segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Opinião do dia - Luiz Werneck Vianna*

Aqui, com a nossa imaginação travada pelo economicismo, pesada herança intelectual que nos ficou do nosso longo processo de modernização politicamente orientado, parece que a nossa opção, nostálgicos do terceiro-mundismo, é a de fazer ouvidos moucos ao som ao redor.

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*Cientista Social da PUC-Rio, em artigo, ‘O som ao redor’, O Estado de S. Paulo, 1 de fevereiro de 2015.

Câmara elege Cunha e derrota Dilma

• Considerado um aliado pouco confiável, ele teve 267 votos, contra 136 do PT

• Novo presidente deverá ser alvo de inquérito no STF no caso da Lava Jato, que apura corrupção na Petrobras

Ranier Bragon, Márcio Falcão, Andréia Sadi e Natuza Nery – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo Dilma Rousseff sofreu uma derrota histórica neste domingo (1º) com a eleição em primeiro turno do peemedebista Eduardo Cunha (RJ), 56, para a presidência da Câmara dos Deputados.

Considerado um aliado pouco confiável, já que liderou rebelião contra Dilma em 2014, ele bateu o petista Arlindo Chinaglia (SP), nome bancado pelo Planalto, por 267 votos contra 136.

O anúncio foi comemorado com fogos de artifício disparados por aliados na Esplanada dos Ministérios. Horas antes, petistas já haviam "jogado a toalha" e buscavam culpados pelo vexame. Outros 100 deputados votaram em Júlio Delgado (PSB-MG) e 8, em Chico Alencar (PSOL-RJ). Houve 2 votos em branco.

A votação foi secreta e a traição, grande. Apesar de os partidos que apoiavam Chinaglia reunirem 180 cadeiras, ele teve 44 votos a menos. "Uma parte não votou em mim, o que você quer que eu diga?", lamentou o petista.

Houve consenso de que PR, PSD e PDT lideraram as traições. Partidos que têm ministérios no governo já haviam aderido oficialmente a Cunha, entre eles o PRB de George Hilton (Esporte).

"Se fosse a Dilma, eu demitia o ministro amanhã, senão vão achar que ela é frouxa", comentou o deputado Paulo Maluf (PP-SP).

Apesar de adotar um discurso de que não fará uma gestão de oposição ao governo, Cunha tem agora poderes para dar seguimentos a CPIs incômodas para o governo e até a eventual processo de impeachment contra Dilma.

Ele afirmou que eventual pedido de impedimento é "descabido". Em seu discurso no plenário da Câmara, porém, sublinhou o mal-estar com o PT e o governo. Disse que foi tratado como inimigo.

"Não há possibilidade de que eu vá exercer uma gestão de oposição, mas também ninguém vai me ver se curvar ou ser submisso a qualquer coisa que não seja a vontade da maioria desta Casa."

Em sua primeira fala após ser eleito, anunciou como primeira medida a votação de tema incômodo ao Planalto, a proposta que obriga o governo a liberar verbas para as emendas que os congressistas fazem ao Orçamento.

Evangélico, Cunha já deu declarações contrárias a projetos de movimentos sociais e da comunidade gay. Também já disse que não apoia o fim do financiamento privado de campanhas e a regulação econômica da mídia, defendidos pelo governo.

A última vez em que o governo federal sofreu derrota semelhante na Câmara foi na vitória de Severino Cavalcanti (PP-PE) em 2005.

Pego de surpresa pelo resultado, o Planalto avaliou ter uma base real de apoio de apenas 136 deputados, os que votaram em Chinaglia, mas que usará a montagem do segundo escalão para reaglutinar a base. Nos debates sobre a razão do fracasso, a atuação de ministros foi criticada.

Iniciando seu quarto mandato, Cunha presidirá a Câmara até janeiro de 2017, sucedendo Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).

O novo presidente da Casa deverá ser alvo de inquérito no caso que apura o esquema de corrupção na Petrobras. O peemedebista nega ter qualquer relação com o caso.

Cunha derrota Planalto e se elege presidente na Câmara

Governo perde na Câmara

• Cunha vence jogo pesado do Planalto e é eleito presidente da Casa

Isabel Braga, Júnia Gama e Maria Lima – O Globo

BRASÍLIA - Contra a pesada mobilização do Palácio do Planalto nas últimas duas semanas, que incluiu a formação de uma tropa de choque com sete ministros de Estado atuando abertamente a favor do candidato do PT, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) impôs ontem uma enorme derrota ao governo se elegendo o novo presidente da Câmara dos Deputados. Ele conseguiu já no primeiro turno do pleito 267 votos, quase o dobro dos 136 obtidos pelo petista Arlindo Chinaglia (SP). No discurso de posse, proferido logo após o anúncio da vitória, o peemedebista criticou a interferência do Executivo na eleição do Legislativo, disse que o governo pode se tranquilizar, mas anunciou a disposição de trabalhar e votar, ainda esta semana, o Orçamento Impositivo, que obriga o governo a empenhar parte das emendas individuais dos parlamentares.

- Nós assistimos a uma tentativa de interferência do Poder Executivo na eleição do Poder Legislativo. Mas o Parlamento, pela sua independência, sabe reagir e ele reagiu no voto, na escolha, na sua opção. Mas, passada a disputa, esse é um episódio virado. Não temos que fazer disso nenhum tipo de batalha, nem qualquer tipo de sequela. O que temos que fazer é começar a trabalhar - afirmou Cunha.

A dimensão da derrota do Planalto pôde ser observada pelo fato de Arlindo Chinaglia ter conseguido 44 votos a menos que do que os 180 do bloco que formou. Eduardo Cunha, por sua vez, recebeu 267 votos, 49 a mais do que o número formal dos deputados que integravam seu bloco partidário.

Patrocinado pela oposição, especialmente pelo PSDB, o deputado Júlio Delgado teve 100 votos, quase fechando os 106 votos do total dos partidos que o apoiaram. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), entrou pessoalmente na campanha no fim da semana para enquadrar os deputados novatos que queriam votar em Eduardo Cunha no primeiro turno e garantiu o voto da ampla maioria dos tucanos no aliado.

- O PSDB parou de olhar para dentro, para cargos, e olhou para fora, sintonizado com a sociedade. Eu tirei a digital do PSDB de candidaturas que a sociedade não quer, que usa o método da cooptação. Entregamos o que prometemos - avaliou Aécio.

- Com a postura que teve nos últimos dois meses, botando a cara, mostrou sintonia com as ruas que querem candidaturas que simbolizem a mudança. O PSB vai corresponder ao crédito que ele (Aécio) deu a nossa candidatura - prometeu Júlio Delgado.

Cunha fez uma campanha milionária, percorrendo todos os estados, fazendo uma maratona de almoços e jantares e investindo pesado nos deputados novatos. Considerado como um dos principais inimigos da presidente Dilma na Câmara, com quem sempre teve uma relação difícil, o novo presidente da Câmara comandou embates emblemáticos contra o governo, como a manobra que resultou no fim da CPMF ainda no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a votação da medida provisória dos Portos e a do Marco Civil da Internet. Neste mandato, além da votação das medidas impopulares tomadas por Dilma em relação a direitos trabalhistas e de reequilíbrio das contas públicas tomadas pela área econômica, uma outra preocupação do governo é em relação às articulações da oposição para criar uma nova CPI da Petrobras.

Dificuldades previstas na véspera
Desde o início do dia o comando da campanha petista já previa dificuldades e temia a derrota no1º turno, mas não tão ampla. Em sua estreia de fato na articulação política do governo, o estilo do ministro Pepe Vargas (Relações Institucionais), semelhante ao da presidente Dilma, não foi aprovado por deputados da base aliada. Deputados de vários partidos da base dizem que ele foi de uma "inabilidade brutal" na campanha para eleger Chinaglia, especialmente na forma como cobrou os ministros aliados, e sai do processo "torrado". O petista dá de ombros:

- O papel do ministro que faz a articulação política não é ser doce. Eu falei no tom e no conteúdo que tinha que falar. Não é bom que um partido que está no governo se some à oposição.

E, ainda cedo, já minimizava a possível derrota.

- O presidente pode muito, mas não pode tudo. Tem que aplicar o regimento - disse Vargas.

(Colaboraram: Chico de Gois, Cristiane Jungblut e Fernanda Krakovics)

Eduardo Cunha é eleito presidente da Câmara e impõe derrota ao PT

• Deputado teve 267 votos, contra 136 de Arlindo Chinaglia (PT-SP); Júlio Delgado (PSB-MG) recebeu 100 votos e Alencar ficou com 8

Ricardo Della Coletta, Daiene Cardoso, João Domingos e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff sofreu ontem uma importante derrota no Congresso com a eleição do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara. Com 267 votos, ele derrotou o candidato oficial do Palácio do Planalto, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que recebeu 136 votos, 44 a menos do que a soma dos deputados que compunham o bloco que o apoiou. Júlio Delgado (PSB-MG), candidato da oposição, teve 100 votos e Chico Alencar (PSOL-RJ), 8 votos. Houve dois votos em branco.

Cunha vai suceder a Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Com a reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) para a presidência do Senado, o PMDB manteve os dois postos de comando no Congresso.

O governo federal ajudou Renan, mas trabalhou contra Cunha. Nos últimos dias, ministros próximos à presidente, como Pepe Vargas (Relações Institucionais), Jaques Wagner (Defesa) e Aloizio Mercadante (Casa Civil), fizeram intensa campanha pelo candidato do PT.

Considerado um desafeto pelo Palácio do Planalto, Cunha, ao tomar posse na presidência da Câmara, optou por um discurso conciliador. “O governo sempre terá, pela sua legitimidade, a governabilidade que a sua maioria poderá dar, no momento em que ela for exercida e se for exercida”, disse. “Passada a disputa, não faremos nenhum tipo de batalha.” Ele, porém, criticou a atuação do governo em favor de Chinaglia durante a campanha. “Assistimos à tentativa de interferência do Executivo, mas o Parlamento soube reagir e reagiu no voto.”

Depois, em entrevista coletiva, voltou a garantir a estabilidade política na sua gestão. “Não será a presidência da Câmara que vai provocar instabilidade. Não vamos ter estabilidade econômica sem estabilidade política. Somos responsáveis o suficiente para saber que o País precisa de estabilidade política”.

Ele anunciou que o segundo turno da reforma constitucional que cria o Orçamento impositivo será votado assim que forem cumpridos os prazos. O governo não quer a aprovação desse projeto. Cunha citou ainda outras duas prioridades do início de sua gestão: rever o pacto federativo, de modo a dar aos Estados e municípios condições de respirar diante da concentração de recursos na União, e fazer a reforma política. O primeiro item também não é bem visto pelo governo, pois se propõe a retirar poderes da União; o segundo é apoiado pela presidente Dilma e pelos partidos aliados de forma genérica, mas não há consenso quanto à forma como será feita a reforma política.

Cargos. Ao avaliar a derrota, Chinaglia admitiu que deputados do bloco que o apoiavam não votaram nele. “Uma parte dos aliados não votou em mim. O fato de você constituir bloco não garante voto”.
O PT foi duplamente perdedor. Na tentativa de assegurar votos para Chinaglia, os petistas abriram mão de outros cargos titulares na Mesa Diretora, cedidos a aliados. A primeira vice-presidência ficou com o PP; a segunda, com o PR; a primeira secretaria foi para o PRB, enquanto a segunda coube ao PSD; a terceira foi destinada ao PSDB e a quarta secretaria ao PTB.

Além disso, o PT e o governo tentaram, sem sucesso, um acordo com Cunha para que na próxima eleição a presidência fosse entregue a um petista.

O governo trabalhou com um cenário de derrota durante todo o dia. Antes mesmo de saber o resultado da eleição, o Palácio do Planalto mandou ao candidato do PMDB recados segundo os quais pretende iniciar um diálogo com o peemedebista a partir desta segunda-feira.

Antes da votação, na tentativa de se descolar da pecha de governista, Arlindo Chinaglia tentou convencer os deputados de que apenas pelo fato de ser do PT não seria submisso no comando da Câmara. “Se alguém imagina uma Câmara subjugada, é um erro imenso. Os partidos não permitirão, as bancadas não permitirão, nós não permitiremos. Somos um entre 513, somos iguais em nossas diferenças”, disse ele na tribuna.

Em seu discurso no plenário, o candidato do PSB, Júlio Delgado (MG), atacou a hegemonia do PMDB, que já tem a vice-presidência da República e a presidência do Senado.

Planalto já busca 'pacto' com antigo desafeto

• Antes mesmo da vitória de Cunha, ministros agiam para reconstruir pontes com peemedebista

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Depois de sofrer a primeira derrota política do segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff iniciou um movimento para reconstruir pontes com o PMDB e a base aliada do governo no Congresso. Antes mesmo do resultado da eleição que levou à presidência da Câmara o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ministros do PT entraram em campo para propor um "pacto de governabilidade" ao antigo desafeto.

Dilma acompanhou a disputa do Palácio da Alvorada e almoçou com os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Jaques Wagner (Defesa), Pepe Vargas (Relações Institucionais) e Miguel Rossetto (Secretaria Geral da Presidência). A presidente deu carta branca para a aproximação com Cunha e o vice Michel Temer (PMDB) foi acionado para ajudar nesse movimento.

"Não acredito que Eduardo Cunha vá agir como inimigo. Durante o processo eleitoral, ele rompeu alguns cercadinhos que eu não rompi, mas ninguém pode sentar na cadeira de presidente da Câmara e virar oposição", afirmou o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), que perdeu a eleição para Cunha. O petista admitiu, porém, que a partir de agora o governo fica "no limite da instabilidade" na Câmara.

"Não se pode, depois da eleição, ser sangue para todo o lado. Vamos apostar no diálogo para garantir a governabilidade", emendou José Guimarães (PT-CE), um dos coordenadores da campanha de Chinaglia.

Pauta. A derrota do petista é preocupante para Dilma porque expôs a insatisfação dos deputados com o Planalto e com o PT, além de escancarar a fragilidade da articulação política com o Congresso.
No Senado, o governo comemorou a recondução de Renan Calheiros (PMDB) à presidência da Casa e acredita que, apesar de dividido, o PMDB ali não dará dor de cabeça porque é mais fácil a "repactuação".

O temor do Planalto e da cúpula do PT, agora, é com a inclusão de uma "pauta bomba" na Câmara, com projetos que aumentem as despesas do governo, em tempos de dificuldades na economia. Não é só: Cunha também já prometeu apoiar uma nova CPI sobre corrupção na Petrobrás.

Na avaliação do Planalto, a eleição de ontem foi marcada por um jogo de traições da base aliada, no rastro da Operação Lava Jato, que escancarou um esquema de corrupção na Petrobrás. Em conversa reservada, um ministro disse ao Estado que Cunha se comportará como "embaixador dos grandes interesses econômicos".

O governo, agora, vai usar as nomeações do segundo escalão para abrir o diálogo com o PMDB e outros partidos.

PT fica sem cadeira alguma na mesa da Câmara

- O Globo

Além da derrota para a presidência da Câmara, o PT acabou ficando sem nenhuma das 11 vagas da Mesa Diretora da Câmara. Para atrair aliados para o bloco de apoio a Arlindo Chinaglia (PT-SP), a legenda cedeu as três vagas a que teria direito ao PR, ao PSD e ao PROS. Por conta das traições, no entanto, o partido não terá aliados em nenhum desses espaços. Ao PSD, caberá a Segunda Secretaria.

Só que o deputado que irá preencher a vaga é Felipe Bornier (PSD-RJ), um dos coordenadores da campanha de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A vaga do PR também irá para um apoiador de Cunha, o deputado Giacobo (PR-PR), que concorreu como avulso e derrotou o que havia sido indicado pela legenda, Lúcio Vale (PR-PA). O PROS concorreu a uma suplência, mas foi derrotado por Ricardo Izar (PSD-SP), simpatizante de Júlio Delgado (PSB-MG):

- Vai ser duro, vamos ter que conviver com a nova realidade - disse o líder Vicentinho (PT-SP).

Em votação secreta, Renan Calheiros é eleito presidente do Senado pela 4ª vez

• Senador obteve 49 votos e venceu seu opositor na disputa mais acirrada pela presidência da Casa

Ricardo Brito, Anne Warth e Nivaldo Souza – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Em disputa mais acirrada que já enfrentou, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) foi reeleito presidente do Senado. Numa disputa inédita contra outro colega de partido, o peemedebista obteve 49 votos votos contra Luiz Henrique, que conquistou 31 - ainda teve um voto nulo. Esta é a quarta vez que Renan se elege para o cargo, igualando o recorde do seu antecessor, o ex-presidente e ex-senador José Sarney (PMDB-AP).

A eleição, em votação secreta, foi a mais acirrada que enfrentou desde que, em 2007, reelegeu-se pela primeira vez com 51 votos contra 28 do senador potiguar do DEM Agripino Maia. Na sua eleição passada, em 2013, com 56 votos a favor contra 18 para o ex-senador Pedro Taques (PDT-MT).
Renan Calheiros foi forçado a mudar de estratégia de campanha depois que Luiz Henrique lançou-se na terça-feira candidato em caráter "irreversível". A intenção dele era colocar seu nome apenas no domingo, horas antes da eleição. A bancada do PMDB reuniu-se na sexta-feira à tarde e, por 15 votos dos 19, indicou Renan.

O peemedebista não pretendia ficar na "vitrine" desde que o Estado revelou, no início de setembro, que ele foi um dos citados pelo ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa em sua delação premiada. Contou com o respaldo do Palácio do Planalto para essa operação, uma vez que foi um dos principais fiadores da presidente Dilma Rousseff no Congresso durante o primeiro mandato. Após o lançamento de Luiz Henrique, ministros começaram a trabalhar pela reeleição de Renan.

O presidente reeleito contou com o apoio declarado também do PT, que no sábado, 31, fechou questão em favor de Renan. Luiz Henrique teve o apoio de sete partidos: PSB, PDT, PSOL, PP, PPS, PSDB e DEM, além de independentes de outros partidos da base aliada.

Em discurso antes da eleição, o presidente reeleito justificou a estratégia de adiar, ao máximo, sua candidatura. "Tive durante o tempo todo cautela de não precipitar movimentos. Não seria respeitoso que os novos senadores não participassem ativamente desse processo eleitoral", afirmou.
Renan disse que irá cumprir com "absoluto rigor" a regra da independência dos poderes. Foi uma resposta a Luiz Henrique, que acusou Renan de se vergar a interesses do Executivo em troca de nomeações políticas.

O peemedebista defendeu também a mudança no financiamento de campanhas, "fonte de suspeitas". Segundo ele, porém, o ideal é que o Congresso avalie essa proposta e que a população opine sobre ela posteriormente, por meio de referendo, e não previamente, como a presidente Dilma Rousseff já defendeu, via plebiscito.

O senador disse ainda que o País não pode e não dará "marcha à ré" nos campos social, econômico e político e resgatou ainda o mote da campanha de Dilma Rousseff, afirmando que vai corrigir o que está errado e potencializar o que está certo.

Ao fim de seu discurso, Renan alfinetou Luiz Henrique e disse que não quer ser "regente" de nada. Luiz Henrique usou essa expressão para defendeu sua liderança à frente de reformas, caso seja eleito.

Aécio responsabiliza PT por vitória de Renan Calheiros no Senado

• Presidente do PSDB afirmou esperar que Renan se descole do Planalto e prometeu 'oposição revigorada'

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), responsabilizou a bancada do PT pela reeleição do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Na disputa mais acirrada por que passou para o cargo que assumirá pela quarta vez, Renan conquistou em votação secreta 49 apoios, o adversário do partido Luiz Henrique (SC), 31, e ainda teve um voto nulo.

"Quem votou fechado (em Renan Calheiros) foi o PT, mais do que o PMDB", afirmou Aécio, logo após o resultado.

No início da noite de sábado, 31, a bancada do PT decidiu apoiar, por unanimidade, a reeleição do peemedebista alagoano.

Aécio Neves disse esperar que Renan seja mais um presidente do Poder Legislativo do que um aliado do Palácio do Planalto. Durante o ano passado, especialmente nas eleições, o ex-presidenciável tucano chegou a acusar o presidente reeleito do Senado de atuar a serviço do governo Dilma Rousseff.

Aécio afirmou que o resultado da votação indica que houve "muita insatisfação" na base aliada. E avisou ainda que haverá uma oposição "revigorada" após o resultado das urnas.

DEM. O novo líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), também criticou a ação do PT na eleição de Renan. "O PT optou por transformar o senado como braço do Planalto", disse.

Após a derrota, Luiz Henrique volta a criticar gestão de colega

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Derrotado na disputa à presidência do Senado Federal, o senador Luiz Henrique (PMDB-SC) criticou a atuação do senador reeleito Renan Calheiros (PMDB-AL) em relação ao governo federal.

Segundo ele, o presidente reeleito deve ter uma posição de altivez em relação à presidente Dilma Rousseff (PT).

"O presidente do Congresso Nacional tem de ter relação altiva com o presidente da República. Agora, quando ele indica ministros e diretores de estatais, perde essa autoridade", disse.

Luiz Henrique deixou o plenário antes mesmo do discurso de Renan Calheiros em agradecimento pela vitória.

Oposição quer auditar Minha Casa Minha Vida

• Deputados de PSDB e DEM recorrerão ao TCU; petistas defendem o programa

- O Globo

BRASÍLIA- Parlamentares da oposição criticaram os atrasos do Programa Minha Casa Minha Vida, vitrine do governo Dilma Rousseff, e disseram ontem que pedirão esclarecimentos ao Poder Executivo, além de uma auditoria especial do Tribunal de Contas da União (TCU). Reportagem publicada ontem pelo GLOBO mostrou que, segundo a Controladoria-Geral da União (CGU), 1,3 milhão de unidades foram contratadas entre 2012 e abril de 2014, e, até dezembro 83% delas não tinham sido iniciadas.

O relatório citou "risco patrimonial grave para a União", como a liberação antecipada de dinheiro pelo Ministério das Cidades a agentes escolhidos pelas prefeituras para gerenciar os projetos habitacionais. Os repasses são feitos em volumes até 25 vezes maiores do que o capital e o patrimônio líquido do agente intermediário - "sem qualquer forma de garantia". Procurado ontem, o Ministério das Cidades não respondeu.

O deputado federal Antonio Imbassahy (PSDB-BA) disse que pedirá ao Ministério Público Federal que investigue o programa e que o TCU faça auditoria especial:

- No conjunto, esse é um programa que deve ser aplaudido, mas há essas deficiências na execução.

O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) afirmou que já pediu informação sobre as contas do Minha Casa Minha Vida, mas que nunca recebeu "uma resposta clara". O deputado Mendonça Filho (DEM-PE) lembrou que, em 2014, o programa estava na campanha pela reeleição de Dilma e que o governo fez mais propaganda dele do que casas.

Já o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), afirmou que há um acompanhamento fino do Programa de Aceleração do Crescimento e do Minha Casa Minha Vida, e defendeu as iniciativas, dizendo que elas têm "resultados muito bons". O senador Paulo Rocha (PT-PA) descartou que haja uso de dados errados sobre o programa nas propagandas do governo.

Economia e corrupção pautarão Congresso

• Mudanças em benefícios e políticos implicados na Lava Jato são alguns dos temas do ano

- Márcio Falcão, Ranier Bragon e Gabriela Guerreiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA -Num cenário que promete turbulências econômicas, o novo Congresso terá que votar projetos com impacto direto no cotidiano da sociedade e ainda se dedicar à saúde financeira de Estados, municípios e do governo federal.

O governo vem adotando uma série de cortes de gastos e outras medidas de impacto na economia que dependerão de aval dos congressistas.

A agenda econômica tem temas espinhosos como as mudanças na concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários e a política de valorização do salário mínimo.

Faz parte a prorrogação de um mecanismo que permite à União gastar livremente 20% das receitas de contribuições sociais (exceto previdenciárias), a DRU (Desvinculação das Receitas da União).

Estados e municípios ainda pressionam senadores para a análise de projetos que acabam com a guerra fiscal entre entes federativos.

As movimentações ocorrerão em meio às expectativas dos desdobramentos da Operação Lava Jato, que apura os desvios na Petrobras. Em breve, a Justiça deve revelar os políticos envolvidos.

Há ainda a ameaça da oposição e de parte da base governista de emplacar uma nova CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Petrobras, o que ampliaria o desgaste da estatal e do governo.

A equipe de Dilma prefere restringir as investigações à Justiça para barrar um novo palco para a oposição.

Os congressistas também prometem votar reforma no sistema eleitoral, bandeira de Dilma no segundo mandato.

Na pauta social estão regras que mudam a relação patrões/empregados domésticos. Já apreciado no Senado, texto que torna a corrupção crime hediondo, resposta aos protestos de 2013, precisa de definição dos deputados.

Em meio a novos protestos em capitais por causa do aumento de tarifa, o passe livre no transporte público deve ser discutido. A medida ganhou força em 2013, mas depois da desmobilização social, acabou na gaveta.

O Planalto quer aliviar as empreiteiras...

• ...mas com os procuradores da República no Paraná não há acordo. Os próximos alvos são gigantes como Odebrecht e Andrade Gutierrez

Flávia Tavares e Murilo Ramos - Època

Havia quase um mês que a presidente Dilma Rousseff não falava publicamente. Ela escapuliu como pôde das cobranças sobre os rumos da economia do país, as mudanças nas regras trabalhistas, apagões, estiagem e outros colapsos do início de seu segundo mandato. Na terça-feira, dia 27, Dilma reuniu seus 39 ministros para um reunião - e finalmente falou. Mas disse coisas preocupantes. Para a presidente, as empreiteiras acusadas de corrupção no petrolão não devem ser punidas pela Justiça. Somente as pessoas. É precisamente o contrário do que a Lei Anticorrupção, enviada por ela ao Congresso e aprovada pelos parlamentares, exige: punição severa às empresas que desviem dinheiro público.

Em discurso, Dilma mostrou preocupação com o futuro da Petrobras, principal empresa de uma cadeia produtiva que responde por 13% do PIB brasileiro. "Temos de apurar com rigor tudo de errado que foi feito. Temos de aprimorar mecanismos para que coisas como essas não voltem a acontecer. Temos de saber apurar e investigar", disse a presidente. Em seguida, ela capitulou: "Nós temos de saber fazer isso sem prejudicar a economia e as empresas.

Queria dizer que punir, ser capaz de combater a corrupção, não quer dizer destruir as empresas. As pessoas têm de ser punidas, e não as empresas" (leia o editorial na página 9). Em três frases, a palavra "empresas" apareceu três vezes. Podia ser falha retórica. Mas não. Era um recado claro.

O Ministério Público Federal discorda da presidente. Os procuradores que atuam na Lava Jato querem, sim, alcançar as pessoas, no caso os políticos enlameados no escândalo, mas também as empreiteiras. A estratégia para ter sucesso na missão é a divisão de tarefas. Os procuradores do Paraná miram as empreiteiras; o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, os políticos. Nesta semana, com a volta das atividades do Supremo Tribunal Federal, Janot vai pedir que voltem à Justiça paranaense os casos de políticos que perderam mandato nas últimas eleições e, assim, o foro privilegiado. Além disso, Janot vai mandar a Curitiba integrantes da força-tarefa que ele próprio montou, formada por procuradores da República e promotores de Justiça do Distrito Federal. O objetivo é estreitar a relação com os membros de uma outra força-tarefa, criada em abril do ano passado por nove procuradores da República lotados no Paraná.

O MPF partiu para o contra-ataque. Criou um site repleto de documentos e dados sobre a Lava Jato - não faltam provas sobre o caso. Incluiu um espaço para que internautas façam denúncias. Aproveitou para divulgar resultados do trabalho até agora: foram recuperados R$ 500 milhões em dinheiro desviado da Petrobras. O site sobre a força-tarefa do MPF entrou no ar na quarta-feira, logo após Dilma ter conclamado seus ministros a "travar a batalha da comunicação".

Numa entrevista concedida ao jornal O Globo, o procurador da República no Paraná, Deltan Dallagnol, refutou que as empreiteiras envolvidas no escândalo sejam meras vítimas de servidores da Petrobras. Para ele, as empreiteiras são as protagonistas do esquema de corrupção instalado na estatal há anos. "Se as empresas se organizaram em cartéis para fraudar licitações e aumentar ilegalmente suas margens de lucro, não íaz sentido alegar que foram vítimas de achaques por seus cúmplices", disse Dallagnol. Quando o procurador acrescenta que os desvios, somente na Diretoria de Abastecimento, aquela que era comandada por Paulo Roberto Costa, podem ultrapassar os R$ 5 bilhões, fica ainda mais difícil imaginar que a Justiça deva aliviar as punições para as empreiteiras.

As empresas que até agora não foram denunciadas deverão ganhar atenção especial dos investigadores nos próximos capítulos da investigação. Entre elas está a Odebrecht, que mereceu um inquérito exclusivo. O principal objeto da apuração é um contrato de R$ 3,1 bilhões assinado em dezembro de 2009 com a Petrobras para a construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Em outubro do ano passado, ÉPOCA revelou uma suspeita de superfaturamento na obra, num percentual de 18% a 20%. Ali, segundo as evidências colhidas pelo MPF e uma investigação independente de ÉPOCA» foram embutidas as propinas embolsadas por Paulo Roberto Costa e o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque»- além da "colaboração" financeira com as campanhas dos partidos que comandavam o aparelhamento político na Petrobras. Em um dos depoimentos da delação premiada, Costa afirmou ter sido orientado por um diretor da Odebrecht, Rogério Santos de Araújo, a abrir uma conta na Suíça para receber US$ 23 milhões em propina paga pela empreiteira entre os anos de 2008 e 2009. Costa disse que, após receber as propinas, costumava redistribuí-las para outras contas. "A Odebrecht nega veementemente as alegações caluniosas feitas pelo réu confesso e ex-diretor da Petrobras. Nega em especial ter feito qualquer pagamento ou depósito em suposta couta de qualquer executivo ou ex-executivo da estatal", diz a empreiteira, em nota.

A Andrade Gutierrez também é objeto de uma investigação específica. Em um de seus depoimentos, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa afirmou ter recebido entre US$ 2 milhões e US$ 2,5 milhões da construtora. Costa afirmou que o dinheiro foi movimentado em contas de um banco em Lichtenstein. Os pagamentos foram intermediados pelo lobista Fernando Baiano, operador do PMDB preso pela PF. Em seu depoimento, Costa se queixou da Andrade Gutierrez. Disse que a empresa não costumava cumprir acordos. "Mesmo após ganhar algum contrato, a empresa custava a depositar o valor devido ao PP (Partido Progressista)", disse. O PP era um dos três partidos que controlavam politicamente a Diretoria de Abastecimento da Petrobras, em conjunto com o PT e o PMDB. Em nota, a Andrade Gutierrez afirmou categoricamente que "nunca, em momento algum, fez qualquer tipo de repasse de valores para o senhor Paulo Roberto Costa ou para qualquer pessoa".

No mesmo depoimento, Costa acusou outra empresa: a Estre Ambiental. Por meio de Baiano, Costa disse ter se aproximado do então proprietário da empresa, Wilson Quintela Filho. Ainda de acordo com Costa, Quintela pagou R$ 1,4 milhão em propina para que a Estre pudesse participar de uma licitação de uma subsidiária da Petrobras. Costa disse ter recebido o dinheiro das mãos de Baiano. Afirmou, ainda, que parte do dinheiro foi entregue por Baiano depois de ele ter deixado a Diretoria de Abastecimento da Petrobras, em abril de 2012. A Estre Ambiental afirmou que "desconhece as razões da menção e estranha a inclusão de seu nome no referido depoimento".

O mundo mágico de Dilma

• Depois de 26 dias em silêncio, presidente faz malabarismos retóricos para camuflar as contradições entre as medidas adotadas nesse segundo mandato e o discurso de campanha e apresenta à população um Brasil da fantasia

- IstoÉ

Passados 26 dias da posse, a presidente Dilma Rousseff interrompeu o silêncio na terça-feira 27. No discurso de 35 minutos proferido durante a abertura da primeira reunião ministerial do segundo mandato, na Granja do Torto, em Brasília, Dilma tentou construir a imagem de um Brasil próspero e cujos problemas são causados por fatores que, para ela, não guardam relação com os erros do seu governo. Mais uma vez, Dilma acabou mostrando um preocupante distanciamento da realidade – como se ela ainda estivesse encastelada no mundo mágico da campanha eleitoral, quando exibiu um país das maravilhas.

A expectativa era a de encontrar uma Dilma mais pragmática, munida de argumentos técnicos capazes de tranquilizar uma população que assiste insegura à guinada empreendida pelo Planalto nos primeiros dias de governo, sobretudo na política macroeconômica, que implica cortes drásticos, inclusive nos gastos sociais. Mas, em vez de explicar os ajustes promovidos pela equipe econômica, entre os quais o aumento dos impostos, as decisões impopulares para tentar conter a inflação, a presidente manteve a toada da campanha ao apresentar um Brasil "de continuidade e mudanças" e atribuir o desequilíbrio nas contas do primeiro mandato ao efeito do que chamou de "dois choques": queda no preço das commodities e alta dos alimentos, devido à seca. Ou seja, no País desenhado pela presidente, os problemas são poucos e decorrentes do cenário internacional. Dilma também fez uma ginástica verbal para negar o fosso profundo existente entre o governo que se inicia e o discurso da campanha. "Nós devemos enfrentar o desconhecimento, a desinformação sempre, permanentemente", disse a presidente. "Vamos mostrar a cada cidadão que não alteramos um só milímetro o nosso compromisso com o projeto vencedor na eleição", discursou.

A despeito de ter finalmente reconhecido a necessidade da retomada da credibilidade da economia nacional, a indisfarçável irritação de Dilma com um funcionário que operava o monitor no qual lia o discurso deixou claro que as informações repassadas ali não lhe causavam qualquer conforto. "Podia passar mais rápido, por favor? ..."Bom, eu vou preferir ler, sabe?" Enquanto seguia à leitura do texto, a presidente dava declarações surpreendentes pela falta de senso crítico e versão distorcida apresentada, como quando garantiu ter combatido a inflação e jurou não ter mexido nos direitos trabalhistas, apesar da mudança já anunciada nas regras do seguro-desemprego. Sobre o escândalo da Petrobras, disse que a empresa "já vinha passando por um rigoroso processo de aprimoramento de gestão". E completou: "Nunca um governo combateu com tamanha firmeza e obstinação a corrupção e a impunidade". A realidade, no entanto, é cruel para a maior empresa do País. Um dia depois do discurso da presidente, a Petrobras contabilizou internamente que as perdas com corrupção, ineficiência, câmbio e petróleo causaram uma sobreavaliação de ativos de mais de R$ 88 bilhões na empresa. O valor equivale a 15% do patrimônio da estatal.

A presidente também tentou vender uma versão rósea da realidade ao justificar o tarifaço, que vai aumentar o preço da gasolina, da energia e de impostos. Afirmou tratar-se de medidas de caráter "corretivo", uma vez que, segundo ela, teve de segurar preços para proteger a população. Na verdade, seu discurso é uma tentativa de justificar as contas no vermelho acumuladas em seu primeiro mandato. O governo Dilma fechou 2014 com um rombo bilionário no caixa do Tesouro Nacional, com as despesas do governo com pessoal, programas sociais, despesas administrativas e investimentos superando as receitas de 2014 em R$ 17,2 bilhões. A proximidade da eleição subiu os gastos e a maior parte das despesas foi para manter a estrutura do próprio governo. No mundo de Dilma, seu governo controlou a inflação, adotou medidas para favorecer os negócios e o fez reduzindo a pobreza e garantindo empregos. Embora os fatos e os números a desmintam, ela pediu aos ministros para combater os boatos contrários. Para ela, os problemas residem nas notícias desfavoráveis e uma guerra de comunicação poderia abafar as falsas críticas à realidade do País. "Não podemos permitir que a falsa versão se crie e se alastre. Reajam aos boatos, travem a batalha da comunicação, levem a posição do governo à opinião pública", conclamou. Terminado o encontro ministerial, ficou mesmo a certeza de que sorrisos e clima ameno ficaram restritos à foto oficial da reunião. O mundo mágico descrito por Dilma parece que não consegue convencer nem mesmo sua própria equipe.

Economistas preveem inflação acima de 7% em 2015

• Mediana das projeções do boletim Focus indica IPCA em 7,01% no fim do ano. Estimativa para o PIB cai a quase zero

- O Globo

RIO - Economistas do mercado financeiro elevaram mais uma vez as projeções para a inflação neste ano. Segundo o boletim Focus divulgado nesta segunda-feira pelo Banco Central, agora a previsão é que o IPCA, índice oficial que mede a alta de preços no país, feche o ano em 7,01%, na quinta elevação seguida da previsão. É a primeira vez que a projeção para o indicador supera o patamar dos 7%, desde que começaram a ser calculadas estimativas para 2015.

Parte da pressão sobre os preços virá dos chamados preços administrados, como tarifas de energia e combustíveis. A expectativa para o "tarifaço" fez a mediana de projeções para essa categoria de preços subiur pela oitava vez seguida, de 8,7% para 9%.

A revisão do cálculo ocorre dias após o Banco Central prever, na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que o reajuste nas contas de luz pode chegar a 27,5% neste ano, em meio à crise vivida pelo setor elétrico. A alta dos preços de gasolina e diesel — em decorrência do aumento de impostos que começou a valer neste domingo — também deve pesar sobre o bolso do consumidor. Levantamento do GLOBO mostrou que o reajuste em postos de combustíveis no Rio já chega a mais de 8%.

Entre o chamado "top 5", grupo de analistas que mais acertam as projeções, o cenário é um pouco mais otimista, com inflação a 6,86% no fim de 2015. Ainda assim, a taxa ficaria acima do limite da meta estabelecida pelo Banco Central, de 4,5%, com 2 pontos percentuais de tolerância. Pelas contas da autoridade monetária, o alvo só será alcançado no fim de 2016, de acordo com a ata divulgada semana passada.

PIB em quase zero
Além da inflação elevada, os economistas preveem que a atividade econômica ficará praticamente estagnada neste ano. A mediana das projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) caiu de 0,13% para apenas 0,03% — na quinta revisão para baixo consecutiva. A previsão para o ano que vem também foi cortada, de 1,54% para 1,5% — segunda redução seguida.

Em relação aos juros, o mercado continua a ver a taxa básica Selic em 12,5% no fim do ano. Isso significa que os analistas esperam mais uma elevação de 0,25 ponto percentual nos juros — e, por enquanto, acreditam que o Banco Central interromperá o ciclo de altas por aí. Para 2016, a expectativa é de um ligeiro alívio, com os juros básicos caindo a 11,5% até o fim do ano que vem.

Ricardo Noblat - Gosto amargo da derrota

- O Globo

"Nem oposição nem situação. Serei independente" Deputado Eduardo Cunha, PMDB-RJ, novo presidente da Câmara

O governo da presidente Dilma Rousseff amanheceu ontem sem dispor de uma resposta satisfatória para a indagação que corria de boca em boca entre ministros de Estado e líderes do PT desde o início da semana passada: o que seria pior? Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se eleger presidente da Câmara dos Deputados para um mandato de dois anos? Ou ser derrotado e permanecer como líder do seu partido na Câmara?

AGORA, o que mais apavorava o governo: é a atribuição do presidente da Câmara de receber ou ignorar pedidos de impeachment do presidente da República. Dilma detesta Eduardo. Sempre o tratou mal. Considera Eduardo um dos deputados mais fisiológicos da Câmara. Não o perdoa por ter contribuído para derrotas do governo em votações importantes. E não quis pagar preço algum para tentar convertê-lo em aliado.

SE TIVESSE ouvido Lula, ela teria procedido de outra forma. Ou teria feito um acordo com Eduardo ou se mantido distante da eleição na Câmara. Mas, não. Dilma mobilizou a máquina do governo para derrotá-lo. E acabou conferindo-lhe o rótulo de candidato da oposição — embora a oposição propriamente dita apoiasse a candidatura a presidente do deputado Júlio Delgado (PSB-MG). Dilma imaginou eleger um candidato do PT — e perdeu.

AO CAIR da noite de ontem, só havia uma dúvida : contra Arlindo Chinaglia (SP), candidato do PT a presidente, o PSDB de Aécio Neves ajudaria a eleger Eduardo logo no primeiro ou no segundo turno? A oposição dava como certa a derrota de Júlio . E estava disposta a votar em Eduardo para vencer o PT e o governo. Foi o que fez. No Senado, tentara impedir a reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) para presidente. Em vão.

DILMA NÃO precisava ter colhido na Câmara uma derrota tão amarga no início de seu segundo governo, enquanto o escândalo da Petrobras só faz esquentar . Donos e executivos de empreiteiras presos em Curitiba cansaram de esperar um sinal dela ou de Lula de que há vontade de socorrê-los. Não querem mofar na cadeia, destino reservado ao ex-publicitário mineiro Marcos Valério, um dos cérebros do mensalão.

DE FATO, eles só têm uma saída: em troca de penas menores, contar tudo o que sabem sobre o esquema de desvio de dinheiro da Petrobras para financiar a base de sustentação do governo no Congresso e abastecer o caixa 2 dos partidos. O caso deverá chegar em Lula. E em Dilma. Foi Lula quem nomeou o delator Paulo Roberto Costa para diretor da Petrobras. Ali, ele pintou o diabo. Dilma conviveu amistosamente com Paulo Roberto durante anos a fio.

POR ORA, não convidem Lula e Dilma para a mesma mesa. Lula está certo de que Dilma nada faz para salvá-lo, além de não levar em conta seus conselhos. De sua parte, Dilma não se conforma em ter herdado dele a enrascada da Petrobras. Mantém Graça Foster na presidência da empresa para que ela siga limpando a cena do crime e apanhando no seu lugar.

PARA AFLIÇÃO de Dilma e Lula, é no meio desse imbróglio que se encaixará o novo e poderoso presidente da Câmara dos Deputados. Bom dia, Eduardo.

Dora Kramer - Derrota anunciada

- O Estado de S. Paulo

O desfecho de derrota anunciada para o governo na disputa pela presidência da Câmara poderia ter sido outro se os estrategistas do Palácio do Planalto tivessem dado ouvidos ao ex-presidente Luiz Inácio da Silva, desde o início favorável à construção de um acordo entre o PT e o PMDB.
Na última semana o governo ainda tentou "criar um clima" de virada disseminando a versão de que a pressão sobre os deputados em favor do petista Arlindo Chinaglia produziria resultados de última hora.

A ficha da realidade, porém, caiu na sexta-feira à noite quando já era tarde demais e uma oferta de acordo - feita por escrito, com a letra do ministro das Relações Institucionais, Pepe Vargas - acabou consolidando a confiança de Eduardo Cunha e companhia na vitória. Ao ponto de ser recusada uma tentativa de "embaixada" feita por Lula por intermédio do prefeito do Rio, Eduardo Paes.

Naquela altura as contas, feitas e refeitas, já lhes eram favoráveis o suficiente para não haver espaço nem razão para um recuo. Cunha estava praticamente com a presidência da Câmara nas mãos, o que o governo teria a oferecer?

Em um papel levado pelo deputado Sandro Mabel (desde ontem sem mandato) ao gabinete da liderança do partido onde estavam reunidos os pemedebistas, Pepe Vargas propunha de início o seguinte: os dois candidatos e as respectivas bancadas partidárias fariam uma reunião e anunciariam que o melhor para ambos os parceiros de governo seria um esforço de unidade. A paz (teatral) estaria, assim, sacramentada.

A sugestão incluía mais dois itens de pressupostos para o acerto. Um deles, a retirada de partidos de oposição do bloco de apoio a Eduardo Cunha; outro, o compromisso de rodízio de ocupação da presidência da Casa, tal qual havia sido feito quando da escolha de Arlindo Chinaglia em 2007 e sua substituição por Michel Temer (PMDB) em 2009 e depois uma nova rodada com o petista Marco Maia e o pemedebista Henrique Eduardo Alves.

Recebida a proposta, Cunha trancou-se no "confessionário" - um minúsculo espaço no gabinete reservado para conversas a portas fechadíssimas - com gente de confiança e concluiu: a oferta era um sinal evidente de fragilização do outro lado. Poderiam, portanto, ficar tranquilos. O adversário havia "piscado", reconhecendo a impossibilidade de vitória no enfrentamento.

Eduardo Cunha, então, disse a Mabel que não teria como aceitar. Não iria romper compromissos assumidos anteriormente com partidos de oposição ( DEM e Solidariedade), tampouco teria como assegurar o compromisso de rodízio lá na frente.

As circunstâncias são outras. Eleito agora com votos de boa parte da base aliada revoltada com o PT, não haveria garantia hoje de que esses mesmos partidos estivessem dispostos a apoiar um candidato petista em 2016. Acordo recusado, dali a pouco telefona para Eduardo Cunha o prefeito do Rio falando em nome de Lula para sondar se não havia ainda alguma possibilidade.

Com todo apreço que o público ali reunido dedica aos meios e modos de Lula fazer política (em contraponto à presidente Dilma), as condições da disputa estavam dadas, não havia como mudá-las, assunto encerrado.

Depois disso o governo ainda se enrolou todo ao tentar negar o inegável, alegando que a proposta de acordo partiu do PMDB. Pois é, para quê se a vantagem estava com o partido?

Fica do processo como um todo, e desse episódio em particular, a evidência de que não é só a condução da economia que precisava de correção.

A pilotagem da política carece de mãos calejadas, cabeças organizadas, sangue frio e pés no chão. Tipo do ofício em que vocação é posto.

Valdo Cruz - Solta o bicho, Dilma

- Folha de S. Paulo

Lá se foi apenas um mês de 2015 e a sensação é de que já estamos nos arrastando de tanto peso nas costas. Tarifaço, inflação em alta, contas públicas no vermelho, juros subindo, desemprego aumentando, crises hídrica e elétrica e um cheiro danado de recessão no ar.

Um começo de ano deprimente, uma volta rápida e cruel à realidade depois da fantasia eleitoral. Em troca, somos apenas convidados a suportar o remédio amargo do ajuste na política econômica para fazer a dura travessia do deserto.

Necessário, mas necessitamos de mais. Não dá para ficar somente sob a égide da equipe econômica, que aumenta imposto daqui, corta gastos dali, sobe juros ali e faz seu trabalho, essencial, para resgatar a confiança perdida no governo.

Falta um pouco de esperança, de um animador de auditório, que prepare o terreno e crie condições para o país deslanchar enquanto Joaquim Levy, Nelson Barbosa e Alexandre Tombini fazem o trabalho pesado.

Algo que sobrou no governo Lula, personificado pelo próprio ex-presidente petista, e que falta na era Dilma, que adormeceu, em vez de despertar, o espírito animal do empresariado --a coragem e a ousadia de investir e buscar novas oportunidades.

A crise atual talvez seja uma oportunidade única para forçar o governo Dilma a despertar, de vez, para a agenda do investimento, acabando com amarras e tabus que só emperram obras e projetos públicos e privados. Para sua própria sobrevivência.

A presidente até tentou no primeiro mandato. Obteve algum sucesso, é justo reconhecer, mas jamais na dimensão necessária para tirar o país do atoleiro. Seu estilo intervencionista e controlador falou mais alto e não gerou a confiança necessária no empresariado para investir forte.

Como diz um empresário, o governo Dilma vive falando em despertar o espírito animal do empresariado, mas o trata sob rédeas curtas. Solta o bicho, presidente Dilma.

P.S.: Saio em férias, até março.

Luiz Carlos Azedo - Uma derrota anunciada

• A presidente Dilma Rousseff saiu enfraquecida da eleição no Senado e foi derrotada de forma acachapante na Câmara. Em ambos os casos, o dispositivo parlamentar deixou a desejar

- Correio Braziliense

As disputas pelo comando da Câmara e do Senado consolidaram a hegemonia do PMDB no Congresso e revelaram as contradições, as fragilidades e as vacilações do Palácio do Planalto na condução das articulações políticas.

No Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) foi reeleito para o comando da Casa por 49 votos a favor, contra 31 e um nulo, graças aos votos da bancada do PT, que chegou a ameaçar uma debandada em favor da candidatura de Luiz Henrique (PMDB-SC).

Na Câmara, com maciço apoio da base governista, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) confirmou o favoritismo já no primeiro turno, com 267 votos, contra 136 de Arlindo Chinaglia (PT-SP), 100 de Julio Delgado (PSB-MG), 8 de Chico Alencar (PSol). Houve dois votos em branco.

A presidente Dilma Rousseff saiu enfraquecida da eleição no Senado e foi derrotada de forma acachapante na Câmara. Em ambos os casos, o dispositivo parlamentar deixou a desejar. No Senado, a vitória de Calheiros se deve mais à movimentação de bastidor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva do que às articulações do Palácio do Planalto, que flertou com a candidatura de Luiz Henrique.

Somente no três últimos dias, os ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e da Articulação Política, Pepe Vargas, entraram em campo para enquadrar os petistas simpáticos ao candidato dissidente do PMDB. Dilma, agora, terá de negociar a indicação do líder do governo no Senado com Calheiros. A intenção era escolher alguém não ligado ao presidente do Senado.

Já na Câmara, a atuação do Palácio do Planalto foi um desastre completo. Desde o começo, pois lançou a candidatura de Arlindo Chinaglia (PT-SP) há dois meses, enquanto a do líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), estava posta há dois anos.

Na véspera da disputa, o governo propôs a retirada da candidatura de Chinaglia em troca do restabelecimento do revezamento entre PT e PMDB no comando da Casa a cada dois anos. Já era tarde. O racha na base do governo havia isolado o PT.

A diferença de apenas 29 votos de Chinaglia, o candidato oficial, para os dois candidatos de oposição, Delgado e Alencar, mostra como é frágil o dispositivo parlamentar do governo na Câmara. Dilma terá de comer pela mão de Eduardo Cunha, seu desafeto de estimação no Congresso.

Dilma perdeu capacidade de iniciativa política, pois todos os projetos do governo começam a tramitar pela Câmara, e corre sério risco de que os desdobramentos da Operação Lava-Jato, que investiga a corrupção na Petrobras, revelem envolvimento de sua campanha com o esquema.

Ajuste fiscal
O resultado dessas trapalhadas aponta para uma legislatura cheia de dificuldades para o governo. No curto prazo, a agenda do Palácio do Planalto é ditada por medidas provisórias do ajuste fiscal executado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que demandam aprovação do Congresso.

O pacote de Levy restringiu o acesso a auxílio-doença, pensões, seguros desemprego e defeso, e abono salarial. Segundo o governo, o objetivo é economizar R$ 18 bilhões em 2015. A bancada trabalhista no Congresso luta contra as mudanças, principalmente o deputado Paulinho da Força, presidente do Solidariedade, cuja bancada apoiou a candidatura de Cunha.

O secretário-geral da Presidência, ministro Miguel Rossetto, abriu diálogo com as centrais sindicais, de forma a aperfeiçoar as propostas, mas isso não resolve o problema, porque a Força Sindical é ligada ao Solidariedade e a CUT não suporta as pressões da própria base quando não consegue unir todas as centrais sindicais.

Outra matéria polêmica é o veto da presidente Dilma Rousseff à correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, também determinada por medida provisória. Nos cálculos da Fazenda, a medida geraria uma renúncia fiscal da ordem de R$ 7 bilhões.

O governo defende um reajuste menor, de 4,5%, mas corre o risco de sofrer uma derrota. O senador Romero Jucá (PMDB-RR), relator do Orçamento de 2015, já disse que o Congresso pode derrubar o veto. Ele foi indicado para líder do governo por Calheiros, mas o nome foi vetado por Dilma Rousseff.

Mais complexa é a negociação em relação aos aumentos de tributos. São reajustes nas alíquotas de PIS, Cofins, IPI, IOF, além do retorno da Cide-Combustíveis. O governo quer obter mais de R$ 20 bilhões de arrecadação, sendo que R$ 694 milhões viriam do reajuste de 2,5 pontos percentuais na alíquota de PIS/Cofins sobre a importação.

Essa é a praia de Eduardo Cunha, que se destacou como parlamentar pela capacidade de articular emendas parlamentares aos projetos do governo de natureza tributária e fiscal.

José Roberto de Toledo - Prever o imprevisível

- O Estado de S. Paulo

A eleição do novo presidente da Câmara dos Deputados virou manchete porque prenuncia um cenário de crise política para Dilma Rousseff (PT). Dizem os entendidos de Brasília que o sonho da oposição - o pedido de impeachment da presidente - teria atalhos sob a direção de Eduardo "Deus mostrou o caminho correto" Cunha (PMDB). Mas não se cassa um presidente sem pressão popular. E essa estrada passa longe de Brasília.

Para continuar sonhando, a oposição precisa das condições socioeconômicas certas (ou erradas, dependendo do ponto de vista). Só assim teria chance de mobilizar a opinião pública. Inflação, desemprego e desabastecimento costumam ser o tripé que eleva os ânimos perto do ponto de ebulição. Na verdade, não são esses indicadores em si, mas a percepção do público sobre eles.

A "inflação do tomate", de abril de 2013, era uma alta sazonal dos preços dos alimentos, mas, graças às redes sociais digitais, ganhou ares de explosão inflacionária - mesmo que não fosse de fato. Se comunicação não é o que um diz mas o que o outro entende, a opinião pública não se molda apenas pelos fatos mas pela versão predominante dos fatos. É a guerra das expectativas.

E Dilma começou 2015 perdendo a primeira batalha dessa guerra. Sem que nenhuma pesquisa de avaliação de governo digna de nota tenha sido divulgada desde a posse da presidente, o indicador mais relevante sobre sua popularidade é a confiança do consumidor medida pelo INEC - uma série mensal de pesquisas do Ibope/CNI. Nenhum outro indicador tem correlação estatística mais forte com a popularidade presidencial, seja quem for o presidente. Soube-se, na sexta, que o INEC caiu 4,6% em janeiro.

Entre outros motivos, porque o pessimismo em relação à inflação aumentou 10%. Hoje, nada menos do que 85% dos brasileiros acham que os preços vão aumentar (45%) ou aumentar muito (40%) nos próximos seis meses. Também dois em cada três apostam no crescimento do desemprego (mais 6,1% em relação dezembro).

A confiança do consumidor só não está pior porque mais gente acha que sua renda pessoal vai aumentar do que diminuir - embora esse otimismo já tenha sido bem maior no passado. No fim das contas, o INEC caiu ao seu menor patamar em dez anos. Desde junho de 2004 ele não chegava ao número de 104, como agora.

É muito provável que o crescimento do pessimismo do consumidor se converta em criticismo do cidadão em relação a Dilma. As próximas pesquisas de avaliação do governo vão confirmar ou não essa hipótese. E, se confirmarem, é o que basta para a oposição voltar às ruas e tentar emplacar seus slogans?

É necessário, mas insuficiente.

As tentativas de mobilizar parte expressiva da sociedade contra o que quer que seja fracassaram nos últimos meses. Do "Fora Dilma" ao "Contra a tarifa", nenhuma manifestação reuniu mais do que a meia dúzia de sempre. Muitas vezes o número de policiais superou o de manifestantes. Em termos de empolgação, foram tão animadas quanto os blocos pré-carnavalescos paulistanos.

Isso não quer dizer que o quadro não possa mudar. Em maio de 2013, quase ninguém imaginava o vulto que os protestos populares alcançariam no mês seguinte. Quase ninguém porque cientistas de uma universidade dos EUA dizem ter previsto esses e outros distúrbios ocorridos na América Latina desde 2012.

Reunidos em torno de um programa batizado "Embers" (Early Model Based Event Recognition using Surrogates), eles monitoram uma pletora de dados eletrônicos, com ênfase nas redes sociais e, a partir de modelos matemáticos, elaboram "alertas" sobre a chance de um protesto virtual se tornar real. Fazem isso com 10 países latino-americanos, e sua maior taxa de acerto é com os alertas brasileiros. Para quem gosta de teoria da conspiração, o programa é financiado pelo governo norte-americano.

Vinicius Mota- Menos Petrobras

- Folha de S. Paulo

A crise da Petrobras é tão violenta e multifacetada que fica difícil enxergar a ponta do fio capaz de resgatá-la do enrosco. Corrupção, colapso administrativo, ineficiência e incompetência se misturam e se reforçam. Deixam ruínas bilionárias pelo caminho e engolfam a estatal em descrédito e zombaria.

A catarse na empresa ajuda a tirar o foco das decisões que, no âmbito do Executivo e do Legislativo, foram responsáveis pela gênese do monstro. Trata-se do projeto de erigir no Brasil um Estado paralelo, organizador de interesses políticos e empresarias, chamado Petrobras.

Os artífices desse programa anularam o vetor que desde os anos 1990 mitigava a vocação monopolista da empresa. Impuseram-na como operadora dos campos do pré-sal. Obrigaram-na a adquirir no Brasil toda sorte de equipamentos e insumos de exploração. Determinaram uma expansão de gastos e investimentos de dar inveja a faraós do passado e xeques do presente.

Não se impute apenas ao PT de Lula e Dilma a responsabilidade pelo portento. A massa de partidos indistintos que provê maioria no Congresso sempre esteve à procura de um manancial de cargos, verbas e contratos dessas proporções. Um conjunto significativo de empresas também lambeu os beiços diante do butim.

Era a própria democracia que esse consórcio predava com sua criatura tentacular. O jogo do grande poder e do dinheiro grosso se desviava dos trâmites institucionais, tomava um atalho nas trevas dos gabinetes e conspurcava a Constituição.

Mas a República reagiu. Polícia, Tribunal de Contas, Procuradoria, Justiça, opinião pública, imprensa livre e instituições de mercado conseguiram resistir a esse titã do autoritarismo e da ineficiência. Na semana passada, a ainda presidente da Petrobras admitiu que a estatal encolherá bastante. Num início de ano cheio de notícias ruins, há algo para comemorar.

Marcus Pestana - Pimentel: entre Minas e o PT

- O Tempo (MG)

Lá se foi o primeiro mês. Faltam ainda 47. Todo governante eleito no Brasil tem, pela tradição política, a chamada “lua de mel” no seu primeiro semestre de governo. Seriam prematuros quaisquer avaliação e julgamento mais profundos.

O PT de Minas agora vai sentir na carne os efeitos da postura do governo federal. Estados e municípios vivem novamente um estrangulamento fiscal. Mas é preciso diferenciar joio de trigo; a situação de Minas é muito melhor do que, por exemplo, a deixada pelo PT no Distrito Federal. E muito melhor do que a média dos Estados.

Os governos de Lula e Dilma levaram de Minas a nova fábrica da Fiat e o polo acrílico de Ibirité. Os repasses da Lei Kandir não foram feitos. A Cide foi zerada para compensar a má gestão da Petrobras e da política de preços públicos. O compromisso de aprovar o novo marco legal para o setor mineral, alterando os royalties, ficou esquecido, trazendo imenso prejuízo a Minas. 

O Banco do Brasil, mesmo diante de decisão judicial, desrespeitou cronograma de desembolsos contratado de um empréstimo, com prejuízo superior a R$ 1 bilhão, punindo empresas com desnecessários atrasos de pagamentos. O BNDES criou enormes entraves na execução de outra operação de crédito contratada. Sempre sob o manto de um espantoso silêncio de Fernando Pimentel e do PT de Minas. Que sempre preferiram ficar com o PT, e não com os interesses de Minas.

Na transição republicana presidida pelo governador Alberto Pinto Coelho, optaram por ficar murmurando pelos cantos em relação a uma suposta e inexistente falta de transparência e cooperação. Em vez de arregaçarem as mangas e trabalharem por soluções junto com o governo federal, como fizeram Aécio Neves e Itamar Franco, em 2002.

Tentavam com isso criar o clima para velha e surrada tese da “herança maldita” que não houve. Prova disso é o regular pagamento do 13º salário e do salário de janeiro ao funcionalismo.

A realidade bate à porta. Equívocos e erros começam a ser cometidos. Pessoas erradas em lugares errados. A política de segurança está ameaçada pela perda de solidariedade da Polícia Militar e do Ministério Público. O rebaixamento da ouvidoria a posição secundária compromete o discurso da participação e controle social.

O PT vai ter que encontrar a embocadura do poder. Tem a chance agora de provar que as versões divulgadas na campanha sobre o piso nacional dos professores e da Lei 100 eram verdadeiras. Quem sabe Pimentel não consegue convencer o companheiro Dias Toffoli, relator que derrubou a Lei 100 no STF, a rever seu ponto de vista?

E na queda de braço de Minas e da Cemig com o governo federal sobre as usinas em disputa após a edição da desastrosa política energética que desorganizou um setor essencial, Pimentel ficará com Dilma ou com Minas?

A retórica eleitoral agora dará lugar à prática governamental. E, infelizmente para o PT de Minas, a realidade não comporta demagogias e mentiras.
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Marcus Pestana, deputado federal e presidente do PSDB de Minas Gerais

Joaquim Cardozo - Chuva de caju

Como te chamas, pequena chuva inconstante e
[ breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Tereza? Maria?
Entra, invade a casa, molha o chão,
Molha a mesa e os livros.
Sei de onde vens, sei por onde andaste.
Vens dos subúrbios distantes, dos sítios
[ aromáticos.
Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e
[ mangabas,
Onde os coqueiros se aprumam nos baldes dos
[ viveiros
E em noites de lua cheia passam rondando os
[ maruins:
Lama viva, espírito do ar noturno do mangue.
Invade a casa, molha o chão,
Muito me agrada a tua companhia,
Porque eu te quero muito bem, doce chuva,
Quer te chames Tereza ou Maria

1936