segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

"Cabe às oposições, como é óbvio e quase ridículo escrever, se oporem ao governo."

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex- presidente da República, em artigo de 2011, ‘O papel da oposição”

Petrobras é investigada nos EUA

• Departamento de Justiça americano busca descobrir se representantes da estatal receberam propinas

- O Globo

RIO e SÃO PAULO - O Departamento de Justiça dos EUA abriu uma investigação criminal contra a Petrobras para saber se houve pagamento de propina para a empresa ou algum de seus funcionários nas operações americanas da estatal brasileira, segundo o jornal britânico "Financial Times". Essa investigação ocorre de forma paralela a outra, feita pela Securities and Exchange Commission (SEC, o órgão regulador do mercado americano). A Petrobras tem recibos de ações, os chamados ADRs, negociados na Bolsa de Valores de Nova York.

A investigação do Departamento de Justiça busca descobrir se a Lei de Práticas Corruptas no Exterior, que proíbe o pagamento de propina para obter vantagens em negócios, foi violada. O objetivo é confirmar se alguma empresa registrada nos EUA subornou funcionários ou representantes da Petrobras para ter privilégios comerciais.

A reportagem, porém, não dá detalhes sobre as suspeitas do Departamento de Justiça americano, nem afirma quais seriam os negócios da Petrobras sob investigação no país. No início deste ano, a refinaria de Pasadena, no Texas, se tornou alvo de investigação em função de suspeitas de superfaturamento e evasão de divisas.

O "FT" menciona as últimas investigações, realizadas pela Justiça brasileira, sobre um dos "maiores escândalos de corrupção da história do país", ressaltando que muitos dos problemas aconteceram durante o governo da presidente Dilma Rousseff. A coluna Lex, uma das mais relevantes do jornalismo financeiro, cita a Operação Lava-Jato no Brasil.

Segundo o jornal, o Departamento de Justiça americano e a SEC preferiram não comentar o caso. Procurada, a assessoria da Petrobras não se pronunciou. Em 2013, a Justiça americana e a SEC denunciaram mais de 20 empresas e representantes que desrespeitaram a Lei de Práticas Corruptas no Exterior no país. Em um dos casos, o Departamento de Justiça apresentou uma denúncia contra depositários que negociaram propinas com representantes do Bandes, banco estatal venezuelano.

MPF pediu colaboração dos EUA
O Ministério Público Federal acredita que a investigação dos EUA possa ajudar a identificar desvios de dinheiro da diretoria Internacional da Petrobras. Na delação premiada, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa - que cumpre prisão domiciliar após ter informado que recursos foram desviados da estatal para PT, PMDB e PP - afirmou que a diretoria internacional da Petrobras cobrava propina de 3% do valor dos contratos fechados pela área. O setor era comandado por Nestor Cerveró, que nega irregularidades.

As apurações de cobrança de propina na área internacional dependem de colaboração estrangeira. Costa acusou como "operador" da área Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, que atuaria para o PMDB. As autoridades brasileiras não acreditam, até agora, que Soares possa, a exemplo de Costa e do doleiro Alberto Youssef, apontar beneficiários do esquema. A atuação de Soares é investigada pela Polícia Federal, mas até agora ele não foi incluído em nenhum dos inquéritos abertos em torno dos desvios na Petrobras.

No fim de agosto, um dos integrantes da equipe que investiga os desvios na Petrobras entrou em contato com os americanos para buscar colaboração. Na avaliação dele, há possibilidade de funcionários públicos dos EUA estarem envolvidos em irregularidades, facilitando a ação dos brasileiros.

O principal alvo da investigação é a negociação de compra da refinaria de Pasadena, no Texas. Em março passado, veio à tona um documento que a própria Petrobras encaminhou ao órgão que regula o mercado financeiro nos EUA - SEC, Securities Exchanges Comission - em 2007. Nele, a estatal petrolífera anota que comprou metade da refinaria por US$ 416 milhões, e não por US$ 360 milhões.

Duas semanas antes do pedido de colaboração, o Tribunal de Contas da União (TCU) condenou o ex-presidente da Petrobras Sérgio Gabrielli e outros dez diretores da estatal a pagar o prejuízo de US$ 793,2 milhões com a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos.

A empresa belga Astra adquiriu a Crown Central - antigo nome de Pasadena - em 2004, apenas um ano antes de fechar acordo com a Petrobras. A empresa tinha uma dívida superior a US$ 200 milhões. A Astra a comprou por US$ 42,5 milhões e ainda fez investimentos de quase US$ 100 milhões para modernizar a refinaria. A Petrobras comprou 50% do negócio.

No contrato, uma cláusula determinava que, caso houvesse divergência entre os sócios, a empresa discordante deveria comprar a parte do outro. A divergência veio logo, em 2008, e a Astra apresentou sua proposta de venda para a Petrobras.

Em vez de comprar, a Petrobras recorreu à Justiça. Perdeu e foi obrigada a pagar uma indenização de US$ 639 milhões.

EUA investigam corrupção na Petrobras

• Controles internos da estatal são foco principal de investigação do Departamento de Justiça, diz 'Financial Times'

• Lei que inibe prática de corrupção por empresas americanas também pune companhias com ações em Nova York

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O Departamento de Justiça dos Estados Unidos abriu investigação criminal para examinar as suspeitas de que um esquema de corrupção desviou recursos da Petrobras para políticos e funcionários públicos, segundo o jornal britânico "Financial Times".

Advogados ouvidos pelo jornal disseram que o objetivo é apurar se houve falha nos controles internos da estatal brasileira, que tem ações negociadas na Bolsa de Nova York e por isso está sujeita à legislação americana.

A SEC, principal agência reguladora do mercado de capitais americano, também abriu investigação sobre a Petrobras na área cível, de acordo com o "Financial Times".

Conhecida pela sigla FCPA, a lei americana de combate à corrupção no exterior foi desenhada para punir empresas americanas que subornassem funcionários públicos para fazer negócios em outros países, mas também se aplica a companhias com ações negociadas nos EUA.

As investigações sobre corrupção na Petrobras tiveram início no Brasil em março, quando a Polícia Federal prendeu o ex-diretor de abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef, apontado como operador de um esquema de lavagem de dinheiro que teria movimentado R$ 10 bilhões.

Os dois aceitaram colaborar com a Justiça para tentar reduzir suas penas. Em seus depoimentos, disseram que ajudaram o PT e outros partidos da base aliada a montar um esquema de superfaturamento de obras e desvio de recursos da estatal.

As autoridades dos EUA querem saber se a Petrobras, seus funcionários, fornecedores ou intermediários violaram a lei americana, que prevê punições para fraudes em registros contábeis e controles internos das empresas.

A advogada brasileira Sylvia Urquiza, que já atuou em casos em que a legislação americana foi aplicada, disse que as penas podem chegar a multas pesadas e à prisão de executivos envolvidos.

Segundo a advogada, a maioria dos casos é resolvida por meio de um acordo entre o governo americano e as empresas, com o pagamento de indenizações milionárias.

Investidores também poderão recorrer à Justiça americana se acharem que tiveram prejuízo com as ações da Petrobras por causa da corrupção na empresa, afirmou o advogado Eduardo Boccuzzi. "As ações da Petrobras perderam 23% neste ano em Nova York", disse.

Procurada, a Petrobras não quis se manifestar. Há duas semanas, a companhia contratou dois escritórios de advocacia para aprofundar investigações internas, abertas sob pressão da PricewaterhouseCoopers, empresa de auditoria que analisa os balanços da estatal.

Colaborou Giuliana Vallone, de Nova York

CPMI agora tentará fazer novas convocações

• Oposição volta atrás em acordo e quer ouvir depoimentos de políticos

Maria Lima – O Globo

Para reverter a repercussão negativa do anúncio feito pelo relator Marco Maia (PT-SP) a respeito do acordo para convocar agora apenas agentes públicos, integrantes da oposição na CPMI da Petrobras vão tentar aprovar, já na reunião da terça-feira, as convocações do presidente licenciado da Transpetro, Sérgio Machado; do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto; e do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque. A alegação da oposição é que o acordo fechado na semana passada era no sentido de primeiro se ter acesso à delação premiada de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, depois ouvir os agentes públicos e só então partir para a convocação dos personagens políticos. Mas Marco Maia teria feito o comunicado de forma "equivocada", o que gerou a interpretação de que o objetivo seria a blindagem de políticos.

- Após o curto-circuito gerado com a comunicação equivocada do Marco Maia, vamos querer que se vote, na terça-feira, outros requerimentos pendentes. Do jeito que foi anunciado, ficou parecendo que queríamos excluir convocações. O líder do PT, Humberto Costa, é que não queria de jeito nenhum a convocação do Duque. O PMDB, em menor escala, não queria a do Sérgio Machado. Se o governo votar contra, que assuma sua responsabilidade perante a sociedade. Não estamos querendo proteger ninguém - disse Rodrigo Maia, representante do DEM na CPMI.

Em entrevista ao GLOBO, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, anunciou que o acordo seria revisto esta semana. Segundo Aécio, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), representante do partido na CPMI, disse que usaram de sua ingenuidade para firmar o acordo, dando margem a uma interpretação dúbia sobre o papel da oposição.

- A CPMI existe porque nós fomos ao STF para viabilizá-la. As denúncias estão aí vivas porque lutamos muito para que não fossem enterradas, como queria o governo - afirmou Aécio.

PMDB ameaça barrar ida de ministro de Dilma para STF

• Partido veta indicação de José Eduardo Cardozo para vaga de Joaquim Barbosa

• Ações da PF contra peemedebistas durante a campanha eleitoral criaram animosidade na cúpula da sigla

Severino Motta, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Cotado para uma vaga no Supremo Tribunal Federal, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, virou alvo de líderes do PMDB no Congresso, que trabalham para barrar sua indicação para a vaga aberta com a aposentadoria de Joaquim Barbosa.

Os senadores José Sarney (AP), Eunício Oliveira (CE), Lobão Filho (MA) e seu pai, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, ficaram incomodados com ações da Polícia Federal que atingiram líderes do partido durante a campanha eleitoral deste ano.

Eles se queixam da atuação de Cardozo, a quem a PF é subordinada, e sinalizaram ao Palácio do Planalto que seu nome será rejeitado no Senado se a presidente Dilma Rousseff indicá-lo para o STF. Principal aliado do governo no Congresso, o PMDB tem a maior bancada da Casa.

A irritação dos líderes peemedebistas teve início em setembro, quando reclamaram do tratamento dado pela campanha de Dilma ao partido nos Estados. Eunício concorreu ao governo do Ceará e Lobão Filho, ao do Maranhão. Os dois foram derrotados.

Os peemedebistas também culparam o Planalto pelo vazamentos de detalhes das investigações da Operação Lava Jato que colocaram integrantes da cúpula do partido entre os suspeitos de receber propina de empresas que fizeram negócios com a Petrobras.

O ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa, que fez acordo com a Justiça para ajudar nas investigações, apontou o ministro Lobão, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), entre possíveis beneficiados pelo esquema.

Durante a campanha, a PF revistou a mulher de Eunício Oliveira num aeroporto de Fortaleza, antes de ela embarcar num jato executivo rumo a um evento de campanha. Lobão Filho foi abordado pela PF no aeroporto de Imperatriz (MA), também quando se preparava para embarcar numa viagem de campanha com assessores.

Os policiais revistaram o avião, carros e bagagens da comitiva de Lobão Filho. O vice-presidente da República e presidente da sigla, Michel Temer, e Renan Calheiros criticaram a atuação da PF.
O secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, subordinado de Cardozo, chegou a gravar um depoimento para a campanha de Flávio Dino (PCdoB), que derrotou Lobão Filho nas eleições. Como o PT apoiava Lobão Filho, o secretário vetou o uso das imagens.

O Senado nunca rejeitou uma indicação presidencial para o STF. Os líderes do PMDB ameaçam vetar Cardozo se ele for escolhido por Dilma, mas não estão trabalhando por nenhum outro nome.

Desavenças
Além da animosidade com o PMDB, o ministro da Justiça também tem desavenças com outro cotado para a vaga no STF, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.

Durante a operação Porto Seguro da PF, Adams foi surpreendido quando um de seus principais colaboradores na AGU, José Weber Holanda, foi apontado como participante de um esquema de venda de pareceres técnicos.

A situação criou desgaste político para Adams, uma vez que um procedimento investigativo também foi aberto contra ele. O mesmo foi arquivado em agosto de 2013, quando o Ministério Público afirmou que Adams não fez parte do esquema e nada havia contra ele a ser apurado.

A vaga que Dilma tem para preencher no STF foi aberta com a aposentadoria do ex-ministro Joaquim Barbosa, em julho. Ela não tem prazo para escolher, mas deve fazê-lo até o fim deste ano.

Além de Cardozo e Adams, são cotados para a vaga o professor da USP Heleno Torres, o professor da Universidade Federal do Paraná Luiz Fachin, o ministro do STJ Benedito Gonçalves, o subprocurador da República Eugênio Aragão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e o presidente da OAB, Marcus Vinícius Furtado Côelho.

Fusão para fortalecer oposição

• PSB, PPS, DEM e Solidariedade planejam bloco para testar a junção de ideários diferentes

Lucas Pavanelli – O Tempo (MG)

Com histórias distintas e origens até opostas, partidos que estão, hoje, na oposição ensaiam aproximação a partir da próxima legislatura. Lideranças do PSB, PPS, DEM e Solidariedade (SD) têm conversado desde a última semana para tentar chegar a uma saída e engrossar a voz na próxima legislatura na Câmara. A ideia que mais ganha força é que dois ou mais desses partidos montem um bloco parlamentar durante o primeiro semestre do ano que vem. O grupo serviria como laboratório para ver se há, no futuro, possibilidade de fusão.

A criação do bloco é necessária para que essas legendas possam sobreviver. Com a Câmara mais fragmentada da história – a partir do ano que vem, 28 legendas terão representação na Casa – todas as quatro siglas perderam espaço.

O DEM, que elegeu 43 deputados em 2010, viu suas fileiras serem reduzidas para 22 nomes após as eleições deste ano. O PSB é o maior partido do bloco, e perdeu um parlamentar – passando de 35 para 34 deputados. O PPS encolheu de 12 para dez deputados e é apenas a 15ª maior bancada. Já o Solidariedade, criado no ano passado com 22 nomes, terá apenas 15 a partir do ano que vem. Na soma, as legendas perderam 31 parlamentares de uma eleição para a outra.

A fragmentação da Câmara é apontada pelo deputado federal Júlio Delgado (PSB) como facilitador nesse processo.

“Fica difícil exercer o papel com 28 partidos. As conversas foram iniciadas em São Paulo, e nós vamos ver se será fusão, cooperação, federação ou possibilidade de alinhamento com outros partidos”. Para Delgado, essa aproximação “é mais fácil com os partidos que apoiaram o PSB no primeiro turno das eleições deste ano”. Conversas com o PPS estão em andamento.

Nesse alinhamento, o nome da deputada estadual do PPS Luzia Ferreira é lembrado para ser acomodada na Prefeitura de Belo Horizonte, comandada pelo PSB do prefeito Marcio Lacerda.

“Vamos caminhar, inicialmente, como bloco parlamentar na Câmara e avaliar no próximo semestre a possibilidade de fusão. Isso daria uma atuação mais consistente e possibilidade de se criar uma terceira força no Parlamento, que não seja nem PT, nem PSDB”, analisa Luzia, membro da Executiva nacional do PPS.

O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho, avalia que o futuro desses partidos passa pela estratégia da oposição para o segundo mandato de Dilma Rousseff (PT).

“Temos hoje cinco partidos de oposição, e uma fusão passa por uma estratégia nacional, se é melhor ter cinco, quatro, três ou duas siglas nessa situação”, avalia.

A formação de um bloco parlamentar com mais uma ou duas legendas é citada como melhor caminho pelo único deputado federal do SD eleito por Minas, Zé Silva. “Maior bancada facilitaria a atuação na Câmara”, afirma o deputado.

No Rio, prefeito e dirigente disputam indicação no PMDB

Roberta Pennafort - O Estado de S. Paulo

RIO - As eleições cariocas de 2016 serão realizadas sob o impacto dos Jogos Olímpicos. O PMDB do atual prefeito Eduardo Paes, no poder desde 2009, planeja tirar partido da competição, que acontecerá na cidade dois meses antes do pleito, e do volumoso conjunto de obras que a precede. O nome ainda será definido.

Para Paes, o candidato peemedebista ideal é o discípulo Pedro Paulo, deputado federal. O presidente da sigla no Estado do Rio, deputado estadual eleito Jorge Picciani, quer que o candidato seja seu filho Leonardo Picciani, também deputado federal.

Paes trata Pedro Paulo como o "primeiro-ministro" de sua gestão e considera que tê-lo na prefeitura seria mais benéfico para a tríade com o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) e a presidente Dilma Rousseff (PT). Já Leonardo Picciani argumenta que o partido "não tem dono".

"A disputa é natural. O PMDB tem muitas lideranças e não existe um candidato natural. Claro que o prefeito sairá com alta aprovação. Quanto às Olimpíadas, não tenho dúvidas de que serão os melhores jogos da história e que vão impactar pelo legado para a cidade", disse Picciani.

Outros seis partidos devem lançar candidatos: PT, PSOL, PSB, PR, PRB e PSDB. O único que já parece ter um consenso é o PSOL, com o deputado estadual Marcelo Freixo. No PR e no PRB as escolhas pendem para Clarissa Garotinho, segunda deputada federal mais votada, e para o senador Marcelo Crivella, derrotado por Pezão. No PT, citam-se os nomes do atual vice-prefeito, Adilson Pires, e do deputado federal Alessandro Molon.

O deputado estadual Luiz Paulo Correa da Rocha e o deputado federal Otávio Leite devem ser os tucanos a concorrer internamente à candidatura. No PSB, é forte o nome do senador eleito Romário.

Polarização de 2014 põe PT e PSDB em atenção para disputa pela Prefeitura

• Disposição de Marta de enfrentar Haddad em prévias e perspectiva de que tucanos terão um estreante como candidato, ligadas ao acirramento da disputa nacional, fazem escolhas de 2016 terem ainda mais influência sobre as definições de 2018

Ricardo Galhardo e Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

A disputa eleitoral pela Prefeitura de São Paulo em 2016 começa a pautar as conversas nos partidos protagonistas da recém-encerrada campanha presidencial, a mais acirrada em 20 anos de enfrentamentos entre PT e PSDB. Dentro das duas legendas já circulam listas de nomes interessados nas indicações das siglas, enquanto pré-candidatos de outras legendas tentam, a exemplo do que ocorreu na corrida pelo Planalto, ser uma alternativa a essa polarização.

A capital paulista foi palco de fenômenos importantes para PT e PSDB na campanha encerrada no mês passado. Os tucanos avançaram sobre redutos que até eleições passadas eram predominantemente petistas nas periferias das zonas sul, como Capela do Socorro, e leste, como Itaquera. O resultado fez acender a luz de alerta no PT, partido que em 2012 obteve a terceira vitória na disputa municipal, mas a primeira superando um adversário do PSDB.

Poucos dias depois do 2.º turno da eleição presidencial, a ministra da Cultura, Marta Suplicy, procurou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para dizer que está disposta a enfrentar o prefeito Fernando Haddad em prévias no PT. Lula não se posicionou contra nem assumiu qualquer compromisso com a ex-prefeita, que administrou a cidade de 2001 a 2004.

Entretanto, o ex-presidente lembrou que é natural os gestores buscarem a reeleição e citou a escolha de Dilma Rousseff como candidata neste ano - Marta foi entusiasta do Volta, Lula, o que a desgastou no Planalto.

No PT, o aviso é visto com desconfiança. Parte dos petistas crê que Marta está mesmo disposta a sair candidata, diante da baixa aprovação da gestão Haddad. A ministra - que já anunciou sua saída da pasta - pretende explorar o receio dos vereadores de verem a bancada ficar menor caso o desempenho do partido na disputa pela Prefeitura seja ruim.

Outra parte do PT acredita que Marta tenta se cacifar. Embora tenha sido bem avaliada no MinC, o desgaste com Dilma e com dirigentes do partido durante a campanha isolou a ex-prefeita. Ela poderia repetir a tática de 2012, quando levou a decisão de disputar prévias contra Haddad até a garantia de que seria nomeada ministra.

Seja quem for o candidato, o PT sabe que a disputa será difícil. "O PT está diante de uma esfinge e, se não souber responder suas perguntas, pode ser devorado", diz o presidente municipal do partido, vereador Paulo Fiorilo.

A pergunta é: por que o PT perdeu os votos da periferia que sempre o apoiou? Para a direção partidária, responder a essa questão é a principal tarefa para os próximos meses, antes de abrir o processo de escolha do candidato. Uma das respostas é melhorar a imagem da gestão Haddad, operação já em curso.

A avaliação do prefeito desabou após os protestos de 2013, mas se recuperou e teve 22% de ótimo e bom em setembro, segundo o Datafolha. É pouco, porém, para um candidato à reeleição.

Esses índices, associados ao desgaste do governo federal, ajudam a entender a ampliação da vantagem do PSDB sobre o PT no eleitorado paulistano. Em comparação com 2010, Dilma perdeu 14 pontos porcentuais entre os votos válidos no 1.º turno: foi de 38% há quatro anos para 24% em 5 de outubro. No 2.º turno, perdeu para Aécio Neves (PSDB) por 64% a 36%.
Na disputa estadual, Alexandre Padilha (PT) ganhou em 4 das 58 zonas eleitorais da cidade, abaixo das 21 vencidas pelo correligionário Aloizio Mercadante contra Geraldo Alckmin em 2010.

Prévias. Na seara tucana, o senador eleito José Serra avisou a aliados que não pretende disputar o cargo novamente. Com isso, os pré-candidatos que em 2012 abriram mão das prévias e o deputado José Aníbal - de quem agora é 1.º suplente, mas há dois anos foi o único a enfrentar Serra na votação interna - são novamente citados para a disputa interna.

"A ideia é que o partido realize prévias se mais de um nome se apresentar", disse o presidente do PSDB municipal, Milton Flávio. Ele avalia que a disputa por sua sucessão no diretório, em abril, vai iniciar esse processo. Por ora, os tucanos preferem a discrição e dizem que ainda é cedo para esse debate.

Em 2012, colocaram-se para a disputa interna, mas abriram mão em favor de Serra, o vereador Andrea Matarazzo e os deputados Bruno Covas e Ricardo Tripoli. O primeiro é ligado a Serra e o segundo, a Alckmin, que terá papel crucial nessa definição. Parte dos tucanos defende que o pré-candidato seja escolhido o quanto antes e nomeado secretário estadual, para ganhar visibilidade.

Tripoli, por sua vez, aposta em atrair o apoio de Aécio. Seus "trunfos" são justamente não ser ligado nem a Serra nem a Alckmin - ele era próximo de Mário Covas - e ter sido o deputado federal mais bem votado na capital. Para Aécio, ter um nome de confiança na principal disputa de 2016 será importante para o papel de líder da oposição ao PT. / COLABOROU FÁBIO BRANDT

Para recuperar Minas, Aécio volta a escalar Anastasia

• Fiel aliado vai reorganizar PSDB local e já é cotado para disputar prefeitura de BH, enquanto tucano tenta liderar oposição federal

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

Apontado durante a campanha presidencial como o virtual "superministro" da infraestrutura ou chefe da Casa Civil no caso de vitória de Aécio Neves, o ex-governador e senador eleito por Minas Gerais, Antonio Anastasia (PSDB), assumirá em 2015 a missão de reorganizar a "tropa" tucana no Estado enquanto seu padrinho político atua no cenário nacional.

Se no Congresso ele dividirá os holofotes com um time de tucanos históricos que formarão a "tropa de elite" do partido no Senado - José Serra, Tasso Jereissati, Álvaro Dias e Aloysio Nunes Ferreira -, em solo mineiro o ex-governador assumirá o protagonismo da oposição. Ele já é apontado como candidato à prefeitura de Belo Horizonte em 2016. Um sinal do prestígio de Anastasia e de seu peso político foi o volume que ele recebeu de doações na campanha pelo Senado: R$ 17,7 milhões, o que lhe colocou no topo do ranking dos que mais arrecadaram.

A conquista da capital mineira é vista pelos aecistas como determinante para a retomada do poder no Estado, que a partir de janeiro será governado por Fernando Pimentel (PT) depois de 12 anos de hegemonia tucana.

"Aécio terá o compromisso com a causa nacional e será o líder das oposições. Já Anastasia será o principal líder da oposição em Minas", diz o deputado federal Marcus Pestana, presidente do PSDB mineiro. Essa tese também é advogada pela direção nacional do partido. "Aécio já deu o recado de que vai cuidar do ambiente nacional. Vai se dedicar a fazer oposição ao governo federal", afirma o deputado federal reeleito Bruno Araújo, presidente do PSDB pernambucano e membro da cúpula nacional tucana. Ele faz, porém, uma ressalva. "Uma coisa não elimina a outra. O ambiente de oposição nacional depende essencialmente dele, mas Minas será sempre sua base."

Reeleição.Aclamado como líder da oposição em seu retorno ao Senado, na semana passada, Aécio deixou claro para seus aliados que não pretende submergir em Minas nos próximos quatro anos. Seu plano é reeleger-se presidente nacional do PSDB em 2015 e comandar a montagem dos palanques municipais para as eleições do ano seguinte.

Durante os oito anos em que Aécio governou Minas - entre 2003 e 2010 - e nos quatro seguintes, Anastasia foi, ao lado da irmã do ex-presidenciável, Andrea Neves, quem deu as cartas nos bastidores do Palácio da Liberdade - e depois na Cidade Administrativa, sede oficial do governo mineiro, inaugurada em 2010. Andrea e Anastasia são as figuras que mais gozam da confiança de Aécio, e também as que ele mais escuta na hora de tomar decisões.

Com biografias, estilos e perfis diametralmente opostos, coincidem em um aspecto: a discrição. Na engrenagem do governo mineiro, Anastasia era o responsável por fazer a máquina andar, enquanto a Andrea cabia a operação política e de comunicação, além do zelo pela imagem do irmão.

Aliado. Eleito prefeito de Belo Horizonte em 2008 com o apoio do PT e do PSDB e reeleito em 2012, Marcio Lacerda (PSB) é apontado como um dos pilares no projeto de Aécio de recuperar território em Minas. A relação com o senador, que já era boa, ficou institucionalmente bem resolvida após PSB deixar a base da presidente Dilma Rousseff (PT) e se assumiu como oposição.

Apesar do virtual apoio da máquina ao seu candidato, Aécio não deve contar com a mesma ampla base partidária que o apoia desde 2002. "O assédio do Pimentel e da Dilma aos partidos aliados de Aécio será muito forte. A base dele certamente irá se desidratar", avalia o cientista político Rudá Ricci.

Projeção de expansão do PIB em 2014 cai de 0,24% para 0,20%, diz Focus

Ana Conceição – Valor Econômico

SÃO PAULO - Os analistas de mercado seguem ajustando para baixo suas estimativas para a economia brasileira, de acordo com o boletim Focus, do Banco Central. A mediana das previsões para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano caiu de 0,24% para 0,20%. Há um mês, a projeção era de crescimento de 0,28%. Depois de ficar estacionada algumas semanas em 1%, a estimativa para 2015 recuou para aumento de 0,80%.

A produção industrial deste ano também foi revisada para baixo, de queda de 2,17% para recuo de 2,21%. A estimativa para 2015, contudo, teve ligeira melhora, de crescimento de 1,42% para 1,46%.

Na semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que a produção industrial de setembro caiu 0,2%, ante agosto, quando se esperava aumento de 0,2%. No trimestre entre julho e setembro, houve queda também de 0,2% ante o trimestre anterior, segundo o IBGE.

Para analistas consultados pelo Valor na ocasião, esse resultado colocou um viés de baixa para o PIB do período, que será divulgado no fim deste mês. O primeiro mês do quarto trimestre também não parece ter sido bom para o setor a julgar pelo PMI industrial do Brasil, medido pelo HSBC, que recuou a 49,1 em outubro, de 49,3 em setembro. Medições abaixo de 50 indicam contração da atividade. Esse índice composto leva em conta produção, emprego, preços, demanda interna e externa.

Tarifa de ônibus tem defasagem de até 16% e vira nova "bomba"

Daniel Rittner - Valor Econômico

BRASÍLIA - O fim da corrida eleitoral traz de volta uma "bomba tarifária" prestes a explodir no colo de prefeitos e governadores. Alvo das manifestações de junho do ano passado, as tarifas de ônibus acumulam defasagem de até 16% em um conjunto de cinco grandes capitais ou regiões metropolitanas - Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Fortaleza e Goiânia - e precisam de reajustes "salgados" nos próximos meses. Curitiba, que engrossava a lista, anunciou na sexta-feira à noite um aumento de R$ 2,70 para R$ 2,85.

Em todos esses casos, o serviço já foi licitado e há garantia de equilíbrio econômico-financeiro nos contratos. Com isso, as empresas têm direito à cobertura integral de seus custos operacionais, por meio da tarifa cobrada dos usuários ou de subvenções pagas pelo orçamento público.

O que elas alegam é que não tem mais sido possível cobrir os custos nem com uma coisa nem com outra. Governos estaduais e municipais se veem agora diante do seguinte dilema: ou aumentam o valor da passagem, contrariando a voz das ruas, ou colocam mais dinheiro em subsídios, fragilizando as contas públicas.

A alternativa - ignorar o assunto - implica o risco de encarar uma espiral de ações judiciais movidas pelo setor. "É preciso que haja respeito aos contratos", diz o presidente da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Otávio Cunha. Segundo ele, se não houver resposta à defasagem na remuneração garantida em contrato pela prestação dos serviços, a tendência é uma onda de cobranças no âmbito administrativo e na Justiça.

Um levantamento inédito da NTU aponta onde estão os problemas. Fortaleza é a primeira capital da lista que enfrenta o dilema. A data de aniversário dos contratos é em novembro e o valor da tarifa (R$ 2,20) está com 15% de defasagem. Em Belo Horizonte, onde o reajuste anual está previsto para o mês de dezembro, há 12% de defasagem. Para corrigir essa distorção, a tarifa pode subir dos R$ 2,65 praticados atualmente para quase R$ 3.

O déficit calculado pela associação ainda não leva em conta a alta, na semana passada, nos preços do óleo diesel. Continua servindo, porém, como uma referência do tamanho das distorções. Cunha afirma que os prefeitos e governadores - depende se o serviço é intermunicipal ou atende a uma cidade apenas - não precisam necessariamente optar por reajustes no valor da passagem.

O município de São Paulo, por exemplo, tem compensado integralmente o congelamento da passagem em R$ 3 com subvenções. Com isso, não há defasagem na remuneração das transportadoras. A prefeitura já avisou que não haverá reajuste em 2015.

O caso da região metropolitana de Goiânia demonstra como essa equação pode ser complicada. A passagem, que havia subido de R$ 2,70 para R$ 3 em maio do ano passado, teve que recuar para o patamar original um mês depois por causa das manifestações.

Em 2014, também em maio, houve aumento de 3% e o governador Marconi Perillo (PSDB) assumiu uma série de compromissos para compensar a perda de receita das empresas. Ele acertou o pagamento de 50% das "gratuidades" no sistema de ônibus, que dispararam com a implantação do passe livre para estudantes, em meio aos protestos. O custo para os cofres estaduais era estimado em cerca de R$ 4,5 milhões por mês.

"Até agora, não recebemos um centavo", lamenta o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Goiás, Edmundo de Carvalho Pinheiro, que atribui a dificuldade ao período eleitoral. O governo não pôde criar novas despesas durante a campanha. "Esperamos resolver isso em breve. Estamos passando por uma situação financeira extremamente grave e o sistema está desequilibrado. Se nada for feito, podemos ter problemas até para o pagamento do 13º salário de motoristas e cobradores", diz.

A NTU calcula que a remuneração das viações que prestam o serviço de transporte em Goiânia e em outros 17 municípios da região metropolitana, onde o sistema é integrado, está defasada em 12,3%. Uma das primeiras vítimas foi o processo de renovação da frota. As empresas haviam se comprometido a comprar 300 ônibus novos em 2014, de um total de 1.370 já em circulação, e suspenderam as encomendas devido aos problemas de caixa.

Pinheiro avalia que o modelo de remuneração do serviço de ônibus, em todo o país, está "fadado ao fracasso" e precisa de uma espécie de pacto. Há cada vez menos passageiros, que querem transporte de qualidade, mas sem custo alto. O número de usuários nas nove maiores regiões metropolitanas caiu 35%, entre 1995 e 2013. De todos os deslocamentos urbanos motorizados, 65% serão em transporte individual em 2030, conforme projeções da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Eram 25% em 1980.

O espaço para a redução de impostos e tributos, que permitiu represar tarifas no auge das manifestações, ficou curto. Quase todas as capitais zeraram a cobrança de ISS e da taxa, cuja média nacional é de 4%, para o gerenciamento do sistema de ônibus. É a arrecadação com esse tipo de taxa que financia autarquias responsáveis pelo planejamento e fiscalização do sistema.

Alguns governos estaduais, como o Rio de Janeiro, reduziram a alíquota do ICMS cobrado sobre o óleo diesel. A União tomou duas atitudes: tirou o PIS-Cofins da receita bruta das empresas e promoveu uma desoneração da folha de pagamentos. De acordo com a NTU, essas isenções e descontos propiciaram uma redução de 15% nos custos operacionais, mas esse ganho já foi consumido.

Muita inflação pela frente - O Estado de S. Paulo / Editorial

A inflação de outubro pode ter sido uma boa notícia para o governo e um alento para os mais otimistas. Depois de uma alta de 0,57% em setembro, os preços ao consumidor subiram apenas 0,42% no mês passado, detalhe destacado quase com entusiasmo em alguns dos primeiros comentários profissionais. Com esse resultado, o aumento no ano chegou a 5,05% e já ficou muito acima da meta oficial, de 4,5%, mas quem se importa com isso? Se o número de outubro se repetir neste mês e no próximo, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) terá subido 5,93% em 2014 - um resultado praticamente igual ao de 2013, de 5,91%. Pelo quinto ano consecutivo o dado final ficará na vizinhança de 6%. A presidente Dilma Rousseff e seus auxiliares poderão manter o discurso oficial sobre a inflação sob controle e sempre dentro da meta - como se a margem de tolerância de 2 pontos porcentuais fosse parte da meta.

Por enquanto, esse resultado é só uma esperança, justificada pela aparente melhora do cenário no mês passado. Até outubro, a inflação de 12 meses, 6,59%, continuou acima do "teto da meta", uma distorção conceitual muito conveniente para a retórica do governo.

Enquanto o público engolir essa licença poética, os defensores da política oficial poderão continuar proclamando a seriedade e a eficácia da política anti-inflacionária, mesmo com a inflação brasileira muito acima dos níveis observados na maior parte dos emergentes. Inflação acima dos padrões produz muito mais que estragos no orçamento dos consumidores e no planejamento das empresas. Também desajusta o câmbio, torna a produção nacional menos competitiva e prejudica a geração de emprego industrial.

Mas a inflação terá mesmo perdido impulso? No atacado, os preços aumentaram 0,73% em outubro, depois de um recuo de 0,18% em setembro, como informou nesta semana a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Quedas no atacado nem sempre se transmitem ao varejo, especialmente quando a demanda dos consumidores é muito forte. Mas aumentos acabam quase invariavelmente afetando os preços nas etapas seguintes de processamento e de comercialização e acabam chegando, de alguma forma, às lojas, feiras e supermercados.

Além disso, a inflação tem sido e continuará sendo afetada pela liberação gradual de preços contidos politicamente. As tarifas de eletricidade já têm sido aumentadas, mas ainda há ajustes pela frente. A isso é preciso acrescentar os prováveis efeitos da seca. A geração hidrelétrica ainda será prejudicada por algum tempo e isso poderá resultar em preços maiores nos próximos leilões de energia.

O Banco Central (BC) aumentou de 5% para 5,3% a projeção de alta dos preços administrados por contrato e monitorados. Para 2015 está projetada uma alta de 6%, segundo a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Essas estimativas foram divulgadas na quinta-feira de manhã. Horas depois, a Petrobrás anunciou reajustes de 3% para a gasolina e de 5% para o diesel. A Petrobrás, segundo estimativa do mercado, perdeu uns R$ 2,4 bilhões este ano com o controle de preços. Novos aumentos, segundo analistas, provavelmente ocorrerão em 2015.

Mas é preciso levar em conta outros fatores inflacionários, mais constantes e de efeito mais amplo. Em outubro, 64,7% dos itens incluídos no IPCA foram reajustados. Em setembro, 61,4% dos itens haviam encarecido. A difusão dos aumentos mostra condições de mercado muito propícias ao repasse de preços mais altos. Pode-se apontar em cada mês este ou aquele vilão da inflação - a alimentação, o transporte, a energia elétrica, etc. Mas o vilão de fato é a política focada mais no consumo do que no investimento e na produção.

Essa política marcou os últimos 12 anos de governo. Em cada Ata do Copom há referências ao descompasso entre consumo e oferta e a uma "demanda robusta", alimentada pelo gasto público, pela expansão do crédito e por aumentos salariais maiores que os ganhos de produtividade. Mantida essa política, a inflação continuará longe da meta e o cenário de baixo crescimento e desajustes fundamentais ficará muito mais feio.

Ricardo Noblat - Do outro lado do espelho (Ou o começo do governo Aécio)

- O Globo

"Chega a ser risível ouvir o PT falar que é hora de descer do palanque. O PT , sempre que perdeu, nunca desceu. "
Aécio Neves

Os adversários de Aécio Neves passaram as últimas semanas de campanha alertando que ele faria no governo o que negava que fosse fazer. Nem por isso Aécio escreveu uma Carta ao Povo Brasileiro. Uma vez eleito, contudo, esqueceu tudo o que disse, mas não escreveu, que não é bobo como foi Fernando Henrique. Ao cabo, avalizou o saco de maldades desembrulhado de imediato por seus auxiliares. Confira.

ARMÍNIO FRAGA, ministro da Fazenda, aumentou a miséria extrema. Gente que vive com até R$ 70 mensais passou de 3,6% para 4% da população – mais 371 mil pessoas. Agora, os miseráveis são 10,5 milhões de brasileiros e brasileiras. Na campanha, Aécio lembrou que a FAO havia tirado o Brasil do mapa da fome. Bobagem, claro, mas a FAO, órgão da ONU, é comandada por um companheiro dele e deu uma mãozinha.

NO BANCO CENTRAL, Neca Setúbal, a banqueira de Marina Silva e herdeira do Itaú, subiu a taxa de juro para 11,25% — o maior juro real do mundo. Com isso, a comida sumiu do prato das famílias mais pobres e as letrinhas dos livros escolares.

A PETROBRAX aumentou os preços da gasolina e do diesel. Considerando que o frete é 30% do custo da comida, os preços no supermercado crescerão mais. Melhor substituir o ovo por alguma promoção de miojo com prazo de validade perto de vencer.

AÉCIO AFIRMOU que vai "fazer a lição de casa " e combater a inflação — embora na campanha tenha dito que a inflação estava sob controle, mas era mentira só para ganhar a eleição, bobinhos. Armínio mandou cortar gastos do governo: encolher os bancos públicos, conter benefícios sociais e aumentar o desemprego. Sim, porque vocês também lembram que Aécio observou na campanha que, se baixar a inflação, o desemprego aumenta.

A ANEEL, aparelhada pelo PSDB, autorizou aumentos na conta de luz. Para os ricos do Rio, aumento de 20%; para os pobres do Norte, tipo Roraima, de 54%. Quem mandou acreditar que a adversária é que faria tarifaço, não é? Deviam ter aprendido com o Collor, que disse na eleição de 1989 que Lula confiscaria a poupança. Deu no que deu. Daqui até 2018, tomem memoriol, queridos!

O OPERADOR NACIONAL do Sistema do governo Aécio avisôôô , avisôôô , avisôôô que vai rolar racionamento de energia no verão, vai rolar! É que seca é seca e mané é mané: não chove na Cantareira do Alckmin, mas também não chove nos reservatórios das hidrelétricas. E reservatórios vazios não movem turbinas. Sim, o desmatamento da Amazônia que Aécio dizia ES
tar sob controle, disparou em agosto e setembro: devastados 1.626 km², aumento de 122%.

MAIS HERANÇA maldita para azucrinar Aécio: devemos os tubos e conexões. As contas públicas de setembro tiveram o pior resultado da história com rombo de R$ 25,5 bilhões. É muito, mas não é. Na PetrobraX, surrupiaram sem contabilizar uns R$ 10 bilhões. A balança comercial de outubro foi a pior desde 1998. Aécio acha, segundo Armínio, que a culpa é do povo que enricou e pegou mania de fazer as compras do mês em Miami. Por enquanto, era isso. Beijinho no ombro, caros leitores.

PS: ENGULAM o choro, levianos! Podia ser pior. A vitória deles — aqueles "eles" lá do outro lado — seria um "retrocesso neoliberal". Inclusive, o chefe da seita deles comanda sessões de "machismo, racismo, preconceito, ódio, intolerância e nostalgia da ditadura militar", segundo recente resolução partidária. Dizem até que degola bodes, mas aí já acho que é maldade dos nossos blogueiros progressistas.

Jose Roberto de Toledo -A melhor política do mundo

– O Estado de S. Paulo

Eleição após eleição, o sistema político brasileiro gasta mais dinheiro arrecadado junto a um grupo menor de empresas para eleger um Congresso cada vez mais disperso e menos funcional. A síntese extraída do resultado das urnas e da prestação de contas dos partidos pelo Estadão Dados é dura só na aparência. O sistema é tão bom que quem é do ramo não quer mudá-lo. Fácil entender por quê: é eficiente, eficaz e lucrativo.

O Congresso a ser empossado em 2015 será o mais caro da história. Somando-se tudo que os 513 deputados e 81 senadores declararam ter arrecadado em suas campanhas, a fatura chega a R$ 1,1 bilhão. É 11% mais, já descontada a inflação, do que o gasto para eleger os membros da legislatura que está chegando ao fim – e que havia sido mais cara do que a anterior, e a anterior etc.

Embora milhares de empresas e pessoas contribuam financeiramente para candidatos, um clube restrito libera a maior parte do dinheiro para os partidos. Metade das doações empresariais para os congressistas eleitos em 2014 veio de só 1,5% dos doadores. O processo de concentração é tão avassalador que poderia virar título de best-seller: “Capital (e política) no século 21”. Porém, não deixa de ser um tipo de eficiência. Mais de menos.

Além de concentradas, essas doações são eficazes. Elegem. Dos 513 novos deputados federais, 360 receberam dinheiro de pelo menos uma – mas, quase sempre, de mais de uma – das 10 maiores empresas doadoras. É 70% da Câmara, um quórum suficiente para aprovar qualquer reforma constitucional que queiram. Ou engavetar as reformas que não queiram, como é mais comum.

O dinheiro para campanha está acima de ideologias, une governistas, oposicionistas e fisiológicos. Como as assessorias dos doadores gostam de dizer, tem para todos os partidos. Embora tentador, seria errado batizar esse processo com alguma palavra terminada em “ão”. Afinal, é quadrienal e está dentro da lei.

Não importa que a lei tenha sido escrita pelos que recebem o dinheiro. Lei é lei. Deve ser cumprida e valer para todos. Tanto é assim que seu cumprimento generalizado criou o fenômeno da multiplicação partidária. Outro recorde que o próximo Congresso bateu é o número de partidos com direito a cadeiras nele: 28. Só a Índia tem um sistema mais prolífico.

Mas dividindo-se pelo número de eleitores, o brasileiro talvez seja o melhor do mundo.

Com tanto dinheiro sobrando nas eleições, quase todo mundo quer um partido para chamar de seu. Basta o dono da sigla eleger um deputado federal para ter uma fatia do Fundo Partidário (jeito de o nosso virar deles), horário garantido na TV para fazer propaganda (ou para alugar) e ainda ser convidado para excretar o que quiser em debates televisivos. Nem maconha irrigada no Colorado (EUA) é mais lucrativa. Ambos são legais.

A perfeição ainda não foi atingida, claro. Com 28 partidos fica ainda mais caro aprovar qualquer coisa importante, e o preço da governabilidade tende a escapar pelo teto da meta. Mas a baixa produtividade não é um problema só de Brasília, certo?

Como o Legislativo não legisla, o Judiciário toma-lhe o lugar. Dá no que deu. Proíbe troca-troca de partido por um deputado só, mas sanciona a orgia partidária. Se for em grupo, podem fundir, fundar, o que for. O Kama Sutra de siglas está liberado.

O eleitor não entende essa liberalidade de costumes. Tanto é que recordes 72% revelaram ao Ibope, pouco antes de votar, que não, eles não têm preferência por nenhum partido político.

Faltou o instituto perguntar se têm raiva de quem tem. É a mais alta taxa de apartidários desde o fim da ditadura. (Por falar em eleição, protesto e ditadura… Não, melhor esquecer.)

O sistema político brasileiro é o mais eficaz, eficiente e lucrativo do mundo. Só quer reformá-lo quem não faz parte dele. Funde o seu partido e aproveite a festa.

Valdo Cruz - Lorotas de cada um

- Folha de S. Paulo

Lorota é o mesmo que conversa fiada, uma grande mentira. Para a reeleita Dilma Rousseff, esta é a melhor definição para ideia de reduzir o número de ministérios a fim de cortar gastos do governo.

De fato a economia com a redução de ministérios não é lá grande coisa. Talvez não chegue a "R$ 10 bilhões" num universo de despesas de custeio do governo federal que, até outubro, foram de R$ 615 bilhões.

A questão financeira da patranha do corte de pastas é, porém, apenas um dos lados da discussão. Dilma alega que áreas importantes, como igualdade racial, tiveram mais atenção depois que ganharam status de ministério. Pode ser, mas essa é outra história muito mal contada.

Em um governo com 39 ministérios, a presidente não tem tempo suficiente nem para cumprimentar todos os seus ministros. Alguns simplesmente passam meses sem despachar com a chefe, como aconteceu no primeiro mandato dela.

A lógica da boa governança, sempre defendida pela petista, indica que o melhor caminho seria reduzir o número de ministérios. Daria mais agilidade ao governo atual, marcado pela demora em tomar decisões.

O fato é que, ao tachar a proposta do tucano Aécio Neves de lorota, a dona do Planalto inventa uma história mal contada para esconder o real objetivo de ter a Esplanada dos Ministérios inchada: atender o apetite por cargos dos aliados.

E por falar em lorota, o governo promete tirar as contas públicas do vermelho cortando gastos com seguro-desemprego, abono salarial, auxílio-doença e pensões de viúvas. A mesma promessa feita desde 2011, mas até hoje não cumprida.

Tal ideia soa mais a conversa fiada, algo que o governo deveria evitar no novo mandato. É justo lembrar que, pelas primeiras declarações, Dilma parece estar consciente de que precisa mudar. A conferir.

Afinal, seu tempo de empurrar os problemas com a barriga já se foi. Não dá mais para viver de lorotas.

Renato Janine Ribeiro - A estagnação dos políticos

• Por que falta sangue novo na política

- Valor Econômico

Uma pergunta: se nas empresas a renovação dos quadros seguisse o mesmo ritmo da política - devagar, quase parando - o que seria delas? E a mesma pergunta vale para as universidades, as artes, um pouco tudo. Da boca para fora, dois terços de brasileiros disseram a sucessivas pesquisas que queriam "mudanças". Na hora do vamos ver, deixaram quase tudo como estava. José Roberto de Toledo mostrou que, dos 27 governadores eleitos, apenas quatro representam algum tipo de renovação. Mesmo entre os deputados novos, boa parte é Filho ou Neto. Várias famílias mandam na política há gerações.

Num mundo que muda a uma velocidade surpreendente, em que a palavra "inovação" assume vários sentidos mas em todos eles constitui prioridade, das empresas à política e à vida pessoal, como entender que nossa vida eleitoral seja um forte baluarte contra o novo? Porque isso é um enorme problema para nós. A baixa renovação política - não só dos governantes, mas das lideranças e mesmo quadros - torna difícil o país se adaptar a ideias novas, a projetos diferentes, em suma, lidar com um mundo em transformação.

Olhemos as fotos. Os políticos são, na grande maioria, homens. Mesmo tendo uma mulher na chefia do Estado, como Dilma Rousseff, seus colaboradores são quase todos do sexo masculino. Vestem terno e gravata. Seu descompasso visual é enorme com o país que representam. Podem variar na qualidade e estética do corte, mas as cores que predominarão em seus costumes serão as escuras. Na galeria do poder, quem destoa são os artistas ou gente da cultura - ou deixando o terno de lado, como Gilberto Gil, ou usando-o mas com cores berrantes, alegres, no paletó ou na camisa.

Um século atrás, qualquer foto de homens da classe média para cima, num lugar público, os apresentaria de terno e chapéu. Podia haver um abismo entre representantes e representados, mas o código de vestimenta, excluídos os pobres, era parecido. Hoje, não é mais. Vejo isso nas universidades. Reitores e dirigentes usam terno. Professores, exceto na área de direito, não. Até parece que os que mandam na universidade se vestem para as instâncias de poder externas a ela, não para as instâncias de produção do saber que nela existem.

Já li a historinha que se segue narrada de várias formas. Um profissional de recursos humanos recebe um candidato, encaminhado pelo pai, que tem amizade com algum diretor. O rapaz se sente mal no terno que veste, está tenso, não cabe no lugar nem no emprego. Mas, a certa altura, o entrevistador tem um "insight" e pergunta ao jovem o que ele gosta mesmo de fazer. Os olhos brilham e o rapaz conta. Adora ouvir "heavy metal" enquanto lida com o computador. Em suma, ele é um gênio da informática ou do "design", e veste roupas confortáveis, às vezes desengonçadas, tem "piercings" e tatuagens. Foge completamente ao padrão de quem trabalha na empresa. Mas é um gênio - que o entrevistador contrata, para uma jornada ou local de trabalho que não é nada usual.

Essa historinha tem muitas versões, pode ser verdadeira ou não, mas deve ter acontecido mil vezes. Porém, sempre é contada como exceção, como surpresa. Está na hora de torná-la mais frequente. Está na hora de compreender que os costumes mudaram!

Imaginem isso na política. Os candidatos se curvam a um modelo que já está pronto. Quem quer isso? A grande maioria não quer. Nas eleições deste ano, só vi espírito jovem no PSOL - o partido supostamente radical de esquerda. Recomendo, no YouTube, o clipe "Política não é para os engravatados", da vereadora Fernanda Melchionna, de Porto Alegre. Ela discute o projeto de lei de um colega, regulamentando as vestimentas das vereadoras (!!), e ironiza a exigência de usarem gravatas.

O exemplo que dei pode não parecer feliz para os empresários, que na maioria vestem terno e gravata. Mas quis ilustrar o abismo que há na política, entre representantes e representados, não só em ideias e projetos políticos, mas principalmente no modo de ser. Nossos eleitos têm pouco a ver com o sangue novo que pulsa na sociedade. Durante muitos anos, a política recebia transfusão de sangue de figuras inesperadas, heroicas até, mas que ela vampirizava. Lembro Mário Juruna, o cacique xavante que ia ver os ministros da ditadura de gravador em punho, para depois denunciar promessas não cumpridas. Morreu pobre e esquecido, em 2002. De lá para cá, cada vez menos sangue novo chega à política. As manifestações pelo impeachment de Collor, em 1992, consagraram apenas o presidente da UNE, Lindbergh Farias, hoje senador pelo Rio. Este ano, só o PSOL parece que lançou a candidatura de participantes das manifestações de 2013. A maior parte não se elegeu.

A política é pouco atraente para quem sente latejar a criatividade. Isso me preocupa. Sei que a demanda por mudanças é muito vaga. Mas há um descontentamento difuso em nossa sociedade. Os políticos preferem dizer, contra tudo o que se conhece de protestos deste gênero desde 1968, que ninguém sabe a que se devem nossas manifestações (o que é mentira). As eleições ignoraram o mal-estar de 2013. Mas ele permanece inteiro. A modorra e a pasmaceira venceram a curto prazo, porém permanece a insatisfação. Mal surgem novos líderes na política. Um partido que raras vezes mencionei nesta coluna, o PSOL, é o único que discute esta questão. Ele pode ter mais futuro do que parece em nossas análises realistas, que triangulam a política entre PT, PSDB e o que ainda não sabemos se é Rede ou PSB. Porque é cada vez menos provável um jovem cheio de vida e de ideias ingressar na política como ela é. E nesta eleição pioramos. O descontentamento é o maior em trinta anos de democracia, os protagonistas os menos empolgantes.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Rubens Ricupero - Um conselho a Tancredo

• Dilma parece não ver a importância de uma boa gestão econômica e deve repetir erros do passado

- Folha de S. Paulo

"Escolha um bom ministro da Economia e 80% de seus problemas estarão resolvidos."

Foi com esse conselho que o então primeiro-ministro Felipe González respondeu à pergunta de Tancredo Neves sobre o segredo do êxito do governo espanhol. Na viagem de janeiro de 1985, antes da posse que nunca haveria, o presidente eleito fizera uma escala não prevista em Madri. Aécio Neves estava com ele e deve ter ouvido o conselho.

Se a presidente Dilma recebeu conselho igual, não parece ter pressa de segui-lo. Ou pensa que não tem a menor importância.

Afinal, seja qual for o nome escolhido, é provável que o verdadeiro ministro continue a se chamar Dilma Rousseff. Quem leu as longas entrevistas publicadas na sexta (7) só pode tirar uma conclusão: são entrevistas de ministro da Fazenda.

O que sobra para o ansiado ministro, rearranjar os móveis no tombadilho do Titanic? Não há nada nas declarações à imprensa nem nas vivas reações sarcásticas às interpelações críticas dos jornalistas que indique mudança de temperamento, atitude ou orientação.

Engana-se ou ilude-se quem quiser ou enquanto puder.

Com efeito, a única surpresa nas entrevistas fica por conta da indefinição quanto aos cortes de gastos: "Vamos [...] ver o que dá para reduzir". Ou sobre a meta de superavit primário: "Ainda estamos fazendo estudos (para saber) o que vai ser".

Seria de imaginar que quatro anos no governo é tempo mais que suficiente para saber onde cortar ou qual é o superavit possível.

O resto dá a impressão de que a campanha não terminou. Nada há de errado com a economia, não existe queda de confiança dos empresários, a criação de emprego não está caindo, reduzir o número de ministérios é "lorota", da mesma forma que mudar a meta de inflação.

Nossos problemas vêm ou da deflação lá fora ou da seca aqui dentro. Não há tarifas represadas nem dificuldades no setor elétrico. Tampouco é verdade que alguns países latino-americanos crescem mais que nós.

Trata-se de demonstração de obstinada negação da realidade. É perfeita a continuidade com o que temos visto ao longo dos quatro anos ou na propaganda de campanha. Nesse sentido, as entrevistas são de uma coerência admirável. Ou talvez se devesse dizer assustadora.

O que não se consegue vislumbrar é onde está a mudança.

Cada vez parece mais claro que o governo não venceu, apenas repetiu de ano. Ou melhor, passou com nota raspando. Passou com um cacho interminável de dependências. Sua nota não deu para passar em inúmeras disciplinas: crescimento, inflação, superávit primário do Orçamento, dívida pública e líquida, saldo comercial, deficit em conta corrente, crise da indústria, taxa de investimento, taxa de poupança etc.

Na eleição de Lula em 2002 houve pânico pelo desconhecido. Seria o caso hoje de passar a ter medo do demasiado conhecido?

Ou existe alguma razão escondida para crer que o governo-aluno repetente, que não fez a lição de casa, que colou na prova de superavit primário com truques contábeis, agora que os professores são mais severos e as matérias mais difíceis, vai se tornar o primeiro da classe?

Mais uma façanha de Dilma - O Estado de S. Paulo / Editorial

Ao tomar posse de seu primeiro mandato, em 1.º de janeiro de 2011, a presidente Dilma Rousseff disse que "a luta mais obstinada" de seu governo seria "pela erradicação da pobreza extrema". A dois meses do fim desse mandato, descobre-se que o total de brasileiros considerados miseráveis subiu 3,68%, de 10,081 milhões para 10,452 milhões, entre 2012 e 2013. Foi a primeira alta desde que o PT chegou ao poder, em 2003. Dilma, portanto, foi incapaz de cumprir seu principal compromisso como administradora - justamente aquele que ela invocou nos palanques para diferenciá-la dos candidatos de oposição - e nada indica que ela terá melhor desempenho no segundo mandato, pois a situação econômica atual é bem pior do que a de quatro anos atrás.

Os números sobre a miséria constam de estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Esse levantamento deveria ter sido divulgado em outubro, mas o Ipea, vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos, decidiu adiar a publicação, sob a alegação de que a legislação eleitoral proibia a divulgação de dados que pudessem favorecer candidatos.

O governo não teve esse mesmo pudor na campanha de 2010, quando o lulopetismo tentava levar o "poste" Dilma à Presidência. Naquela ocasião, o Ipea divulgou dados retumbantes sobre a redução da miséria na gestão de Lula, usados à vontade na propaganda eleitoral para favorecer a candidata petista. Mesmo na última campanha, Dilma foi à TV, em cadeia nacional, para trombetear que, "em uma década, foram retirados 36 milhões de brasileiros da miséria" - e ela acabou corrigida pelo próprio Ipea, que informou que a queda havia sido de 8,4 milhões.

Por fim, não há nada na lei eleitoral que impeça órgãos do Estado de divulgar seus dados regulares durante a campanha. Torna-se então evidente que o zelo do governo nada mais foi do que uma manobra para escamotear números que revelavam as imposturas de sua propaganda - o que gerou uma crise no Ipea, levando dois diretores a pedirem demissão. Numa eleição tão apertada como a que reconduziu Dilma à Presidência, era preciso impedir que o eleitor tivesse conhecimento de qualquer informação que desmentisse a retórica petista.

De acordo com o Ipea, a proporção de extremamente pobres passou de 5,29% para 5,50% da população. A linha de extrema pobreza baseia-se em uma estimativa do valor de uma cesta de alimentos com o mínimo de calorias para suprir as necessidades de uma pessoa, segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação e a Organização Mundial da Saúde. Ou seja, o Brasil ainda tem mais de 10 milhões de pessoas que não conseguem se alimentar de forma minimamente adequada.

Por esse critério, ressalta o Ipea, o número de pessoas em situação de pobreza - cuja linha é o dobro da linha de extrema pobreza - caiu de 15,93% para 15,09%. No entanto, se fosse levado em conta o critério do programa Brasil sem Miséria, que estabelece a renda per capita de R$ 77 mensais como linha de extrema pobreza, o porcentual de pobres no País seria menor, mas também teria apresentado crescimento - de 8,9% para 9%. Também por esse critério, o número de extremamente pobres seria de 8,05 milhões - um salto de 3,6% para 4% da população, ou 870.784 pessoas a mais.

Tal situação é particularmente constrangedora quando se recorda que o combate à pobreza é cantado pelos petistas como a grande marca de seus governos. Mas o fôlego dos programas de distribuição de renda só se mantém se houver renda a ser distribuída - algo que a desastrosa gestão econômica de Dilma comprometeu.

Para reverter o quadro, Dilma deveria recordar o que ela mesma disse quando tomou posse em 2011. Primeiro, afirmou que "a superação da miséria exige prioridade na sustentação de um longo ciclo de crescimento". Depois, reconheceu que "a inflação desorganiza a economia e degrada a renda do trabalhador", razão pela qual jurou que não permitiria, "sob nenhuma hipótese", que "essa praga volte a corroer nosso tecido econômico e a castigar as famílias mais pobres".

Tutela política – O Globo / Editorial

• O DL 8.243, já derrubado na Câmara, serve apenas para formalizar a política de instalação de aparelho

Aperfeiçoar o regime de democracia representativa, sem cair em armadilhas do populismo que contrabandeiam mecanismos de "democracia direta", deve ser preocupação constante dos políticos e de organismos da sociedade organizada.

O desafio é criar-se uma multiplicidade de canais em que o cidadão, sem deixar de se sentir representado nas Casas legislativas, atue de uma maneira mais próxima dos centros de decisão. Em democracias com populações gigantescas, como a brasileira, é fundamental a atenção com a distância entre o Estado e as pessoas. Quanto menor, melhor.

A criação de comissões com representantes do povo para ajudarem na elaboração e/ou execução de políticas específicas é prática antiga. Assim, como alega o governo, não deveria causar qualquer estranheza a instituição de uma política e de um sistema de participação social, por meio do Decreto-Lei 8.243, em maio.

Mas a questão é bem outra. Nada contra comissões em si. O problema, e sério, está na constituição do tal sistema, formado por uma constelação de comissões instaladas na administração direta e mesmo estatais, previstas para atuar em fóruns, mesas de negociação, audiências públicas, conferências nacionais, ouvidorias etc.

Toda esta enorme estrutura criada para supostamente representar a "sociedade civil" ficaria, segundo o decreto, sob a coordenação da Secretaria Geral da Presidência da República, com status de ministério, hoje ainda ocupada por Gilberto Carvalho, a ser substituído no segundo governo Dilma certamente por outro político da alta hierarquia do PT. Não por acaso.

Na verdade, este "Sistema Nacional de Participação Social" é a materialização em lei da política de aparelhamento do Estado que o partido executa com disciplina desde a chegada ao Planalto, com Lula, em 1º de janeiro de 2003. Sob inspiração chavista. Esta evidência é escancarada quando o 8.243 define, para os fins do sistema de comissões, o que é "sociedade civil": "O cidadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações."

Óbvio, não é simples coincidência esse meio político-social ser o mesmo em que o PT exerce grande influência, tem enorme representatividade e atua até mesmo distribuindo recursos públicos por intermédio de ministérios e autarquias que controla (Incra é um desses guichês generosos).

De qualquer eleição feita neste universo para escolher "representantes do povo" sairão nomes ligados ao PT, a suas correntes e legendas aliadas à esquerda. Um jogo de cartas marcadas.

Esta já seria uma razão forte para a Câmara dos Deputados ter revogado o decreto-lei, decisão a ser confirmada pelo Senado. Outro motivo é que a formulação dessa proposta, capaz de tutelar a máquina do Estado por interesses político-ideológicos específicos e conhecidos, tem de ser feita às claras, no Congresso. Não por uma canetada presidencial.

Roberto Romano - Reforma política e lobby

- O Estado de S. Paulo

Não é preciso ter a finura de Marcel Proust para evocar as trapaças do tempo que toldam a memória e fragilizam a vontade. Santo Agostinho tem duras páginas sobre a nossa desgraça na finitude, mortal fuga do Eterno. Dele fomos expulsos pelo erro que nos trouxe a mentira e o declínio até o Apocalipse. Em plano bem menor, os escândalos da vida econômica e política escondem armadilhas que dominam a consciência pública, distorcida pela falsidade cronológica. Temos notícias dos crimes e delitos de modo diacrônico: toda manhã os jornais trazem os "malfeitos". Retomados, tais fatos entorpecem os sentidos. Após alguns anos poucos indivíduos ouvem, olham, sentem, inalam a podre desolação imperante nas instituições pervertidas pelos interesses ilegais.

Sistemática, a vida coletiva pervertida tem outro lado, o sincrônico: no instante em que uma quadrilha assalta certa repartição ou instituto, outra age de modo igual em parte distante ou próxima do poder. A máquina de moer princípios éticos opera em dois registros temporais. A cidadania distraída sempre retoma a cantilena da indignação quando estoura um escândalo, mas não busca o fio que une os atentados aos dinheiros públicos.

Como arrancar, na luz diurna, bilhões destinados às políticas públicas? Ninguém pode fazer tal milagre isoladamente. Para o sucesso toda uma rede é armada, técnicas precisam ser movidas, hábitos comuns reúnem os meliantes. A corrupção não é singular, mas necessariamente coletiva. Estudos analisam os atos de quem rouba o erário. A intelecção dos agentes corruptos une as trocas de favores, "amizades", apadrinhamentos, interesses sociais e políticos (J. Boissevain, Friends of Friends: Networks, Manipulators and Coalitions, 1974).

Para corromper normas e projetos são inventadas novas e sutis formas de acesso às informações, às pessoas, às influências. Uma estrutura triádica, no entanto, sempre opera no setor escuro da vida política: existem os clientes, postos nos dois lados do balcão, e os agenciadores (os brokers), que distribuem cargos e recursos, garantem fidelidade aos pactos.

Combater a corrupção requer controlar os "clientes" e quem os favorece. O caso Alberto Youssef é claro: ele serviu como broker para corrompidos nos dois polos, o público e o privado. Não basta punir um ou dois integrantes da rede, os três devem receber sanção negativa. A tarefa requer forças que vão além de polícia, Justiça, controladorias. Todos os que pagam impostos deveriam agir como fiscais dos cofres públicos. É mais fácil, entretanto, abrir o jornal, ligar a TV ou o computador e assumir o rito inútil da indignação que leva... à hipnose e ao esquecimento.

Com o moderno Estado foi inoculado na massa dos contribuintes o dogma de que existem funções explicitamente públicas, desempenhadas por pessoas cujos poderes são limitados pela ordem jurídica. Nessa forma de pensar, apadrinhamentos, favores recíprocos, apoios financeiros para eleger parlamentares e governantes permanecem na penumbra, raramente surgem na cena para "desacreditar a ordem legal". Mas todos sabem e ninguém confessa: as ligações perigosas entre clientes e brokers definem a política "realista" que gera as referidas trocas de dinheiro, clientela, sufrágios eleitorais (Della Porta, D. e Mény, Démocratie et Corruption en Europe, 1995).

No Antigo Regime o rei distribuía favores aos nobres e clérigos para manter o trono. Na época já existiam os "padrinhos", os clientes e os brokers, que abriam a via para os cargos e dinheiros públicos. As revoluções modernas instauraram o regime parlamentar. Nele desapareceriam os benefícios do monarca. Pobre ilusão, pois os parlamentos reforçam "as técnicas do favor e, com elas, o apadrinhamento e a clientela também se modernizaram. Nem a politização, nem a burocratização acabam com elas"(F. Monier, Patronage et Corruption Politiques dans l'Europe Contemporaine, 2012). Os elos entre as formas privadas (e públicas) para o enriquecimento de políticos e líderes econômicos foram instaurados na própria gênese do Estado parlamentar.

As empresas dependiam do quadro normativo e fiscal do Estado, concessões e contratos governamentais iniciam sua era dourada. E os políticos passam a precisar dos empresários para seus assuntos eleitorais. Ambos buscavam informações para suas estratégias específicas. Na Inglaterra uma "private law" da House of Commons devia ser votada sempre que iniciativas no campo ferroviário eram empreendidas. O lobby tem papel relevante. Desde 1830 os empresários do ramo se introduzem no Parlamento, em 1860 eles já eram 200. Ali uniam o papel de representantes de empresas e do eleitorado. Surgem os agentes parlamentares e o lobby profissional. Tais agentes operam com parlamentares, intermedeiam o trato entre firmas, governo, deputados. Em 1867 aparecem as United Railway Companies e várias associações visando ao lobby. Elas controlam o Board of Trade, aprovam ou impedem leis entre 1870 e 1880. Na França ocorre algo similar. Desde 1870 os deputados pertencentes à centro-direita ocupam 50 cargos administrativos em grande empresas do país: finanças, ferrovias, mineração, indústria pesada, comércio, seguros (J. I. Engels, in Patronage et Corruption, citado acima). Só no século 20 começa, na Europa e nos EUA, o controle efetivo dos tratos entre empresas privadas e governos.

O que ocorre no Brasil, portanto, deve ser visto em perspectiva temporal: aqui ainda se pratica a simbiose de empresários e políticos com vista a levar recursos públicos para os cofres das firmas privadas e para os partidos que assumem nas administrações e nos parlamentos (municipais, regionais, nacional) a função de lobistas, truque que tem o nome de "bancada X ou Y" do Congresso. Financiamento público de campanhas políticas sem regulamentar o lobby e impedir que líderes operem como brokers nos três Poderes é mover o sorvedouro orçamentário de uma fonte para colocá-lo em outra, menos visível, mais tirânica.

*Roberto Romano é professor da Unicamp e autor de 'O Caldeirão de Medeia' (Perspectiva)

Vinicius de Moraes - Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.