governo, que quer primeiro que o Supremo Tribunal Federal (STF) tome uma decisão final sobre a tramitação dos vetos.

A prioridade do Palácio do Planalto é impedir a votação dos vetos, e por isso o governo marcou uma reunião de emergência para hoje à tarde para discutir os dois temas. Entre os líderes aliados, alguns apostam no adiamento da votação do Orçamento por causa do pedido do governo, mas outros querem fazer prevalecer a autonomia do Legislativo. Já a oposição exige o cumprimento do acordo feito na semana passada, informalmente, com os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN): votar os três mil vetos — em bloco, com votação em separado apenas do veto dos royalties do petróleo — e, em seguida, o Orçamento.

Os líderes governistas devem se reunir hoje à tarde, no Palácio do Planalto, com a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, para definir a estratégia e cpmo proceder no caso dos vetos e do Orçamento. A posição do Planalto foi explicitada na última sexta-feira, quando o ministro da Advocacia Geral da União (AGU), Luiz Inácio Adams, pediu ao Supremo que tome uma decisão final, de plenário, sobre a tramitação dos vetos. Ao visitar o Supremo, naquele dia, Adams defendeu que o Orçamento só seja votado depois que o STF se pronunciar.

O governo espera que o Supremo mantenha a decisão do ministro Luiz Fux de que os vetos devem ser apreciados em ordem cronológica. Mas Fux disse, em comunicado posterior, que os vetos não impediam a votação do Orçamento, numa interpretação polêmica do próprio texto da Constituição.

Segundo fontes do Planalto, o governo aposta numa decisão favorável do Supremo, no sentido de impedir a derrubada de vetos primordiais, como o que trata do fim do fator previdenciário e de matérias tributárias. Nestes casos, o prejuízo seria de R$ 471 bilhões com a derrubada dos vetos.

"Governo faz terrorismo"

Pela oposição, o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), disse que o Legislativo não precisa esperar o Supremo para decidir o que fazer.

— O que o governo está fazendo, por meio do ministro Adams, é terrorismo, dizendo que vai haver prejuízo de quase meio trilhão com a derrubada dos vetos. Ninguém é irresponsável — disse Caiado.

Já o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), aposta no adiamento da votação no Congresso.

— Acredito que não votemos. Só devemos votar o Orçamento se houver o destrancamento da pauta pelo Supremo, julgando os recursos do Senado ou da AGU. A bola está com o Supremo.

O governo ainda terá reuniões, entre hoje e amanhã, com líderes aliados sobre a Medida Provisória dos Portos. O Planalto quer evitar que ela seja desfigurada com a enxurrada de emendas que recebeu.

Fonte: O Globo

PSDB abre ciclo de seminários para discutir rumos em São Paulo

SÃO PAULO - O presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra, abre hoje o ciclo de encontros que o diretório paulista do partido fará em preparação ao congresso estadual da sigla em São Paulo, no dia 28.

O PSDB busca se reorganizar depois da derrota da legenda nas eleições de São Paulo no ano passado e se prepara para a campanha que tentará reeleger Geraldo Alckmin (PSDB) em 2014 diante de um PT fortalecido com as vitórias na capital e nas principais cidades da região metropolitana.

Guerra, que deve ser sucedido na presidência do partido pelo senador Aécio Neves (MG) em maio, vai falar sobre os "novos rumos" do PSDB.

O candidato derrotado à Prefeitura de São Paulo, José Serra, apesar de ser um dos nomes mais fortes dos tucanos no Estado, não foi incluído entre os palestrantes dos encontros, que prosseguem nas próximas duas semanas.

O grupo de Serra fica mais enfraquecido com a provável transferência do deputado federal Walter Feldman para o partido que a ex-senadora Marina Silva pretende criar

Fonte: Folha de S. Paulo

Congressistas adiam transferência a novo partido de Marina

Políticos temem que a Rede, nome dado à legenda, não consiga ser oficializada para concorrer às eleições

Para ser criado e poder concorrer em 2014, partido precisa de 500 mil assinaturas em 9 Estados até setembro

Márcio Falcão

BRASÍLIA - Com receio de que o novo partido da ex-senadora Marina Silva não consiga ser oficializado para concorrer às eleições de 2014, parlamentares que estavam em negociação decidiram adiar a mudança para a Rede, nome escolhido para a legenda.

A ideia de Marina e seus interlocutores é fazer uma nova rodada de conversas quando o cenário para formalizar o partido estiver mais claro.

Para ser criado, a Rede precisa recolher 500 mil assinaturas em pelo menos nove Estados. Esse processo precisa ser concluído até setembro deste ano para que a nova sigla seja credenciada para participar das eleições de 2014.

A ex-senadora e colaboradores admitem que a coleta de assinaturas para a criação da sigla é um desafio, mas apostam na mobilização, especialmente pela internet, para tirar a legenda do papel.

A expectativa de Marina era apresentar no lançamento da Rede uma bancada de pelo menos seis deputados federais, mas só três foram anunciados como fundadores: Domingos Dutra (PT-MA), Walter Feldman (PSDB-SP) e Alfredo Sirkis (PV-RJ).

Também já anunciaram o embarque a deputada estadual Aspásia Camargo (PV-RJ) e os vereadores Ricardo Young (SP), Jefferson Moreno (RJ) e Heloísa Helena (AL).

A Rede também conversou com os deputados Ricardo Tripoli (PSDB-SP), Reguffe (PDT-DF) e Alessandro Molon (PT-RJ), além do senador Eduardo Suplicy (PT-SP) e da ex-senadora Serys Slhessarenko.

Serys disse que teve conversas preliminares com a equipe de Marina e que estava esperando a consolidação do novo partido. "A gente tem de esperar consolidar as questões aqui e depois ver a questão eleitoral", afirmou.

Reguffe circulou pelo local e prometeu ajudar na coleta de assinaturas. "Não pretendo sair do PDT, mas vou ajudar a recolher assinaturas porque é justo e democrático que a Marina possa disputar a Presidência", disse.

Suplicy seguiu o mesmo discurso e até assinou a ficha para a criação do partido. Ao lado de Marina e Heloísa Helena, ele afirmou que ficou "tentado a cair na Rede", mas disse que se comprometeu a permanecer no PT enquanto o partido aderir a suas propostas, como a renda mínima e a transparência nos gastos do governo.

Por ora, a ordem na futura legenda é minimizar a ausência de estrelas da política. A ex-senadora, em entrevista concedida anteontem, disse que não haverá "recrutamento" de parlamentares.

"Ninguém está à caça de parlamentar, nem fazendo tudo para ter bancada. As pessoas virão por identidade programática, por coerência com as regras da Rede. Muitos dos nossos aliados continuarão em seus próprios partidos."

O estatuto do futuro partido prevê pontos polêmicos para sua bancada, como o limite de uma reeleição e a exigência de que só poderá assumir cargo no Executivo quem renunciar ao mandato parlamentar.

Fonte: Folha de S. Paulo

Eduardo acena para o Rede, de Marina

Rumo a 2014. Governador afirma que PSB manterá "diálogo e cooperação" com o novo partido capitaneado pela ex-senadora, que também busca viabilizar seu projeto presidencial

A máxima de que política é feita de gestos é levada como regra pelo governador Eduardo Campos (PSB). Interessado em ver o cenário da sucessão presidencial cada dia mais embaraçado para a presidente Dilma Rousseff (PT) - embora jamais admita esse desejo publicamente -, o líder socialista enviou uma carta de apoio ao "Rede Sustentabilidade", agremiação criada pela ex-senadora Marina Silva, que na última eleição presidencial surpreendeu abocanhando 20% dos votos e empurrando a disputa para o segundo turno.

No documento, Eduardo diz querer estabelecer um canal de diálogo e cooperação com a nova legenda. Ele considera urgente o debate proposto pelo Rede Sustentabilidade. "Entendemos que a construção deste novo partido será de grande contribuição ao urgente debate que nossa sociedade reclama e queremos afirmar o nosso propósito e a nossa determinação de manter canais de diálogo e de cooperação. A luta que nós do PSB abraçamos há mais de meio século recebe agora um importante aliado, liderado por Marina Silva", destaca.

Com as palavras, o habilidoso governador acena também aos 903.655 pernambucanos que nas eleições presidenciais de 2010 escolheram Marina nas urnas do Estado. Foi o melhor desempenho dela como candidata em toda a região Nordeste. Entre os recifenses, 36,73% votaram na fundadora do Rede Sustentabilidade, enquanto 42,92% votaram em Dilma, para quem Eduardo militou.

O PSB enviou o documento pelo secretário estadual de Meio Ambiente, Sérgio Xavier, que o leu no último sábado durante evento de lançamento do novo partido, em Brasília. "Na jovem democracia brasileira, porém, mais incipiente ainda é a nossa cultura partidária, sendo extremamente desafiador o trabalho de todos aqueles que se empenham em fundar, estruturar e consolidar um partido político, como sabemos todos que nos dedicamos à tarefa de fazer do nosso PSB uma instituição forte, coesa e comprometida com a construção de um país justo, soberano e socialmente equilibrado", exaltou Eduardo, diplomático.

No último dia 31, Campos recebeu para um reunião o deputado federal Alfredo Sirkis (PV-RJ), que se integrará à nova legenda e possivelmente formará a executiva do Rede Sustentabilidade. O carioca saiu da reunião defendendo uma aproximação entre o governador e a ex-senadora. "Quanto mais candidatos com a ideia de modernização do Estado, melhor. Mas não vejo como seria possível uma chapa dos dois. Tanto a Marina ser vice depois de ter obtido 20% dos votos, como o Eduardo Campos ser vice", escreveu Sirkis em seu blog.

Fonte: Jornal do Commercio

PSB prepara visita de Campos ao RS

Governador de Pernambuco, ainda pouco conhecido no Brasil, começa na Capital roteiro de preparação para disputar o Planalto

Caue Fonseca

De olho nas eleições de 2014, o PSB começa a preparar terreno para a visita do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, ao Rio Grande do Sul, em abril. Potencial candidato à Presidência e principal estrela do partido, Campos será um dos palestrantes do 26º Fórum da Liberdade, na Capital, e aproveitará a oportunidade para apresentar suas credenciais ao empresariado gaúcho.

A passagem por Porto Alegre será o ponto de partida de uma série de visitas pelo Brasil para torná-lo conhecido fora de seu reduto eleitoral, onde foi reeleito com 83% dos votos válidos. Além de palestrar no Fórum, o neto do ex-governador Miguel Arraes – de quem herdou a paixão pela política – conversará com empresários no Tá na Mesa, evento da Federasul.

A escolha não se dá por acaso. Entusiasta declarado das parcerias público-privadas (PPPs) e da meritocracia no governo, Campos vem adotando um modelo de gestão identificado com o mundo dos negócios e atraindo empreendimentos para seu Estado.

– Os empresários costumam dizer que nosso governo tem o ritmo de uma empresa. É proativo e rápido na resolução de gargalos – diz o jornalista Evaldo Costa, que trabalhou com Arraes, conhece Campos desde pequeno, quando ainda era apenas "Dudu", e hoje é seu secretário de Imprensa.

O PSB quer amplificar a imagem de "gestor competente" atribuída a Campos em Pernambuco.

– No RS, gostamos de resultado, não de conversa. Campos tem o fundamental: currículo, ficha limpa e coisas para mostrar – argumenta o deputado federal Beto Albuquerque (PSB).

Principal interlocutor do pernambucano no Estado, Beto fala abertamente na chapa à Presidência. Campos é visto como uma terceira via na polarização PT-PSDB. Aliado de Dilma Rousseff, o governador é mais cauteloso e não confirma a candidatura.

Mas Campos não é unanimidade. Entre seus críticos, é classificado como controlador e intransigente. Ganhou a alcunha de "coronel". O apelido chegou a ser citado em reportagem recente na revista The Economist. Em 2011, Campos conseguiu emplacar a própria mãe, a então deputada federal Ana Arraes (PSB-PE), para uma vaga de ministra do Tribunal de Contas da União (TCU).

Fonte: Zero Hora (RS)

As estratégias de Dilma contra os potenciais rivais

A presidente, Lula e o PT apostam no constrangimento de aliados que cogitem aderir a projetos alternativos liderados pelo governador Eduardo Campos e pela ex-ministra Marina Silva.

Estratégia de Dilma é constranger os aliados

No jogo da corrida pelo Planalto, PT promoverá eventos com objetivo duplo: exaltar as realizações dos governos petistas e fazer com que a base aplauda as conquistas. Dessa forma, a presidente terá munição contra quem cogitar desembarcar do projeto da reeleição

Denise Rothenburg, Helena Mader

Um evento para comemorar os 10 anos de governo do PT nesta quarta-feira é considerado por aliados e até adversários como a largada da campanha reeleitoral de Dilma Rousseff em duas frentes. A primeira, é propagandear as realizações desse período. A outra, começar a constranger os integrantes da base governista que cogitem aderir projetos alternativos. Em conversas reservadas, estrategistas ligados ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a Dilma consideram que, no momento em que um aliado aplaude o que vem sendo feito na gestão petista e tudo é devidamente registrado, fica mais difícil alguém da base sair desse projeto, porque estará sem discurso. E é esse jogo que começa esta semana.

Até agora, há dois potenciais adversários fora da oposição tradicional que preocupam o PT. O governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos, e a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, que, no sábado, lançou as bases de seu novo partido — a Rede Sustentabilidade —, num encontro que reuniu cerca de 1,5 mil pessoas em Brasília. “Marina não nos mete medo. Nossa prioridade é reeleger a Dilma e fortalecer o PT. Quem quiser ser candidato, tudo bem. Marina não tem nada na cabeça, não tem ideologia. Eduardo Campos tem. É nosso aliado. Tem o direito de querer ser candidato. No entanto, precisa saber que o mesmo risco que corre o pau, corre o machado”, diz o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP).

O parlamentar é um dos poucos a dizer abertamente o que pensa a respeito das duas pré-candidaturas. Ele não acredita que petistas migrarão para o partido de Marina, embora muitos tenham desfilado no evento de lançamento da Rede. A aposta de Devanir, entretanto, faz sentido, porque, a esta altura do campeonato, ainda é incerto que Marina consiga vencer os entraves burocráticos para formalizar a Rede até setembro deste ano, ganhando, assim, passe-livre para concorrer às eleições de 2014.

O presidente do PT de São Paulo, deputado estadual Edinho Silva, vai na mesma linha de Devanir: “Estou entre os que defendiam que havia espaço no PT para a volta da Marina, porque o debate que ela propõe, de sustentabilidade, é uma das grandes prioridades do PT atualmente. Temos que respeitar a opção dela, mas não acredito que o nosso partido perderá quadros”, avalia. Edinho, no entanto, vê com mais naturalidade do que outros petistas o surgimento de novas apostas na política. “O partido não pode reagir às movimentações políticas. O PT tem a sua lógica, e não deve tomar atitudes que sejam de reação. Nossa prioridade é avançar na construção do governo Dilma e priorizar o fortalecimento nos estados”, garante.

Edinho Silva sonha com a manutenção da aliança com o PSB de Eduardo Campos. “Acho difícil que haja uma ruptura entre o PT e o PSB para 2014. O Eduardo Campos deve continuar na coalizão do governo Dilma, porque é uma liderança reconhecida e valorizada pelo PT, uma liderança muito leal a tudo o que o PT construiu, especialmente ao (ex) presidente Lula. Vejo Eduardo Campos como um grande aliado.” O petista nega que o evento em comemoração aos 10 anos do partido no governo, marcado para a próxima quarta-feira, em São Paulo, tenha como objetivo fortalecer a legenda para fazer frente ao crescente número de rivais em potencial. “Isso aqui não tem nada a ver com eleição, queremos comemorar os 33 anos do partido e os 10 anos de governo do PT”, diz.

O evento de São Paulo, entretanto, será o primeiro de uma série que o partido fará Brasil afora, com destaque para a Região Nordeste, sede da primeira reunião nacional do PT este ano (leia quadro ao lado). O ex-presidente Lula pretende aproveitar o encontro no Ceará — governado por Cid Gomes (PSB) — para atrelar o socialista à reeleição de Dilma. A iniciativa servirá para tirar fôlego de uma pré-campanha de Eduardo Campos no plano interno.

Infiltrados

Dentro do PT, há o receio de que Eduardo Campos acabe sendo levado a admitir uma candidatura com o discurso do tipo “meu partido deseja e esse projeto não é meu, é do partido”. Para evitar que isso ocorra, a ideia de Lula é cercar o PSB desde já. Iniciativas semelhantes a essa com Cid Gomes devem se repetir ainda no Piauí, também governado pelo PSB. Em breve, deve ser agendada ainda uma visita a Renato Casagrande (PSB), governador do Espírito Santo. Casagrande está no primeiro mandato e é candidato à reeleição no ano que vem. Há quem diga que, embora seja um dos mais próximos a Eduardo Campos, a aposta do PT é a de que Casagrande pode jogará contra a candidatura própria da sigla a presidente em 2014, de forma a segurar seu projeto estadual.

Esses três casos indicam que o PT buscará formas de encantar os socialistas nos estados a seguir no projeto da reeleição Dilma Rousseff. Assim, Eduardo Campos passaria a ter, dentro de “casa”, aliados infiltrados especialmente para defender a candidatura da presidente Dilma Rousseff. Os socialistas, entretanto, duvidam que o PT tenha sucesso nessa empreitada, e não tratam a presidente Dilma como adversária. “Não somos adversários da reeleição de Dilma. Os adversários são as circunstâncias que estão aí. O PT precisa saber que tem gente torcendo que ela vá mal, mas não é esse o nosso caso. O PT tem que se preocupar menos conosco e mais com os problemas do Brasil”, responde o líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque (RS), com um alerta direto aos petistas no sentido de trabalhar mais e fazer menos política para manter os aliados.

Pé na estrada

Confira a programação partidária de Dilma e Lula prevista para as próximas duas semanas

São Paulo

Na próxima quarta-feira, a presidente Dilma Rousseff desembarca em São Paulo. Ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela participará de um evento em comemoração pelos 10 anos do PT no governo federal e pelos 33 anos do partido. O encontro vai reunir integrantes do diretório nacional da legenda, além de cerca de mil militantes de todo o Brasil. A celebração do PT é vista como uma oportunidade para reafirmar publicamente a união da legenda em torno de Dilma e refutar as suspeitas de que haveria uma crise ética na sigla por conta do julgamento do mensalão.

Ceará

Em 1º e 2 de março, haverá uma reunião do diretório nacional do PT em Fortaleza. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é esperado para a reunião e existe uma grande expectativa de que Dilma também compareça ao evento. Assim como o encontro em comemoração aos 10 anos do PT no governo, que será realizado em São Paulo, o evento de Fortaleza também deve celebrar a data.

“Marina não tem nada na cabeça, não tem ideologia. Eduardo Campos tem. É nosso aliado. Tem o direito de querer ser candidato. No entanto, precisa saber que o mesmo risco que corre o pau, corre o machado” (Devanir Ribeiro, deputado do PT-SP)


“Não somos adversários da reeleição de Dilma. Os adversários são as circunstâncias que estão aí. O PT precisa saber que tem gente torcendo que ela vá mal, mas não é esse o nosso caso. O PT tem que se preocupar menos conosco e mais com os problemas do Brasil” (Beto Albuquerque, líder do PSB na Câmara)

Fonte: Correio Braziliense

Rede pede ajuda ao PSD e PMDB para barrar projeto

Caio Junqueira

BRASÍLIA - O partido que a ex-candidata a presidente da República Marina Silva lançou sábado em Brasília propõe uma nova forma de fazer política, mas já recorre a políticos tradicionais para tentar intermediar seus interesses no Congresso Nacional.

O ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, e integrantes do PMDB, por exemplo, já foram procurados para auxiliar a barrar a tramitação de um projeto que pode ser fatal para que a Rede de Marina prospere.

Trata-se do projeto de lei 4.470 de 2.012, que veda a partidos que ainda não tenham passado por uma eleição o direito à repartição do fundo partidário e ao tempo de televisão. Isso mesmo que parlamentares tenham migrado para ele.

O projeto, de autoria do deputado Edinho Araújo (PMDB-SP), foi uma resposta do Congresso à criação do PSD, que desidratou diversas legendas país afora. Só na Câmara, mais de 50 deputados migraram para o partido de Kassab. Suas maiores vitórias, porém, foram decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que reconheceram o direito da sigla ao tempo de rádio e televisão e ao fundo partidário, proporcionais ao tamanho da bancada federal.

Com receio de que novos partidos fossem criados, foi elaborado o projeto de lei de Araújo, do qual Kassab foi grande avalista. Tanto que uma das condições para que sua bancada apoiasse a candidatura de Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) a presidente da Câmara era de que o texto fosse aprovado. Em outubro Alves, então líder do PMDB, apresentou um requerimento em que pede urgência na apreciação do projeto. Eleito presidente, a expectativa é de que articule sua aprovação.

Para evitar esse cenário, a Rede delegou a um dos seus fundadores, o deputado Walter Feldman (PSDB-SP), o papel de articular no ambiente político, em especial no Congresso, a não aprovação do texto. "Se esse projeto for aprovado seria um desastre, seria dramático, seria um golpe. Um golpe com certeza", disse ao Valor. Em razão disso, ele iniciará um ciclo de conversas com lideranças partidárias no Congresso. Já conversou inclusive com Kassab, de quem foi secretário municipal, e com Araújo. "Falei que o partido novo é um movimento que parte da sociedade, que não pode ser barrado. Que não pode haver uma barreira imposta por quem tem interesses específicos que é exatamente a manutenção das suas estruturas." Segundo ele, não houve sinalização dos dois. Ele apenas o ouviram "respeitosamente".

Feldman também disse que tentará neutralizar rejeições a Rede. "Vamos não só divulgar esse novo modelo, mas dar início a um processo de articulação política para que tenhamos sucesso em setembro (prazo final de filiações). Isso significa conversar com o Parlamento para que compreenda a necessidade de oxigenar a democracia."

Alguns obstáculos, contudo, já são avistados. O mais evidente deles é que os simpatizantes da Rede no Congresso -Feldmann inclusive- atuaram contra a eleição de Alves e do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Não à toa, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), avalia que a criação da Rede é um estímulo para que o projeto seja aprovado. "Esse lançamento facilita a aprovação, porque ninguém quer criar mais uma oportunidade para dividir tempo de televisão e fundo partidário", afirmou. Disse ainda que a tendência é de que o projeto seja aprovado com uma emenda que estabeleça uma "janela" para troca de partidos. Sem que isso, contudo, afete a distribuição do tempo de TV e do fundo partidário.

Por outro lado, a maior bancada da Câmara é contra o projeto. "Não tem sentido aprovar esse projeto. O que o Congresso precisa é fazer uma ampla reforma política que mexa com todo o sistema. Não podem haver medidas casuísticas que resultem na aprovação de um projeto em cima ou que permitam a criação de partidos em cima da hora e sem programa definido", declarou o líder do PT, José Guimarães (CE).

No sábado, durante o primeiro ato da programação de lançamento da Rede em Brasília, intelectuais da nova legenda deixaram claro a necessidade de rejeitar purismos na política -apesar de todas as críticas feitas ao longo do dia a políticos com histórico ético questionável. Na mesa de debates estavam Ricardo Abramovay, professor de economia da Universidade de São Paulo; Eduardo Viola, cientista político da Universidade de Brasília; Carlos Nepomuceno, jornalista; e a própria Marina.

Coube a Abramovay colocar em questão os grandes desafios da Rede. "Como criar uma sigla a partir de uma tradição em que partidos revolucionários se criam e acabam traindo seus melhores ideais em razão das exigências do realismo político?" Ou: "É possível a formação de coalizões atuando com a ética da convicção ou isso é uma vã ilusão sonhática?" Nas respostas, a redenção à realpolitik. "Não podemos ter a ilusão de sacralização de qualquer organização. Pessoas virtuosas criam instituições virtuosas que corrigem as pessoas quando elas falham. Somos falhos. A sociedade sabe disso. Somos pessoas falhas na busca de uma instituição virtuosa para nos corrigir quando falharmos", disse Marina.

Para Viola, a democracia representativa dos moldes atuais deve ser valorizada. Nepomuceno colocou que o atual modelo político, egresso das revoluções francesa e da independência americana, serviu muito bem ao país, embora esteja em xeque com a chegada da internet.

Fonte: Valor Econômico

O Orçamento, os vetos e a Constituição - Marcus Pestana

E não adianta buscar bodes expiatórios nas oposições.

A ressonância daquilo que acontece dentro do Congresso é baixa. O nível de acompanhamento desenvolvido pela população sobre seus representantes é frágil. O resultado é que, muitas vezes, as informações ou não chegam à sociedade ou chegam de forma distorcida.

A democracia não pode prescindir de um Congresso sólido e legitimado. O Congresso é a casa que gera as leis que regulam a vida social no país. Duas são as leis mais importantes na democracia moderna: a Constituição e o Orçamento. São marcos do rompimento com o poder absoluto da monarquia.

O Congresso brasileiro não conseguiu, por desarticulação política do governo Dilma e inércia de sua base de sustentação, votar o Orçamento da União para 2013. E não adianta buscar, nas oposições, bodes expiatórios, já que elas têm menos de 25% de senadores e deputados. Isso traz evidentes prejuízos à execução das ações governamentais e leva o governo a práticas heterodoxas. Haverá a tentativa de votar o OGU/2013 nos próximos dias.

Mas há uma pedra no caminho. Há 13 anos o Congresso Nacional não aprecia os vetos presidenciais, deixando o processo legislativo inconcluso. Nessa dinâmica, o Congresso perdeu papel e poder e o Executivo se agigantou, já que pode editar MPs com vigência imediata e que, se modificadas pelo Congresso, podem sofrer vetos, que não são jamais apreciados. Um verdadeiro presidencialismo imperial.

No evento da votação do veto à lei que tratava dos royalties do petróleo, o dedicado deputado Alessandro Molon (PT-RJ), provocou o Supremo e conseguiu decisão liminar do ministro Luiz Fux, determinando que o veto só pudesse ser votado após os outros mais de 3.000 represados desde o ano 2000. Abriu-se uma janela de oportunidade para que resgatássemos o respeito à Constituição e às prerrogativas do Congresso Nacional.

O Artigo 66 da Constituição diz em seu parágrafo 6º: "Esgotado sem deliberação, o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final...". Simples e claro assim: as demais proposições, e não apenas os demais vetos.

Muito vai-se falar e ouvir sobre o assunto nesta semana, mas o essencial que está em jogo é a defesa da democracia, da Constituição - seu pilar essencial - e as prerrogativas do Congresso Nacional, sua instituição basilar. Não se trata de uma obstrução obtusa ao Orçamento nem de uma estratégia irresponsável e oportunista para derrubar vetos antigos de grande repercussão financeira e social.

Em tempos de arroubos totalitários bolivarianos, a liberdade e a democracia exigem nossa eterna vigilância. Atropelar a bússola maior da democracia é abrir perigoso precedente. Ou a Constituição vale ou não vale, e aí, a democracia corre risco.

Na promulgação da Constituição de 1988, Ulysses Guimarães disse: "A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia". Não é possível tergiversar sobre isso.

Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG)

Fonte: O Tempo (MG)

Futuro à vista - Wilson Figueiredo

Estará redondamente enganado quem insistir em não ver que nada de razoável se pode esperar do país que se aproxima da última fronteira da democracia, sem se dar conta do perigo: sem sinal de vida na oposição (e na contramão da história), a volta ao ponto de partida toma a feição de fatalidade. Mais uma.

Afinal, atravessamos com saldo insuficiente a etapa subentendida como social-democrática e outra petista, igualmente frustrantes para quem esperava mais de ambas, e não do mesmo. Qual seja: sem o cidadão se dar conta de viver um círculo vicioso que o devolve ao ponto de partida e o condena ao eterno recomeço como destino. É hora de repensar.

Pois por aí, acorrentados a um círculo vicioso, três dezenas de partidos políticos ainda não se fartaram do indigesto equivoco de aproveitar a oportunidade como se a solução obsoleta ainda se aplicasse. Os insatisfeitos com as benesses do mandato cogitam abertamente de outra fornada de partidos de ocasião. Já é provocação.

Não é por acaso que os partidos políticos, suficientemente desgastados, passaram a ser referidos, nos meios de comunicação, como siglas que soletram menos do que o próprio nome. Será o fim da picada se o que está por trás não vier a ser indício de que algo ainda pior está à espreita. Afinal, os cidadãos são a mão de obra de que as democracias dispõem. E eleições oferecem a oportunidade. Crises, tanto faz, sejam econômicas ou políticas, espreitam o baixo custo da moralidade (pelo menos) pública. Mais de trinta partidos políticos entorpecem o regime representativo, agravado pela carência de uma oposição vigorosa e, como popularmente se diz, sem rabo preso. Não faz sentido político acreditar que, sem a sintonização com a moralidade pública, qualquer sistema de governo possa durar mais do que a oportunidade de mostrar a que veio. E deixar se fartarem seus beneficiários, diretos e indiretos.

A sucessão se aproxima como nuvem de gafanhotos, com significado de precursores de outras pragas, e já não há como acreditar que duas candidaturas, oriundas do mesmo interesse continuísta, venham a ser mais bem sucedidas do que a saudável renovação pelas urnas. Um dos dois pretendentes — um ex e uma presidente em exercício — não terá como se apresentar pela única vaga oficial disponível. Ninguém deixa de ser candidato por vontade alheia. Um (Lula ou Dilma Rousseff) será surpreendido e o outro viverá sensações que só a alta política, mesmo quando joga baixo, pode proporcionar.

O gargalo em que se meteu a experiência proporcionada, com êxitos e maltratadas esperanças, a partir da Constituição de 1988, levou à ilusão de alguma solução sobrenatural, capaz de reforçar a candidatura única oficial. São candidaturas para guardar lugar, a de Dilma e a de Lula, como se não fossem apenas para tapar o sol com peneira. Na metade do primeiro mandato presidencial de Dilma Rousseff, o ex-presidente em exercício de ociosidade e a presidente que atira em todas as direções (sem acertar os alvos) acumulam duas candidaturas no espaço vazio onde a oposição rarefeita mal respira. Não foi levado em conta o imprevisível.

A candidatura de Dilma Rousseff à reeleição não conta com o petismo atuante por trás dos fatos e vive do palavrório de Lula, sem considerar o peso indisfarçável da classe média propriamente dita. E sem perceber, por trás da confusão, o patrocínio social-democrata confiado à própria falta de sorte dessa corrente de opinião deixada para trás pela História. Classe média e democracia são outra fatalidade a se consumar. Questão de oportunidade, inclusive esta, embutida na passagem de nível histórico. A classe média não abdica do rigor moral de que o governo Dilma desistiu por precipitação, depois de dar um chega pra lá na largada da sucessão a que Lula se atrelou como carona.

Por enquanto, o próprio pretendente, que atende pelo apelido de Lula, ainda não se habilita a outro esporte que não seja a esgrima doméstica. Padrinho e afilhada, na guarda das prerrogativas de pré-candidatos oficiais, zelam pela sucessão doméstica exclusiva. O resto é supérfluo. Era o que faltava e, se vier a ocorrer a inevitável candidatura realmente oposicionista, nem precisará ser razoavelmente de esquerda. O socialismo está fazendo curso de extensão para domesticar o capitalismo. Bastará que provenha da oposição, documentada em programa de governo, como folheto de ópera oferecido ao eleitor. Não precisou mais do que o exemplo que o governador Eduardo Campos, com a noção adequada às circunstâncias, vem proporcionando com clareza e senso de oportunidade. Sobretudo, com objetividade e respeito pelos cidadãos.

Em tempo: desde que não seja mais um projeto alternativo do próprio governo Dilma Rousseff, que ainda não confirmou o que começou como alinhamento ético, mas ficou devendo explicações. Não despachou sequer para as calendas gregas a candidatura Lula, que é o bode do mujique com que a presidente Dilma pode esvaziar de riscos marginais o amplo salão da democracia.

O que não pode é o regime democrático murchar como se percebe. Sem a posição falando grosso, a democracia se expõe a uma depreciação acelerada. O sentimento oposicionista, se não for exercido dialeticamente pelos meios próprios, muda de curso como a água que sempre encontra a saída que não fazia parte dos cálculos. Revoluções, tanto as reais quanto as fictícias, têm motivos visíveis e conseqüências imprevisíveis. A hora não é a dos relógios.

Fonte: Jornal do Brasil

Cínico - Ricardo Noblat

"Não seremos nem oposição nem situação a Dilma." (Marina Silva, sobre o partido pelo qual será candidata a presidente)

Há limite para tudo — até mesmo para os direitos fundamentais das pessoas. Por exemplo: você é livre para dizer o que quiser. Mas você não pode dizer tudo o que queira. Á lei considera crime determinadas coisas. Ela também deveria punir quem abusa do cinismo — e por abusar; ofende a sociedade. Foi o caso recente de Renan Calheiros (PMDB-AL), há pouco eleito presidente do Senado. Abusou de ser cínico.

UM MANIFESTO que pede o impeachment de Renan é o sucesso do momento nas redes sociais. Atraiu até agora mais de um milhão e meio de assinaturas. No dia em que for encaminhado ao Senado, seu destino será a lata do lixo. Milhares de assinaturas obrigam o Congresso a examinar propostas de leis ordinárias, mas o afastamento de um dos seus dirigentes... Esqueça. Não me pergunte por que é assim. Simplesmente é.

O CONGRESSO, que em 2007 absolveu Renan contra todas as evidências de que prevaricara, jamais o condenará. A cara do Congresso e igual ao focinho de Renan. Expressiva fatia dos votos que elegeu Renan presidente do Senado pela segunda vez tem a ver com a tranqüilidade que ele inspira aos seus pares. Quem esteve com a cabeça a prêmio tudo fará para que seus camaradas sejam poupados de experiência tão angustiante.

RENAN GOVERNARÁ o Senado por dois anos. E talvez por mais dois. Enquanto ali estiver, respirem em paz os senadores que temem ser alvo de uma ação moralizadora de origem interna ou externa. O controle que Renan exerce sobre o Senado é acachapante. O corregedor do Senado, encarregado de zelar pelo bom comportamento dos senadores, será uma figura da inteira confiança de Renan.

A PRESIDÊNCIA DO Conselho de Ética caberá a outro homem de confiança de Renan. Ou do PT, o que não fará diferença. Só terá assento ali quem representar a sólida garantia de que defenderá Renan acima de qualquer coisa, bem como todos òs que desfrutem da condição de aliados fiéis dele. No passado, acusado de quebra de decoro, Renan foi condenado pelo Conselho de Ética e absolvido pelo plenário. A história não se repetirá.

PORTANTO, TUDO bem até aqui e a perder de vista — para Renan, os seus e aqueles que não se importam com essa coisa comezinha chamada ética. Tudo bem, nada! Mas o que fazer se o Congresso (Câmara dos Deputados e Senado) está todo dominado? Nem mesmo isso, contudo, assegura a Renan o direito de ser cínico. Excessivamente cínico. Abusivamente cínico. Descaradamente cínico. Insolentemente cínico.

PREFIRO "INSOLENTEMENTE" cínico. Lembra-me um professor do curso ginasial que bradava com os alunos: "Não sejam insolentes" Pois Renan foi ao comentar o pedido de impeachment dele. Primeiro chamou de "lícita e saudável" a mobilização na internet para recolher mais assinaturas contra ele. Depois subverteu seu significado. Disse que a mobilização tem por objetivo tomar o Congresso mais ágil e preocupado com os cidadãos.

POR FIM, desdenhou do movimento. "O número de assinaturas não é tão importante quanto a mensagem" E lembrou que fora líder estudantil. E que também se valera de todos os meios para obter o que desejava. O número de assinaturas é tão ou mais importante, sim, do que a mensagem. Se não fosse grande jamais Renan comentaria o assunto. Nada há de estudantil na iniciativa.

O COMENTÁRIO atende à recomendação de assessores para que Renan não pareça presunçoso. Presunçoso? Taí uma coisa que ele definitivamente não parece. Em compensação... Deixa pra lá.

Fonte: O Globo

Insípido, inodoro, incolor - Renato Janine Ribeiro

Uma amiga do Facebook levanta a questão: se nossos dois principais partidos são PT e PSDB, como o PMDB conseguiu obter a presidência das duas Casas do Congresso, além de já ter a Vice-Presidência da República? Dos quatro substitutos constitucionais da presidenta da República - um deles é o presidente do Supremo Tribunal Federal -, três agora pertencem a esse partido. Não é pouca coisa! Ainda mais porque o PMDB, se é um grande partido, não é o maior em bancada ou votos e, mais grave de tudo: suas ideias ou ideais são amplamente ignorados. Aliás, se ele não disputa há anos a Presidência do país, é justamente porque não tem proposta para o Brasil.

Quais partidos nossos representam, hoje, ideias? Certamente, PT e PSDB. Por isso são os finalistas nas campanhas eleitorais, os polos entre os quais gravita nossa política, que podem ter o apoio de qualquer outra agremiação, menos um do outro. Já o PMDB é apenas um gigantesco micropartido. Quando alguém se queixa das siglas de aluguel, dos partidos sem ideologia, das agremiações que existem só para se aliarem aos vitoriosos - tudo isso vale, de algum modo, para o PMDB. Daí que falte generosidade a quem pretende fechar uns micropartidos, alegando contra eles um princípio que também afetaria nosso partido hoje mais antigo, herdeiro das lutas contra a ditadura, mas que, ao desistir de propor algo inovador ao Brasil, se reduziu a uma confederação de lideranças regionais.

Com boa vontade, podemos acrescentar a esses dois partidos um movimento difuso, herdeiro da onda verde de 2010, que deu um quinto dos votos a Marina Silva mas mal tem representação parlamentar, governadores ou prefeitos e, até o momento, não dispõe de partido ou de um grupo de líderes. É uma sensibilidade em busca de atores, personagens, dirigentes. Teria eleitores, só lhe falta o resto. Tem minha simpatia, mas não irrestrita.

Maior micropartido dá três substitutos da presidenta

Mesmo partidos que em sua história tiveram momentos altos estão, hoje, amorfos. Além do PMDB, grande campeão da luta contra a ditadura, lembremos o PDT, de Leonel Brizola, o PPS, herdeiro do partido comunista que em 1989 viveu a memorável campanha presidencial de Roberto Freire, o PFL (hoje DEM), que nasceu para cravar o prego final no caixão da ditadura, o PV, que lançou Gabeira à Presidência, o PSB, que tem nomes para quem socialismo é mais que um retrato na parede... Pouco disso continua presente no dia a dia deles. Nosso sistema político é um jogo no qual cada partido pode se aliar com qualquer outro, exceto o PT e o PSDB um com o outro, e ainda assim olhe lá. Até o impedimento canônico de alianças entre PT e PFL/DEM caiu: para derrubá-lo, foi criado o PSD.

Isso é de todo mau? Não. Já se observou que esse território sem dono nem perfil, esse "Marais", se quisermos usar o nome cunhado na Revolução Francesa para o centrão da época, é o que permite ao Brasil uma governabilidade política talvez superior à dos atuais Estados Unidos. Lá, o conflito de dois partidos ata as mãos dos governantes. Aqui, o PMDB desata qualquer nó. Garante a governabilidade. Isso não é pouca coisa. Nos países que olhamos com certa inveja porque em tese funcionariam melhor do que nós, a arte da governabilidade consiste em fazer a minoria da população eleger a maioria do Parlamento - formando assim um governo que toma decisões e as executa, mesmo sem ter a maior parte da população de seu lado. Toma-se a maior das maiorias simples, que é convertida em metade mais um, em maioria absoluta. Há muitos truques para conseguir isso; o mais conhecido é o voto distrital. E, no fundo, é melhor sermos governados pela maioria simples do que não termos governo nenhum, ou governos que caem em semanas ou meses, como sucedeu na França e Itália ao longo de décadas, ou hoje na Bélgica, onde um sem-número de partidos não chega a acordo para formar um gabinete.

Mas há algo bastante decepcionante quando vemos que, com exceção de dois partidos e um sentimento, o verde, que ainda não é movimento, quanto mais partido, e feitas as exceções individuais de praxe (Cristovam Buarque, Luiza Erundina...), as demais bancadas do Congresso mal se dão ao trabalho de formular um projeto para o Brasil.

Poderia ser diferente? Poderia. Na verdade, há uma grande preguiça de pensar. Aqueles que não pertencem a nenhum dos lados poderiam promover uma reflexão, seja sobre pontos específicos, propondo leis ou pelo menos estudando temas como o sistema econômico, financeiro ou político, ou ainda o trânsito. Poderiam, assim, construir alternativas, a longo prazo. Na hipótese mais tímida, tal ação poderia obrigar as grandes famílias que disputam o poder, para valer, a levá-los em conta. É mais honroso ser procurado pelo PT, o PSDB ou os verdes em decorrência de estudos, projetos, ideias, do que apenas para somar votos no Parlamento.

Daí, finalmente, que eu não leve muito em conta os candidatos de outros partidos, que não o PT, PSDB ou o movimento verde, à Presidência. Michel Temer, Eduardo Campos e outros podem bem vir a ocupar o Planalto, mas somente por acaso - se a fortuna assim o decidir, por exemplo, caso uma desgraça aconteça à presidenta Dilma. Ou se tudo o mais entrar em crise. Temos três exemplos civis de eleitos pela "fortuna" no último meio século: Jango, Sarney, Itamar - para não falar em Collor, eleito pelo povo mas em circunstâncias de exceção. Contudo, em condições normais, a Presidência vai para quem tenha ideias sobre o que fazer com ela. Isto não é falha, aliás, dos nomes mencionados: eles apenas pertencem a partidos sem proposta. Seria melhor se a tivessem.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Fonte: Valor Econômico

Fernando Lyra - Aécio Neves

Fernando Lyra foi um dos melhores homens públicos do Brasil contemporâneo.

Conheci-o nos primeiros dias do governo de Tancredo, em Minas, quando ficamos amigos. Testemunhei sua dedicação à causa nacional naquele trecho de história, que nos devolveu a soberania sobre o Estado brasileiro.

Tancredo tinha amigos e correligionários. Mas também alguns poucos correligionários a quem ele dedicava afetuosa amizade. Lyra era um deles. Lembro-me de como gostava da sonora gargalhada de Fernando e como se divertia com as interjeições próprias do sertanejo que ele era, quando uma notícia o espantava. Qualquer que fosse a dificuldade do momento, o seu otimismo intransigente amenizava a conjuntura negativa.

Ele teve papel fundamental no processo político que garantiu a reconquista da democracia no país. Com a derrota da emenda Dante de Oliveira, foi preciso mudar o campo de batalha, para que nos mantivéssemos fiéis à causa da reconstrução democrática.

Lyra dedicou horas a fio em conversas com membros do Colégio Eleitoral, procurando convencê-los de que o Brasil vivia uma nova hora. Enquanto as ruas gritavam o nome de Tancredo, Fernando o sussurrava, nos corredores do Congresso e nos encontros que varavam noites. Assim, foi construindo uma sólida base para que se cumprisse o que ele antevia -o fim da longa noite do regime de exceção e o amanhecer de um novo tempo.

Alguns dias antes da posse incumbiu-me o presidente eleito de convocar os que seriam convidados para compor o ministério para um encontro reservado na Granja do Riacho Fundo, em Brasília. Nunca me esquecerei da grande emoção com que Fernando Lyra recebeu o convite para a pasta da Justiça. Tancredo lhe disse: "Olha, Fernando, o tamanho de sua responsabilidade. Você vai assumir o meu ministério!"

O presidente se referia à circunstância histórica que o levara a assumir, praticamente com a mesma idade de Fernando, o Ministério da Justiça no governo Vargas. Tancredo sabia que não faltavam juristas consagrados para o cargo, mas carregava consigo a plena consciência de que, nas circunstâncias difíceis da transição, precisava ter ao seu lado homens leais ao país, providos de coragem e conscientes da sua responsabilidade histórica.

Com profundo compromisso com o Brasil, Lyra acabou com a censura e emprestou seu talento para aplacar ensaios de crises que poderiam colocar em risco os rumos da novíssima República fundada. Ponderava e defendia os avanços que estavam sendo gestados sem jamais transigir no principal -nos valores que uniram os brasileiros e líderes de diferentes tendências em torno da causa da liberdade.

O Brasil perdeu um dos artífices de sua história.

Aécio Neves senador (PSDB-MG)

Fonte: Folha de S. Paulo

Cadastro positivo - Melchiades Filho

Interessado em adiantar o calendário eleitoral e fixar um slogan de apelo popular, o governo federal põe em risco a credibilidade da principal ferramenta de inclusão social que ele ajudou a implantar.

Criado sem alarde em 2001, o Cadastro Único hoje traz os dados de 70 milhões de pobres e miseráveis.

Permite não apenas localizar essas pessoas para o repasse de dinheiro -como o Bolsa Família. Mas também monitorar a frequência escolar das crianças, mapear carências e demandas de saúde e prospectar empregos ou outras oportunidades de inserção em cadeias produtivas.

A montagem do cadastro foi um sinal de vitalidade da gestão pública. Quebrou a lógica perversa das repartições. O Estado foi em busca do cidadão, e não o contrário.

Contribuindo para vigiar e depurar as informações, prefeituras e governos de Estado têm o direito de consultar a base digitalizada, assim como pesquisadores do assunto.

Mas, como todo arquivo vivo, que dirá num país de dimensão continental e tantas vulnerabilidades, o Cadastro Único não é perfeito. Exemplo disso é a recente "descoberta", pelo Ministério do Desenvolvimento Social, de 2,5 milhões de miseráveis até então ignorados pela lista.

O critério de pobreza extrema também é questionável. O teto da renda mensal per capita foi cravado em R$ 70 -se ganhar R$ 71, o sujeito não é mais miserável. Mais: tal valor permanece congelado desde 2009. Se ajustado pela inflação, estaria agora na casa de R$ 90.

Por isso, será licença estatística, senão mentira deslavada, anunciar que "acabou a miséria no país", como Dilma Rousseff ensaia fazer ainda neste ano. O governo conhece de perto as limitações do Cadastro Único. Sabe que a linha de indigência, além de tênue, está defasada.

Por isso, também, o Planalto deveria corrigir a métrica dos programas sociais antes de decretar o fim do ciclo de estímulos ao consumo.

Fonte: Folha de S. Paulo

Mudar para manter - José de Souza Martins

Numa estrutura monárquica, a renúncia foi decisão republicana de um papa moderno até na inovação da tradição conservadora

Já há um elenco diversificado de explicações para a renúncia de Bento XVI ao trono de São Pedro. A melhor foi a dada por ele mesmo: "Para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor esse que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado". O papa não fez nenhuma referência mais explícita ao mar proceloso em que se move a barca e, sobretudo, referência a quem agita as águas que perturbam os rumos da nau sagrada. Manteve in pectore os fatores institucionais de seu gesto. Foi desprendido ao tomar sobre os próprios ombros o peso imenso dos fatores da renúncia como debilidade pessoal.

No entanto, em artigos de Jamil Chade e Filipe Domingues, no Estado dessa semana, fica claro que há no Vaticano uma disputa de poder: o cardeal Bertone, secretário de Estado, de um lado, e o papa, de outro, com pontos de vista antagônicos sobre questões cruciais e delicadas da vida da Igreja. Os fatores da fragilidade papal não são, pois, fatores apenas físicos; são também os do debilitamento da comunhão dos que se assentam à mesa pascal neste limiar da Quaresma. Como o que ocorreu no Horto, o papa declara que se aparta para orar. A linguagem que Ratzinger usa, neste episódio, é altamente simbólica. Decisão amadurecida há meses, ele escolheu, no calendário litúrgico da Igreja, o momento ritual mais significativo para seu anúncio. O Papa quis dizer muito mais do que disse. Confirmou-o na missa da Quarta-feira de Cinzas, ao falar em "divisões no corpo eclesial", em "individualismos e rivalidades". Renunciou para, em penitência, manter a unidade da Igreja. Nesse ato, Ratzinger fechou seu perfil, o de um funcionário da fé, oposto ao Ratzinger satanizado por aqueles que nele viram um reacionário inimigo político da libertação.

A cátedra de São Pedro vaga quando o papa morre. A decisão de Bento XVI expõe um dos aspectos mais complicados do papado nas últimas décadas: quando é que um papa começa a morrer? No sistema papocêntrico, essa é uma questão vital. Estamos acostumados a encarar o fim de um papado como processo que se torna público com o solene anúncio de que o papa morreu, no som grave do campanone (sino grande) do Arco delle Campane, na Basílica de São Pedro, espalhando-se pelos telhados de Roma e pelos ouvidos do mundo católico. Rito do chamado mortório por meio do qual a morte do papa se difunde. Mas quando, de fato, começa essa morte que pode estender-se por meses e anos? Ela começa quando o papa já não tem o vigor físico e mental que lhe garantam domínio sobre o que pensa e faz. Quando seus atos não se tornam necessariamente fatos, quando entre a intenção e a consequência interpõem-se vontades que não são as suas e até contrárias às suas. Na franqueza do papa renunciante de agora está posto o reconhecimento público dessa dimensão dramática da vida de um papa e da Igreja.

Os acólitos e coadjutores do pontífice são os que primeiro podem notar seu debilitamento. Mesmo os leigos que o servem podem perceber que o papa está aquém do que fora ou do que deveria ser. O motorista de Pio XII, que o acompanhava, a uma certa distância, nos passeios pelos Jardins do Vaticano, de certo modo disse isso à comissão de beatificação de Pacelli. Ainda em vida, Pio XII dizia ter visões de Nossa Senhora nesses passeios. Ele dizia, mas nunca vi nada, foi o que informou o motorista.

Os do poder na Cúria têm, não raro, transformado a debilidade física e mental dos papas em ponto de partida do que o sociólogo Erving Goffmann chama de conspiração alienativa. É o primeiro momento do morrer de alguém. A murmuração e as conversas atenuam a legitimidade dos atos de quem delas é objeto. O que numa estrutura como a da Igreja significa encurtar a autoridade do papa em favor da corte e da máquina de poder da instituição, a Cúria Romana. Não é estranho que, nessas circunstâncias, haja quem atue como papa ad hoc, papa das sombras. O carisma papal de algum modo fica entre parênteses, usurpado por motivações de poder que não são nem podem ser necessariamente reconhecíveis, na Igreja, como manifestações do Espírito Santo. Aqui, a análise político-ideológica, de tipo partidário, pouco ou nada tem a dizer porque incapaz de reconhecer mediações e significações a ela completamente estranhas.

A disputa de poder detectada neste episódio da renúncia de Bento XVI aparentemente é dessa natureza. O pronunciamento e a decisão do papa sugerem uma aguda consciência dessa antecipação de sua morte institucional. E também sua intenção de cortar-lhe as consequências danosas à unidade da Igreja ao abrir espaço para a convocação do conclave e a eleição de um substituto. No quadro dos paradoxos de Bento XVI, uma decisão republicana numa estrutura monárquica, mais um indício de um papa moderno até na ação inovadora em nome dos valores da tradição conservadora.

* José de Souza Martins é sociólogo, professor emérito da Faculdade de Filosofia da USP e autor, entre outros, de Exclusão Social e a Nova Desigualdade (Paulus)

Fonte: Aliás / O Estado de S. Paulo

A renúncia do Papa - Paulo Brossard

O fato, que na semana passada ocupou o centro de todos e a todos sobrepujou, não se prende à crise intercontinental, nem às guerras emergentes que têm prosperado, não aconteceu em nossa vizinhança, mas longe daqui e, embora ocorrido em minúsculo Estado localizado dentro dos muros da capital da Itália e nos limites do Vaticano, repercutiu e continua a repercutir no mundo inteiro. Ocorreu ou está ocorrendo na sede histórica da cristandade. O chefe espiritual de imensa coletividade, que se estende por todos os continentes, e que ocupa cargo em princípio vitalício, foi protagonista de evento inesperado e sem precedente desde séculos. O papa Bento XVI renunciou ao Trono de São Pedro. Este o fato, possível, mas raro.

E, embora ele interesse precipuamente à comunidade católica, sua repercussão se estendeu além desses limites a mostrar que há coisas que não se exprimem por números, nem se aferem como se apuram bens materiais. É o que vem acontecendo, envolvendo setores confessionalmente desligados do pontífice resignatário. Com efeito, divulgada a renúncia do Vigário de Roma, não cessaram as manifestações por parte de cristãos e não cristãos, crentes ou incréus. Um dos primeiros a lastimar o afastamento de Bento XVI do cenário internacional foi o primeiro-ministro da Inglaterra, país que tem uma igreja própria na qual a rainha detém a suprema autoridade.

Para não desprezar a prata de casa, lembro que após a República, com a separação da Igreja do Estado, houve quem postulasse a extinção da legação que o Brasil mantinha junto à Santa Sé, e Rui Barbosa disse que também fora dessa opinião, contudo, o tempo e a maior experiência fizeram com que ele mudasse e o Brasil continuou a manter a legação, hoje embaixada, junto ao Vaticano. Tudo isso é sabido, assim como a declaração inicial do resignatário, "fiz isso em plena liberdade para o bem da Igreja, depois de ter rezado por muito tempo e ter examinado diante de Deus a minha consciência", se ele se limitasse a aludir à fragilidade de suas forças já inferiores à magnitude dos problemas a enfrentar, a renúncia teria outro alcance, mas ele aditou alguns dados que vieram a lhe dar indisfarçável relevo. Se as palavras dizem respeito à comunidade eclesial, não deixam de interessar à comunidade internacional, como vem interessando amplamente. E quando declara pensar em particular nas pessoas contra a unidade da Igreja, nas "divisões do corpo eclesial", que "desfiguram a Igreja", "na hipocrisia religiosa", estão a indicar a formidável dimensão dos problemas inerentes aos fatos alinhados, e ao despedir-se dos sacerdotes romanos declarou que a Igreja necessita de "verdadeira renovação". De outro lado, pode-se imaginar a dramática situação do sucessor de São Pedro que o levou a despojar-se da investidura sem paralelo.

Enfim, se a fragilidade física é real, também parece inegável que os sofrimentos espirituais de que padece o Sumo Pontífice não sejam quiçá menos dolorosos. Aliás, há fatos notórios, ocorridos em mais de um lugar da cristandade, que devem ser mortificantes para uma pessoa da espiritualidade do Servo de Cristo mais que "a disputa de poder", de que se fala, tanto mais quando ele era pela limpeza exemplar que entendia imperioso realizar e que não teve como praticar no que se refere à mancha da pedofilia.

Por tudo isso, penso que no ato da renúncia, pela qual se desinvestiu das insígnias supremas, o Santo Padre praticou o que podia cometer ao sentir-se impedido de concretizar ato de ofício. Penso que o gesto está impregnado de fidelidade e coragem e será sempre lembrado, pois ele se prende à necessidade da "verdadeira renovação da Igreja" segundo suas palavras.

*Jurista, ministro aposentado do STF

Fonte: Zero Hora

Crise ameaça usinas de cana do País

Em dois a três anos, 60 usinas de açúcar e etanol, das 330 que processam 90% de toda a cana do País, deverão interromper atividades

Crise leva quase 20% das usinas de cana do Centro-Sul a fechar ou mudar de dono

Marcelo Rehder

Das 330 usinas de açúcar e etanol da Região Centro-Sul do Brasil, responsáveis por 90% de toda a cana-de-açúcar processada no País, 60 deverão fechar as portas ou mudar de dono nos próximos dois a três anos, de acordo com a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica). A entidade tem confirmação de que pelo menos dez deixarão de processar a safra 2013/2014, por dificuldades financeiras.

Desde 2008, quando começou a crise financeira mundial, nenhuma decisão de instalação de nova usina foi tomada no País. Só quatro unidades estão previstas para entrar em operação até 2014, mas são projetos que foram decididos antes da crise.

Em contrapartida, 36 usinas entraram em recuperação judicial nesses cinco anos. Pior: no mesmo período, 43 foram desativadas, e a grande maioria jogou a toalha nos últimos dois anos.

Em recuperação judicial desde 2010, a usina Floralco, do município de Flórida Paulista, no oeste do Estado de São Paulo, por exemplo, decidiu encerrar suas atividades em dezembro de 2012. Cerca de 2 mil trabalhadores ficaram sem receber o último salário e a segunda parcela 13º.

Além da dívida salarial, a empresa não depositava o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) dos trabalhadores nem a contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), há mais de um ano.

"Estamos aguardando a conclusão das negociações de venda da usina, para ver se ela vai voltar a fazer safra e normalizar a situação dos funcionários", diz Milton Ribeiro Sobral, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas Farmacêuticas e Fabricação de Álcool, Etanol, Bioetanol, Bicombustível de Presidente Prudente e Região.

Com dívida superior a R$ 200 milhões, a Floralco recebeu uma oferta de compra à vista, de US$ 148 milhões, da Lanetrade, trading americana com operação global nos mercados de açúcar, café e outros alimentos. O prazo para depósito do pagamento vencia na última sexta-feira, mas a Justiça prorrogou por mais 15 dias. Se o negócio não vingar, uma assembleia de credores decidirá o destino da empresa.

Efeito cascata. A crise se alastra pelas usinas, causando estrago no emprego e na atividade econômica das microrregiões onde as destilarias estão localizadas. Em 2012, o setor sucroalcooleiro eliminou mais de 18 mil postos de trabalho no País, segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), feito com base em dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. O quadro tende a se agravar este ano.

"A situação do setor é complicada", afirma Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica. Como em qualquer setor de atividade, há problemas de má gestão das empresas, mas a grande dificuldade, segundo ele, é a questão da perda de produtividade agrícola.

Além de faltar recursos para renovar e ampliar o canavial, as usinas colheram três safras consecutivas afetadas por problemas climáticos, o que aumentou o custo. Também tiveram de investir na mecanização do plantio e colheita da cana. Para piorar, o setor alega não ter como repassar o aumento de custo para o preço, por causa da concorrência da gasolina e dos preços do açúcar fixados no mercado internacional. Custos em alta e margens comprimidas resultam em aumento do endividamento.

Nem mesmo o reajuste recente no preço da gasolina foi suficiente para trazer alívio às usinas, diz a Unica. A Petrobrás reajustou em 6,6% o valor cobrado pelo combustível, o que teve impacto, para o consumidor, entre 4,2% e 5,3, segundo especialistas.

"Evidentemente, pode proporcionar um aumento de 4% no etanol, mas o mercado é muito disputado e nada garante que vá ficar com o produtor", diz o diretor da entidade. "Se o posto ou o distribuidor aumentar sua margem, o produtor vai ficar com zero", reclama o executivo.

O impasse econômico deve elevar o endividamento do setor sucroalcooleiro para R$ 56 bilhões ao final da safra 2013/2014, conforme levantamento do Itaú BBA. A dívida deve crescer R$ 4 bilhões em relação aos valores da safra anterior (R$ 52 bilhões) e se aproximar do faturamento das usinas do Centro-Sul, estimado em cerca de R$ 60 bilhões.

O diretor comercial do Itaú BBA, Alexandre Figliolino, estima que um terço do setor sucroalcooleiro passa por dificuldades. Ele divide o setor em quatro grupos distintos. O primeiro, formado por grandes grupos, principalmente internacionais, com pleno acesso ao capital. Outro, de empresas nacionais com bom desempenho. O problema está, segundo ele, no terceiro e no quarto grupos.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Municípios assumem gastos de União e Estados

Ribamar Oliveira

BRASÍLIA - Os municípios brasileiros gastaram mais de R$ 19 bilhões em 2011 para oferecer serviços à população que, por lei, deveriam ser custeados pela União e pelos Estados, segundo estudo feito pelo economista e geógrafo François Bremaeker, da Associação Transparência Municipal (ATM). Serviços como a manutenção do posto dos correios e telégrafo, da unidade municipal de cadastramento dos imóveis rurais e da junta de alistamento militar, embora não sejam de competência dos municípios, terminam sendo custeados pelas prefeituras para que eles estejam disponíveis aos seus cidadãos.

O estudo feito por Bremaeker mostra que os maiores prejudicados são os menores municípios, com população de até 10 mil habitantes, que gastam proporcionalmente mais para garantir os serviços que não são executados pelos Estados e pela União. "A participação relativa desses gastos sobre a receita total é maior nas regiões mais "abandonadas", ou seja, onde há necessidade de uma atuação mais intensa por parte dos municípios para garantir fornecimento dos serviços à população", diz o texto da ATM.

Os municípios brasileiros gastam, em média, 5,25% de sua receita orçamentária com a execução desses serviços, de acordo com o trabalho de Bremaeker. A região Sudeste é a única que apresenta um gasto médio municipal abaixo da média nacional. A razão disso, segundo o texto, é o fato dela ser a região que apresenta as mais elevadas receitas orçamentárias médias do país. Entre as regiões, o Centro-Oeste é o que apresenta os resultados mais preocupantes, diz o estudo, pois os seus municípios registram a mais elevada participação relativa de gastos com serviços de responsabilidade exclusiva da União e dos Estados (5,96% da receita orçamentária, em média).

Para realizar o estudo, Bremaeker enviou questionários a todos os municípios brasileiros, com perguntas relacionadas às despesas com serviços de responsabilidade da União e dos Estados e que são custeadas pelas prefeituras. Com base nas respostas, o economista estabeleceu médias desses gastos, de acordo com o tamanho da população dos municípios. Ele utilizou também os dados contábeis municipais que estão disponíveis na página do Tesouro Nacional na internet para projetar a participação dessas despesas nas receitas orçamentárias.

Bremaeker constatou também que 3.895 municípios, com população inferior a 20 mil habitantes, despendem com os serviços e ações da competência dos Estados e da União mais do que conseguem arrecadar com os seus tributos. O texto diz que os 122 municípios com população de até 2 mil habitantes têm um gasto com essas despesas 4,23 vezes maior que o da sua arrecadação tributária.

Para os 1.171 municípios com população entre 2 mil e 5 mil habitantes essa relação é de 3,04 vezes; de 1,99 vezes para os 1.207 municípios com população de 5 mil a 10 mil habitantes e de 1,4 vezes para os 1.395 municípios com população de 10 mil a 20 mil. "Isso representa dizer que 70,02% dos municípios brasileiros comprometem mais do que toda a sua arrecadação tributária para custear serviços que a União e os Estados deveriam executar no seu território por sua própria conta", diz o estudo.

Em entrevista ao Valor, Bremaeker explicou que ceder pessoal e instalações para o funcionamento de órgãos estaduais e federais é a despesa mais comum das prefeituras. "Geralmente o posto dos correios e telégrafo funciona dentro do prédio da prefeitura, com servidores municipais", disse. "Quando esse serviço está fora da prefeitura, funciona em um prédio municipal ou alugado pela prefeitura". A junta de alistamento militar costuma funcionar dentro da prefeitura ou em prédio municipal, também com servidores municipais nas funções, informou. Embora o cadastramento de imóveis rurais seja uma atribuição do INCRA e da Receita Federal, todo o suporte e a orientação da população são feitos por servidores municipais, disse.

Na área de segurança, a situação não é diferente. "A delegacia de polícia funciona com alguns servidores municipais cedidos e a prefeitura é quem custeia a gasolina dos veículos, quando não compra o próprio veículo e custeia a refeição dos presos", informou. "O mesmo acontece quando há um destacamento da polícia militar no município". Segundo ele, as guardas municipais passaram a substituir a polícia militar na segurança das vias públicas e até mesmo na organização do trânsito, quando a sua competência é apenas de proteger os prédios públicos, como a câmara, os postos de saúde e as escolas.

O programa federal de saúde da família, por exemplo, financia apenas uma parte dos custos de manutenção da equipe, segundo Bremaeker. "O município tem de entrar com uma contrapartida elevada no custeio dos salários desses profissionais e também dando suporte para o funcionamento da equipe, como o veículo para os deslocamentos". A prefeitura também acaba custeando o transporte escolar dos alunos de estabelecimentos de ensino estaduais.

Fonte: Valor Econômico

Governo do Rio omitiu 35 dias ao informar viagens de Cabral

Relatórios oficiais divergem de nota divulgada pelo governador há um ano

Em três viagens ao exterior, governador teve despesas pagas em dias em que não tinha compromissos oficiais

Italo Nogueira

RIO - O governo do Rio omitiu 35 dias de viagens do governador Sérgio Cabral (PMDB) ao prestar esclarecimentos sobre as viagens internacionais que ele fez em seu primeiro mandato à frente do Estado.

Documentos obtidos pela Folha com base na Lei de Acesso à Informação mostram que, de 2007 a 2010, o governador ficou pelo menos 134 dias no exterior ao participar de 27 missões oficiais.

Em maio do ano passado, nota preparada pela assessoria de Cabral informou que o governador passara 99 dias fora do país - ou seja, 35 dias a menos do que revelam os documentos obtidos agora.

A nota divulgada no ano passado foi uma resposta a um questionamento feito pela Folha na época em que foram divulgadas fotos de Cabral com o empresário Fernando Cavendish, dono da construtora Delta, em Paris.

Os documentos obtidos agora são processos administrativos que aprovaram o pagamento de diárias para Cabral e as pessoas que o acompanharam nessas viagens.

Das 27 missões oficiais realizadas no período, foram liberados relatórios referentes a vinte. Em seis viagens, não houve pagamento de diárias. O governo não liberou o processo referente a uma viagem, sem dar justificativa.

Questionada sobre a divergência entre os relatórios e as informações prestadas há um ano, a assessoria de Cabral afirmou que em 2012 só divulgou datas em que o governador teve compromissos "que mereceram publicidade".

Os documentos obtidos pela Folha mostram que, em três viagens à Europa, Cabral recebeu diárias dos cofres públicos por períodos em que não havia nenhum compromisso oficial em sua agenda.

Isso ocorreu na viagem de setembro de 2009 a Paris, em que Cabral e assessores foram fotografados ao lado de Cavendish. Ele recebeu R$ 6.384 em diárias por essa viagem.

Embora seus compromissos oficiais só tivessem início em 14 de setembro, o governador embarcou no dia 10 para Paris e recebeu diárias pelos três dias que passou na cidade antes da missão oficial.

A assessoria de Cabral diz que ele participou nesses dias de encontros preparatórios para a apresentação da candidatura do Rio como sede da Olimpíada de 2016, mas os documentos não fazem referência a essas reuniões.

O mesmo ocorreu em duas outras viagens do governador, para Paris e Londres, em 2008. Ele embarcou bem antes do início de seus compromissos oficiais e recebeu recursos públicos para cobrir suas despesas nesses dias.

O relatório sobre outra viagem, que levou Cabral a Davos, na Suíça, em 2009, informa que antes ele passou em Paris, onde se hospedou num hotel que cobrava diária de US$ 350. Na Suíça, o hotel de Cabral cobrou US$ 95 por dia.

Os relatórios do governo mencionam os preços das diárias, mas não dão os nomes dos hotéis em que o governador ficou. De acordo com sua assessoria, Cabral precisou dormir em Paris para esperar uma conexão para a Suíça.

Os documentos obtidos pela Folha só têm informações sobre o primeiro mandato de Cabral porque o pagamento de despesas em viagens oficiais passou a ser feito com cartões de crédito corporativos, e não mais com diárias.

Seguindo padrão adotado pelo governo federal, o Rio classificou os documentos que detalham as despesas com os cartões como "reservados" e poderá mantê-los em sigilo por cinco anos.

Fonte: Folha de S. Paulo