segunda-feira, 4 de março de 2013

OPINIÃO DO DIA – Fernando Henrique Cardoso: retrovisor

As forças governistas, depois de precipitarem a campanha eleitoral, voltaram ao diapasão antigo: comparar os governos petistas com os do PSDB. Chega a ser doentio! Será que não sabem olhar para a frente? As conjunturas mudam. O que é possível fazer numa dada fase muitas vezes não pode ser feito em outra; políticas podem e devem ser aperfeiçoadas. Porém, na lógica infantil prevalecente, em lugar de se perguntar o que mudou no País em cada governo, em que direção e com qual velocidade, fazem-se comparações sem sentido e imagina-se que tudo começou do zero no primeiro dia do governo Lula. Na cartilha de exaltação aos dez anos do PT no poder, com capa ao estilo realismo socialista e Dilma e Lula retratados como duas faces de uma mesma criatura, a História é reescrita para fazer as estatísticas falarem o que aos donos do poder interessa. Nada de novo sob o sol: é só lembrar dos museus soviéticos que borravam nas fotos os rostos dos ex-companheiros caídos em desgraça... O PSDB não deve entrar nessa armadilha. É melhor olhar para a frente e deixar as picuinhas para quem gosta delas.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente da República. ‘Sem disfarce nem miopia’. O Estado de S. Paulo / O Globo / Zero Hora, 3/3/2013

Manchetes de alguns dos principais jornais do país

O GLOBO
Cardeais pressionam para ler dossiê secreto
Já são 500 mil em áreas pacificadas
Déficit dobra no setor de serviços
Disputa por terra mata mais no país

FOLHA DE S. PAULO
Anvisa quer flexibilizar a aprovação de fitoterápicos
Preparação do conclave 'testa' favoritos para suceder o papa
PSB articula candidaturas regionais para apoiar Campos
Ministérios vão liberar papéis da ditadura para consulta

O ESTADO DE S. PAULO
Após dois anos, Dilma busca apoio de sindicatos
Preço da terra agrícola sobe mais do que o ouro
Limite do FGTS para casa própria pode subir

VALOR ECONÔMICO
Empresas veem riscos em nova concessão de ferrovias
País precisa de mais R$ 40 bi para projetos
Brizola Neto planeja coibir rotatividade no trabalho
BC pode barrar dividendo de banco

BRASIL ECONÔMICO
Governo aposta na alta da taxa de investimento para alavancar o PIB
Cresce interesse francês pelo país
Trem de alta velocidade
EUA sem acordo sobre cortes

CORREIO BRAZILIENSE
R$ 40 milhões para irrigar a corrupção
Brasil ignora perguntas da ONU sobre violações
Roubar, matar ou morrer ainda jovem

ESTADO DE MINAS
Partidos cobram dízimo de servidores
Acusação tem fortes trunfos contra goleiro
Bancos abrem crédito de olho nas restituições

O TEMPO (MG)
Polêmicas da reforma política dividem deputados mineiros
Estados brasileiros estão endividados, diz relatório
Tucanos de SP querem dividir poder com Aécio

GAZETA DO POVO (PR)
Pequenas empresas terão R$ 30 milhões para inovação
Relator crê em votação da reforma política mesmo sem consenso entre os partidos
Cardeais brasileiros debatem eleição

ZERO HORA (RS)
Sucesso na safra fará o RS crescer 6% em 2013
Novo papa: Dom Odilo, nome em alta no Vaticano
Em breve no Estado: Cadeias em que a chave fica nas mãos dos presos

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Representantes do Brasil querem ver relatório
Governador se articula contra MP dos Portos

Após dois anos, Dilma busca apoio de sindicatos

A presidente Dilma Rousseff, virtual candidata à reeleição, decidiu seguir o conselho do ex-presidente Lula e tentar se reaproximar das centrais sindicais. Nos últimos dois anos, ela delegou os contatos ao secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, e os sindicatos se queixavam de falta de espaço no governo. Na semana passada, Dilma recebeu os presidentes da CUT e da UGT. Ela também determinou aos ministros que analisem as reivindicações dos trabalhadores e verifiquem quais podem ser atendidas a curto prazo. Outro possível candidato à Presidência em 2014, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), também tenta se aproximar dos sindicatos. Hoje, ele deve receber a direção da Força Sindical.

Dilma abre a porta para sindicalistas e prepara medidas de reaproximação

Na busca de aliados. Depois de ver relação com centrais estremecida por causa de embates durante greves, presidente segue conselho de Lula, recebe grupos organizados

Roldão Arruda

A presidente Dilma Rousseff seguiu o conselho de seu antecessor e padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva, e iniciou um processo de reaproximação com as centrais sindicais. A agenda presidencial evidencia a nova estratégia: após dois anos sem muito espaço para reuniões com sindicalistas, Dilma tem tido agora uma série de encontros do gênero.

Só na semana passada, recebeu dois presidente de centrais sindicais - Vagner Freitas, da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e Ricardo Patah, da União Geral dos Trabalhadores (UGT). No dia 12 ela deve participar da inauguração da nova sede do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, filiado à UGT e representante de um setor com cerca de 400 mil trabalhadores. A data foi acertada diretamente entre o Planalto e os organizadores.

Também não está descartada a possibilidade de, amanhã, ao término da 7.ª Marcha das Centrais Sindicais, em Brasília, Dilma receber os sindicalistas no Planalto. Até ontem a agenda presidencial não registrava o compromisso, mas os sindicalistas não descartavam a hipóteses do encontro.

Em outros anos, Dilma sempre preferiu delegar missões desse tipo ao secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Por causa disso, eram quase invariáveis nas centrais as críticas ao seu estilo. Nos confrontos entre o governo e os funcionários públicos, na greve que estes realizaram em meados do ano passado, eram comuns as comparações entre a presidente e Lula - todas sempre desfavoráveis a ela.

O esforço de aproximação do Planalto com as centrais deve ir além de cumprimentos e reuniões. Paralelamente, o Planalto está reunindo ministros de diferentes áreas para analisar as principais reivindicações dos trabalhadores e verificar quais podem ser atendidas a curto prazo.

De acordo com alguns líderes sindicais, o governo corre para fazer o anúncio de alguma "boa novidade" até o Dia do Trabalho, comemorado em 1.º de maio.

Gentilezas. Filiado ao DEM, o presidente da UGT, Ricardo Patah, sempre integrou o coro dos que criticavam o distanciamento entre Dilma e as centrais. Na quinta-feira passada, porém, ao deixar o Planalto, a opinião dele já era outra. Saiu "encantando" com as atenções que ele e seus acompanhantes, entre os quais quatro deputados ligados à central, receberam da presidente.

O encontro, programado para durar uma hora, estendeu-se por uma hora e meia. Dilma interessou-se particularmente pelos problemas enfrentados pelos motoboys, uma das categorias em que a UGT tem maior penetração, e, ali mesmo, determinou a Gilberto Carvalho a organização de um grupo interministerial para estudar essa questão.

"Eu sempre tive contato com o Lula, que recebia as lideranças sindicais pelo menos uma vez por mês, visitava sindicatos e chegou a ir ao congresso anual da UGT. Com a Dilma sempre foi diferente, mas dessa vez ela nos surpreendeu", diz Patah.

"Ela nos recebeu com muita atenção, ouviu nossas reivindicações e opiniões sobre a política econômica do governo. Dissemos a ela, por exemplo, que não é correto desonerar a folha de pagamento das empresas sem exigir contrapartidas dos empresários, para garantir o nível de emprego. Foi um encontro histórico, na minha avaliação."

Dois dias antes de Patah, a presidente havia recebido Vagner Freitas de Moraes, presidente da CUT, a maior central do País, historicamente próxima do PT. Moraes também notou a mudança, mas não viu nela nenhuma "alteração de rota". "Acho que a presidente está aprimorando as políticas de um governo exitoso. Sempre dissemos a ela que os resultados das ações são melhores quando se fala diretamente com os interlocutores da sociedade", diz. "Não é uma atitude eleitoreira nem oportunista, mas sim uma evolução."

Segunda maior central do País, a Força Sindical, do deputado Paulo Pereira da Silva, é a exceção (mais informações abaixo).

Tendência. Além de tentar se reaproximar dos sindicalistas, Dilma mudou a atitude com outros setores também. Passou a receber mais empresários, além de ter estreitado relações com o MST, outro histórico aliado do PT, ao visitar neste ano um assentamento rural ligado à organização.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Campos vai atrás da Força Sindical de Paulinho

Governador e líder do PSB, possível rival de Dilma em 2014 começa maratona para construir imagem nacional

João Villaverde

BRASÍLIA - O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), inicia nesta semana uma maratona para se aproximar do movimento sindical. A distância entre o partido que ele preside e as centrais sindicais é considerada pelas lideranças socialistas como principal deficiência para consolidar o nome do governador como figura nacional – e também como um possível candidato na corrida presidencial. Hoje, em Recife, o governador deve receber a direção nacional da Força Sindical, segunda maior central do País. Oficial- mente, a pauta prevê uma conversa sobre a batalha que está sendo travada entre o governo Dilma Rousseff (PT) e os trabalhadores do setor portuário, representados principalmente pela Força.

Mais do que discutir portos, porém, o encontro é uma tentativa de início de uma relação política. No final do mês, Campos deve desembarcar em São Paulo para novo encontro com a Força. Durante um encontro nacional de dirigentes da central, apresentará suas idéias sobre os rumos do Brasil. “Se o PSB tem um calcanhar de Aquiles, com certeza é o movimento sindical. Essa sempre foi nossa dificuldade”, diz o vice-presidente nacional do PSB, Roberto Amaral. “Isso precisa ser superado.” A proximidade maior do PSB é com a Central de Trabalhadores do Brasil (CTB), quarta maior do País,com 624 sindicatos e 694 mil associados (é quatro vezes menor que a Central Única dos Trabalhadores, a CUT, próxima ao PT, com 2172 sindicatos e 2,7 milhões de filiados). Apesar de ser o braço sindical do PC do B, a CTB tem dirigentes filiados ao partido de Campos. O PSB também tem um representante na direção nacional da União Geral dos Trabalhadores (UGT), a terceira maior.

Aproximação. O encontro com Campos interessa ao presidente da Força, deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT- SP). Isolado pelo Planalto, ele tem dado sinais de que pretende afastar o PDT da base governista.Paralelamente,também participa da gestação de um novo partido, o Solidariedade. O encontro de hoje, para o qual foram convidados também parlamentares ligados à Força, é uma primeira tentativa de aproximação de Paulinho e Campos. “Tenho uma relação de amizade antiga com ele e gosto do seu jeito de governar. Ao contrário da Dilma, que não escuta, ele ouve as pessoas e trata as reivindicações com seriedade”, afirma o deputado,líder sindical e dirigente partidário. “Como o governador não tem muita relação com os sindicatos, queremos nos aproximar e ouvir o que está pensando do Brasil, da economia.”

Fonte: O Estado de S. Paulo

PSB quer alavancar Campos com palanques nos Estados

Partido planeja ter ao menos 12 candidaturas próprias a governador em 2014

Principal problema é ausência de nomes fortes nos três maiores colégios eleitorais do país: SP, Minas e Rio

Diógenes Campanha, Luiza Bandeira

SÃO PAULO - O PSB pretende montar pelo menos 12 candidaturas próprias aos governos dos Estados em 2014 para vitaminar a possível empreitada presidencial do governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

A busca por palanques regionais é um dos principais desafios da sigla -que teve nove candidatos em 2010- para tirar a vantagem da presidente Dilma Rousseff e do senador Aécio Neves, virtuais candidatos de PT e PSDB.

Na semana passada, a petista e o tucano já contaram com os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso como cabos eleitorais pelo país -em Fortaleza e Belo Horizonte, respectivamente.

Enquanto isso, sem "padrinho", Eduardo Campos viu correligionários (Cid Gomes, governador do Ceará, e Ciro Gomes, ex-ministro) se manifestarem contra sua candidatura à Presidência, expondo uma dificuldade para os palanques regionais em 2014.

Para manter o PSB na aliança, grupos petistas cogitar negociar com Campos a vaga de vice de Dilma. Em discurso na convenção do PMDB, porém, a presidente fez anteontem elogios ao atual ocupante do posto, Michel Temer, e defendeu "vida longa" na parceria com a sigla.

Na lista de ao menos 12 candidatos nos Estados, os carros-chefes do PSB são seus seis governadores (AP, PI, PB, PE, ES e CE). Metade pode tentar a reeleição e os outros tentarão fazer os sucessores.

O principal problema é a ausência de nomes fortes nos três maiores colégios eleitorais: São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, que, juntos, somam 58 milhões de eleitores, 41% do total no país.

Com tucanos

Em SP, a legenda não conta mais com seu candidato ao governo de três anos atrás: Paulo Skaf entrou no PMDB em 2011. O presidente do PSB-SP, Márcio França, não descarta se aliar ao PSDB.

"Pode ser que uma coligação com Geraldo Alckmin [governador e potencial candidato à reeleição] ajude a campanha do Eduardo", diz.

A aproximação do PSB é bem-vista por tucanos -para afastar a sigla do PT.

A relação entre as duas legendas, porém, sofreu um abalo em 2012. O PSB paulistano apoiou Fernando Haddad (PT), em vez de José Serra (PSDB), para a prefeitura.

Em Minas, Márcio Lacerda (PSB), prefeito de Belo Horizonte, é apontado por dirigentes do partido como aposta ao governo do Estado.

Mas ele disse ao presidente do PSDB estadual que pretende cumprir seu mandato inteiro na prefeitura.

Lacerda é afilhado político de Aécio Neves e, no PSB, está mais ligado ao grupo dos irmãos Ciro e Cid Gomes, que defendem apoio a Dilma. O presidente do PSB local, Walfrido dos Mares Guia, é ex-ministro de Lula e ligado ao PT.

No Rio, a sigla é integrante do governo Sérgio Cabral (PMDB) e, até agora, apoia a eleição do vice-governador, Luiz Fernando Pezão (PMDB).

Colaborou Paulo Peixoto, de Belo Horizonte

Fonte: Folha de S. Paulo

PSDB acusa Dilma de antecipar campanha

Oposição critica discurso da presidente na convenção do PMDB

SÃO PAULO - Líderes do PSDB reagiram ontem ao discurso da presidente Dilma Rousseff durante a convenção nacional do PMDB, no último sábado, e a acusaram novamente de antecipar em mais de um ano a campanha presidencial. Em evento, promovido na capital federal, a presidente referiu-se aos opositores como "mercadores do pessimismo", que torcem contra e apostam no fracasso do país.

Em nota, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), pré-candidato tucano à Presidência, considerou "curiosa" o que chamou de "obsessão" de Dilma pela oposição e recomendou à petista que seria "prudente" deixar o palanque e enfrentar "os reais desafios" do país. Para Aécio, o Brasil, que neste momento "precisa muito mais de uma presidente do que de uma candidata", assimila com preocupação mais um "pífio resultado da economia" nacional, referindo-se ao PIB de 0,9% ano passado.

Para o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, o discurso de Dilma não tem "qualquer consistência". Segundo Guerra, dizer que a oposição torce contra o Brasil é "compreensível apenas para quem está em campanha eleitoral". O tucano frisou que o resultado do PIB do país mostra que o discurso do governo e a realidade caminham em direções opostas. "O discurso vai para um lado, enquanto os fatos caminham em outra direção", disse.

Já o líder do PT na Câmara dos Deputados, José Guimarães, concordou com a avaliação de Dilma de que parte da oposição "torce pela volta da inflação e para que o país não cresça neste ano". Para ele, ela não está antecipando o debate eleitoral, mas discutindo o país.

- Há uma torcida para o quanto pior, melhor. Não se faz disputa política dessa maneira, mas com a discussão de ideias. E Aécio Neves tem que discutir o país - afirmou.

Fonte: O Globo

Quinze anos de tiroteio verbal

O último confronto direto nos palanques foi em 1998 e, desde então, os ex-presidentes mantêm os embates públicos. A menos de dois anos da disputa ao Planalto, eles intensificam as críticas às gestões tucana e petista

Karla Correia

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu o seminário do PT em Fortaleza, na última quinta-feira, para fazer uma mea culpa do partido em relação ao mensalão. “Somos seres humanos, alguns de nós podem cometer erros, é verdade.” Dito isso, voltou as baterias para a oposição. “Nós não vamos permitir que ninguém jogue em cima de nós a pecha que eles carregaram a vida inteira do jeito de fazer política”, afirmou. Na mira estava o antecessor, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com quem trava uma batalha verbal. A 19 meses do pleito de 2014, as discussões públicas já dão o tom do que será o embate em torno da sucessão presidencial.

A antecipação da disputa presidencial trouxe Lula e Fernando Henrique de volta como protagonistas na arena política, 15 anos depois da última vez que se enfrentaram diretamente nos palanques, nas eleições de 1998. Eleito em 2002, Lula ganhou musculatura política e se tornou o maior cabo eleitoral do PT na última década. Vitorioso em 1998, Fernando Henrique seguiu caminho inverso e passou a ser escondido por seu partido, o PSDB, nas campanhas presidenciais seguintes. Nunca perdeu, contudo, o papel de articulador político dentro da legenda. “Esconder FHC foi um erro estratégico que custou muito caro ao PSDB e, agora, o partido está concentrado em recuperar esse legado de oito anos de governo tucano sob o comando dele”, diz um cacique tucano próximo a FHC.

É em busca dessa “herança bendita” que FHC tem se lançado em viagens. Em Belo Horizonte, durante evento do PSDB mineiro, rebateu uma recente afirmação de Dilma, de que o governo petista não herdou nada da gestão tucana. “O que a gente pode fazer quando a pessoa é ingrata? Nada. Cospe no prato em que comeu”, disparou, para logo depois acusar o PT de “usurpar” o projeto tucano. “Quem não tem projeto é quem está no governo, porque eles pegaram o nosso. Agora mesmo estão discutindo a privatização da distribuidora de energia elétrica. O que aconteceu no Brasil foi uma usurpação de projeto.”

Padrinho da provável candidatura de Aécio Neves (MG) ao Planalto, Fernando Henrique tem organizado encontros do senador com economistas para formular o embrião de um programa de governo tucano para 2014. Edmar Bacha, um dos “pais” do Plano Real, é frequente nessas reuniões, assim como o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan. Os esboços do programa e as falas públicas têm se concentrado meticulosamente em pontos considerados fracos da atual gestão, como segurança pública, saúde e o fraco crescimento da economia. No próximo dia 12, o tucano Luiz Paulo Vellozo Lucas deve lançar um livro passando um pente fino na saúde financeira da Petrobras. Fernando Henrique estará presente, com a metralhadora apontada para o governo Dilma.

O discurso de Fernando Henrique é cuidadosamente preparado para enfrentar uma tática que já deu certo por duas vezes para os petistas: a transformação da eleição em uma espécie de plebiscito, onde mais do que escolher entre candidatos, o eleitorado é instado a apontar se deseja ou não a continuidade de um modelo. “Quem teme a comparação é o outro lado. Eles ficavam sem dormir quando eu falava ‘nunca antes na história do Brasil’”, disse Lula, na última quinta.

Fonte: Correio Braziliense

Tucanos de SP querem dividir poder com Aécio

Serristas vão querer a secretaria geral do PSDB se mineiro virar presidente do partido

Pedido foi feito pelo senador paulista Aloysio Nunes a Fernando Henrique

SÃO PAULO - Aliados do ex-governador José Serra pediram ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que convença o senador Aécio Neves a ceder o segundo posto na hierarquia do partido, a secretaria geral, a um nome indicado pelos tucanos de São Paulo. A demanda é uma reação ao receio de que o mineiro tenha controle total sobre a máquina partidária a partir da convenção nacional do PSDB, em maio.

Aécio deve assumir a presidência do PSDB neste ano, em um movimento cujo objetivo é ampliar sua exposição como potencial candidato à Presidência da República. No comando do partido, o tucano será a maior estrela da propaganda do PSDB na televisão.

Em junho, a sigla terá um programa de dez minutos em horário nobre. Além disso, terá 40 anúncios na programação entre maio e junho. Como há consenso de que ninguém terá força para conter o senador caso ele queira a chefia da sigla, o PSDB paulista passou a reivindicar o controle da secretaria geral.

FHC foi procurado pelo senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), que trabalha para facilitar o diálogo entre Aécio e Serra, que há anos travam uma disputa dentro da sigla. Aliados do mineiro afirmam que, caso Aécio decida ser presidente do PSDB, "faria sentido" a "ala paulista" indicar o secretário geral.

Bênção. Eles destacam, porém, que o principal quadro a ser consultado é o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Ele tem se mostrado afinado com Serra nas articulações. Na semana passada, quando Aécio foi lançado como candidato por FHC, Alckmin evitou endossar publicamente a indicação e disse considerar prematuro debater o assunto.

Governadores do PSDB querem definição rápida

Governadores do PSDB querem que o candidato do partido à Presidência da República da seja definido ainda neste ano. Embora a candidatura do senador Aécio Neves seja apontada como natural, eles dizem ser favoráveis à prévia caso haja mais um postulante à indicação – mas desde que a disputa interna seja feita ainda em 2013.

"Em muitas regiões, o grau de conhecimento dele (Aécio) é baixo. Acho que é hora, sim, de aparecer mais, apresentar propostas e alternativas", disse o governador do Paraná, Beto Richa.

"Um candidato identificado mais cedo tem prós e contras. Eu, pessoalmente, acho que devemos iniciar o ano sabendo quem seria", declarou o governador de Minas, Antonio Anastasia, aliado de Aécio. "Não dá para fazer como em 2010: chegar em maio e definir o candidato", disse Anchieta Jr., governador de Roraima.

A declaração dos governadores sobre a escolha do candidato, ainda que por prévia, é apoiada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo presidente do partido, Sérgio Guerra. O único a não compartilhar do pensamento é o paulista Geraldo Alckmin, que diz estar preocupado com o debate antecipado.

PT e PMDB vão brigar em oito Estados

Dada a largada para as eleições de 2014, uma preocupação do PT e do governo federal é a disputa acirrada que se avizinha entre o partido e o PMDB em pelo menos oito Estados importantes: Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Ceará e Minas Gerais.

Os primeiros gestos de agrado para evitar que esse racha prejudique a reeleição da presidente Dilma Rousseff foram dados com a presença dela em jantar de homenagem ao senador José Sarney (PMDB-AP), oferecido pelo vice-presidente Michel Temer. Dilma, em prova de consideração ao PMDB, reforçou a importância da aliança para as eleições.

De outro lado, durante a semana, o vice-presidente atuou como bombeiro para evitar que manifestações ocorressem contra Dilma ou o PT na convenção nacional do PMDB, anteontem em Brasília. A ideia inicial de caciques era colocar em votação moção nacional proibindo palanques duplos nos Estados. Na sexta-feira, Temer conseguiu convencer a base a deixar a moção de lado.

Fonte: O Tempo

Aquecimento do debate e antecipação da sucessão - Marcus Pestana

O sentido do discurso firme, equilibrado e corajoso de Aécio Neves

Certa vez, na Câmara dos Comuns, Churchill ironizou: "A democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos". Não há outro caminho. A construção do futuro transita pela consolidação da liberdade como um valor universal, permanente, inegociável e sem adjetivos. O debate franco e aberto permite o clareamento das posições, a explicitação das divergências, a construção de consensos e o posicionamento da sociedade.

Nas últimas semanas, a temperatura política subiu. Mesmo com líderes experientes, co
mo Aécio Neves, alertando que cada coisa tem o seu tempo, que antes de 2014 temos que vencer 2013 e que, na política, a ansiedade e a precipitação são más conselheiras, o fato é que as coisas esquentaram. A sucessão presidencial foi precocemente para as ruas.

Por incrível que pareça, quem jogou lenha na fogueira foram Dilma e o PT. Acossada pelo mal-estar crescente em suas bases e pelo crescimento do "volta Lula", Dilma e o PT subiram no palanque a dois anos do fim de seu mandato. Ao partidarizar a discussão do novo marco para o setor elétrico, aparelhar a cadeia nacional de rádio e TV com um discurso que desrespeitou a liturgia do cargo e radicalizar a polarização nas comemorações dos dez anos do PT, Dilma e o PT tiraram as oposições para dançar num outro ritmo.

A toda ação corresponde uma reação. O contraponto era necessário. Não há uma única forma de se ver o Brasil. Foi esse o sentido do discurso firme, equilibrado e corajoso do senador Aécio Neves, como porta-voz das oposições. A voz de Aécio obteve grande repercussão nacional.

O senador apontou que as conquistas de uma economia sólida e estabilizada, herdada do governo FHC, estão se exaurindo. Denunciou que não é mais a presidente que governa e, sim, a lógica da reeleição.

Criticou o crescimento econômico raquítico e o desempenho pífio do PAC. Jogou luzes sobre o grave processo de desindustrialização e o perigo concreto de descontrole inflacionário. Cobrou transparência nas contas públicas e o fim da "contabilidade criativa", que mina a credibilidade do país. Realçou a destruição da Petrobras, das estatais e das agências reguladoras pelo aparelhamento e pela desqualificação da gestão pública. Demonstrou as ameaças no setor energético e as agressões permanentes à Federação.

Fez um raio X do fraco desempenho nas áreas prioritárias de educação, saúde e segurança. Por fim, denunciou firmemente o estímulo à intolerância e ao autoritarismo, nos confrontos com o STF e MPF, nos ataques à imprensa livre e, até mesmo, a uma simples blogueira cubana dissidente. Desmascarou a farsa da suposta faxina e chamou a atenção para a complacência com os desvios éticos. Em resumo, um discurso de estadista.

Quem tinha dúvidas sobre a disposição de luta, atitude, coragem, ousadia e visão de futuro de Aécio e do PSDB, sabe, hoje, que travaremos o bom combate em favor das boas causas.

Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG)

Fonte: O Tempo

Quarteto de hipóteses (ou concerto de fantasia) - Wilson Figueiredo

Bem fez a ex-senadora Marina Silva, que não quis chegar atrasada nem perder tempo na sucessão presidencial, depois que Lula se incumbiu da regência oculta de um improvisado quarteto de cordas. Tudo sem deixar a função de adjunto presidencial de Dilma Rousseff., com que o contemplou - com simpatia e ironia - seu antecessor no Planalto. Não se sabe o que acontecerá à presidente Dilma no sinuoso percurso até as urnas ano que vem. Por enquanto, todos somados, formam o quarteto de hipóteses presidenciáveis o governador de Pernambuco, o ex-governador de Minas e a ex-senadora. Mas, candidato mesmo, para valer e prevalecer, apenas Luiz Inácio Lula da Silva. Se houver dúvida, faça-se pesquisa de opinião pública e a eleição será o óbvio.

A senadora Marina, considerando que eleição não se antecipa em vão, não quis esperar mais e cuida da moldura da sua candidatura. Preferiu fazer uma rede e correr o risco de ouvir o próprio Lula recomendar cuidado porque, como se diz no varejo, “caiu na rede é peixe”. Pelo menos, era. Lula pratica o arrastão de liberais que se assustam com o esquerdismo meramente sindical com que se fez e se refaz.

Lula é candidato nato à procura de eleições. A futura sucessão presidencial foi por ele trazida para o presente por ter emprestado o mandato a Dilma Rousseff. Historicamente falando, a vez caberia, por gravidade palaciana, a José Dirceu de Oliveira, se não tivesse sido atropelado pelas conseqüências. Quis a história que Dirceu fosse descartado pelo mensalão e, em proveito de Lula, que a candidatura Dilma Rousseff surpreendesse pela originalidade. Mulher com currículo de esquerda foi ponto certo. Golpe de surpresa. E surpreendeu com a disposição ética com que se apresentou ao limpar a fachada do governo.Durou pouco.

A economia rateou e Lula percebeu que recairiam sobre ele as conseqüências de um governo Dilma trincado nos resultados. As nuvens se acumularam. Aos primeiros sinais de mau tempo na economia, o ex-presidente e atualmente adjunto empurrou a presidente para a campanha eleitoral, com chuva ou com sol. Mais do que a sucessão propriamente dita, o que se passa à margem dos fatos é farsa.

A sucessão derrapou até agora no vácuo político, mas tanto fez que o motor pegou no tranco e Dilma Roussef foi empurrada por Lula, que fez que ia mas não foi. Dilma foi, mas ao jeito dela e, por educação, para retribuir à gentileza do adjunto, e assumiu desajeitadamente a candidatura à reeleição, que se tornou o anexo do nosso presidencialismo de estimação. Até prova em contrário, a candidatura Dilma Rousseff não passa de gentileza para preservar a candidatura de Lula (implícita na própria eleição dela).

Governantes não gostam de ser enganados, e nisso Lula tem demonstrado talento destituído de ética. É suficiente o que se vê e se esquece como se fosse descuido. Estão aí, para quem quiser ver, as biografias insepultas sacrificadas pelo mensalão e o equivoco fatal de achar que o tempo dá conta de tudo.

Assim que a tempestade desabou, ao peso do mensalão, na metade do primeiro mandato de Lula, José Dirceu de Oliveira foi sacrificado pelo silêncio presidencial e demitido farisaicamente da Casa Civil - sem consideração política _ para aliviar a barra e aplacar a ira da opinião pública. Dirceu não era o único, mas o credenciado pela confiança petista para suceder a Lula nos vinte anos ininterruptos de poder previstos para o petismo.

Como diria no seu tempo Benedito Valadares, o que movia Lula era o sintoma indisfarçável da mania nacional de bancar Tiradentes com o pescoço dos outros. Com a candidatura Dilma, Lula surpreendeu o PT e frustrou a pressão em favor da candidatura de Dirceu. O fato é que a hipótese Dilma Rousseff, se tiver efeito político suficiente nas pesquisas, pode atravessar o caminho do adjunto de presidente e levá-lo de volta ao insucesso. A antecipação da campanha eleitoral tem várias a impressões digitais.

Mesmo assim, o adjunto eleitoral de Dilma Rousseff deve estar convencido de que, no pedregoso solo da sucessão presidencial, o futuro imediato não oferece garantia de continuidade. Nada impede que a história venha a ser contada de outra maneira. Até lá, Lula está se poupando do bombardeio que o espera. Nem a dívida de gratidão com José Dirceu poderá ser utilizada como recurso final, pois a condenação de seu ex-ministro da Casa Civil não o livrou de uma dívida sufocante jun to à História. 

Desenha-se o final punitivo, pois Lula não gosta de pagar o bem com o bem: ficou devendo a reparação a Dirceu quando o demitiu e, quando podia trazê-lo de volta à Casa Civil, como reparação política, tratou foi de mantê-lo longe do poder. Só se livrou, porém, de ser o patrono oculto do mensalão, com a esfarrapada desculpa de se proclamar o último a saber dos fatos. E das conseqüências a longo prazo.

Pelo lado de dentro do poder, não há outro roteiro para a sucessão presidencial senão esse método furado, de dar a largada sem sair do lugar. Este começo limitado a empurrar a candidatura presidencial à reeleição será página virada assim que se apresentar um bom fato. A candidatura de Lula está posta e conta com ele, que conta com ela. A conferir.

Fonte: Jornal do Brasil

PT acua Eduardo Campos - Ricardo Noblat

“Uma provável e legítima candidatura do PSB ao Palácio do Planalto é um problema maior para o PSDB.” José Dirceu

Se comprado apenas pelo que diz para divulgação, até que Lula parece bonzinho quando quer. Lula quis parecer bonzinho em Fortaleza, na semana passada, ao responder perguntas sobre a hipótese de o PSB lançar Eduardo Campos, atual governador de Pernambuco, para concorrer à sucessão de Dilma em 2014. “Não podemos impedir as pessoas de fazerem o que é do interesse dos partidos”, disse Lula, o cordato.

E FOI ADIANTE: “Defendo a liberdade incondicional de cada partido de fazer o que bem entenda. Se não fosse assim, o PT não teria chegado à Presidência da República”. Por fim, elogiou o próprio Eduardo: “Ele é uma personalidade que pode desejar qualquer coisa que quiser neste país”. Eduardo apoiou Lula na maioria das eleições presidenciais disputadas por ele. Lula só apoiou Eduardo para que ele se reelegesse governador.

NO ANO PASSADO, Lula e Eduardo haviam combinado que o deputado Maurício Rands (PT) seria o candidato dos dois a prefeito de Recife. O PT controlava a prefeitura há 12 anos. Um dia, Eduardo soube que Lula anunciaria a candidatura a prefeito do senador Humberto Costa (PT). Foi nessa ocasião que a boa relação entre os dois começou a ir para o buraco. Eduardo isolou o PT e elegeu um prefeito do PSB.

DESDE ENTÃO, ele e Lula nunca mais se viram ou se falaram. À Dilma, recentemente, Eduardo revelou que somente no próximo ano o PSB se posicionará sobre a eleição presidencial. Adiantou que o partido tende a disputar a eleição com candidato próprio, mas que não poderia garantir que o fará. Dilma renovou seu desejo de contar com o apoio do PSB — no primeiro ou em um eventual segundo turno.

DE LÁ PARA cá, tudo desandou sob a condução do presidente emérito. Lula apertou os irmãos Gomes (Cid, governador do Ceará, e Ciro) para que ameaçassem abandonar o PSB. Sem candidato forte ao governo de Pernambuco, o PT acenou para Fernando Bezerra Coelho, ministro da Integração Nacional por indicação de Eduardo. Fernando lançou uma nota de quatro magras linhas negando os acenos.

EDUARDO SABE que Fernando quer suceder-lhe. E que, para isso, será acolhido pelo PT. Em 1986, então secretário de estado do governo Roberto Magalhães (PDS), Fernando largou o cargo para apoiar Arraes, candidato a governador pelo PSB. Em 2002, mudou- se para o PMDB e apoiou Jarbas Vasconcelos, que quatro anos antes derrotara Arraes. Finalmente, em 2006, voltou ao PSB para apoiar Eduardo, que se elegeu governador.

A OFENSIVA DO PT contra Eduardo põe em risco duas condições essenciais à consolidação da candidatura dele a presidente: a unidade do PSB e a unidade das principais correntes políticas de Pernambuco. Caso Fernando acabe no PT para disputar o governo, sua candidatura subtrairá parte da força da ampla coligação partidária que sustenta a ambição presidencial de Eduardo. Lula sabe disso. E por saber...

MARINA SILVA será candidata a presidente? Ela não é da base de apoio a Dilma. Não lhe tira votos. Eduardo é da base de apoio e tira votos de Dilma. De resto, desmancha o cenário considerado ideal por Lula para que ele ganhe outra vez: PT, apoiado por um monte de partidos x PSDB quase só. Eduardo deixaria a base do governo na companhia de outros partidos. Nenhum partido parece disposto a trocar Dilma por Aécio.

EDUARDO METE muito medo no PT. A pecha de direitista, privatista e anti-Lula não gruda nele. É preciso, portanto, sufocá-lo logo de saída. Todas as armas serão usadas para isso.

Fonte: O Globo

Dilma e o dragão - Melchiades Filho

É curioso e significativo que Dilma Rousseff, logo ela, tenha manuscrito um bilhete mandando sua equipe afirmar o controle da inflação "como um valor em si".

Curioso porque a presidente sempre foi uma alma desenvolvimentista. Ministra de Lula, militou na ala anti-Palocci, que defendia relaxar a política monetária para ajudar a expandir a economia. Eleita, permitiu à inflação ascender além (do centro) da meta, enquanto alegava fatores sazonais e minimizava o aquecimento da demanda.

Significativo porque indica uma inflexão. Hoje, a inflação preocupa o Planalto mais do que o PIB.

O resultado da atividade econômica em 2012 (+0,9%) foi, de fato, anêmico. Mas há sinais de retomada. No último trimestre do ano, os investimentos em maquinário para produção e construção civil aumentaram. A indústria parece ter normalizado os estoques. Mantidos o ritmo da virada do ano e os juros baixos, o país crescerá além de 2% em 2013.

Além disso, estão programados para este ano leilões de rodovias, ferrovias, poços de petróleo, aeroportos e mesmo do trem-bala. Depois de levar traulitadas até de aliados, o governo melhorou prazos e taxas de retorno para quem apostar nessas grandes obras de infraestrutura.

O pacote logístico talvez não turbine o PIB de imediato. Mas contribuirá para aliviar o desânimo da iniciativa privada. Isso sem falar da nova lei de portos, que abre perspectiva atraente a investimentos.

Sobre a inflação, porém, não há boa notícia engatilhada. A taxa anualizada deve seguir rodando na casa de 6% nos próximos meses.

Não basta escrever bilhetes e reclamar dos "mercadores do pessimismo" para desarmar expectativas inflacionárias. Na ordem do dia estão calibrar as tarifas de importação, ajustar gastos correntes, manejar a supersafra de alimentos e aquietar o ministro da Fazenda, não necessariamente nesta ordem.

Fonte: Folha de S. Paulo

Lanterna na proa - José Roberto de Toledo

Duas notícias caíram no colo dos que a candidata Dilma Rousseff tachou de “mercadores do pessimismo”: o PIB nanico de 2012 e a terceira queda consecutiva da confiança do consumidor (INEC), já em 2013. Uma é o passado, a outra insinua o futuro. O mercado, de lanterna na popa, excitou-se com o PIB e esnobou o INEC. O governo, no discurso, sugere que se apaguem as lanternas. Navegar no escuro–ou iluminando a ré – dá na mesma: a praia. Como sempre ocorreu no último quarto de século, a política segue o rastro da economia. Tem sido assim desde a hiperinflação de José Sarney e a eleição de Fernando Collor, passando pelo lançamento do real e a eleição de Fernando Henrique Cardoso, até chegar à explosão do consumo da era Lula e à eleição de Dilma.

O PIB de hoje é o slogan eleitoral de amanhã. E o consumo de amanhã é o resultado da próxima eleição. Assim, lanterna à proa. Um consumidor de manchetes mais distraído poderia protagonizar o seguinte diálogo com alguém que tenha lido até o fim o noticiário sobre os rumos da economia nos últimos tempos: – E o PIB, hein? Caiu, né? – Não. – Não? – Não. Freou forte, mas está subindo. Bem lentamente, mas continua indo para cima. – Ah, mas está quase parando, indo ca- da vez mais devagar. – Também não. – Como não? Vi aí no jornal, por cima do seu ombro: diz que só não está pior do que na época do Collor. – Você precisa ler a história toda. Depois da crise mundial de 2008, a economia do Brasil andou para trás por nove meses, até quase o final de 2009. Mas aí deu a louca e pisou fundo no acelerador por um semestre. Desde 2010 ela continuou crescendo, mas em ritmo cada vez mais lento. Foram dois anos de desaceleração contínua até junho do ano passado. – Ah, então estamos a caminho do fundo do poço... – Pois é. Não. – Você é do contra, né? – Deixa eu terminar? Quando parecia que iria parar e engatar a ré, a economia começou a acelerar novamente em 2012.

No terceiro trimestre, cresceu mais depressa do que no segundo; e no quarto trimestre, mais rapidamente do que no terceiro. – Puxa, que alívio! Então está tudo bem... – Não. – Você está de sacanagem! – Não sou eu, são os números. Primeiro, que ela ainda está mais devagar que este ônibus. Depois, não dá para projetar nenhuma tendência de reaceleração da economia antes de maio ou junho. – Por que? – É preciso ver se essa retomada tímida do fim do ano passado se sustenta em 2013. – E por que não se sustentaria? – O capital continua assustado. Os investimentos pulam para cima e para baixo a cada um ou dois anos. Ao menor sinal de crise, a euforia vira desconfiança, às vezes depressão. – O capital é bipolar, é? –Não sei.

O Delfim chama de “stop and go”: anda e para, anda e para. – Entendi, é como o trânsito em São Paulo. – Sem falar que tem o problema do consumo. – Que é que tem o consumo? O consumo está ótimo. Olha ali pela janelinha a quantidade de camelô na calçada. – Não sei, não. Parece que o consumidor está perdendo a confiança. – Desconfiado é você. – Olha aqui essa nota no pé da página: diz que o índice de expectativa do consumidor caiu de novo em fevereiro. É o terceiro mês seguido que o consumidor fica mais desconfiado. – Desconfiado de que? – Da inflação, que voltou a subir. – E daí? Olha lá para fora. Nunca teve tanto carro na rua nem avião no ar. A classe C deixou a rodoviária às moscas. Não leu aí no seu jornal, não? – Eu sei, se não fosse o consumo das famílias o PIB já tinha se estatelado há muito tempo. Mas esse índice em queda... – E esse tal de INEC por acaso é pitonisa? – Não chega a tanto, mas sempre que ele caiu várias vezes em seguida, o consumo das famílias acabou desacelerando depois. E se o consumo não crescer mais tanto assim, aí o PIB pode ficar nanico de novo. – Não esquenta, não.

Se perceber que isso vai acontecer, a Dilma lança mais incentivo para o povo comprar geladeira e carro em 120 vezes sem juros. – Aí é que este trânsito não vai andar mesmo. –Mas a tentação é grande, né? Quem não quer ser popular como o Lula foi? – Esse é que é o ponto. Quando a confiança do consumidor subiu, a popularidade do Lula e da Dilma subiram junto. Quando ela cair... – Mas você não disse que o PIB está subindo, que pisou no acelerador de novo? –É,bem...Puxa, me distraí. Dá licença, por favor, que eu preciso descer. – Ih, passou do ponto, foi? – Temo que sim. Quer ficar com o jornal?

Fonte: O Estado de S. Paulo

'Temos hoje um quadro de estagflação'

Para economista, mistura de baixo crescimento com inflação em alta é maior desafio para governo

João Sorima Neto

SÃO PAULO - A expansão de apenas 0,9% da economia em 2012, com uma inflação anual acima de 6%, põe o Brasil numa incômoda posição, que tecnicamente os economistas chamam de estagflação. Trata-se de um quadro de baixo crescimento com elevação de preços. A diferença, no caso brasileiro, é que a estagflação clássica traz aumento do desemprego, o que ainda não acontece por aqui. O economista José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, afirma que o governo está em xeque diante deste quadro: ou aumenta o juro para frear a alta dos preços ou tolera uma inflação maior em troca de um Produto Interno Bruto (PIB) mais generoso. Mendonça de Barros estima um crescimento de 3% este ano, com a inflação cedendo um pouco, mas ainda rondando o patamar de 6%. "O Brasil está preso a uma armadilha de baixo crescimento. Só com o aumento do investimento a economia vai acelerar", diz.

Como senhor analisa o PIB de 2012?

O dado negativo que mais chamou a atenção foi a queda de 4% no investimento no ano passado. Embora tenha melhorado um pouco no último trimestre do ano, foi uma baixa muito pesada. O que fez diferença foi a retração no setor privado. Os empresários, especialmente no setor industrial, recuaram bastante no investimento. A hipótese mais razoável para explicar esse comportamento é que a incerteza se elevou com a contínua mudança de regras, especialmente no setor elétrico.

Há outros fatores que abalam a confiança dos empresários para investir?

A crescente piora da infraestrutura do país é outro fator que desestimula o investimento. Nações que investem menos de 5% do PIB em infraestrutura não crescem, é histórico. O Brasil investe 2%. Apesar da baixa da Selic e do juro do crédito do BNDES, além de uma certa desvalorização cambial, a incerteza por todos esses fatores explica a retração do investimento.

Se esse sentimento de incerteza persistir, o que se pode esperar para o PIB deste ano?

O investimento privado será decisivo para o crescimento da indústria e do PIB. Se o investimento crescer 2,9%, acredito que a economia se expanda 3%. O problema é que, até agora, apenas a produção de caminhões, que entra na conta do investimento, está forte neste início de ano por causa da safra recorde. Para reconquistar a confiança do empresário, leva tempo.

Os leilões de concessões de ferrovias e rodovias que o governo pretende fazer este ano não ajudam a melhorar o investimento?

Embora eu acredite que os editais de concessões serão mais amigáveis ao investidor, esse investimento só terá reflexo em 2014. Os leilões acontecem em abril, maio, junho. Mas até fazer canteiro de obras já é julho, agosto.

E o consumo das famílias que vinha puxando o PIB, não vai crescer mais?

Nos próximos dois anos, as pessoas ainda terão de pagar as dívidas que fizeram. O consumo vai crescer, mas a expansão será de 2% até 2014. Não veremos mais aquele ritmo chinês.

A economia brasileira configurou-se em 2012 com baixo crescimento e inflação mais alta. É um quadro de estagflação?

A estagflação caracteriza-se pelo crescimento baixo e pressão inflacionária, com aumento do desemprego. É o que temos hoje no Brasil, mas curiosamente com desemprego baixo. O crescimento do emprego está muito melhor do que o da economia. Para sair desse quadro, ou o governo trabalha para o PIB crescer, mantendo o desemprego baixo, ou faz a inflação ceder. Vai depender dos números de produção e inflação que vierem para que o governo tome a decisão de elevar ou manter o juro (a Taxa Selic) nos atuais 7,25%.

Por que o desemprego está baixo no Brasil, mesmo com o baixo crescimento?

É o setor de serviços que está absorvendo essa mão de obra, com o aumento da demanda por serviços. Mas esse é um setor de baixa produtividade. Eu acredito que a taxa de ocupação deve cair um pouco este ano. É difícil ela se manter nesse patamar com crescimento baixo. E o custo da mão de obra explodiu. Em termos reais, os salários subiram entre 9% e 10% para algumas categorias. Os preços dos serviços acompanham esse aumento, o que leva à inflação.

Diante de tudo isso, dá para concluir que o governo está numa encruzilhada?

Na minha avaliação, o governo caiu na armadilha do baixo crescimento. Apostou que o investimento público, através das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), puxaria o crescimento. Mas não conseguiu executar essas obras. Depois, baixou o juro e melhorou o câmbio e achou que o crescimento vinha por gravidade. Não veio, por causa da falta de infraestrutura, do aumento do custo da mão de obra e do custo Brasil. Agora, a alternativa é buscar o crescimento pelo investimento privado. Não existe bala de prata.

Fonte: O Globo

Mulheres - Aécio Neves

Lembrei-me recentemente da observação que ouvi de uma senhora durante visita que fiz a uma nova penitenciária feminina no meu Estado. Ao comentar a importância da experiência que permitia que bebês ficassem com suas mães até completarem um ano de idade, ela chamou a minha atenção para a facilidade com que os homens cortavam os vínculos com suas companheiras, quando elas se encontravam presas.

Enquanto nos presídios masculinos era comum ver mulheres visitando os maridos anos a fio, o mesmo não ocorria quando era a mulher a sentenciada. E concluiu: não sei se é porque eles não aguentam ou porque não se importam...

Recuperei esse comentário ao rever os dados do Fórum Econômico Mundial ("The Global Gender Gap Report 2012") que apontam os avanços que o Brasil vem alcançando na diminuição das diferenças entre a participação feminina e a masculina na sociedade.

A parceria do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) com bancos privados brasileiros, estendendo ao país o programa de crédito e apoio a mulheres empreendedoras, é mais um exemplo evidente dessa importância. Em dois anos serão selecionadas 1.500 empresas pilotadas por brasileiras. Na parceira com o BID, as instituições financeiras reconhecem que as mulheres têm taxas de inadimplência menores e ocupam cada vez mais espaços maiores no mundo dos negócios e nas universidades. Hoje, 22 milhões dos lares brasileiros são chefiados por elas.

Estudo do Banco Mundial sobre a redução da pobreza na América Latina mostrou que a renda proveniente do trabalho de mulheres contribuiu com 30% na redução da pobreza extrema no continente.

Em Medellín (Colômbia), durante visita que fiz -a convite do meu amigo Luis Alberto Moreno, presidente do BID, e ainda como governador de Minas- a comunidades recém-resgatadas do domínio do narcotráfico, impressionava o número de cooperativas e pequenos negócios conduzidos pelas chefes de famílias e o comprovado alcance social que tinham, pelos empregos e pela estabilidade que geravam em áreas antes dominadas pela violência e pela exclusão.

Por outro lado, não foi sem razão que o presidente Fernando Henrique Cardoso determinou que a titularidade do cartão bancário do Bolsa Escola viesse preferencialmente em nome das mães.

A proximidade do Dia Internacional da Mulher provoca sempre necessários debates e reflexões acerca das desigualdades que ainda precisam ser vencidas neste campo.

Mas existe uma verdade que, porém, não pode ser dimensionada pelas estatísticas oficiais: há um valor ético diferenciado agregado à contribuição que a mulher dá à nossa sociedade, e que merece mais atenção e reconhecimento.

E respeito.

Aécio Neves, senador (PSDB-MG)

Fonte: Folha de S. Paulo

Ciclistas apoiam a democracia? - Renato Janine Ribeiro

Deve soar estranho sugerir que as ciclofaixas que já somam dezenas de quilômetros para o lazer paulistano indiquem o fracasso de nossa democracia. E é claro que acho ótimo apostar na atividade física, largar o carro e ocupar o asfalto com outra coisa que não motores. Mas há um aspecto delas que nunca vi ser discutido, e me incomoda. Por isso nesta coluna, que trata de política, debato hoje o déficit democrático que as ciclofaixas apontam.

O problema é simples: elas foram instituídas há mais de três anos pela Prefeitura de São Paulo, já somam 150 km de extensão - mas ainda temos, a cada esquina, um monitor com bandeirinha, avisando aos ciclistas que não passem no sinal proibido. Ora, se precisamos de pessoas para deter os ciclistas no vermelho, é porque se supõe que os usuários não interiorizaram o cumprimento das leis do trânsito e o respeito ao outro. Supõe-se que, se não houver centenas de monitores, um por quarteirão, ciclistas serão mortos - ou, o que parece mais provável, dado que as bandeirinhas estão lá para deter as bicicletas e não os automóveis, que ciclistas atropelarão pedestres ou baterão em carros. A prefeitura é sábia em não correr o risco de uma morte ou mais a cada domingo. Mas me assusta a suposição de que, sem uma presença maciça de fiscais, teríamos acidentes, talvez numerosos. Os ciclistas de domingo são, ao que parece, pessoas de poder aquisitivo e talvez formação escolar maior que a média da população. No entanto, o que a prefeitura diz, pelos seus atos ainda que não em palavras, é: eles não respeitarão as leis de trânsito se não os tutelarmos. Porque é isso o que está em questão: são tratados como crianças, incapazes que seriam de respeitar a legislação ou mesmo a moral, que manda esperar quando é a vez do outro - carro ou pedestre - passar.

Sigo aqui um princípio que vem de muitos filósofos e deságua em Freud: avaliemos as pessoas pelo que fazem e não pelo que dizem. Certamente as ciclofaixas - as quais não estou atacando, repito - têm um aspecto "cidadão". Mas o fato é que, mantendo a chupeta quando a criança pode ser desmamada, conservando a terceira rodinha na bicicleta quando o jovem já pedala direito, brecando manualmente os ciclistas a cada esquina, protege-se, tutela-se quem não deveria mais precisar disso.

A prefeitura crê na cidadania dos cidadãos?

Dou um exemplo do próprio trânsito. Coloquemos numa rua um sinal de contramão: o motorista pode infringir a lei, mas, se ele for educado, ao ver o aviso, respeitará não só a norma legal mas também as pessoas que transitam pela rua, com tranquilidade, justamente porque elas acreditam que seu direito (à mão única, por exemplo) será respeitado. Ou posso bloquear, fisicamente, o acesso a essa rua. Nesse caso, o motorista não tem escolha. Ele é forçado a respeitar a mão. Fica mais seguro para todos. Mas o motorista é, assim, infantilizado. Estamos dizendo, quando não apenas proibimos uma rota mas a bloqueamos com cimento, que não confiamos em sua liberdade, em sua escolha, em seu caráter ético. Por isso, o mais "adulto", o mais democrático (dado que a democracia consiste em tratar as pessoas como adultas e não como crianças), é sinalizar a via em vez de bloqueá-la.

Não é por acaso que em vários países desenvolvidos o respeito à lei de trânsito é tão maior do que entre nós.

E é esse o problema que as ciclofaixas parecem revelar. Elas, aliás, entram aqui como indicador de um mal-estar bem maior que elas: a dificuldade de nossa sociedade para cumprir a lei, em especial aquela que resume toda a ética: respeite o outro. É até comum, no trânsito, se reclamar quando a prefeitura multa; diz-se então que ela deveria "orientar", isto é, tutelar, proteger, mostrar ao infrator que ele está infringindo a lei, mas sem puni-lo. Isso, como se cada motorista não tivesse passado por uma prova de conhecimento da legislação de trânsito - como se não soubesse que respeitar o pedestre e os veículos é básico, se quisermos um mínimo de cidadania na circulação de pessoas pelo espaço público.

Por que me deter nesta questão que pode parecer pequena? É porque o debate político, no país, é uma troca de acusações entre os dois partidos que têm disputado a Presidência, cada um dizendo que o outro falta com obrigações básicas republicanas (isso os tucanos dizem do PT, chamando-o de corrupto) ou democráticas (isso os petistas dizem do PSDB, que defenderia os interesses dos mais ricos e não os do povo). Pois bem, e se houver um problema sério, não só na forma como nossos representantes eleitos atuam, mas no modo como nós, cidadãos, eleitores e aqui ciclistas, agimos? Se nos colocamos na posição de quem é apenas protegido, de quem não se responsabiliza pelas suas ações, se acreditamos que precisamos usar dinheiro público para dispensar adultos de sua responsabilidade de parar - espontaneamente - a bicicleta no cruzamento, então somos, nós também, responsáveis pelo déficit democrático do país. Na verdade, é assim: na democracia, os defeitos geralmente têm alguma base nos próprios cidadãos, que são quem elege os Poderes.

Duas conclusões. Uma de curto prazo: tirar os monitores que "orientam" os ciclistas seria perigoso, porque eles expressam um problema real, o de cidadãos que não veem a cidadania como dever e, por isso, precisam ser tutelados. Acidentes ocorreriam; não vale a pena. Outra conclusão, esta de longo prazo: isso tem de mudar. Mas mudar na causa, o comportamento das pessoas, e não no paliativo, que são os monitores. Porque, no fundo, não há democracia sem uma sociabilidade democrática, e é esta que, penso eu, está falha entre nós.

Fonte: Valor Econômico

Duas revoluções, dois destinos - Alfredo Sirkis *

Os recentes incidentes envolvendo a visita ao Brasil da blogueira cubana Yoani Sánchez, hostilizada por turbas agressivas da "Solidariedade com Cuba", foram também uma oportunidade perdida para debater o argumento de que a ditadura "de esquerda" seria o inevitável preço a pagar pelos grandes "avanços sociais".

É comum escutarmos que as restrições à liberdade de expressão e de imprensa, a ausência de eleições livres, de pluralismo político ou de alternância no poder, passado mais de meio século da revolução cubana, se justificam por suas conquistas na educação e na saúde e pela ausência de fome e miséria absoluta na ilha. O argumento jamais se sustentou na comparação com outra revolução que a precedeu em 11 anos: a da Costa Rica, de 1948, que obteve notáveis avanços em educação e saúde e garantiu um padrão de vida muito mais elevado, sem o sacrifício das liberdades, do pluralismo, do respeito aos direitos humanos e de um Judiciário independente.

Hoje a maioria da população costa-riquenha é de classe média, seu salário mínimo é 15 vezes maior que o de Cuba, seu produto interno bruto (PIB) e a sua renda per capita são os mais altos da região. Há três vezes menos suicídios do que em Cuba. A Costa Rica tem políticas ambientais e ecoturismo de referência internacional e ambiciona tornar-se o primeiro país carbono neutro do mundo.

A revolução de 1948, liderada por José María Figueres Ferrer, conhecido como Don Pepe Figueres, derrubou o regime oligárquico do presidente Teodoro Picado e do seu mentor político Rafael Calderón Guardia, que fraudavam sistematicamente as eleições, como na nossa República Velha. Foi desencadeada em reação a um "autogolpe" - queimaram as listas com os resultados eleitorais, privando da vitória o candidato progressista Otilio Ulate, e assassinaram um dos líderes oposicionistas, Carlos Luis Valverde. Detalhe curioso: o pequeno partido comunista local, o Partido Vanguardia Popular (PVP), apoiava ativamente o regime oligárquico.

A desmobilização de suas milícias, em troca da garantia dos direitos sindicais e da sua legalidade, acertada numa dramática negociação entre o secretário-geral do PVP, Manuel Mora, e José Figueres, na floresta de Ochomogo, foi decisiva para a relativamente incruenta vitória da revolução após 40 dias de combates.

A junta revolucionária, liderada por Don Pepe, nacionalizou os bancos para democratizar o crédito - até então exclusividade da burguesia compradora (importadora) -, permitindo desenvolver a agricultura e a indústria. Investiu obsessivamente na educação, instituiu a autonomia do Judiciário. Dissolveu seu próprio exército revolucionário depois de uma tentativa de golpe do então ministro da Defesa, Edgard Cardona, inconformado com o tratamento leniente dado por Figueres aos comunistas. Isso não o impediu de derrotar, com o povo em armas, uma invasão do ditador Anastasio "Tacho" Somoza (pai), da Nicarágua, onde se haviam exilado Picado e Calderón.

Ao final de 18 meses, Figueres entregou o governo a Otilio Ulate, legitimamente eleito nas eleições "meladas" do ano anterior, apesar de notórias divergências entre ambos. Voltou à sua Fazenda La Lucha sin Fin, onde ficou até 1953, quando disputou democraticamente e foi eleito presidente.

Cercada de ditaduras por todos os lados até anos recentes, a Costa Rica jamais deixou de promover eleições livres a cada quatro anos. Poderia ter sido assim em Cuba 11 anos mais tarde?

Don Pepe apoiou Fidel Castro com dinheiro e armas. Foram amigos, mas romperam quando Fidel se aliou ao bloco soviético. O contexto da guerra fria - em 1948, nos primórdios, em 1960, no apogeu -, com uma quase imediata hostilidade norte-americana à revolução cubana, fez a diferença, bem como a personalidade de Fidel.

Entre os líderes das duas revoluções ressaltam diferenças de idade, origem social e experiência de vida: Don Pepe, filho de um modesto médico catalão, era pequeno fazendeiro, tinha 42 anos ao liderar sua revolução. Conhecia bem os Estados Unidos, onde estudara. Sua primeira esposa, Henrietta Boggs, era americana. Ele sabia explorar com habilidade as contradições internas em Washington e nunca quis aliar-se à URSS, embora tenha nacionalizado a United Fruit, o flagelo das Repúblicas bananeiras. Fidel, filho de um grande latifundiário de origem galega, era universitário quando chefiou o assalto ao quartel de Moncada. Depois conheceu apenas a prisão, o exílio e Sierra Maestra. Don Pepe era de ouvir, negociar e pactuar. Fidel nasceu para mandar e ser obedecido.

Com pouco sangue e sem paredón, a revolução de 1948 não figura no panteão histórico-jornalístico. É praticamente desconhecida, ao contrário das revoluções trágicas ou das derrotas heroicas dos mártires, não importa quão patéticos ou desavisados. Uma revolução com final feliz, um país que há 65 anos "caiu numa democracia", para nela permanecer até hoje, um líder revolucionário que resolveu abrir mão do poder para depois disputar eleições livres, em 1953 e 1970, são decididamente indignos do rol de eventos e personagens históricos de primeira linha...

Don Pepe Figueres, que gostava de se definir como "socialista utópico", nunca cultivou o "Patria o Muerte" ou outro necrófilo brado retumbante do gênero. Seus compatriotas, los ticos - os costa-riquenhos - pacíficos e cosmopolitas, são, com toda a probabilidade, mais felizes. No entanto, a felicidade - gota de orvalho numa pétala de flor -, pelo visto, não é um indicador relevante no fazer História do nosso tempo.

Essa pacata democracia sexagenária, ainda que em terra de tantos vulcões, não evoca o menor romantismo, não vale sequer uma camiseta ou boina negra com estrelinha vermelha. Mas constitui intenso objeto de desejo na "geração Y", de Yoani Sánchez, dos filhos daquela outra revolução, a tão exaltada em prosa e verso.

* Alfredo Sirkis é escritor, jornalista e deputado federal da Rede.

Fonte: O Estado de S. Paulo

E preciso pensar na Itália, não em si’

ENTREVISTA
Fausto Longo, eleito senador na Itália

Fernanda Sintas

Eleito senador para representar a América do Sul no Parlamento italiano, o brasileiro e descendente de italianos Fausto Longo (Partido Democrático) disse ao Estado que os líderes da Itália precisam entender o recado das urnas. O resultado eleitoral foi inconclusivo e criou um impasse na formação do governo. O recém-eleito senador pretende levar ao Parlamento italiano as demandas da América do Sul, mas também quer ajudar a "devolver credibilidade para as instituições" do país europeu. A seguir, trechos da entrevista:

• Qual será o seu primeiro passo no Parlamento italiano?

Sentar com as lideranças da coalizão de centro-esquerda. Este não é um mandato só meu, é um mandato do partido, então quero ouvir deles quais serão os comprometimentos. Precisamos tentar achar soluções para as demandas na América do Sul, das pessoas que nos elegerem.

• Como o senhor vê o impasse político após as eleições?

Gomo um dos 315 senadores eleitos, tenho a preocupação de devolver estabilidade, credibilidade para as instituições republicanas da Itália. O país atravessa um momento delicado e terei de me envolver na busca de soluções para resgatar a estabilidade econômica e política do país. Há um grupo da sociedade que votou em Bersani, outro no Berlusconi, outro no Beppe Grillo e um que votou no Monti. O equilíbrio foi tão grande que esse é o recado a ser entendido: os líderes desses partidos precisam sentar na mesma mesa e pensar na Itália e não cada um em si.

• E o voto antipolítico?

Os 25% das pessoas que deram esse voto de protesto não podem ser desconsiderados. Eles estão dizendo "reformulem a política". O papel do Grillo agora seria entender o voto que ele teve, sentar no Congresso e ajudar a construir a reforma pedida por aqueles que votaram nele. Por outro lado, temos uma questão mais grave: a não participação no processo eleitoral. Dos italianos que tinham direito de votar, 45% não compareceram. O não voto é mais grave do que o voto de protesto, pois demonstra a perda da credibilidade da sociedade no processo político.

• E como o senhor pode contribuir para melhorar a situação econômica na Itália?

Somos 80 milhões de ítalos-descendentes espalhados pelo mundo. Se todos pudessem visitar a Itália, por exemplo, o turismo, que é um dos principais produtos italianos, seria muito valorizado. É uma economia forte que você pode gerar.

Quem é
Fausto Longo, senador do Partido Democrático.

É arquiteto e mestre em planejamento e tecnologia habitacional pelo IFT do Estado de São Paulo. Responde pela Gerência de Ação Regional da Fiesp e é secretário do Partido Socialista da Itália no Brasil.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Drible no passado - Audálio Dantas

É de se questionar se um ex-colaborador da ditadura deveria representar o Brasil na Copa do Mundo

Muitas imprecisões já rondaram o caso Vladimir Herzog, morto no DOI- Codi no dia 25 de outubro de 1975. Suicídio? Não. Descuido dos militares, que ultrapassaram os limites da tortura? Ou assassinato deliberado, simplesmente para demonstrar poder? Fica a dúvida até hoje. Fato é que, nessa trama urdida pela ultradireita do II Exército, muitos atores desempenharam importante papel, como Sérgio Fleury, Harry Shibata, Ednardo D'Ávila Mello, Fausto Rocha e Cláudio Marques, nomes conhecidos da história. Mas, no desenrolar dessa trama, outros desempenharam papel coadjuvante. Entre eles, José Maria Marin.

O nome voltou à tona a partir de um texto do repórter britânico Andrew Jennings (http://migre.me/dud4t). Também esquentou o caldo a campanha de Ivo Herzog contra a presença de Marin na presidência da CBF(http://migre.me/dud6w). Mas, à época deputado estadual pela Arena, Marin pode ser considerado um serviçal menor nessa história. No paralelo corria uma caçada aos jornalistas, acusados de promover uma infiltração comunista na imprensa paulista - e muitos discursos feitos por políticos na Assembleia pretendiam oferecer acusações e pretextos para justificar as prisões desses jornalistas. Capitaneados por D'Ávila Mello, os militares estavam à caça desde julho de 1975. Em setembro, já diretor de jornalismo da TV Cultura, Vlado estava no alvo: era acusado de liderar a dominação comunista na emissora.

Quinze dias antes da prisão de Vlado, o deputado Wadih Helu tomou a palavra para criticar a TV Cultura, que, dizia ele, estaria dominada por subversivos. Viria depois a intervenção de José Maria Marin, endossando tais críticas num aparte. Na carona de Helu, Marin fez uma figuração a serviço dos militares. Um papel menor, insisto. Mas que, àquele momento, contribuiu com essa trama. Quem resgatou essa questão foi Juca Kfouri nos últimos tempos, ao compartilhar trechos das intervenções de Marin publicados no Diário Oficial (http://migre.me/dudzy).

Atores maiores foram Cláudio Marques e principalmente Fausto Rocha - os jornalistas"democráticos" -, que acusavam e entregavam outros jornalistas. Numa solenidade da Escola Superior de Guerra, no Palácio dos Bandeirantes, Fausto Rocha fez um discurso inflamadíssimo contra a profissão de repórter, dizendo que as redações estavam dominadas por comunistas. À época eu presidia o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo. Em nota, criticamos esse discurso de Rocha - afinal, era uma acusação perigosa e, na minha opinião, não inocente. Assim se iniciou o papel do sindicato. Tínhamos um movimento de fortalecimento do sindicato nas redações, com um projeto político: a resistência à ditadura. Aí inventaram que pretendíamos tomar de assalto a imprensa brasileira e, de repente, disseram que estávamos armando um complô! Certo que havia muito delírio naquelas circunstâncias - mas, muitas vezes, um delírio "deliberado".

Fui convocado pelo comandante do II Exército para discutir essa nota. No fim da conversa, disse-me o general D"Ávila Mello: "Vocês cometeram uma grande injustiça. Esse rapaz (Fausto Rocha) tem razão. Os comunistas estão infiltrados nas redações". Saí de lá espantado com essa declaração. Depois disso explodiu essa campanha contra jornalistas, que teria estopim em outubro: 11 jornalistas foram sequestrados; Vlado, o 12°. Antes dele, 21 foram mortos (ou até hoje são considerados desaparecidos políticos) desde 1964. Outubro mostrou que as acusações semeadas em julho estavam se concretizando.

Três dias antes da morte de Vlado, acontecia uma conferência da Sociedade Interamericana de Imprensa, presidida por Julio de Mesquita Neto. Num momento de ousadia, pedi a palavra. Era uma quarta-feira. Pedi a palavra e disse os nomes dos jornalistas presos, pensando que isso evidentemente se destacaria, pois estaria denunciando prisões ilegais diante de jornalistas de vários países das Américas. Isso irritou os militares que, num primeiro momento, recuaram. E, erradamente, pensei que eles continuariam a recuar cada vez mais. Mas não.

Fui convocado outra vez, para justificar essas declarações ao Exército. Disseram-me que estava caminhando num processo de clara subversão e que poderia ser enquadrado no artigo 14 da Lei de Segurança Nacional. Pensei: a coisa ficou feia. Podia ser a minha vez. Ao mesmo tempo, tinha consciência de que, uma vez feita a denúncia, estaria relativamente protegido. A convocação era uma intimidação, uma afirmação da autoridade. "Os senhores do sindicato fiquem tranquilos", disse um general. Imagine se ficamos...

Nós, jornalistas, estávamos no meio de uma briga de cachorro grande. De um lado, os linha-dura. De outro, os militares que queriam garantir o retorno gradual à democracia - sempre faço essa ressalva. Uns pensavam que, se não afrouxassem as cordas um pouco, o regime poderia explodir. De fato, explodiu a partir do assassinato de Vlado. Pois foi o primeiro caso em que fizemos uma denúncia contundente contra uma morte nos porões, deflagrando um forte movimento de protesto. Ao lado de outros companheiros, eu tinha consciência de que estávamos entrando numa briga. E a censura certamente era nossa maior inimiga. Nisso, um fato importante foi a retirada da censura ao jornal O Estado de S. Paulo, em janeiro de 1975, o que contribuiu para que, no caso Vlado Herzog, publicássemos a notícia da morte. Também o culto ecumênico, noticiado com destaque principalmente pelo Jornal da Tarde, contribuiu para esse movimento - apesar da cidade sitiada para impedir a chegada à Catedral da Sé, 8 mil pessoas marcaram presença nesse dia, um marco na luta contra a ditadura, que já começaria a ruir.

Diante dessa trama maior, é natural questionar sobre José Maria Marin: como um homem (não só um deputado, mas vice-governador e depois governador) com esse passado pode ocupar um cargo dessa relevância no presente? Como um cara assim pode representar o Brasil, nesses tempos de Copa do Mundo? Na minha opinião, isso é simplesmente uma consequência da leniência do Brasil em relação aos que contribuíram (direta ou indiretamente, com maior ou menor papel) com a ditadura militar. Sei que, legalmente, o governo não pode interferir: Marin não pode ser demitido. No entanto, o governo poderia influir politicamente.

Além disso, sabemos que há muitas pessoas de passado importante na história de repressão que atualmente ocupam cargos na política nacional. A leniência persiste, mas a resistência precisa continuar. Estou trabalhando na Comissão da Verdade, Memória e Justiça dos Jornalistas Brasileiros, que contribuirá com a Comissão Nacional da Verdade. Minha questão principal é: no caso Herzog, como em muitos outros, não foram esclarecidas as circunstâncias dos assassinatos. Vemos agora que casos mentidos e desmentidos durante 30 e tantos anos, como o do deputado Rubens Paiva, precisam ser revelados. É a hora de esclarecer esses detalhes.

Depoimento a Juliana Sayuri

Fonte: Aliás / O Estado de S. Paulo

Tantas vidas - Graziela Melo

Tantas vidas
Já passaram
Tantas águas
Desabaram!!!
Lentos barcos
Navegaram
Vivas bocas
Se encontraram
Homens mortos
Se enterraram
Amores loucos
Naufragaram
Sonhos
Que engendrei
Se esfumaram
E os resonhei!!!!!!
Por quantas ruas
Vaguei,
Bares
Por onde andei,
Botecos
Aonde entrei
Te busquei...
Esquinas
Onde espreitei
Teus olhos
Não mais
Encontrei
Sempre
Que os procurei!!!

Mas nunca
Os esquecerei!!!