sábado, 11 de outubro de 2014

Opinião do dia: Aécio Neves

"Mostra uma diferença de posição entre a candidata oficial e eu em relação à Petrobras. A presidente deu uma declaração em que considera esse vazamento estarrecedor. Considero estarrecedor esse depoimento, essas confissões. Um crime cometido sucessivamente ao longo dos últimos 12 anos. Assaltaram a maior empresa brasileira nas barbas deste governo e não há sequer uma reação de indignação da presidente.

Aécio Neves, senador (MG) e candidato a presidente da República, Folha de de S. Paulo, 11 de outubro de 2014.

Paulo Roberto Costa diz que também havia cartéis fora da Petrobras

• Ex-diretor afirma que prática ocorreu em contratos na Repar e em hidrelétricas ‘no Norte do país’

Germano Oliveira e Cleide Carvalho

SÃO PAULO — O ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa disse, em depoimento à Justiça Federal do Paraná, que empreiteiras que realizavam obras para a estatal pagavam propinas de 3% dos contratos para os partidos da base governista (PT, PP e PMDB) porque, segundo ele, temiam, em represália, ficar sem receber contratos em outras obras de outros ministérios ou estatais.

— Se as empresas não pagassem as propinas na Petrobras, os partidos políticos não iriam ver isso com bons olhos — disse Costa, que não informou se as empresas pagariam propina em contratos de outras áreas.

Ele afirmou que tentou, sem sucesso, ampliar o número de empresas a serviço da estatal:

— Os interesses mútuos dos partidos, dos agentes públicos e das empresas, visavam não só a obras da Petrobras, mas também em hidrovias, ferrovias, hidrelétricas etc. A Petrobras até tentou quebrar esse cartel, mas, como eu já disse, o número de grandes empresas é de um grupo muito pequeno. Eu até tentei colocar empresas de menor porte nas obas, mas fui tachado de doido, de que eu iria quebrar a cara, porque algumas empresas não iriam dar conta. Algumas quebraram, como a Santa Barbara, a AIT e a Tenassi. Elas quebraram nos contratos com a Petrobras, mas outras foram em frente.

Ao responder ao juiz Sérgio Moro se alguma empresa do cartel se recusou a pagar propina, Costa disse que “nunca aconteceu”. No depoimento, ele insinuou que havia influência dos partidos políticos também em outras obras do governo federal:

— A cartelização funcionava na Petrobras e fora da Petrobras. Funcionou, por exemplo, na Repar (Refinaria do Paraná). Em Angra dos Reis e nas hidrelétricas do Norte do país. Primeiro, as empresas tinham interesses em outros ministérios, capitaneados pelos partidos políticos. As empresas que atuam na Petrobras são as mesmas que atuam em obras de ferrovias, rodovias, aeroportos, portos, usinas hidrelétricas, de saneamento básico, no Minha Casa Minha Vida. Ou seja, em todos os programas a nível de governo tem partidos políticos interessados.

Costa disse que as grandes empreiteiras sabiam que o dinheiro da propina poderia servir para financiar campanhas políticas em 2010. Procurado, o Palácio do Planalto informou que não comentaria o assunto.

Os advogados do engenheiro Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras, entraram ontem com ação por crime contra a honra contra Costa no 9º Juizado Especial Criminal do Rio. Afirmam que Costa fez acusações falsas e sem apresentar provas de que Duque participasse de um esquema ilícito.

Cerveró contesta acusações
O advogado de Nestor Cerveró, ex-diretor da área Internacional da estatal, informou que seu cliente deixou o cargo em 2008, antes do período investigado. No entanto, Costa disse que o esquema passou a funcionar em 2005. Disse ainda que Costa fez declarações “em condições de constrangimento” e que isso pode levar à invalidade das provas.

Um relatório técnico da Polícia Federal esmiuçou números da Unidade de Coqueamento Retardado (UCR), da refinaria Abreu e Lima, obra a cargo do consórcio CNCC, liderado pela Camargo Corrêa. Concluiu que o CNCC repassou pelo menos R$ 38,750 milhões a título de “comissão” pela obra da Unidade de Coqueamento Retardado (UCR) da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

O valor teria sido repassado por meio de uma fornecedora, a Sanko-Sider. Do valor foram descontados impostos e despesas, e R$ 27,7 milhões foram depositados em contas de empresas de fachada controladas pelo doleiro Alberto Youssef. Para a PF, o consórcio também levou vantagem. O lucro, que era de 9,96% do valor previsto no contrato original, com os aditivos que aumentaram o valor da obra chegou a 26%.

Ex-diretor da Petrobras atuou para candidato do PT no Rio

• Paulo Roberto Costa recebeu de Lindbergh Farias a missão de captar doações de empreiteiras

• Petista disse que Costa tratou com sua campanha da elaboração do programa de governo

Leonardo Souza – Folha de S. Paulo

RIO - O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa trabalhou para o senador Lindbergh Farias (PT) na eleição deste ano para o governo do Rio e recebeu como uma de suas incumbências pedir doações a empreiteiras em nome do candidato.

Trata-se do primeiro caso concreto da participação de Costa numa campanha política do PT com a tarefa de arrecadar recursos.

Costa e o doleiro Alberto Youssef fizeram acordo de delação premiada e prestaram depoimento à Justiça Federal na quarta-feira (8). Deflagrada em março pela Polícia Federal, a Operação Lava Jato investiga esquema de lavagem que teria movimentado R$ 10 bilhões. Segundo a PF, uma "organização criminosa" atuava na Petrobras.

Nos depoimentos, os dois disseram que o tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto, intermediava os recursos desviados de obras da estatal para o partido. Na citação a Vaccari, contudo, eles não fizeram menção a campanhas políticas.

Na operação, a PF apreendeu na casa de Costa uma planilha manuscrita com os nomes de empresas, a maioria empreiteiras que prestam serviços para a Petrobras. Na planilha, havia anotações sobre a colaboração para uma campanha, mas sem menção ao nome do político.

No depoimento desta quarta, Costa foi questionado pelas autoridades sobre do que se tratava a planilha apreendida em sua casa. Ele contou que, no início deste ano, foi procurado por um candidato ao governo do Rio. Pelo acordo de delação, Costa não podia mencionar nomes de políticos com foro privilegiado no depoimento da quarta.

A Folha apurou que Costa se referia a Lindbergh. Por meio de sua assessoria, o petista confirmou que Costa participou de três reuniões de sua campanha, mas, segundo ele, somente para tratar da elaboração do programa de governo na área de óleo e gás.

No depoimento, Costa realmente disse que foi procurado por um candidato para participar de seu programa de governo na área de energia. Contudo, o ex-diretor da Petrobras informou que, numa das reuniões, foi lhe entregue uma lista com o nome de empreiteiras que poderiam contribuir.

"Eu participei eu acho que de umas três reuniões com esse candidato lá do Rio de Janeiro, como outras pessoas também participaram. E foi listada uma série de empresas que podiam contribuir com a campanha para o cargo político que ele estava concorrendo. E essa planilha foi, então, encontrada na minha casa", disse Costa.

Num primeiro momento, Costa negou que houvesse sido procurado para intermediar contribuições. Mas logo em seguida disse que recebeu um pedido para que fizesse contato com as empresas. "Foi solicitado que houvesse a possibilidade de que essas empresas participassem da campanha. Foi isso, era uma candidatura para o Rio."

Planilha
Na planilha apreendida na casa do ex-diretor da Petrobras, havia anotações sobre como seis empresas vinham se comportando em relação a contribuições para a campanha: Mendes Júnior, UTC/Constran, Engevix, Iesa, Hope RH e Toyo/Cetal. Em três casos (UTC/Constran, Engevix e Hope), há menção de que as empresas iriam colaborar ou aumentar a contribuição a pedido de "PR", iniciais de Paulo Roberto Costa.

No pé da planilha, há também a anotação do nome Garreta, precedido de um asterisco. A OAS aparece também precedida de um asterisco.

O marqueteiro Valdemir Garreta, que há anos trabalha para campanhas de petistas, foi contratado por Lindbergh para cuidar da produção de sua campanha na TV e para prestar assessoria de imprensa. Segundo a Folha apurou, a empresa de Garreta também presta assessoria à construtora OAS.

No depoimento, Costa mencionou os nomes das empresas com as quais mantinha contato.

"Ele me contratou para fazer o programa de energia e de infraestrutura. Listou uma série de empresas, algumas que eu tinha contato, outras não. Hope RH, eu nunca tive contato. Mendes Júnior conheço, UTC conheço, Constran nunca tive contato, Engevix conheço, Iesa conheço, Toyo Setal conheço."

Dilma questiona divulgação de denúncias sobre Petrobras

Maria Carolina Marcello - Reuters

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff, que tenta a reeleição pelo PT, disse nesta sexta-feira que considerou "estarrecedora" a divulgação de depoimentos com denúncias de corrupção na Petrobras em plena campanha eleitoral, questionando ainda se foram disponibilizados na íntegra.

"Acho muito estranho e muito estarrecedor que no meio de uma campanha eleitoral façam esse tipo de divulgação", disse Dilma a jornalistas nesta sexta-feira, no Palácio da Alvorada. "Que não se use isso de forma leviana em períodos eleitorais e de forma incompleta."
Na véspera foram divulgados áudios com declarações do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa detalhando um suposto esquema de propinas na estatal que desviaria recursos para PT, PMDB e PP.

"O que me faz achar muito questionável é justamente o fato de se apresentar parte da prova ou parte dos depoimentos", afirmou.

"Em toda campanha eleitoral há denúncias que depois não se comprovam e assim que acaba a eleição ninguém se responsabiliza por elas", continuou.

Mais tarde, a Justiça Federal do Paraná divulgou nota afirmando que os depoimentos de Costa e também de Alberto Youssef, realizados na quarta-feira e disponibilizados na quinta-feira, fazem parte de ações penais que "não tramitam em segredo de Justiça e, portanto... estão sujeitas ao princípio da publicidade".

A nota esclarece ainda que "permanecem sob sigilo os termos da delação premiada".

Direito de defesa
Sobre a permanência do presidente da Transpetro, Sérgio Machado, citado como envolvido no depoimento do ex-diretor da Petrobras, Dilma disse que vai investigar todas as pessoas, mas que respeita a premissa do direito à defesa.

"Não basta só alguém falar que ouviu dizer, não lembra quando, pode ser que foi, e aí você pega e condena a pessoa", disse, acrescentando que o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, tem mantido conversas com Machado.

Questionada se considerava que o PT "errou" neste caso, Dilma defendeu que as pessoas envolvidas nos casos de corrupção sejam punidas, e não as instituições como os partidos políticos.

"Se o PT errou... pessoas do PT erraram, se qualquer outro partido tiver pessoas que erraram, elas têm que ser punidas... doa a quem doer", disse a presidente.
"Você não condena uma instituição, no Brasil você condena pessoas."

Combate à corrupção
Ao reafirmar que tem "tolerância zero" com a corrupção, Dilma voltou a dizer que foi a única dos candidatos à Presidência que apresentou medidas sobre o tema, como a transformação da prática do caixa 2 em crime eleitoral e ações para agilizar o trâmite judicial desses casos.

A presidente aproveitou para criticar o PSDB, dizendo que seu governo respeitou a autonomia de órgãos de investigação como a Polícia Federal e o Ministério Público.

"Quero lembrar que nem sempre foi assim no Brasil. A Polícia Federal foi aparelhada, sim. Foi dirigida durante algum tempo, vocês sabem muito bem, por pessoa que tinha inclusive filiação ao PSDB", afirmou.

"Qual é a diferença nossa: nós investigamos. Me mostra onde é que está (o erro) que eu mando investigar. Eu não varro para debaixo do tapete."

Perguntada sobre a possibilidade de as denúncias causarem impacto em sua campanha, Dilma disse que lutará "com unhas e dentes para que o que não seja justo não ocorra".

Aécio ironiza declaração de Dilma

• Candidato condenou fala de petista, que afirmou estar ‘estarrecida’ com o vazamento de depoimentos sobre esquema na Petrobras

Leandra Lima – O Globo

RIO — Em um pronunciamento feito à imprensa na tarde desta sexta-feira no Rio, o presidenciável Aécio Neves (PSDB) condenou a declaração da presidente Dilma Rouseff (PT), veiculada pela imprensa, de achar estarrecedor o vazamento dos depoimentos do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef sobre esquemas de pagamento de propinas a políticos e partidos para financiar campanhas eleitorais.

— A presidente deu uma declaração de que acha estarrecedor o vazamento desses depoimentos. Eu considero estarrecedor esses depoimentos. Essa confissão de crime cometido sucessivamente é de forma contínua ao longos dos últimos doze anos. Assaltaram a maior empresa brasileira — disse Aécio.

Sobre o programa eleitoral de rádio da candidata Dilma, veiculado nesta sexta-feira, que dizia que Fernando Henrique Cardoso acha os pobres desinformados, o tucano disse achar uma desonestidade intelectual a estratégia de morar críticas ao ex-presidente, e que Dilma tenta desagregar os brasileiros.

— Eu acho isso uma desonestidade intelectual. Se não tivesse a estabilidade da moeda, se não tivesse a Lei de Responsabilidade Fiscal, se não tivesse a privatização de setores importantes da economia, não teria havido os resultados que tiveram no governo do presidente Lula. Acho triste, chega a ser melancólico o início desse segundo turno, onde a presidente da República ir na perversa tentativa de dividir o Brasil entre nós e eles, entre o Norte e Sudeste, entre Norte e Sul. Eu, ao contrário, quero unir o Brasil.

Sobre o silêncio de Romário a respeito de um eventual apoio neste segundo turno, Aécio amenizou e disse acreditar estar junto com ele nos próximos dias.

— Eu tenho dito em relação a todos os apoios que todos tem o seu tempo e deve avaliar qual é o melhor caminho. Reitero que tenho muito respeito ao desempenho parlamentar do Romário, como era também admirador de seu futebol. Mas acredito que possamos estar juntos nos próximos dias —afirmou. Marina Silva tinha sinalizado apoio ao candidato no início da semana, mas depois recuou. Até o momento, a ex-ministra não formalizou sua decisão.

Juiz diz que ação é pública e que depoimentos não foram vazados

• Especialistas avaliam que momento da divulgação foi inoportuno devido às eleições

Cleide Carvalho e Tatiana Farah – O Globo

SÃO PAULO - A Justiça Federal do Paraná afirmou ontem, por meio de nota, que os depoimentos de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, e do doleiro Alberto Youssef não fazem parte da delação premiada e não estão protegidos pelo sigilo legal garantido aos réus que assinam esse tipo de acordo. Os dois falaram ao juiz Sérgio Moro na ação penal em que respondem por lavagem de dinheiro e ocultação de bens - que, por decisão do Supremo Tribunal Federal, tramita na 13ª Vara Federal do Paraná, ao lado de outras nove abertas com base na Operação Lava-Jato. Esta ação penal não é protegida por segredo de Justiça.

Num despacho em que autorizou o compartilhamento dos depoimentos como prova na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Petrobras, o juiz Sérgio Moro afirmou que a ação é pública e, portanto, eles não foram "vazados" pela Corte ou por "quem quer que seja". Para ele, a divulgação pela imprensa é "um consectário normal do interesse público e do princípio da publicidade dos atos processuais em uma ação penal na qual não foi imposto segredo de justiça".

Acesso exige requerimento
O juiz defendeu que a transparência é a "única forma de garantir o escrutínio público sobre a gestão da coisa pública e sobre a integridade da Justiça".

O acesso aos autos da ação penal na 13ª Vara Federal do Paraná é permitido a qualquer cidadão. O processo eletrônico pode ser consultado no site da Justiça Federal, mas, para obter autorização de acesso, é preciso fazer requerimento ao juiz, justificando o interesse. A decisão de permitir ou não é dele. No caso da imprensa, o interesse é informar a sociedade sobre a administração de empresas e recursos públicos.

Além de compartilhar as provas com a CPMI da Petrobras, o juiz autorizou ontem o compartilhamento com a Controladoria Geral da União (CGU) e com apurações internas da estatal. Nos dois casos, determinou que os resultados sejam encaminhados à Justiça.

Citados não têm foro
A delação premiada de Youssef e Costa integra a ação a cargo do Supremo Tribunal Federal, uma vez que políticos suspeitos de participar do esquema têm foro privilegiado - entre eles há governadores, senador e deputados federais. Citados nos depoimentos divulgados pela imprensa, João Vaccari Neto, apontado como operador do PT, e Fernando Soares, que seria operador do PMDB, segundo Youssef, não ocupam cargos públicos e, portanto, não têm privilégio de foro.

O ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque ingressou com ação penal privada por crime contra a honra contra Paulo Roberto Costa, que acusou a diretoria que comandava de desviar propina para o PT. Na ação apresentada ao Juizado Especial Criminal do Rio de Janeiro, os advogados argumentam que as acusações de Costa são falsas e que não foram apresentadas provas. Edson Ribeiro, advogado de Nestor Cerveró, que foi diretor da área internacional da estatal, disse que seu cliente deixou o cargo em 2008, antes do período investigado, e que Costa foi constrangido a falar.

Um dos coordenadores de campanha da presidente Dilma Rousseff e ex-presidente da Petrobras Biocombustível, Miguel Rossetto divulgou artigo ontem classificando o vazamento dos depoimentos como uma tentativa de "manipular" a eleição. O ex-ministro de Desenvolvimento Agrário do governo Dilma disse ainda que as acusações foram feitas sem provas.

"Há em curso uma gravíssima tentativa de manipular a eleição presidencial no Brasil. A quinze dias das eleições, justamente no dia do primeiro programa eleitoral do segundo turno, um vídeo de um criminoso investigado é vazado de forma parcial e mal intencionada", diz trecho do artigo.

Apesar de não haver sigilo de Justiça no processo, especialistas ouvidos pelo GLOBO avaliaram que o momento de tornar público o conteúdo do depoimento foi inoportuno por causa das eleições.

Ex-procurador-geral do Estado de São Paulo, o advogado Marcio Sotelo Felippe considerou que a divulgação "fere o princípio do Estado democrático de direito".

- O bom senso condena (a divulgação). O juiz deveria evitar qualquer conduta que possa ser considerada interferência no processo eleitoral. Isso não ajuda no processo democrático. E não se trata de decisão final, mas de processo em curso - disse Sotelo.

Interferência eleitoral
O professor de Direito Constitucional da PUC-SP Marcelo Figueiredo, considerou inadequada a divulgação.

- Não acho adequado. É um caso muito rumoroso e não é adequado que esses depoimentos venham à tona durante toda essa comoção eleitoral - afirmou.

Para Figueiredo, o correto seria não divulgar neste momento, para não alimentar a disputa eleitoral.

- Ainda que não tenha sido a intenção do juiz, isso acaba alimentando - concluiu.

O jurista Fávio Konder Comparato concordou com os colegas:

- Divulgar isso agora é um tanto quanto suspeito.

‘Não há segredo de Justiça’, reage juiz da Lava Jato

• Sérgio Moro diz, em despacho, que Constituição impõe publicidade das decisões judiciais e atos do processo

Fausto Macedo, Mateus Coutinho e Ricardo Brandt – O Estado de S. Paulo

O juiz federal Sérgio Moro, que conduz as ações criminais da Lava Jato, informou nos autos da Operação Lava Jato que não há segredo de Justiça na ação penal em que foram interrogados o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, e o doleiro Alberto Youssef, na última quarta feira, 8.

A informação consta do despacho de Moro em que autoriza o compartilhamento de provas com a Controladoria Geral da União (CGU) e a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Petrobrás (CPMIPetro).

Alvo de ataques do PT, que o acusa de ter dado divulgação aos relatos de Costa e Youssef – nos quais ambos revelaram repasses de 3% para o partido do governo sobre valor de contratos de diretorias da Petrobrás –, o juiz Moro esclareceu que já no despacho em que recebeu a denúncia contra os dois delatores e outros acusados deixou expresso que o processo tramita “sem segredo de Justiça, em vista dos mandamentos constitucionais da publicidade dos processos e das decisões judiciais”.

Advogados de réus na ação em que Costa e Youssef prestaram depoimento acreditam que o PT e o governo confundiram a divulgação dos relatos de ambos com as delações premiadas – o ex-diretor da Petrobrás já concluiu a sucessão de depoimentos nos termos do acordo de delação; o doleiro está depondo desde quinta feira, 2.

As delações estão sob guarda do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), porque elas contêm informações sobre suposto esquema de propinas para deputados e senadores – parlamentares detêm foro privilegiado perante o Supremo.

Os depoimentos de Costa e Youssef à Justiça Federal nada tem com a delação premiada. Eles são réus em um processo sobre corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobrás, nas obras da refinaria Abreu e Lima. A prisão preventiva dos dois foi decretada em março de 2014. Processos com réus presos têm prazo limitado para terminar – caso contrário, a Justiça tem que soltar os acusados.

Os interrogatórios do ex-diretor e do doleiro foram marcados dia 19 de setembro.
Na quarta feira, 8, quando foram encerrados os depoimentos de Costa e de Youssef, vários advogados que compareceram à audiência revelaram os trechos mais importantes dos depoimentos à imprensa, na saída do Fórum Federal, em Curitiba.

O juiz Sérgio Moro argumenta, ainda, que o caso envolve “supostos crimes contra a administração pública, tornando imperativa a transparência, única forma de garantir o escrutínio público sobre a gestão da coisa pública e sobre a integridade da Justiça”.

“Assim, os depoimentos prestados na última audiência na ação penal pública não foram ‘vazados’ por esta Corte de Justiça ou por quem quer que seja”, reagiu Moro. “A sua divulgação, ainda que pela imprensa, é um consectário normal do interesse público e do princípio da publicidade dos atos processuais em uma ação penal na qual não foi imposto segredo de justiça.”

Nesse mesmo despacho, o magistrado autorizou, ainda, a Polícia Federal, como por ela requerido, a utilização dos depoimentos (de Costa e de Youssef) para instrução de outras investigações conexas à Lava Jato, “não havendo qualquer motivo para restringir o seu emprego para esta ação penal”.

Ele autorizou, também, a Petrobrás, “que é a vítima dos supostos crimes narrados neste feito”, a utilizar os depoimentos como prova emprestada para sua apurações internas.

Em vídeo, FHC afirma que Lula mentiu

• Ex-presidente rebateu fala de petista que o acusou de criticar os nordestinos; para tucano PT 'fica querendo nos jogar contra o povo'

Elizabeth Lopes - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO  - Em vídeo postado nesta sexta-feira, 10, em sua página oficial no Facebook, o ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso diz que o ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva mentiu quando o acusou de criticar os nordestinos. "O PT fica querendo fazer demagogia, querendo nos jogar contra o povo, dizendo que o PSDB fez isso ou aquilo, que eu disse isso ou aquilo, o Lula mentiu, eu não falei de Nordeste ou de nordestinos, nada disso", disse.

Na postagem, Fernando Henrique disse lamentar que a presidente e candidata à reeleição pelo PT, Dilma Rousseff, "tenha embarcado nessa, não é verdade". E disse: "O povo não é bobo, o povo sabe que quem fez o Plano Real fomos nós, quando fui ministro da Fazenda, que melhorou a vida de todo mundo, dos pobres, do trabalhador."

Nas críticas à gestão petista, o ex-presidente tucano disse que é com o receituário do PSDB que se combate a pobreza "e não deixando a inflação voltar e depois aconselhando o povo a não comer carne, a comer tomate, a comer frango, ovo". E continuou: "Não é deste jeito que se resolve a pobreza. Nós, do PSDB, sim, fizemos o que dissemos e deu certo."

O vídeo é mais um capítulo do embate que os dois ex-presidentes da República estão travando com mais frequência neste segundo turno, em prol de seus candidatos, Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT).

Veja a íntegra do vídeo:

PMDB não dará apoio integral a Dilma em ao menos 10 Estados

• Somados, esses Estados reúnem cerca de 35% do eleitorado e incluem os redutos onde Marina venceu

• A falta de consenso levou o PMDB de Mato Grosso do Sul e do Piauí a liberar as bases no 2º turno da eleição

Diógenes Campanha Lucas Sampaio – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO / CAMPINAS - Em disputa acirrada pela reeleição, a presidente Dilma Rousseff (PT) ficará sem apoio integral do PMDB, principal aliado do governo federal, em mais de um terço dos Estados no segundo turno.

Adversário do PT nas urnas, Aécio Neves (PSDB) tem apoio oficial do PMDB em seis Estados (AC, BA, ES, PE, RR e RS) e deverá contar com o empenho de setores peemedebistas em ao menos outros quatro (PI, MS, RJ e SC).

Somados, esses Estados reúnem cerca de 35% do eleitorado nacional e incluem os dois redutos onde Marina Silva (PSB) venceu no primeiro turno: Acre e Pernambuco.

Na Bahia, o ex-ministro de Lula Geddel Vieira Lima lidera o PMDB no apoio a Aécio.

Derrotado na disputa ao Senado, diz contar com engajamento de aliados que evitavam defender o tucano no primeiro turno temendo perder votos diante da popularidade de Dilma no Nordeste.

"Agora não vai ter mais esse receio. Todo mundo vai entrar na campanha do Aécio, sem dissidência", disse.

No primeiro turno, Aécio teve apenas 18% dos votos na Bahia, contra 61% de Dilma.

No Rio Grande do Sul, há tensão entre alas pró-Dilma e pró-Aécio, mas o candidato do partido ao governo, José Ivo Sartori, que enfrenta o PT do governador Tarso Genro, fechou com o tucano.

Dissidências
Em alguns Estados onde peemedebistas prometem apoio oficial a Dilma, a presidente terá dificuldades para cativar militantes da sigla.

No Rio, terceiro maior colégio eleitoral do país, a sigla, que tenta reeleger Luiz Fernando Pezão, está dividida. O candidato e líderes como o prefeito do Rio, Eduardo Paes, defendem Dilma e disputam espaço com a ala aecista do presidente estadual da sigla, Jorge Picciani.

Em Santa Catarina, o PMDB é historicamente antipetista, e até prefere fazer campanha longe da sigla, ainda que para Dilma.

"Não queremos nos misturar com eles", diz o vice-governador reeleito de SC, Eduardo Pinho Moreira, que comanda o PMDB local. Ele promete apoio à presidente, mas admite dissidências.

A falta de consenso levou o PMDB de MS e do PI a liberar as bases no segundo turno. Apesar de alguns líderes apoiarem Dilma, os candidatos do partido ao governo derrotados no 1º turno declararam voto em Aécio.

Para o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha, a divisão reflete o resultado da convenção do partido, quando a chapa Dilma-Temer foi aprovada por 59%. "Ali ficou claro que o partido estava liberado [de se engajar na campanha de Dilma]".

Mais de 60% dos votos de Marina vão para Aécio, diz pesquisas

• Cruzamento mostra que eleitores que acham governo Dilma regular terão papel importante na reta final

Silvia Amorim e Fábio Vasconcellos - O Globo

SÃO PAULO e RIO — Mesmo sem uma definição de Marina Silva (PSB) sobre seu apoio no segundo turno, a maioria dos eleitores da ex-senadora já tomou partido na disputa, conforme mostraram as primeiras pesquisas Ibope e Datafolha divulgadas anteontem. E o candidato à Presidência Aécio Neves (PSDB) é quem mais se beneficiou do espólio de Marina.

Segundo o Ibope, 64% dos que votaram em Marina disseram votar agora no tucano, enquanto 18%, na presidente Dilma Rousseff (PT). Brancos, nulos e indecisos somaram 18%. Pelo Datafolha, o comportamento é semelhante: Aécio herdou 66% dos eleitores da adversária, e a presidente, 18%. Os que disseram votar em branco, nulo ou não souberam responder representaram 16%.

Nos dois levantamentos, Aécio obteve 51% dos votos válidos, e Dilma, 49%.

O Datafolha mediu o potencial de transferência de voto de Marina no segundo turno. Ao perguntar aos entrevistados se eles levariam em conta uma declaração de apoio de Marina para definir o voto, 49% disseram que a posição da ex-senadora será “indiferente”. Outros 40% disseram que levariam em conta a posição dela. Já 9% declararam que votariam, com certeza, em quem Marina apoiasse.

Para a maioria do eleitorado (72%), a expectativa é que Marina anuncie apoio a Aécio, mostrou a pesquisa Datafolha. Somente 12% acreditam numa adesão à campanha de Dilma.

Apesar de o segundo turno ter começado esta semana, é alto o índice de eleitores que estão decididos em relação ao voto. No Ibope, apenas 11% do eleitorado dos dois candidatos admitem rever o voto declarado na pesquisa — 85% disseram que a decisão é definitiva.

Pela primeira vez, o Datafolha fez uma análise das intenções de voto, segundo a classe social dos entrevistados. O tucano tem seu melhor desempenho na classe alta (74% das intenções de voto) e média alta (67%). Dilma lidera entre os eleitores da classe baixa (64%), classificados como excluídos pelo instituto, e da média baixa (53%). Na tradicional classe média, há um empate técnico: Dilma tem 52%, e Aécio, 48%.

Pelo Ibope, a passagem do candidato do PSDB para o segundo turno pode atrair quem afirmou ter anulado ou votado em branco no primeiro turno. Nesse grupo, 31% dizem que vão votar em Aécio, e 13%, em Dilma. Cerca de 47% continuam inclinados a anular ou votar em branco no segundo turno.

Cruzamento com avaliação de governo
Mas a disputa promete ser intensa até o fim da corrida. O cruzamento das intenções de voto com a avaliação do governo Dilma, segundo o Ibope, indica que a presidente tem mais espaço para crescer entre os eleitores que consideram o governo Ótimo/Bom do que Aécio no grupo de eleitores que avalia o governo como Ruim/Péssimo.

Entre aqueles que avaliam positivamente o governo, hoje o maior contingente do eleitorado, de acordo com o Ibope, Dilma registra 85% de intenções de voto, enquanto Aécio tem 12%. No grupo dos eleitores que avaliam o governo como Ruim/Péssimo, Aécio registra 80% de intenções de voto contra apenas 3% de Dilma. Nesse grupo, cerca de 14% dizem que preferem anular o voto a apoiar o candidato do PSDB.

Pelo Datafolha, os números são diferentes, mas as tendências, semelhantes. Entre os eleitores que avaliam o governo como Ótimo/Bom, Dilma soma 80%, e Aécio, 14%. Quem avalia o governo negativamente vota majoritariamente no candidato tucano: 88%. Nesse grupo, Dilma tem apenas 3%. Os brancos e nulos chegam a 7%.

No levantamento do Ibope, 39% dos eleitores avaliam o governo Dilma como Ótimo/Bom, contra 27% que o consideram Ruim/Péssimo, enquanto 33% o consideram Regular.

A grande diferença de intenção de voto dos dois candidatos segundo a avaliação do governo indica que aqueles que consideram a administração federal como Regular terão um papel importante nesta reta final da campanha. Esses eleitores, em tese, têm mais probabilidade de mudar de posição.

Nesse grupo, Aécio tem hoje a maior proporção de intenções de voto, segundo o Ibope: 58% contra 29% de Dilma Rousseff. Embora com percentuais um pouco diferentes, o Datafolha também aponta para o peso que o grupo intermediário terá nesta reta final. Aécio tem 55% entre aqueles que dizem que o governo é Regular, enquanto Dilma marca 30%. Brancos e nulos somam 6%.

Rejeição ainda é maior
Dilma continua tendo os maiores índices de rejeição desta eleição. No Datafolha, os eleitores que não votam de jeito nenhum nela somam 43%. Os resistentes a Aécio são 34%. Para o Ibope, a taxa do tucano é de 33%, e a da presidente, de 41%. (*Do Núcleo de Jornalismo de Dados)

Aécio acusa PT de 'desonestidade intelectual' ao atacar FHC

• Tucano afirma que Dilma Rousseff deveria manter o País coeso, não transformar brasileiros em inimigos

Luciana Nunes Leal e Mariana Sallowicz - O Estado de S. Paulo

O candidato tucano à Presidência, Aécio Neves, acusou o PT de "desonestidade intelectual" ao atacar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) e sugerir que ele não governou para os pobres.

"É triste, chega a ser melancólico, o início do segundo turno com esta perversa tentativa de divisão por parte do governo. É triste ver a presidente (Dilma Rousseff), que deveria ter responsabilidade de manter o País coeso, querer transformar os brasileiros em inimigos. Quero dizer à presidente que perder a eleição é do jogo. O que não pode é perder a coerência", afirmou em entrevista coletiva, no Rio.

Aécio comentou as diferenças entre o que apontavam as pesquisas eleitorais e o resultado da votação do último domingo, quando ficou em segundo lugar com ampla vantagem sobre a candidata do PSB, Marina Silva. "Alguns desses institutos de pesquisas devem explicação aos brasileiros. Alguns resultados fogem de qualquer lógica", declarou.

O tucano disse que, mesmo quando Marina Silva passou a ocupar o segundo lugar nas pesquisas, continuou a acreditar que chegaria ao segundo turno. "Mesmo quando estava em terceiro lugar, não me considerei fora do jogo e estou longe de me considerar o candidato eleito".

Sobre alianças para o segundo turno, Aécio demonstrou tranquilidade em relação à manifestação de Marina Silva, que fez uma série de exigências para apoiá-lo. "Vejo com enorme naturalidade. Há uma convergência crescente entre os companheiros. Marina tomará decisão no tempo certo e será por nós respeitada".

O candidato confirmou que receberá amanhã o apoio do PSB de Pernambuco, em ato no Recife que terá a presença de Renata, viúva do ex-governador Eduardo Campos, morto no dia 13 de agosto, e seus filhos. "É uma honra pessoal receber esse apoio". Pela manhã, disse que o apoio da família Campos "tem um simbolismo muito grande".

O candidato reiterou as promessas de revisão do fator previdenciário, mecanismo criado no governo FHC e mantido por Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff para evitar aposentadorias precoces. "Vamos encontrar uma forma que não seja tão perversa". Aécio também se comprometeu com a correção da tabela do Imposto de Renda pela inflação e com a valorização real do salário mínimo.

O candidato também lembrou que hoje é o dia nacional da prevenção da violência contra a mulher. "Quero reiterar os compromissos de criar uma rede de proteção à mulher que sofreu violência". Aécio passou a maior parte do dia no seu apartamento em Ipanema, na zona sul do Rio, em conversas por telefone sobre a agenda dos próximos dias e possíveis alianças para o segundo turno.

Aliados de Marina flexibilizam debate sobre maioridade penal

• Interlocutores de ex-senadora dizem que posição de Aécio sobre maioridade penal não impediria apoio a tucano

Sérgio Roxo e Silvia Amorim – O Globo

SÃO PAULO — Depois de ter provocado incertezas quanto à concretização da aliança para o segundo turno da disputa presidencial, a proposta de Aécio Neves de redução da maioridade penal em casos de crimes hediondos deixou de ser vista, nesta sexta-feira, como um empecilho para que Marina Silva (PSB) declare apoio ao tucano. Os interlocutores da candidata derrotada, que vinham colocando como ponto fundamental para o acordo um recuo de Aécio nesta questão, passaram a afirmar, nas últimas horas, que o importante é o conjunto das propostas para a área social, como a reforma agrária, a demarcação de terras indígenas e o compromisso em não aletrar as leis trabalhistas para o setor agrícola.

Entre os “marineiros”, já há quem diga que a redução da maioridade penal é um assunto que será tratado pelo Congresso e não pelo presidente da República. A retirada da proposta faz parte da lista de 20 compromissos defendidos pela Rede Sustentabilidade, o partido que Marina tentou criar no passado e foi rejeitado pela Justiça Eleitoral, defendidas para o segundo turno. Nesta sexta-feira, a legenda divulgou uma nota minimizando a importância dos compromissos em que afirma que adesão à candidatura de Aécio não está em questão e que apresentou as propostas para contribuir para “um pleito mais qualificado”. Por fim, o partido diz reconhecer a legitimidade de “Marina Silva, como nossa ex-candidata, de se posicionar conforme sua consciência”.

Porta-voz da Rede, Walter Felman também não acredita que a questão da redução da maioridade penal seja fundamental para a aliança de Marina com o tucano no segundo turno.

— Na verdade, é o conjunto (das propostas). Não tem nenhum sentido acreditar que qualquer candidatura que não tenha ido ao segundo turno tenha autoridade para fazer o seu programa valer. É apenas uma ideia de debate e programa para o segundo turno.

Integrantes da campanha tucana disseram hoje que o clima para um entendimento voltou a melhorar, e a esperança é grande em um acordo com Marina e a Rede.

— Há uma clareza de que não será atendida 100% da pauta definida por eles e isso já é um avanço — disse um dos estrategistas de Aécio.

As negociações estão se dando entre um grupo muito restrito e formado por pessoas muito próximas dos candidatos. Do lado de Aécio, uma dessas pessoas é o candidato a vice, Aloysio Nunes Ferreira, que tem conversado com o ex-tucano Feldman, que nega, porém, as negociações.

Nem mesmo os elaboradores do programa de governo estão participando das tratativas. Até agora, Aécio e Marina não conversaram sobre a pauta de reivindicações programáticas.

O candidato tucano deverá fazer, em seus próximos pronunciamentos, sinalizações sobre pontos que considera de possível entendimento entre ele e Marina, como a reforma política, a questão da demarcação de terra indígenas e sustentabilidade. O encontro do candidato com a viúva de Eduardo Campos, neste sábado, em Pernambuco é, na visão da equipes de Aécio e de Marina, um gesto que ajudará a aproximar a ex-senadora de um anúncio em favor do tucano.
O tucano ainda vai visitar a cidade de Sirinhaém, na Zona da Mata, berço de lutas sociais nos tempos de Miguel Arraes e cidade em que Marina teve o seu maior percentual de votação em todo o país: 74,19%.

A notícia de que aliados de Marina exigiriam um recuo de Aécio sobre a proposta de redução da maioridade penal para crimes hediondos exaltou os ânimos nesta sexta-feira entre lideranças paulistas do PSDB. Aloysio Nunes é o autor da proposta no Congresso. Alguns tucanos interpretaram a inclusão desse ponto na pauta de reivindicações dos aliados da Marina como uma desculpa para a ex-senadora não apoiar Aécio.

Merval Pereira: Acordo programático

- O Globo

As negociações para que a candidata terceira colocada, Marina Silva, una-se à campanha de Aécio Neves neste segundo turno da eleição presidencial, chancelando uma decisão que já foi tomada pela maioria de seus eleitores, podem ter um final feliz neste fim de semana se prevalecer o entendimento em torno de pontos programáticos que estão sendo discutidos pelos dois grupos.

Ambos estão tratando o assunto com muita delicadeza, pois não querem constranger a outra parte e desejam que a união, se ocorrer, faça-se em torno de pontos de acordo que signifiquem avanços no que seria uma unidade para dar ao país um governo progressista que ressalte o melhor do espírito da social democracia encarnada pelo PSDB.

Marina tem deixado claro que não tem interesse em derrotar o PT apenas para vencer a disputa eleitoral, por vingança contra a presidente Dilma pela maneira com que foi tratada na campanha eleitoral, mas para proporcionar ao seu partido de origem condições de rever seus erros e retornar às suas raízes, que teriam, na visão dela, sido perdidas nas disputas políticas dos últimos anos.

Ela vê no momento em que o PSDB chega ao segundo turno a chance de os tucanos ressaltarem seus laços sociais, que deram origem ao Plano Real e a diversas ações para a criação do que Fernando Henrique chamava à época de “rede de proteção social”. Dentro desse espírito, foram criadas a Bolsa Escola, o Auxílio Gás, o Bolsa Alimentação e o Auxílio Alimentação, que originaram o Bolsa Família quando o governo Lula, por sugestão do governador tucano Marconi Perillo, unificou esses programas.

A preocupação dos dois lados durante as negociações foi sempre enfatizar que acordos estavam sendo negociados em torno de programas, e não de cargos ou futuras posições num eventual governo. Marina, por seu lado, tem ressaltado em conversas nos últimos dias, inclusive com membros do PSDB, que não faria nunca um acordo político que não fosse baseado em políticas públicas, e que não se coloca como dona das melhores práticas nem das melhores ideias.


Quer apenas salientar que um acordo programático como o que está sendo costurado será um avanço na negociação política no país, e que tanto ela quanto Aécio Neves têm o mesmo objetivo, que é o de unir forças para fazer as mudanças de que o país necessita. Ela sabe que o resultado das urnas deu a Aécio Neves a primazia das propostas, e apresentou sugestões que, a seu ver, ressaltarão o empenho social do PSDB.

A união nessas bases servirá também para que a campanha do tucano rebata as acusações que vêm sendo feitas pela candidata Dilma, colocando a disputa como sendo entre pobres e ricos, Norte e Nordeste contra Sul e Sudeste. O resultado das eleições desmente essa visão simplista do que saiu das urnas, como analisa o cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC do Rio de Janeiro. Ele e sua equipe desenvolveram um trabalho de análise dos resultados eleitorais com base na divisão geográfica dos votos e têm um banco de dados das eleições presidenciais desde a redemocratização do país em 1989.

Se a geografia do voto petista se alterou radicalmente de 2002 para 2010, a da recente eleição presidencial é bastante semelhante à anterior, em que Dilma foi eleita pela primeira vez. O que difere essa das demais eleições, segundo o professor Romero Jacob, é a divisão socioeconômica do voto nas mesmas geografias. O resultado é mais complexo do que dividir a posição do eleitorado em polos opostos, pois existem na mesma região eleitores de diversos tipos e classes sociais.

Dizer que apenas os pobres votaram em Dilma no Nordeste é um engano, adverte Romero Jacob, pois as classes mais altas também se beneficiam da economia reforçada pelo programa Bolsa Família. (Amanhã, os desafios dos candidatos).

Fernando Rodrigues: Vencer é um detalhe

- Folha de S. Paulo

O técnico de futebol Carlos Alberto Parreira disse uma vez que o gol era só um detalhe. Foi crucificado. Mas ele estava certo. Sem treinamento, jogo coletivo, talentos individuais, esforço constante e uma defesa que recupere a bola e saiba sair jogando, é difícil um time marcar um gol e ganhar a partida.

A metáfora vale também para a política e eleições. Quando um prefeito, governador ou presidente da República perde uma eleição, é raro a derrota se dar por causa de um fato fortuito. Às vezes, pode acontecer (como um gol contra no futebol). Mas o mais lógico é a soma do trabalho durante quatro anos acabar se refletindo nas urnas.

A presidente Dilma Rousseff chega a este momento, faltando duas semanas para o segundo turno da corrida presidencial, com 49% de intenções de voto e 43% de rejeição. Numa conta simples, conclui-se que pode pescar apoios em apenas 8% do eleitorado. Não é impossível, mas tampouco é fácil ou simples.

Pior para Dilma é o clima de país partido que ela e o PT estimularam nas últimas décadas. Na narrativa petista, o Brasil hoje se divide entre ricos contra pobres, regiões Norte e Nordeste contra as demais. Nesse clima beligerante --apesar da roupa azul clara na sua primeira propaganda de TV-- não é fácil em duas semanas estender a mão, dizer que o "governo novo" terá "ideias novas".

Pode ser que no dia 26 de outubro a contabilização dos votos pela Justiça Eleitoral dê mais quatro anos para Dilma. Nesse caso, estará validada toda a tática usada até agora, o discurso do medo, o estímulo ao ódio e ao combate em áreas nas quais seria melhor buscar convergências.

No caso de Aécio Neves, o PSDB portou-se como aquele jogador que ficou quase parado, perto da área adversária. Uma bola parece ter sobrado e há boas condições para marcar o gol. Mas, como dizem os comentaristas esportivos, nessas horas, o chute não precisa de força. É só jeito.

Cláudio Couto: Futebol ou corrida?

- O Estado de S. Paulo

Veja leitor, que injustiça e absurdo! O centroavante palmeirense Henrique, artilheiro do Brasileirão, com 13 gols, corre o risco de ser rebaixado. Enquanto isso, o zagueiro cruzeirense Dedé, autor de um mísero golzinho, ao que tudo indica será campeão. E você bem sabe: como o que importa para a vitória no futebol são gols, é uma inversão de valores que um goleador caia de divisão, enquanto o autor de um único tento se sagre campeão!

O leitor minimamente inteirado do futebol deve ter pensado que o colunista enlouqueceu - ainda mais por se tratar da editoria de Política, e não a de Esportes. Mas o argumento absurdo foi necessário para chamar a atenção para disparate equivalente na esfera da política, insistentemente repetido na última semana. Equivale ao estapafúrdio raciocínio futebolístico acima analisar um campeonato de equipes como se fosse uma corrida entre indivíduos.

Refiro-me à comparação entre parlamentares eleitos com votações pífias e os não eleitos muito bem votados. Exemplo do equívoco veio do Jornal Nacional, na terça-feira: o deputado Mendes Thame (PSDB-SP), 49.º mais votado em São Paulo, com mais de 106 mil votos, foi excluído dos 70 eleitos. Enquanto isso, o advogado Fausto Pinato (PRB-SP), guindado pelos votos do artilheiro do campeonato - digo, puxador de votos - Celso Russomanno - se elegeu com 22 mil escrutínios. Para reforçar o argumento, a reportagem ressaltou que entre ambos havia muitos candidatos mais votados do que Pinato, porém não eleitos. Foi como comparar Henrique com Dedé, entre os quais há inúmeros jogadores que fizeram mais gols do que o cruzeirense, mas não serão campeões.

O sistema adotado para a eleição de deputados e vereadores é o proporcional de lista aberta. Já que para fins eleitorais é impossível calcular proporções de indivíduos (que, como o nome diz, são indivisíveis), calculam-se proporções da casa legislativa em disputa. Assim, grosso modo, se o partido obtiver 10% dos votos em São Paulo, que tem 70 deputados federais, elegerá 7 pessoas.

A votação individual de cada candidato serve para duas coisas. Primeira, definir o lugar de cada um na fila do partido (ou coligação). Assim, no exemplo acima, os sete mais votados entram, ficando todos - do 8.º lugar em diante - no banco de reservas, a suplência. É como se um treinador tivesse como critério de escalação para o time titular o número de gols feitos. Só que, note-se: seriam escalados apenas os com mais gols, mas pertencentes à equipe. É impossível ao treinador de um time escalar jogador de outro, mesmo que mais goleador.

A segunda finalidade da votação em indivíduos é contribuir para a votação total do partido - da mesma forma que os gols feitos por quaisquer jogadores de uma equipe contam para o número total de tentos marcados por ela.

Assim, não são apenas os puxadores de voto que ajudam a eleger candidatos menos votados. Também os votos dados aos candidatos de um partido que não se elegeram contribuem para a votação total do partido. No caso do deputado Thame, os votos dados a ele contaram para a votação total do PSDB. Isso quer dizer que o eleitor de Thame não perdeu seu voto - foi como votar na legenda.

Os votos de legenda contam da mesma forma que os demais - só não definem o lugar na fila. As coligações proporcionais embaralham os partidos e as percepções do eleitor, pois criam combinados de partidos. Porém, não alteram a lógica básica.

Como futebol, eleição proporcional não é disputa entre indivíduos, mas entre equipes - embora cada indivíduo contribua desigualmente para a vitória de seu time. A vitória apenas dos mais votados vale em disputas individuais, como corridas, em que o primeiro ganha e os demais, no máximo, sobem ao pódio. É a lógica da eleição para o Senado. No Tocantins, Katia Abreu venceu por menos de 1% dos votos. Justo, pois é a regra do jogo. Para isso, contou com o apoio de sua equipe, mas a medalha é sua.

Rosiska Darcy de Oliveira: Cara a cara

• PT se quis exemplar e jogou na roleta da corrupção seu capital ético, do qual nada sobrou. Vive dos dividendos de suas políticas sociais

- O Globo

Foi cara a cara, longe do país das maravilhas com que o PT bombardeou o Brasil na propaganda eleitoral, que Aécio Neves enfrentou Dilma Rousseff. É possível que esses poucos minutos do último debate na Globo tenham mudado a história do Brasil. A inesperada votação de Aécio não é alheia à maneira como ele quebrou o gesso dos marqueteiros e, descontraído, desestabilizou Dilma, que sobraçava um calhamaço de colas e procurava respostas nos manuais de João Santana.

Foi também no cara a cara que Luciana Genro pôde explicar a Levy Fidelix que a homofobia deveria ser crime pois, se já fosse, ele sairia dali algemado. O contraste entre a intensidade do debate e a propaganda pré-fabricada mostrou o quanto, sendo enganosa, ela distorce a democracia. Moral da história, quanto menos marqueteiro mais verdade, quanto mais verdade mais democracia. O debate cara a cara decidirá a eleição.

Marina não estará lá. Apesar de derrotada, é uma presença incontornável. Se não conseguiu, literalmente do dia para a noite, improvisar uma candidatura à Presidência, se teve que gastar seus parcos minutos na televisão apenas para se defender de ataques, nem por isso deixou de ter plantado suas sementes. Dilma não contará com o seu apoio. Está colhendo os frutos do veneno que sua campanha destilou.

Se Marina apoiar Aécio, levará consigo um pacote de compromissos que, metabolizados, trarão frescor e audácia à sua plataforma, a exemplo da escola de tempo integral e da diversificação das fontes energéticas. O voto de 22 milhões de brasileiros já inscreveu o ideário da sustentabilidade na agenda do país.

Aécio e Dilma estão, agora, cara a cara. A candidata do PT não poderá continuar a se referir a vagos malfeitos quando questionada sobre crimes como o assalto à Petrobras. Os depoimentos de Paulo Roberto Costa e do doleiro Youssef puxam o fio de uma meada que enreda e vai estrangular o projeto do PT de se eternizar no poder. A corrupção desvelou a face perversa de um partido que, infiltrado no Estado até a medula, confundiu-se com ele e instaurou a comunhão de bens. A candidatura petista continuará a ser assombrada pelo que sussurram os delatores, diretores de empresas e doleiros, nos gabinetes do Ministério Público.

Um partido que se quis exemplar jogou na roleta da corrupção seu capital ético, do qual nada sobrou. Vive dos dividendos de suas políticas sociais de transferência de renda, um capital político investido, muito justamente, nos mais pobres, que ainda são tantos e precisam do governo para progredir.

Há um contraste no país entre os polos mais avançados e escolarizados e aqueles mais dependentes de políticas assistenciais. Esses, concentrados nas regiões Norte e Nordeste, ou espalhados pelo país em bolsões de pobreza, graças às políticas que lhes trouxeram alento, deram um respeitável lastro de votos a Dilma. Os outros, com maior autonomia, exigem mais serviços e de melhor qualidade. São os 60% que votaram pela mudança. O mapa eleitoral conta a história desses Brasis diversos que, ambos, movem-se, felizmente, numa trajetória constante de melhoria que vem de duas décadas e que só tende a se acelerar.

É cara a cara que o PT deverá ouvir que mente quando só fala dos seus sucessos, não aceita críticas e desqualifica os adversários. A mentira está inscrita no autoritarismo dos que falam em nome do povo, arvoram-se em seus defensores enquanto se autoabsolvem de crimes comuns como o desvio de dinheiro público. A mentira foi, desde que o PT assumiu o poder, um instrumento de governo.

O PT mente quando quer controlar a mídia porque a teme — e a teme porque ela diz que ele mente — mas diz que o faz porque ela é “parcial” ou “vendida”. Parcial é o jornalista que discorda do seu modo de governar ou investiga suas transações.

Quer controlar a sociedade, porque a teme — e a teme porque ela aprendeu, por si mesma, a cobrar direitos — mas diz que quer “incentivá-la” a participar em conselhos que seu governo nomearia. Sabe o que é bom para a sociedade e quem deve representá-la. Não admite que a sociedade é múltipla, dinâmica e, exatamente porque mais informada, rebelde aos controles e censuras. Já é participativa, não precisa de “incentivos”, como mostraram as manifestações de rua e como mostra, nas esquinas virtuais, o efervescente interesse pelas eleições.

Escolher entre Dilma e Aécio não é uma escolha entre pessoas. É uma escolha da sociedade em que queremos viver. Ao autoritarismo retrógrado do PT, prefiro os desafios e o ar fresco de uma sociedade aberta.

Rosiska Darcy de Oliveira é escritora

Demétrio Magnoli:Eduardo e umas bolachas

• Suplicy permaneceu fiel a si mesmo, enquanto seu partido mudou até tornar-se irreconhecível

- Folha de S. Paulo

Eu já o esperava, como combinado, diante de sua casa, em São Paulo. O senador chegou depois das onze da noite, vindo de Brasília. Esfaimado, investigou os armários vazios e a geladeira, idem. Encontrou apenas um pacote com meia dúzia de bolachas de água e sal. Por insistência dele, sentados à mesa da cozinha, dividimos as bolachas, junto com um café de cafeteira elétrica. Eduardo Suplicy, definitivamente, não parece um Matarazzo. Depois de 24 anos, ele deixa o Senado. É um ponto final --e não só para ele.

O encontro em volta das bolachas deu-se a meu pedido, em setembro de 2009. O livro da blogueira Yoani Sánchez estava na gráfica, mas o regime cubano negava-lhe autorização de viagem. Suplicy poderia convencer o Senado a convidá-la para um lançamento do livro, pressionando Havana a conceder-lhe o direito de ir e vir. O senador desviou a conversa para os alardeados milagres do castrismo na saúde pública, compelindo-me a retrucar que os anuários estatísticos da ONU colocavam Cuba em posição invejável quanto a indicadores de saúde, vários anos antes da chegada de Fidel ao poder. No passo seguinte, disse-lhe que a teoria da "ditadura benigna", ritualmente aplicada pela esquerda a Cuba, não combinava com seu perfil político.

Xeque-mate. Suplicy ainda solicitou ler os originais. Respondi que, no máximo, teria acesso ao prefácio assinado por mim. O livro, ele leria após a publicação, pois os direitos de Yoani não poderiam depender do seu julgamento sobre as opiniões dela. Dias depois, em dobradinha com o então senador Demóstenes Torres, Suplicy extraiu o convite na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Demóstenes iludia a todos, inclusive a mim, ocultando sua sociedade com um bandido atrás da máscara de parlamentar imaculado. O Eduardo das bolachas também elaborara uma persona política, mas não tinha esqueletos no armário.

Suplicy já era, cinco anos atrás, uma figura estranha no seu partido, algo como a relíquia de uma era histórica encerrada. Pouco antes da segunda campanha presidencial de Lula, em 1994, um editorial da revista teórica do PT classificara Cuba como uma ditadura --e explicara que não existem ditaduras defensáveis. O senador à minha frente era um registro daquele tempo e daquele partido. Desde a ascensão de Lula ao Planalto, Suplicy perdeu o gosto pela investigação de denúncias de corrupção, convertendo-se num disco de vinil riscado, a repetir a estrofe da renda mínima. Fora isso, permaneceu fiel a si mesmo, enquanto seu partido mudava até tornar-se irreconhecível para milhões de antigos eleitores. Nesse descolamento encontra-se a causa da derrota do Matarazzo rebelde.

A derrota tem um número: 2,8 milhões de eleitores abandonaram Suplicy entre 2006 e domingo passado. Não é culpa dele, mas uma das expressões do recuo geral do PT em São Paulo. Seguindo sua lógica própria, orientada pela emoção, o Eduardo das bolachas permaneceu fiel à sigla e à estrela: os símbolos de um tempo pleno de esperanças. Seguindo outra lógica, pautada pela razão, seus eleitores permaneceram fiéis aos princípios traídos pelo PT, negando a sujeição fetichista do presente ao passado. No anoitecer de seu mandato derradeiro, o senador tem a oportunidade de confrontar as duas lógicas e revisitar, de olhos abertos, esse segmento crucial da história política do país.

Tolamente, na madrugada, antes da despedida, eu disse a ele que sua intervenção pelo direito de viagem da blogueira provocaria recriminações num PT rendido aos anacronismos da esquerda latino-americana. Suplicy escutou, mal disfarçando o enfado. Li a resposta óbvia, escrita no seu olhar: "Conte-me algo que não sei". O Eduardo das bolachas falaria ao Senado, em nome de nossas convicções comuns, mesmo contrariando seu partido. Mas não mudaria de partido, nem mesmo em nome de suas convicções.

Um exemplo positivo de negociação política; O Globo - Editorial

• Mesmo que Aécio e Marina não se entendam sobre o segundo turno, a tentativa terá valido pelo seu nível, muito diferente do fisiologismo praticado nas alianças petistas

A candidata Marina Silva, do PSB, transformou em bandeira de campanha a defesa da “nova política”, em que valem as alianças tecidas em torno de programas e a qualidade ética dos políticos. Governar com os “bons” de cada legenda virou símbolo da da ex-senadora, outrora PT e ministra de Lula.

Independentemente das convicções de Marina Silva, caso ela se elegesse não haveria mesmo alternativa a não ser se sustentar em um arco de partidos, por ela ser candidata de uma legenda peso-médio, o PSB. De mais a mais, é tamanha a fragmentação da estrutura partidária brasileira que, seja quem vença eleição hoje no Brasil, a barganha entre partidos é inevitável na busca pela governabilidade.

Derrotada por Aécio Neves (PSDB) na disputa pela ida ao segundo turno contra a candidata à reeleição Dilma Roussef (PT), Marina pratica o que prega, ao negociar com os tucanos um entendimento programático para aderir à candidatura de Aécio.

Faz muito bem. Não apenas por coerência, mas também porque é necessário enfatizar, e cada vez mais, a melhor forma de se exercitar a negociação político-partidária.

Não é grave alguma demora para o desfecho desta negociação, embora haja limites para a indecisão numa campanha tão curta. Marina tem razão em reivindicar de Aécio Neves que adote pontos do seu programa para que o apoie. Mas necessita de bom senso e sensibilidade para avaliar se, diante do mesmo adversário comum de 2010, o melhor é repetir a abstenção daquele ano, posição que poderá ser entendida hoje como autoritária, de negação do jogo político saudável.

Nenhum dilema, porém, retardou o apoio a Aécio dos ex-candidatos Eduardo Jorge (PV) e Pastor Everaldo (PSC), entre outros. O mapa definitivo das adesões depende de condicionantes regionais que interferem nessa acomodação de terreno político-partidário.

O importante é os principais candidatos de oposição, Aécio e Marina, estabelecerem nítida diferença com o fisiologismo com que o PT negocia suas alianças desde a primeira campanha presidencial vitoriosa de Lula, em 2002. Foi quando houve a reunião a portas fechadas entre José Dirceu e Delúbio Soares, do PT, e Valdemar Costa Neto, então PL, em Brasília. Enquanto Lula e José Alencar, também PL, esperavam na sala, os três acertaram as cifras do dote de Alencar para ele ser o vice de Lula.

Percebeu-se depois que ali já estava presente o embrião do mensalão e do atual escândalo na Petrobras, em que acordos são caucionados em dinheiro de origem obscura, em nome de um projeto de poder.

Tanto tempo depois, Dirceu e Valdemar, mensaleiros condenados, estão presos, e Aécio e Marina podem firmar um acordo de campanha de forma translúcida e em bases éticas. Mesmo que não se entendam, terá valido pelo nível da negociação.

A barra vai pesar: O Estado de S. Paulo - Editorial

Deu a lógica nos resultados iguais das primeiras pesquisas dos dois maiores institutos brasileiros, Ibope e Datafolha, sobre a intenção de voto para o segundo turno da eleição presidencial: o oposicionista Aécio Neves à frente de Dilma Rousseff, 51% contra 49% dos votos válidos, por enquanto dentro da margem de erro. Deu a lógica porque, afinal, a soma dos votos recebidos pelos dois principais candidatos oposicionistas no primeiro turno - Aécio Neves e Marina Silva -, no total de 57 milhões (56,8%), superou com folga os 43,2 milhões (41,8%) dados a Dilma Rousseff.

Esses números dizem que a considerável maioria dos brasileiros quer mudança. E mudança significa apear o PT do poder. Se alguém tem alguma dúvida sobre o caráter antipetista dos votos dados a Marina Silva no primeiro turno, basta lembrar que a própria campanha de Dilma Rousseff se encarregou, de forma brutal e indigna, de estigmatizar a candidatura do PSB. É difícil de acreditar que o eleitor de Marina deixe de se ater agora à opção que lhe resta: votar em Aécio.

Mas também é óbvio que nem todos os votos que Marina teve em 5 de outubro serão automaticamente transferidos para Aécio. Mas o forte efeito psicológico tanto, por um lado, da tendência de crescimento da candidatura tucana nas últimas três semanas quanto, por outro lado, da frustrante reversão das expectativas petistas, somado ao substancial apoio a Aécio anunciado por antigos adversários e lideranças políticas ao longo da semana que passou - e ainda as recentes más notícias para Dilma Rousseff e o PT a respeito do desempenho da economia e do escândalo da Petrobrás -, tudo isso certamente influenciará a decisão do eleitor.

É preciso levar em conta, contudo, que na defesa de seu projeto de poder o lulopetismo não terá escrúpulos de apelar a qualquer recurso que estiver a seu alcance, como a ominosa falácia de que o PT tem o monopólio da virtude e todos os seus adversários são também inimigos do povo que só pensam em sacrificar os despossuídos em benefício das elites perversas.

É claro que só quem é mal informado acredita em patranhas como a de que qualquer presidente eleito que não seja do PT acabará com todos os projetos sociais dos governos petistas, principalmente o Bolsa Família. E Lula e Dilma decidiram também proclamar agora que a infâmia está em afirmar que há pessoas mal informadas no Brasil, deturpando deliberadamente declaração feita pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

A direção em que os ventos eleitorais estão soprando indica que a tropa de choque petista terá trabalho pesado até o dia 26. Por exemplo, uma vez que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, está cumprindo aviso prévio e anda com a credibilidade em baixa, Dilma designou Aloizio Mercadante, atual ocupante do Gabinete Civil, para não deixar sem resposta qualquer ataque da oposição na área da Economia. Aloizio tem credenciais para a missão: foi, em 1994, o arauto petista do fracasso antecipado do Plano Real.

Na Comunicação, além do notório João Santana, marqueteiro do Brasil dos Sonhos e das Malvadezas, anda assoberbado o jornalista Franklin Martins, aquele que desde que era ministro da Comunicação Social de Lula está obcecado pela ideia de decretar o "controle social" da mídia. No comando do site oficial da campanha de Dilma, Martins tem a responsabilidade de municiar a militância que atua nas redes sociais com toda sorte de informação que não pega bem na boca de quem fala oficialmente em nome do PT e de sua candidata.

À frente do partido permanece vigilante Rui Falcão, com a importante missão, que não lhe tem dado descanso nos últimos dias, de protestar com indignação contra as denúncias de corrupção no governo que a mídia se vê na obrigação de divulgar todos os dias e de prometer que vai processar criminalmente quem quer que seja que se atreva a questionar os elevados padrões morais da companheirada.

É esse o circo de horrores que provavelmente os brasileiros serão obrigados a assistir nas duas próximas semanas, como preço a pagar pela ousadia de cogitar a alternância no poder.

Manuel Bandeira (19/4/1886-13/101968): Evocação do Recife

Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois
— Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
A rua da União onde eu brincava de chicote-queimado
e partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê
na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras
mexericos namoros risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:
Coelho sai!
Não sai!

A distância as vozes macias das meninas politonavam:
Roseira dá-me uma rosa
Craveiro dá-me um botão

(Dessas rosas muita rosa
Terá morrido em botão...)
De repente
nos longos da noite
um sino
Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era são José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo.

Rua da União...
Como eram lindos os montes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame de dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
...onde se ia pescar escondido
Capiberibe
— Capiberibe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento
Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redemoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro
os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras

Novenas
Cavalhadas
E eu me deitei no colo da menina e ela começou
a passar a mão nos meus cabelos
Capiberibe
— Capiberibe
Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas
Com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
que se chamava midubim e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife...
Rua da União...
A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife...
Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro
como a casa de meu avô.