quinta-feira, 26 de março de 2015

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

É importante mostrar a natureza do que estamos discutindo hoje. Não é corrupção usual. É uma forma organizada de manutenção do poder utilizando dinheiro público. Aumentaram os preços [das obras] para tirar a diferença e dar para os partidos. É uma coisa muito mais séria.

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Fernando Henriques Cardoso, sociólogo, ex-presidente da República, em entrevista na Folha de S. Paulo, 26 de março de 2015.

Novo partido agrava crise entre PMDB e Dilma

PMDB acusa Dilma de manobra

• Partido considera que governo atuou com Kassab para tentar viabilizar PL e promete retaliação

Simone Iglesias, Júnia Gama, André de Souza e Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - O aparentemente inesgotável contencioso entre a presidente Dilma Rousseff e o PMDB ganhou novo capítulo ontem com a interpretação do partido de que o governo tentou uma manobra, em parceria com o ministro Gilberto Kassab (Cidades), para enfraquecê-lo. Segundo peemedebistas, antes de sancionar com vetos a lei que dificulta fusões e a criação de novos partidos, o Palácio do Planalto incentivou Kassab a protocolar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o pedido de fundação do PL, para que não fosse afetado pelas novas regras, mais rígidas, o que foi feito na noite de segunda-feira. A cúpula do PMDB tratou do episódio como "golpe" e "molecagem" do governo e já fala em retaliação. Eduardo Cunha anunciou que seu partido entrará na briga judicial para implodir a criação do PL, e que o Congresso "trabalhará com toda a força" para derrubar o veto da presidente.

Ao perceber a suposta manobra, o vice-presidente Michel Temer ficou furioso e telefonou para o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), na noite de terça-feira.

- Esse tipo de coisa só atrapalha. O ambiente ficou muito ruim no partido - disse Temer a Mercadante, segundo relato de peemedebistas que acompanharam a conversa.

Mercadante afirmou ao vice que não tinha nada a ver com o assunto e responsabilizou Kassab. Logo depois, Kassab telefonou para três senadores do PMDB dizendo que agiu a pedido do Planalto.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também demonstrou irritação com o que considerou uma manobra do Planalto para enfraquecer o maior partido da base aliada e disse que isso piora ainda mais a relação com a presidente:

- Houve uma estrutura de governo que deixou para o último dia para sancionar (lei aprovada no Congresso sobre criação e fusão de partidos), e o Kassab se aproveitou e protocolou (o PL) na véspera. Isso mostra, mais uma vez, que o governo estava empenhado na criação desse partido.

O clima piorou na manhã de ontem, quando Dilma sancionou a lei, mas com um veto à janela de 30 dias que permitia aos parlamentares migrarem para partidos resultantes de fusão sem perder o mandato. O veto, segundo peemedebistas, prejudica projetos de fusão que estão em discussão, envolvendo DEM, PTB e o próprio PMDB.

- Isso é um projeto de enfraquecimento do PMDB e já foi fartamente denunciado. Então, temos que combater esse processo e vamos combater de todas as formas. Na Justiça, na política, derrubando o veto, de todas as maneiras - afirmou Cunha.

Na prática, a lei foi aprovada no Congresso com dois objetivos: o primeiro, impedir que o PL fosse criado e imediatamente se fundisse ao PSD, de Kassab, formando uma nova legenda forte a ponto de permitir ao governo isolar o PMDB. O segundo, para favorecer partidos antigos, como DEM, PTB e o próprio PMDB, a negociarem fusões e ganharem a janela que permite o troca-troca. A primeira parte da lei, que proíbe fusões de partidos com menos de cinco anos de fundação, foi mantida por Dilma. No entanto, ela vetou a janela para os antigos.

Como a lei foi aprovada no Congresso contra a vontade do governo, e a presidente tem prazo legal de 15 dias para a sanção, ela deixou para assiná-la depois de o PL pedir o protocolo no TSE. Com isso, o novo partido tentará reger sua criação pela lei anterior, que permite a fusão. Um ministro do TSE ouvido pelo GLOBO afirmou que a tentativa não deve dar certo, porque o PL não apresentou todos os requisitos necessários para sua criação, como 485 mil assinaturas de apoio. No entanto, disse que foi criada uma situação jurídica que terá que ser analisada futuramente.

Nada feito "às escondidas"
Ontem, Kassab disse que o partido está sendo formado por "companheiros que queriam entrar no PSD" e que nada é feito "às escondidas". Ele não descartou uma fusão no futuro entre o PSD e o PL, afirmando que são partidos "muito próximos".

- Nós não temos nenhuma participação direta ou indireta. São companheiros, na sua grande maioria, que queriam entrar no PSD e não entraram, e estão formando um outro partido. É público que são pessoas próximas do PSD - disse o ministro, que alegou ter ficado sabendo pela imprensa do registro do PL no TSE.

O PMDB se reuniu ontem para tratar do tema. Na reunião da bancada na Câmara, alguns deputados reclamaram de Dilma Rousseff ter esperado até o último dia do prazo para sancionar o projeto.
- A leitura é que ela empurrou com a barriga para dar esse golpe. O PMDB ficou muito irritado com isso, com a demora em sancionar o projeto e permitir criar um impasse jurídico. Ela tinha 30 dias e deixa para o último dia, para dar tempo do Kassab registrar o PL? Até isso ela não sabia? Cria um mal-estar - criticou o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

O deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) acrescentou:

- Vamos brigar contra essa esperteza.

Do PSD ao PL: Um criador de partidos

• Kassab tem se empenhado na arte de criar legendas capazes de atrair parlamentares sem risco de perda de mandato por infidelidade partidária

Mariana Sanches – O Globo

Com a lei eleitoral embaixo do braço, Gilberto Kassab tem surpreendido. Ele percebeu que para driblar a fidelidade partidária era preciso criar um novo partido e assim evitar que parlamentares "infiéis" perdessem os mandatos. Mas Kassab fez mais: entendeu o timing da manobra. Seu PSD foi o primeiro partido fundado em um começo de legislatura, no momento em que o maior número de parlamentares quer trocar de legenda. Ser governo é vital sobretudo para deputados de baixo clero, que dependem de liberação de verbas de emendas para manter seus votos. A formação de situação e oposição provocou a urgência necessária para que deputados e senadores se lançassem ao PSD, sem que Kassab precisasse cortejá-los.

Agora, com o PL, Kassab passará a sacolinha da nova legenda nas bancadas do rebelde PMDB e do neo-oposicionista PSB. PSD e PL são irmãos gêmeos. Ou "estão muito próximos", como disse o próprio Kassab.

A jogada condiz com o perfil do atual ministro das Cidades. Tornou-se homem forte do governo petista sem romper com o padrinho José Serra (PSDB-SP). Em uma década dominada pela oposição entre PT e PSDB, foi Kassab, então no DEM, quem governou a capital paulista por seis anos. Prefeito e desconhecido, cumpria agendas diárias, de rifa de padre a jantar de gala.

À frente da Prefeitura, dirigiu ônibus, trator, guindaste, máquinas de varrer rua. Diante de questionamentos que não queria responder, Kassab adotava resposta padrão, qual fosse o tema.

No governo Dilma, mudou de tática. Tem adotado o silêncio. Conduta adotada sobre a acusação de que haveria assinatura de eleitores já mortos apoiando a criação do PL. Alda Marco Antônio, ex-vice-prefeita de Kassab, diz em defesa do ex-chefe:

- Isso acontece. A mãe do chefe de gabinete do Kassab, uma senhora cheia de saúde, assinou a fundação do PL. Uma semana depois teve um acidente e acabou falecendo. Quem pode prever isso? - questiona ela.

PMDB culpa Planalto por pedido de registro do PL e prepara retaliação no Congresso

• Para líderes da sigla, criação de novo partido de Kassab serviria de manobra para atrair alguns quadros peemedebistas

Ricardo Della Coletta, Pedro Venceslau e Talita Fernandes - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O PMDB viu "jogo combinado" na demora da presidente Dilma Rousseff de sancionar a lei que cria uma quarentena para a fusão entre partidos - apelidado de projeto "anti-Kassab" - e promete retaliar o governo no Congresso e desencadear uma batalha jurídica para impedir a refundação do Partido Liberal.

O tema foi tratado ontem em reunião realizada no gabinete do vice-presidente Michel Temer (PMDB) com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o líder do PMDB na Casa, Eunício Oliveira (CE), e o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB-AM). No encontro, em que ficou clara a revolta com o Palácio do Planalto, eles culparam os ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e das Cidades, Gilberto Kassab, pela articulação que abriu uma brecha para que o PL seja recriado e posteriormente fundido ao PSD.

O PMDB, maior partido aliado e que vive em clima de conflagração com o governo, trabalhou intensamente para impedir o registro do PL, sigla que está sendo montada por Kassab, presidente licenciado do PSD. O objetivo do ministro das Cidades é fundir os dois partidos e os peemedebistas veem nisso um movimento para enfraquecer o PMDB por meio da cooptação de parlamentares. Isso porque a Justiça eleitoral não considera que a mudança para uma sigla recém-criada configura infidelidade partidária. Além disso, os parlamentares de uma legenda que vai se fundir com outra podem carregar consigo para a nova agremiação sua cota do fundo partidário.

No início do ano, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e Calheiros capitanearam a aprovação de um projeto que visava barrar o PL. Além de estabelecer que só poderá haver fusão ou incorporação entre partidos que tenham ao menos cinco anos de existência, ele também só considera válidas as assinaturas de apoiamento para a obtenção de registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de pessoas não filiadas a qualquer partido político.

Mas a presidente Dilma só sancionou o texto ontem, um dia depois de os aliados de Kassab terem entrado com a papelada no TSE para pedir a refundação do PL. Com isso, eles argumentam que a fusão poderá ocorrer porque o registro foi requisitado quando as alterações na lei dos partidos políticos ainda não haviam entrado em vigor.

Reação. Parlamentares do PMDB consultados pelo Broadcast Político afirmaram que a movimentação de Kassab só agrava a crise na base aliada. Eles estudam entrar na Justiça questionando o fato de o pedido de registro não trazer todas as 484.169 assinaturas certificadas.

Eles planejam também impor novas derrotas ao governo Dilma nos próximos dias. No Senado, Calheiros quer votar ainda hoje o projeto aprovado ontem pela Câmara que obriga a presidente Dilma a regulamentar dentro de 30 dias uma lei aprovada no ano passado que trocou os indexadores das dívidas de Estados e municípios com a União. Por trazer fatores de correção mais vantajosos aos entes federados, a lei pode colocar em risco o ajuste fiscal implementado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Também consta como primeiro item na pauta de votações do Senado desta tarde um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) que obriga os chefes do Poder Executivo (presidentes, governadores e prefeitos) a se desincompatibilizarem dos cargos até seis meses antes do pleito para disputar a reeleição.

Ministros e ex-ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ouvidos reservadamente argumentaram que a antecipação do pedido de registro feito pelo PL pode não gerar resultados, uma vez que a criação da legenda só será considerada quando todas as assinaturas estiverem certificadas pela Corte, o que ocorrerá com as novas regras já em vigor. Com uma briga judicial instalada, a decisão final deverá caber o Plenário do tribunal.

Ciúmes. O presidente do PL, Cleovan Siqueira, minimiza a polêmica com o PMDB. "Não precisam ter medo de nós. O PL nascerá pequeno. Já somos proibidos pela lei", disse. Ainda segundo o dirigente, a fusão já não está mais no horizonte da sigla. "Não há razão para tanto ciúme. Mas eu sei que a dor de cotovelo, que é antiga, às vezes volta".

PMDB vai brigar na Justiça para derrubar criação do PL, diz Eduardo Cunha

• Presidente da Câmara afirma que o Congresso vai derrubar o veto de Dilma à lei que restringe criação de novos partidos

Júnia Gama e Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA - O Congresso irá entrar de cabeça na briga para evitar a criação do PL, partido que vem sendo gestado pelo ministro das Cidades, Gilberto Kassab, como forma de diluir o poder do PMDB junto ao governo. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou nesta quarta-feira que o governo estava “empenhado” na criação do partido para enfraquecer o PMDB e que isso piora ainda mais a relação com o Congresso. Cunha afirmou que o PMDB irá travar uma briga na Justiça para implodir o PL.

Para Cunha, a sanção do projeto aprovado pelo Congresso que freia a criação de legendas, apenas no último dia possível, seria uma manobra do governo para favorecer o PL.

— Vamos entrar na Justiça. O fato de terem entrado com o registro na véspera e o governo ter demorado tanto para sancionar é mais um indício de que o governo está trabalhando por esse partido — disse.

— Isso é um projeto de enfraquecimento do PMDB e já foi fartamente denunciado. Então, temos que combater esse processo e vamos combater de todas as formas. Na Justiça, na política, derrubando o veto, de todas as maneiras — atacou.

Sem acusar diretamente a presidente Dilma Rousseff, o presidente da Câmara afirmou que a “estrutura” do governo foi usada para favorecer a criação do partido.

— Houve uma estrutura de governo que deixou para o último dia para sancionar, já programado, e o Kassab se aproveitou e protocolou na véspera – pontuou, completando que a suposta manobra “com certeza absoluta piora” a relação do governo com o Congresso.

Segundo Cunha, políticos com mandato não poderão se filiar ao PL, caso seja criado, para disputar as eleições municipais do ano que vem.

— Tem um manancial de briga jurídica pela frente. Duvido que algum parlamentar vai poder se filiar a esse partido enquanto não tiver definição se alguém pretende disputar as eleições de 2016. Infelizmente, está se optando para sair do campo político para ir para o campo jurídico. Não são partidos com ideologia, com formação para disputar processo eleitoral normal. São partidos criados dentro da máquina do governo com o objetivo de tirar parlamentares de outro partido – afirmou.

O presidente da Câmara disse ainda que o Congresso irá derrubar o veto que a presidente Dilma fez ao projeto.

– Acho que não deveria ter tido nenhum veto no projeto, aquilo não é matéria do Poder Executivo, é de partido político, não afeta a governabilidade. Aquele veto é um veto estranho, porque atrapalha o problema das fusões, fala explicitamente que não pode equiparar o processo de mudança partidária de fusão para criação de partido. Nós vamos trabalhar com toda força para derrubar esse veto. Isso mostra mais uma vez que o governo estava empenhado na criação desse partido – disse.

Bancada critica Dilma
Na reunião da bancada do PMDB, alguns deputados reclamaram do fato de a presidente Dilma Rousseff ter esperado até o último dia do prazo para sancionar o projeto de lei que restringe a criação de partidos, dando prazo para que o PL, partido que estaria sendo articulado pelo ministro Gilberto Kassab (Cidades), pedisse registro no TSE.

— A leitura é que ela (Dilma), empurrou com a barriga para dar esse golpe. O PMDB ficou muito irritado com isso, com a demora em sancionar o projeto e permitir criar um impasse jurídico. Ela tinha 30 dias e deixa para o último dia, para dar tempo do Kassab registrar o PL? Até isso ela não sabia? Cria um mal estar — criticou o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA)

O deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) acrescentou:

— Vamos brigar contra essa esperteza. Alguns responsabilizaram a presidente por ter segurado a sanção.

O líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ),, no entanto, preferiu colocar panos quentes e não atacar a presidente Dilma.

— Teria sido positiva a sanção imediata da lei aprovada pelo Congresso, mas a presidente usou o prazo que a lei permite. Na minha opinião, não muda nada. O PL ainda não alcançou seu registro. Mas, caso se confirme que foi um artifício para burlar a fidelidade partidária, iremos à Justiça _ disse Piciciani, acrescentando:

— A atitude da presidente em não sancionar rapidamente abre margem para interpretar isso ( que foi de propósito), mas eu não faço essa interpretação. Não azedou a relação com o governo não, não é para tanto.

Cunha diz que combaterá 'de todas as formas' criação do PL

• Para presidente da Câmara, nova sigla é 'projeto de enfraquecimento do PMDB' patrocinado por ministro de Dilma

Ranier Bragon e Márcio Falcão – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Afirmando que o Planalto patrocina nos bastidores uma ação para minar o PMDB, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse nesta quarta (25) que combaterá na Justiça e na política, "de todas as formas", a tentativa do ministro das Cidades, Gilberto Kassab (PSD), de recriar o Partido Liberal.

O ressurgimento da legenda é o novo foco de atrito entre PMDB e Planalto. Cunha e caciques peemedebistas acusam Kassab de patrocinar uma operação para tirar parlamentares do partido.

"Com certeza absoluta é um projeto de enfraquecimento do PMDB. Vamos combater de todas as formas, na Justiça, na política, de todas as maneiras", afirmou Cunha.

Segundo o presidente da Câmara, o Congresso vai trabalhar também "com todas as forças" para derrubar vetos da presidente Dilma Rousseff ao projeto aprovado que dificulta a criação de siglas.

"Não deveria ter tido nenhum veto. Estranho, vamos trabalhar com todas as forças para derrubar esse veto, isso mostra mais uma vez que o governo está empenhado na criação desse partido", afirmou o peemedebista.

Embora negue publicamente relação com o PL, Kassab é o principal articulador da nova sigla. Sua intenção é, posteriormente, fundi-lo com o PSD, formando uma sigla governista de porte para rivalizar com o PMDB.

Traumann pede demissão após vazamento de documento interno

• Titular da Secom deixa o cargo nesta quarta após 'Estado' revelar material que cita 'caos político' e 'comunicação errática' do governo

Rafael Moraes Moura, Tânia Monteiro e Anne Warth - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff aceitou nesta quarta-feira, 25, o pedido de demissão do ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Thomas Traumann, informou em nota a Presidência da República. Sua saída já era esperada e ocorre uma semana após o Estado revelar com exclusividade um documento interno do Planalto no qual critica várias posturas do governo federal na área da Comunicação, considerada "errática" no documento, e avalia que o governo vive um momento de "caos político". Após o episódio, o ministro saiu de férias por seis dias e retornou ao trabalho nessa segunda-feira, 23.

De acordo com a nota, Dilma "agradeceu a competência, dedicação e lealdade de Traumann no período como ministro e porta-voz". A Presidência da República não informou o sucessor de Traumann na Secom - por enquanto, a pasta será comandada pelo secretário-executivo Roberto Messias.

O documento revelado pelo Estado afirma que os apoiadores da presidente estão levando uma "goleada" da oposição nas redes sociais e aponta como saída para reverter o quadro pós-manifestações de 15 de março o investimento maciço em publicidade oficial em São Paulo, cidade administrada pelo petista Fernando Haddad, onde se concentra, atualmente, a maior rejeição ao PT.

Nesta terça-feira, 24, integrantes da Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado aprovaram requerimento convidando Traumann para prestar esclarecimentos sobre o documento elaborado pela pasta, que também fala em "caos político".

O jornalista havia assumido o comando da Secom em 3 fevereiro de 2014, no lugar de Helena Chagas.

Substituição. As primeiras informações eram de que Traumann iria para o cargo de gerente de comunicação institucional da Petrobras, no lugar do sindicalista Wilson Santarosa, demitido na semana passada.

No entanto, o vazamento do documento da Secom irritou profundamente a presidente Dilma Rousseff. Segundo o Broadcast Político apurou, o ministro não deve mais ser designado para esse cargo.

O governo segue buscando nomes para assumir a Secom. Além do novo titular da Secom, Dilma deve definir o sucessor de Cid Gomes no Ministério da Educação (MEC), que vem sendo chefiado interinamente pelo ex-secretário-executivo da pasta, Luiz Cláudio Costa.

Frustração e rejeição do eleitor deixam Dilma com pouca margem de manobra reduzida

• Futuro da presidente depende do impacto que o ajuste econômico terá na rotina dos brasileiros

Mauro Paulino Diretor-Geral do Datafolha
Alessandro Janoni Diretor de Pesquisas do Datafolha

Por trás da reprovação majoritária da população ao governo Dilma Rousseff, revelada pelo Datafolha após as manifestações de 15 de março, há diferenças importantes entre os eleitores que se posicionam contra a presidente.

Por meio de uma análise combinatória de duas variáveis --o voto declarado no segundo turno da eleição presidencial de 2014 e a avaliação que os entrevistados fazem do governo Dilma hoje--, o Datafolha dividiu a amostra de sua última pesquisa nacional em seis subgrupos.

Os três primeiros reúnem aqueles eleitores que optaram por Dilma no ano passado e que agora têm visões diferentes sobre o desempenho da presidente. São os eleitores "satisfeitos", os "apreensivos" e os "frustrados".

Os outros três grupos são compostos de pessoas que não votaram na petista, isto é, escolheram o senador Aécio Neves (PSDB-MG), votaram nulo ou em branco nas últimas eleições. São subdivididos em "surpresos", "atentos" e "refratários".

Os eleitores "satisfeitos" avaliam positivamente o início do segundo mandato da candidata que elegeram. Atribuem à presidente nota 8,3 --a média na população é 3,7. Eles correspondem a 11% dos brasileiros, são mais velhos e muito mais petistas do que a média. Vivem principalmente no interior do país, estão mais otimistas com a economia e são os que menos acreditam em omissão de Dilma diante da corrupção na Petrobras. É o segmento mais fiel à presidente.

Os eleitores "apreensivos" não aprovam, mas também não reprovam o governo Dilma. Avaliam sua gestão como regular ou não souberam opinar. Totalizam 15% da amostra e, entre os que votaram na petista, são o grupo com mais moradores das capitais. Dão nota 6,1 à presidente e estão pessimistas com os rumos da economia, mas em proporção menor do que a média.

Em comum com os grupos que não rejeitam Dilma, os "apreensivos" estão mais otimistas em relação à sua situação econômica pessoal do que com as condições do país. Se sentirem em sua rotina os efeitos dos ajustes na economia, tendem a se frustrar. Caso contrário, podem voltar a apoiar a presidente.

Os eleitores "frustrados" votaram em Dilma, mas agora a consideram uma presidente ruim ou péssima. De todos os seis subconjuntos, é o que tem menor renda e mais moradores no Nordeste. Somam 16% e atribuem média 2,4 à petista, nota superior apenas à dos "refratários".

É um estrato que demonstra bastante pessimismo com a economia e o mais inseguro com o emprego. Para reconquistá-los, o governo deveria minimizar os efeitos da recessão no mercado de trabalho e em benefícios sociais.

No universo dos que não votaram em Dilma na eleição, dois pequenos subconjuntos destacam-se pela avaliação que fazem da presidente.

Os "surpresos" representam apenas 2% do total, são menos escolarizados e mais pobres, e dão nota 7,1 à gestão da petista. Os "atentos", que somam 10%, a consideram regular, com média 5,4. São mais jovens, a maioria tem ensino médio e é do sexo masculino, estão pessimistas com a economia do país, mas nem tanto em relação à situação econômica pessoal.

O maior grupo de todos é o dos "refratários". Corresponde a quase metade da população (47%). É um contingente que não votou em Dilma e a reprova totalmente. Entre eles, a nota média obtida pela petista fica em 1,7. É o segmento mais escolarizado e com mais gente no Sudeste.

Exibe grande pessimismo na economia e é o que mais condena a presidente por omissão diante da corrupção na Petrobras. Foi o estrato mais presente nos protestos do dia 15 e parece blindado contra iniciativas do governo.

Impacto do ajuste
As variações na opinião pública daqui em diante dependerão principalmente do impacto do ajuste econômico no dia a dia dos brasileiros, especialmente nos segmentos "apreensivos" e "atentos" da população.

São estratos que percebem a gravidade da situação do país, mas ainda não o projetam para a vida prática. Para os "atentos", ações ou confusões na área da educação, como a que aconteceu com o FIES, podem pesar bastante.

Para os "frustrados", a questão é saber se o fantasma do desemprego se materializará. Isso pode ser determinante para a adesão desse segmento às manifestações de rua. Entre os eleitores "refratários", o governo não encontra, por enquanto, espaço para manobras.

A rejeição que perdura desde as eleições, intensificada pela derrota do antipetismo nas urnas, anula, pelo menos por enquanto, qualquer tentativa de aproximação de Dilma com esse segmento. Resta saber quem da oposição preencherá essa lacuna.

PMDB não quer enforcar Dilma, só sufocá-la

• Ideias como a redução de ministérios são jogo de cena do partido

Chico de Gois – O Globo

BRASÍLIA - O sonho de dias melhores na Câmara, esboçado no início da semana passada, terminou rapidamente. E o pesadelo, para o governo, voltou na forma de PMDB. Em menos de dez dias, o aliado indigesto exigiu a demissão do então ministro da Educação, Cid Gomes, forçou o governo a renegociar as dívidas de estados e municípios e ensaia novas estocadas.

O PMDB e seus satélites sentem que têm a corda na mão. E esticam até o ponto que consideram ideal. Não a ponto de enforcar o governo, mas até sufocá-lo para que peça água. Ninguém no partido quer o governo pendurado, mas, sim, de joelhos.

A lógica peemedebista é a seguinte: até o ano passado, durante o primeiro mandato de Dilma, o PMDB, que ocupa a vice-Presidência, só foi chamado para algum lugar de destaque quando Dilma viajava, e Temer era obrigado a assumir a Presidência simplesmente para não deixar a cadeira vazia.

Por isso, argumentam os peemedebistas, o partido não se sente responsável pela crise financeira. Até aceita colaborar com a recuperação, mas não quer assumir sozinho o ônus do arrocho fiscal.

Para fugir da pecha de fisiologista, a sigla decidiu propor a redução do número de ministérios de 39 para 20. A medida tem dois objetivos práticos: dar um sinal às ruas de que segue o cortejo dos manifestantes e forçar o Planalto a promover o ajuste fiscal não apenas com medidas que atinjam o bolso do eleitor - e, portanto, impopulares para o Congresso - mas também cortando na máquina.

A redução em si dos ministérios não interessa ao partido. É ensaiada como enforcamentos em filmes: são mero jogo de cena.

Petistas analisam que seu parceiro de campanha vai continuar segurando a corda, mas sem rompê-la. Enquanto a brincadeira macabra continua, os petistas rezam para que Dilma dê algum sinal de vida. Com um Legislativo forte, e tendo seu comando nas mãos do PMDB, a respiração do governo deve continuar ofegante por um bom tempo.

Serra se reúne com petistas e aliados para discutir crise

• Parlamentares se dizem preocupados com rumos do ajuste fiscal

Fernanda Krakovics – O Globo

BRASÍLIA - Um grupo de pelo menos doze senadores, tanto da base aliada quanto da oposição, reuniu-se anteontem à noite para discutir a crise política e os problemas na economia. O assunto principal foi o ajuste fiscal proposto pela presidente Dilma Rousseff, que encontra resistências no Congresso, inclusive no PT. A conversa - no apartamento do senador Waldemir Moka (PMDB-MS), em Brasília - reuniu desde o líder do PT, senador Humberto Costa (PE), até o senador José Serra (PSDB-SP). O ministro Armando Monteiro (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) também estava presente.

Participantes da reunião demonstraram preocupação com a contaminação do cenário econômico pela crise política, e com a condução do ajuste fiscal pelo governo.

- Qual é o pacote do Levy? Se forem só essas duas medidas provisórias é muito pobre. Nós podemos contribuir, mas o ajuste tem que ter início, meio e fim. O governo só diz que vai cortar. E vai fazer que colcha? - perguntou Walter Pinheiro (PT-BA), citando o ministro Joaquim Levy (Fazenda).

Serra concordou com o argumento de Pinheiro, segundo senadores presentes. Dissidente no PMDB, o senador Ricardo Ferraço (ES) disse ainda estar tentando entender o "cavalo de pau" dado pelo governo na política econômica neste início do segundo mandato da presidente Dilma. Ferraço também condiciou seu eventual apoio ao ajuste fiscal à garantia de que, arrumadas as contas do país, o Palácio do Planalto não vai voltar a adotar o modelo anterior, implementado pelo ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.

- É importante sinalizar que não viveremos esse tipo de experimento de novo. É a história do elefante que leva o escorpião para atravessar o rio. A gente não quer ser inocente útil - afirmou Ferraço no encontro, segundo fontes.

Também da ala independente de seu partido, o PP, a senadora Ana Amélia (RS) disse que o governo primeiro precisa reconhecer seus erros, e que a presidente Dilma deve mudar seu modo de fazer política, citando como exemplo o recuo na mudança do indexador das dívidas de estados e municípios.

- Está todo mundo preocupado com a contaminação da economia pela situação política. As expectativas são negativas - disse Ana Amélia.

Coube ao ministro Armando Monteiro, ex-senador, pedir um voto de confiança no governo e pregar a necessidade imperiosa do ajuste fiscal.

- Precisamos olhar para a frente - pediu o ministro, de acordo com senadores presentes.

Embora tenha se dito aberto ao diálogo, o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) ressaltou, segundo relato de senadores, que continua sendo oposição.

- Não vou propor nada irresponsável, temos que procurar saídas para o Brasil, mas sou oposição.

Pelo diagnóstico feito pelo grupo, o governo não acena com uma perspectiva de melhora na economia, vendendo o arrocho como um fim em si mesmo. Seria um misto de problema de comunicação com falta de sensibilidade política, em diagnóstico feito por integrantes desse grupo.

Bloco informal pode ser criado
Dos participantes da conversa, um grupo menor, formado somente por senadores da base aliada, pretende formar um movimento suprapartidário, que atuaria como um bloco informal. O senador Paulo Paim (PT-RS), que já revelou planos de sair de seu partido se o ajuste fiscal for não for modificado, aposta que esse bloco informal seja o embrião de uma nova legenda.

Na casa de Moka estiveram o líder do PT, Humberto Costa (PE); José Serra (PSDB-SP); Antonio Anastasia (PSDB-MG); o líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE); José Pimentel (PT-CE); Walter Pinheiro (PT-BA); Ricardo Ferraço (PMDB-ES); Ana Amélia (PP-RS); Luiz Henrique (PMDB-SC); Wilder Morais (DEM-GO) e Blairo Maggi (PR-MT).

Entrevista - Fernando Henrique Cardoso

Dilma se tornou refém de Joaquim Levy

• Ex-presidente diz que petista vive uma 'armadilha' e que, hoje, Lula perderia
as eleições

Daniela Lima Ricardo Balthazar - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acha que a presidente Dilma Rousseff tornou-se refém de seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o economista de perfil conservador que ela recrutou para dar uma guinada em sua política econômica e equilibrar as finanças do governo.

"Ela não pode demitir. É refém dele", disse FHC, em entrevista à Folha. "Poder até pode, mas o que acontece depois? Ela está presa, não tem muito por onde escapar."

Para o ex-presidente, Dilma vive numa armadilha, forçada a promover um ajuste duro e sem força para convencer aliados no PT e no PMDB a aprovar medidas propostas de sua equipe econômica.

"O problema é econômico, mas a solução é política", disse o tucano.

"Não estou vendo se formar uma coalizão que sustente a saída." A seguir, os principais trechos da entrevista.

Em 1999 o sr. viveu uma crise e o PT pediu seu impeachment. O que diferencia o "Fora FHC"do "Fora Dilma"?

O "Fora FHC" era partidário, limitado ao PT. Eu nunca perdi o Congresso. Não perdi a credibilidade nem a capacidade de ação política. Não é a mesma situação de hoje. Há um elemento de descrédito.

Mas qual é o principal vetor da insatisfação popular: a corrupção, o estelionato eleitoral, a economia?

É a somatória. O que dá sustentação é a economia-- que está só começando--, mas é indiscutível que a corrupção pesou. O movimento foi de repulsa. Em 2013 [as jornadas de junho], os alvos eram dispersos. Agora tudo se concentrou simbolicamente no anti-Dilma. Não quer dizer que efetivamente queiram tirar a Dilma de lá. Até porque, pela corrupção, não é ela a responsável maior.

Como assim?

Ela herdou. Todo esse sistema que está aí não foi criado no governo dela. Ela tentou se livrar. Demitiu ministro, mexeu na Petrobras. Agora, o povo não percebeu assim. Simbolicamente centrou na Dilma. Ela está numa armadilha. Não sei se acham que ela é corrupta. As pesquisas dizem que acham que ela sabia e não fez nada. A imagem da Dilma que fez a a faxina sumiu.

Armadilha?

Ela não tem o que fazer. O que tinha, já fez: nomeou o Levy. E isso só aumentou a armadilha, porque agora ela não pode demitir. É refém dele. Poder até pode, mas o que acontece depois? Então, ela está presa, não tem por muito onde escapar.

O PMDB propôs corte de ministérios e tem criticado o ajuste. Ele roubou a agenda da oposição?

Se estiver fazendo isso, ele está mudando de lado. Se for isso, não acho mal não [risos].

O sr. definiu Joaquim Levy como 'tecnocrata'. Ele não terá força para bancar o ajuste?

Ele não tem experiência política. Quando fiz o Plano Real, o que eu fazia? Eu falava. Minha função era política. Eu não era técnico, não sou economista sequer. Alguém tem que fazer isso. No caso, era eu, não o presidente, mas alguém tem que fazer.

Então falta condução política?

Os economistas, quanto mais tecnocratas, mais querem que a racionalidade impere. Não pode. A racionalidade econômica pura esmaga tudo. O problema é econômico, a solução é política. E não vejo uma coalizão.

O sr. esteve com Temer e há um alinhamento entre PMDB e PSDB na CPI da Petrobras...

Com o Temer tenho uma relação. Ele deu uma declaração interessante: a Câmara tem um momento que ela engravida e dá a luz. Ela engravidou da reforma política. E aí eu acho que tem que conversar PMDB, PSDB, PT... Para evitar o naufrágio do sistema e da classe política toda. Agora, não é isso que a rua está pedindo.

A reforma não é a resposta?

A rua está pedindo para passar a limpo. Não adianta responder como a Dilma tentou, dizendo que 'nunca ninguém combateu tanto a corrupção como o nosso governo' --e ainda botou o 'nosso', coitada. Ninguém acredita.

O sr. disse 'coitada'. É pena?

Pena não é sentimento que se deva ter de políticos. Acho que ela está de mau jeito.

É solidariedade?

Solidariedade, não. Estou do outro lado. Acho, como ser humano, que ela deve estar padecendo.

Setores que defendem o impeachment dizem que o sr. poupa Dilma e reedita o que fez em 2005 por Lula...

Em 2005 havia possibilidade legal de pedir impeachment. Por que não teve? Porque a rua não estava nessa posição. O impeachment não é um ato simplesmente técnico. Cria um fosso, um mal-estar historicamente ruim. Agora, quem está processando a Dilma por algo que ela fez? Não tem. Quer dizer que não venha a acontecer? Não sei. Estamos numa situação de ponto de interrogação. Dependemos do calor da rua, do avanço do processo judicial e da mídia. Seria irresponsável nessa situação eu sair com uma bandeira fora de hora.

Mas o sr. acha que hoje um pedido de impeachment de Dilma teria o mesmo problema que viu no de Lula em 2005?

Não, é diferente. E vou dizer uma coisa arriscada: o Lula perde hoje. Hoje [se Dilma cai e fazem novas eleições], o Lula perde. Mas não penso eleitoralmente. Sou democrata. Não vou dizer: 'Então vamos fazer o impeachment porque o Aécio [Neves] ganha, o Geraldo [Alckmin] ganha, ou eu ganho'. Não estou dizendo que nunca vai se chegar a tal ponto [do impeachment]. Não sei.

O sr. disse recentemente que é preciso "passar a limpo" a corrupção na Petrobras. Antonio Anastasia (PSDB-MG)está entre os investigados...

Pegar uma referência vaga sobre alguém e colocar num processo é irresponsabilidade. Mas minha opinião é clara: está lá, que investiguem. Mas, no caso do Anastasia, é uma coisa fragílima.

Acha que houve influência política na escolha dos nomes?

Tudo na vida é política. Não creio que o procurador-geral [Rodrigo Janot] faça um acordo, mas obviamente há influências de todos os lados, em todas as esferas. O próprio policial, um procurador que quer uma coisa, o outro que quer outra. Isso não é necessariamente ruim, é normal, desde que o processo continue e se consiga provar algo.

O sr. disse que não é "crível" que Lula e Dilma não soubessem. A mesma lógica vale para o cartel em São Paulo?

É muito diferente. Aqui não tem acusação de que dirigente político tivesse recebido dinheiro, de que o PSDB tivesse recebido. O STF arquivou porque não tinha nada. É importante mostrar a natureza do que estamos discutindo hoje. Não é corrupção usual. É uma forma organizada de manutenção do poder utilizando dinheiro público. Aumentaram os preços [das obras] para tirar a diferença e dar para os partidos. É uma coisa muito mais séria.

Depoimentos apontam que o cartel na Petrobras se organizou no final de sua gestão...

Não é isso. Eu li. As empresas dizem que se organizaram como associação, mas que só tornaram como prática mais tarde. Pode ter havido corrupção no meu governo? Houve muito homicídio no meu governo, sabia? Marido matou mulher, mulher matou marido. O que eu tenho a ver com isso? Não há nem acusação desse tipo de organização no meu governo.

Acha possível que a dinâmica da última eleição presidencial tenha influenciado o levante contra Dilma?

É possível. Houve uma coisa ruim que é a ideia do nós contra eles. Isso foi proposto pelo PT e pelo Lula. Criaram um antagonismo. Agora reclamam que tem ódio nas ruas. Mas eles que soltaram.

Dilma agora pede estudo sobre corte de ministérios

• Pressionada por queda de popularidade e cobrada por aliados, presidente cogita fazer 'gesto' para mostrar mais austeridade

Tânia Monteiro, Rafael Moraes Moura - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Cobrada publicamente pelos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para que reduza o número de ministérios e "corte na própria carne", a presidente Dilma Rousseff encomendou estudo à Casa Civil para que verifique a possibilidade de redução ou extinção de pastas. Hoje, o primeiro escalão do governo tem 39 cargos com status de ministro.

Entre os ministérios que poderão ser atingidos estão os da Pesca e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), além de secretarias com status de ministério, como Assuntos Estratégicos, Direitos Humanos, Mulheres e Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Todos esses órgãos foram criados ou passaram a ter ministros no comando durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, à exceção do GSI, órgão que substituiu a Casa Militar. O governo está tratando do assunto com cuidado para evitar problemas com aliados e os segmentos sociais interessados nas pastas.

Na campanha eleitoral do ano passado, Dilma defendeu o atual número de ministérios dizendo que eles fortalecem demandas de minorias e não trazem despesas consideráveis ao governo.

Agora, a presidente avalia que a redução seria um gesto político que mostraria que o "ajuste fiscal é para valer" e que o governo está disposto a dividir o ônus com a sociedade. Na terça-feira, o presidente do Senado chegou a dizer que, "se aplaudimos o Mais Médicos, está na hora do Menos Ministérios".

No início da gestão na Casa Civil da então ministra Gleisi Hoffmann (PT-PR), o Palácio do Planalto já havia preparado um estudo de redução de ministérios, mas decidiu não levar a proposta adiante por temer a repercussão entre os movimentos sociais. Hoje, o problema continua existindo e a ideia é conversar com os setores envolvidos, mostrando que as políticas daquelas pastas não serão abandonadas.

Gesto. Na época, o Planalto não soube como apresentar a ideia aos aliados e prevaleceu a percepção de que secretarias como Direitos Humanos e Igualdade Racial tinham importância simbólica e a perda do status de ministério teria baixo impacto no que diz respeito à redução de custos. Mas, agora, a necessidade do gesto político estaria pesando mais que os números. Na época, não se conseguiu transformar uma "proposta técnica" em uma "proposta política", conforme um integrante do governo.

Na gestão de Gleisi na Casa Civil, cogitou-se incorporar a Secretaria de Assuntos Estratégicos ao Ministério do Planejamento, enquanto a Pesca retornaria ao Ministério da Agricultura. As pastas de Cidades e Integração Nacional passariam a ser uma só.

Neste novo modelo de estudo, há quem defenda que a Secretaria de Comunicação (Secom) - desde ontem sem um titular permanente, diante da demissão do jornalista Thomas Traumann - perca o status de ministério.

Algumas das atuais secretarias poderiam ser incorporadas à Secretaria-Geral da Presidência, como a de Mulheres. A de Direitos Humanos poderia voltar a ser subordinada ao Ministério da Justiça, como ocorria antes, e a de Igualdade Racial poderia ser assumida tanto pelo Ministério do Desenvolvimento Social como por Desenvolvimento Agrário, pastas com as quais já há integração de programas.

O governo está sob bombardeio, em decorrência das manifestações de 15 de março e novas programações para o dia 12 de abril, que fizeram despencar a popularidade da presidente. O entendimento é que o corte de ministérios serviria para emitir um sinal de austeridade fiscal. Quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deixou o Planalto, existiam 26 ministérios.

A Casa Civil diz oficialmente que não há demanda de Dilma sobre a redução do ministério. Em entrevista ontem à noite, o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, criticou a proposta de diminuir o o promeiro escalão.

Pela 1ª vez, BC admite retração em 2014 e 2015

• Na véspera da divulgação do PIB de 2014, BC admitiu que a atividade deve ter queda de 0,1%, ante crescimento de 0,2% da projeção anterior; para 2015, estimativa é de baixa de 0,5%

Célia Froufe, Adriana Fernandes e Victor Martins - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Na véspera da divulgação do Produto Interno Bruto (PIB) de 2014 pelo IBGE, o Banco Central diminuiu a projeção de crescimento e admitiu que o País deve ter registrado recessão no ano passado. Agora, o BC calcula que o PIB de 2014 tenha retração de 0,1%. A informação consta do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), que revela uma piora da estimativa para o último ano do primeiro mandato de Dilma Rousseff, já que, na edição anterior do RTI, estava em alta de 0,2%.

Para 2015, o Banco Central projetou que o PIB deverá registrar queda de 0,5%. No primeiro ano do seu governo, em 2011, a presidente conseguiu um crescimento de 2,7% e, no segundo, de apenas 0,9%. Em 2013, a economia teve uma alta de 2,3%.

Esta semana, em audiência no Senado, o presidente da instituição, Alexandre Tombini, admitiu que os dados atuais estão enfraquecidos, mas disse acreditar numa retomada da economia no segundo semestre deste ano e uma expansão com mais vigor em 2016.

No Relatório de Inflação, o BC projetou alta de 0,2% do consumo das famílias este ano e expansão de apenas 0,3% do consumo do governo. A estimativa para os investimentos - Formação Bruta de Capital Fixo - em 2015 é de retração de 6%. No último Relatório de Mercado Focus, a mediana das estimativas do mercado para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2015 estava em contração de 0,83%.

No Senado, Tombini disse esperar um crescimento da agropecuária, uma expansão mais modesta do setor de serviços e uma queda da atividade fabril. No Relatório Trimestral de Inflação (RTI), esse prognóstico foi transmitido em números: o setor rural deve ter alta de 1% este ano e os serviços, de 0,1%.

O BC prevê um tombo de 2,3% da indústria. A queda prevista para este ano é maior do que a estimativa de retração de 1,7% no ano passado.

Ano passado. O recuo da projeção de 2014 foi puxado por uma expectativa menor de crescimento do setor da indústria. Pelas novas projeções, o PIB do setor agropecuário vai crescer 1,3% ante 1,4% da estimativa anterior. Já a projeção de crescimento da indústria recuou de uma queda 1,4.% para 1,7%. O setor de serviços, de acordo com o BC, deve ter uma expansão de 0,6% . No relatório de dezembro, o BC contava com uma alta de 0,6 % para esse setor.

Ainda de acordo com o RTI, o consumo das famílias deve ter expansão de 1% em 2014, enquanto o do governo, de 1,8%. Já a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) deve ter queda de 8,2% em 2014.

Déficit de caixa do estado deve chegar a r$ 13,5 bilhões em 2015

• Governo culpa crise econômica e anuncia medidas para aumentar receita

Luiz Gustavo Schmitt – O Globo

Em audiência pública na Comissão de Orçamento da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) ontem, o secretário estadual de Fazenda, Julio Bueno, admitiu que a previsão de déficit de caixa do estado até dezembro é de R$ 13,5 bilhões. A conta não fecha, já que a despesa do estado para 2015 é de R$ 67 bilhões, contra uma receita de R$ 53,5 bilhões. No ano passado, a receita estadual prevista era de R$ 77 bilhões.

De acordo com o secretário, a deterioração nas contas do estado é conjuntural e tem origem na redução do ritmo da economia do país e na crise da Petrobras, que concentra 80% de sua atividade no estado.

A expectativa para 2015 é de queda de R$ 2,6 bilhões na arrecadação de royalties e participações especiais, e de R$, 2,4 bilhões no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Além disso, a previdência estadual, o RioPrevidência, sofre com um déficit de R$ 5 bilhões.

Bueno anunciou uma série de medidas que serão tomadas para tapar o buraco. A primeira delas será o uso de R$ 6,2 bilhões do Fundo de Depósito Judicial do Tribunal de Justiça do Rio para garantir o pagamento dos aposentados e pensionistas do RioPrevidência até dezembro. O projeto de lei que autoriza a medida será votado hoje na Alerj.

Renegociação com empresas
O secretário ainda disse que o estado pretende fazer um esforço para reduzir despesas - quer cortar R$ 1 bilhão em cargos de comissão - e aumentar a arrecadação em até R$ 6,5 bilhões. Apenas a renegociação de dívidas de grandes empresas devedoras de impostos deverá trazer aos cofres públicos ao menos R$ 2 bilhões:

- Somente uma dessas empresas vai fechar um acordo para pagar R$ 1,5 bilhão - disse, sem dar o nome da companhia.

Bueno lembrou também que o estado deve aumentar em R$ 200 milhões a arrecadação, após a retirada de benefícios fiscais do setor siderúrgico. O projeto de lei que regulamenta essa medida foi aprovado na última terça-feira na Alerj.

Desde sua posse, o governador Pezão anunciou um esforço fiscal de R$ 4,5 bilhões. Em janeiro, decretos estipularam redução de R$ 1,5 bilhão por ano nos gastos de custeio e pessoal, nas secretarias e em outros órgãos da administração direta do estado.

José Serra - Vamos ocupar-nos da crise, não a crise de nós

- O Estado de S. Paulo

Nas próximas semanas o Congresso Nacional se pronunciará sobre um projeto de lei que, se for aprovado, dará início a mudanças profundas na política brasileira: a implantação do voto distrital nas cidades com mais de 200 mil eleitores. Nesses municípios - cerca de 90 - vivem 38% dos eleitores brasileiros. A chance de esse projeto ser aprovado é grande, até porque a mudança pode ser feita por lei ordinária, aprovada por maioria simples no Senado e na Câmara.

Tomemos como exemplo a cidade do Rio: se o projeto virar lei, ela será eleitoralmente dividida em 51 distritos, de aproximadamente 95 mil eleitores. Cada um deles elegerá um vereador. Como consequência, os custos de campanha cairão vertiginosamente, aumentará a representatividade do vereador e o eleitor dos distritos poderá acompanhar o atuação do eleito. Esse novo sistema tem tudo para dar certo e para influenciar a redefinição do processo de escolha de deputados estaduais e federais.

Esse projeto de lei sobre o voto distrital é um dos seis que já encaminhei no Senado. Propus ainda a extinção das Mesas das casas legislativas brasileiras: Câmaras municipais, Assembleias Legislativas, Câmara dos Deputados e Senado. Por quê?

Em países como EUA e Chile, a direção dos respectivos Parlamentos é exercida pelo presidente eleito por seus pares, que escolhem também um ou dois vice-presidentes. E pronto! No Brasil, a tradição e a prática levam à eleição de um time completo. Em todas as casas legislativas há um presidente, vice, secretários e suplentes. A cada dois anos é feita uma composição entre partidos e indivíduos, dando margem a um troca-troca na repartição dos cargos que nada tem que ver com os eleitores, com o interesse público ou com programas de governo.

E tudo isso para quê? Para nada, exceto aumentar as despesas, pois o parlamentar que integra a "Mesa" dispõe de mais funcionários, nomeações e outras regalias. Ironicamente, aqueles que trabalham com seriedade, e são muitos, empregam seu tempo em atividades administrativas rotineiras que nada têm que ver com seus eleitores e deveriam ser exercidas pela burocracia dos Legislativos.

O terceiro projeto apresentado estabelece que a receita do PIS-Cofins cobrado sobre as atividades de saneamento básico seja investida no setor e no Estado onde foi gerada. É isto mesmo: por incrível que pareça, existe hoje uma tributação mórbida que incide sobre as empresas que cuidam da água e do esgoto. São R$ 2 bilhões por ano, surrupiados de atividades essenciais para a saúde da população.

O quarto projeto cria a Nota Fiscal Brasileira (NFB), baseada na experiência da Nota Fiscal Paulista. Neste caso, trata-se da devolução aos consumidores de 30% do imposto estadual ao valor adicionado (ICMS) nas vendas a varejo. Pois bem, a NFB permitirá que seja devolvido pela Receita Federal o equivalente à metade do crédito já concedido pelo Estado. Essa contrapartida ampliará o estímulo à exigência de notas fiscais e diminuirá ainda mais a sonegação. A arrecadação como um todo cresce, enquanto a carga tributária individual diminui.

O quinto projeto aborda uma questão crítica da economia brasileira, talvez a principal: a fragilização wagneriana da Petrobrás, no bojo não apenas da corrupção como método de governo, mas também, e sobretudo, do irrealismo e até da irresponsabilidade do planejamento dos investimentos da empresa.
Um aspecto desse processo sempre me chamou a atenção pela sofisticação da inépcia e pela utilização do patrimônio público para fins puramente eleitorais: a implantação do método da partilha na exploração das reservas do pré-sal. Isso foi inventado em 2009/2010 com o propósito de servir à eleição presidencial, pois poderia facilitar aquela polarização que o marketing petista inventou e procurou exacerbar entre "nacionalistas" e "entreguistas" para satanizar adversários.

A partilha sempre foi uma falsa opção porque o método das concessões, estabelecido durante o governo FHC, funciona muito bem do ponto de vista da prospecção, da exploração, das receitas obtidas e dos interesses nacionais. O mais grave, porém, não foi o novo método, mas a obrigação imposta à Petrobrás de assumir a exclusividade na operação de cada novo poço aberto e aportar, no mínimo, 30% dos investimentos necessários. O projeto lei que já apresentei suprime essas duas obrigatoriedades, que agravaram os problemas financeiros e administrativos da empresa. E isso se deu num contexto de represamento oportunista dos preços dos combustíveis e de investimentos desastrados, como no caso das refinarias. O resultado foi o endividamento exponencial da Petrobrás e, aspecto menos lembrado, o atraso de cinco anos na exploração de reservas existentes.

Por fim, elaborei um projeto impondo limites ao endividamento da União, exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal que até hoje, passados 15 anos, não foi cumprida. Estados e municípios têm limites para suas dívidas consolidadas, mas o governo federal, não. Obtive apoio da maioria dos senadores para desarquivar um projeto de resolução (PRS) de 2007. Meu projeto será apresentado como substitutivo a esse PRS.

O objetivo é coibir abusos dos governantes de plantão, melhorar as condições de solvência do setor público, facilitar o equilíbrio de longo prazo das contas públicas e reduzir as despesas com juros. Os limites impostos envolverão a dívida líquida e a dívida bruta da União, como proporção de suas receitas líquidas.

Faço o rol desses projetos, entre outros que vou apresentar, para demonstrar que é, sim, possível estabelecer uma agenda virtuosa quando se sabe para onde se quer ir. Preocupa-me o clima de pessimismo, que vejo aqui e ali, como se o Brasil vivesse uma espécie de mal-estar da abastança, próprio de um país que tivesse resolvido todos os seus problemas e pudesse se entregar ao luxo do tédio. Não! Existe, sim, muito por fazer, desde que se tenha clareza de propósitos. Vale dizer: nós vamos ocupar-nos da crise, não a crise de nós. Não temos tempo de alimentar o tédio. Temos a urgência das mudanças, em muitas frentes de batalha. À luta!

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*José Serra é senador (PSDB-SP)

Merval Pereira - Governo sem rumo

- O Globo

A tensão política só faz aumentar em Brasília, e reflete a disputa intestina dentro de um governo sem rumo e sem liderança. A coalizão governista, artificialmente montada, desmonta-se a olhos vistos sem que exista alguém que possa dar um destino, um caminho, para a rearrumação da casa.

Há exemplos de desencontros por todos os lados, e necessariamente a presidente Dilma está no centro de todos eles, em vez de guia tornando-se descaminho. Pode ser que eu tenha perdido alguma coisa, mas há alguma explicação lógica para que uma decisão tomada em novembro do ano passado possa ser desautorizada quatro meses depois pelo mesmo governo?

A repactuação da dívida dos estados e municípios foi feita durante a campanha eleitoral, e seria até normal que a presidente, para agradar cabos eleitorais importantes, tivesse prometido o que não poderia fazer. Eleita, porém, poderia simplesmente não sancionar o projeto, afirmando que os tempos eram outros. Seria mais um estelionato eleitoral, mas teria nexo.

Do jeito que foi feito, parece que só quando o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, chegou ao governo é que os desmandos foram identificados. Nesse caso, a situação é mais grave do que parece. Se for verdade, Dilma estava convencida, até a chegada de Levy, de que a renegociação da dívida era perfeitamente possível, e que outras medidas que hoje o seu novo governo renega estavam certas.

Quando ela diz que fez tudo certo no primeiro mandato, não estaria mentindo, mas reafirmando convicções. Nesse caso, a continuação no cargo é um perigo potencial de repetição dos mesmos erros caso um dia a economia se recupere ainda em sua gestão.

E quando o ministro Joaquim Levy classificou de "brincadeira" a desoneração da folha de pagamentos de várias empresas, não estava fazendo uma metáfora, estava apenas revelando a qualidade das decisões econômicas tomadas pela equipe de Mantega e sua nova matriz econômica.

O que dizer do plano maquiavélico de usar mais uma vez o hoje ministro Kassab para criar um novo partido, o PL, que se fundiria ao PSD e assim permitiria que muitos deputados e senadores hoje no PMDB o deixassem, enfraquecendo-o na coalizão governista?

Como não são bobos, os líderes do partido viram longe a situação e começaram uma rebelião interna que não tem hora de acabar. Ainda mais quando detectam que a própria presidente Dilma participou diretamente da manobra, não sancionando a lei aprovada pelo Congresso que a impediria.

O tiro deve sair pela culatra, primeiro porque o PL acabou se inscrevendo no Tribunal Superior Eleitoral sem o número mínimo de assinaturas, prometendo remetê-las depois. Mas a impugnação da nova legenda, que parece provável, não apaga o fato de que o Palácio do Planalto continua tentando neutralizar a força do PMDB, que já sentiu para que lado o vento sopra e começa a saltar do barco, não como quem foge acovardado, mas como quem enfrenta os desmandos da capitã, afinal identificada como incapaz de levar o barco nessa tempestade que enfrenta.

A necessidade identificada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, de haver um plano econômico abrangente que possa dar um rumo à economia, e não apenas cortes de gastos que atingem os cidadãos mais desprotegidos e as empresas que geram empregos, é correta e vai ao encontro do que tem cobrado o presidente do PSDB, senador Aécio Neves.

Está também correta a exigência do PMDB de que o governo reduza para 20 o número de ministérios e corte os cargos em comissão de provimento direto, que são cerca de 25 mil DAS. Só que é uma ação populista, pois foi o mesmo Renan Calheiros, juntamente com Eduardo Cunha, que aceitou que os partidos políticos mais que dobrassem a verba do Fundo Partidário e aumentassem as verbas dos parlamentares.

É como diz o ditado: em casa em que falta pão, todos brigam e ninguém tem razão. No país desgovernado, faltam pão e quem dê o rumo.

João Bosco Rabello - Tentação e risco

- O Estado de S. Paulo

A prevalecer a leitura de que a lei que impõe quarentena de cinco anos para fusões entre partidos, aprovada pela Câmara no início da legislatura, pode não se aplicar ao PL, que formalizou anteontem seu pedido de refundação, a presidente Dilma poderá ter ampliado seus problemas no Congresso.
Dilma só sancionou a lei ontem, depois que o PL deu entrada no seu pedido, indicando que esperou esse ato antes. Desconfia-se que o PL pode ficar de fora da restrição da lei sancionada após ter pedido o registro, porque a lei não pode retroagir para prejudicar.

Como a Lei só é Lei depois da sanção presidencial, o partido estaria fora de seu alcance e, assim, poderia fundir-se ao PSD, como originalmente concebido pelo ministro das Cidades, Gilberto Kassab, para ira dos peemedebistas. Esse plano ajudou a eleger Eduardo Cunha presidente da Câmara.
Mesmo feitas as avaliações jurídicas e descartada a possibilidade de fusão, a demora na sanção está, para o PMDB, definitivamente vinculada à intenção de manter o projeto de Kassab viável. O que o partido atribui ao ministro Aloísio Mercadante.

A ter razão o PMDB, chega-se à conclusão de que a presidente Dilma Rousseff decidiu correr os riscos de esgotar as possibilidades de se livrar do jugo do aliado, hoje em oposição ao seu governo. Seria uma cartada final, antes de materializar o diálogo que passou a pregar diariamente.

Talvez porque a presidente veja na troca com o PMDB uma capitulação e não uma aliança para ir adiante no resgate de seu governo. Se estiver raciocinando pela cartilha do PT, de fato, não há expectativa que se justifique com relação ao PMDB.

De imediato, o PMDB deverá impor mais derrotas políticas à presidente, para demonstrar controle da base e força maior que o PT nesse momento. E é esse momento que deve importar para a presidente, porque o tempo conspira contra ela.

Não é de se imaginar que o Planalto ainda trabalhe com ao cenário de derrocada do PMDB por conta dos inquéritos abertos contra parlamentares no Supremo Tribunal Federal, para retomar sua condição impositiva na relação.

Os inquéritos dão razoável tempo a Cunha e ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), algo que pode passar de dois anos, o que torna o tempo um problema presidencial, não do legislativo.
Além disso, por mais sedutora que seja a tese de um partido igual ou maior que o PMDB, a tendência é que ele venha não a substituir o aliado rebelde, mas somar-se a este, em pouco tempo, como mais um polo de demanda partidária sobre o governo.

O governo precisa começar a dar sinais de autocrítica, como reconhecer que submeter a população e mercado a dietas rigorosas e manter-se obeso vai levar a um impasse de consequências imprevisíveis.
Reacender a briga com a base aliada, através do PMDB, é manter o espírito bélico onde se faz necessária a trégua – aliás, pedida pelo próprio governo. Enfraquecer o PMDB nesse momento, é pauta do PT não de governo.

Bernardo Mello Franco - Regime forçado

- Folha de S. Paulo

Em 1993, os brasileiros decidiram em plebiscito que o país continuaria a ser regido pelo sistema presidencialista. Em 2015, Brasília discute se o parlamentarismo enfim chegou, em uma versão piorada e sem consulta prévia ao eleitor.

A cada derrota de Dilma Rousseff no Congresso, surge alguém para anunciar que a República mudou de regime. O parlamentarismo, que andava esquecido, virou a palavra da moda no governo e na oposição.

A explicação é simples: diante de uma presidente acuada, o PMDB passou a dar as cartas. Com menos de 13% das cadeiras da Câmara, o partido capitalizou a insatisfação geral com o governo e passou a submeter o Planalto às suas vontades.

"Do ponto de vista político-administrativo, nós vivemos no parlamentarismo. A presidente não sabe ainda, mas quem governa o Brasil hoje é Renan Calheiros, na presidência do Senado, e Eduardo Cunha, na presidência da Câmara", provocou o tucano Aécio Neves, na revista "Istoé".

As ações do PMDB têm um objetivo comum: retirar poderes do governo e transferi-los ao Congresso, ou seja, ao próprio PMDB. Os petistas, que reinavam tranquilos há 12 anos, começaram a acusar o golpe.

"Nosso sistema é o presidencialismo de coalizão. O país funciona desse jeito. Nós podemos até discutir uma mudança, mas isso não é cabível neste momento", afirmou ontem o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

Ele disse que a proposta do PMDB para limitar o número de ministérios "fere de morte o presidencialismo". Outros petistas fazem a mesma queixa sobre a chamada "PEC da Bengala", que ameaça tirar de Dilma o direito de nomear mais cinco ministros do Supremo Tribunal Federal.

Para quem está ganhando, o arremedo de novo regime é mais que bem-vindo. "Eles estavam acostumados a ver o Executivo mandando no Legislativo. O que mudou é que agora o Congresso é independente", proclama o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), aliado de Cunha.

Luiz Carlos Azedo - Desmancha sem bater

• A saída de Traumann, o terceiro ministro a deixar a equipe no segundo mandato , mostra que o governo está se autodissolvendo, como leite em pó instantâneo, sem que a oposição tenha a ver com isso

Correio Braziliense

“Jornalista não é notícia”, diz um velho jargão das redações. Quando isso acontece, geralmente a vítima costuma ser o próprio. É caso do ex-ministro-chefe da Comunicação Social Thomas Traumann, que ontem pediu demissão do governo. Em nota oficial, o Palácio do Planalto “agradeceu” a participação do jornalista que entrou no governo como assessor do ex-chefe da Casa Civil Antônio Palocci e acabou sucedendo no cargo a sua chefe imediata, Helena Chagas, depois de cair nas graças da presidente Dilma Rousseff por despachar com ela todo dia.

Traumann é o segundo ministro a pegar o boné em menos de uma semana. O outro foi Cid Gomes, que era o titular da Educação e desembarcou em grande estilo, espinafrando a base do governo em plena Câmara, à qual fora convocado para esclarecer em plenário porque havia dito que na Casa há “300, 400 achacadores”. Traumann deixou o Palácio do Planalto cantarolando no Twitter o samba Novos rumos, de Paulinho da Viola: “Todos os anos vividos/ São portos perdidos que eu deixo pra trás;/Quero viver diferente,/ Que a sorte da gente /É a gente que faz”.

O jornalista assumiu o cargo em janeiro de 2014. Desde 2012, porém, atuava como porta-voz da Presidência. Caiu porque vazaram um documento reservado de sua lavra no qual admitia que a comunicação do governo fora “errada e errática”, mas avaliava que “a crise é maior do que isso”. O documento dizia também que os “eleitores de Dilma e Lula estão acomodados brigando com o celular na mão, enquanto a oposição bate panela, distribui mensagens pelo WhatsApp e veste camisa verde-amarela”.

“Furo” do jornal O Estado de S. Paulo, o texto gerou grande polêmica e atiçou a oposição, que pretendia convocar o ministro para dar esclarecimentos ao Senado. Dividido em três partes — onde estamos, como chegamos até aqui e como virar o jogo? —, propôs que a presidente Dilma Rousseff se exponha mais, o que está sendo feito à risca, em vez de mergulhar e escalar um ministro forte como porta-voz, como fazem os políticos matreiros nas crises bravas.

“É preciso que a PR fale mais, explique, se exponha mais, seja nos quebra-queixos pós-eventos, seja respondendo ouvintes da Voz do Brasil (20 milhões de ouvintes), seja com a mídia tradicional (TV aberta, de preferência), seja com a volta das entrevistas por Facebook. Não importa quantos panelaços eles façam” — preconizava na semana seguinte às manifestações de 15 de março.

O mais grave, porém, foi defender o aparelhamento dos meios de comunicação sob controle estatal, o que já vinha acontecendo, por meio da consolidação de “um núcleo de comunicação estatal, juntando numa mesma coordenação a Voz do Brasil, as páginas de sites, Twitter e Facebook de todos os ministérios, o Facebook da Dilma e a Agência Brasil”. Sugeriu ainda que a publicidade oficial em 2015 fosse focada em SãoPaulo, reforçando as parcerias com a prefeitura: “Não há como recuperar a imagem do governo Dilma em São Paulo sem ajudar a levantar a popularidade do Haddad”.

O ex-ministro da Comunicação Social concluiu o documento com uma citação do rei dom José, que após o terremoto de Lisboa (1755) perguntou ao marquês de Alorna o que podia ser feito. Ele respondeu: “Sepultar os mortos, cuidar dos vivos e fechar os portos”. Quem “morreu” no terremoto que abala o governo Dilma foi Traumann, que desejava voltar para o Rio de Janeiro e pleiteava a condição de gerente de comunicação da Petrobras, cargo que agora subiu no telhado. Foi abatido pelo fogo amigo dos petistas que miram o controle das verbas de publicidade do governo. Dilma ficou possessa com a história.

O grande “mordomo” da caso é o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, sob cuja pasta a cúpula do PT gostaria que o orçamento de publicidade ficasse sob controle. Mas é bem possível que vazamento do documento, que fulminou Traumann, tenha ocorrido na cozinha da própria Secretaria de Comunicação da Presidência. O próprio documento é coisa de quem já não tem acesso ou liberdade para conversar com a presidente da República.

Estão cotados para substituí-lo no posto os jornalistas Kennedy Alencar, que foi assessor de Lula e hoje é comentarista da CBN, e Paulo Moreira Leite, ex-diretor da Isto É em Brasília, apresentador da TV Brasil e colunista do jornal digital Brasil 247. Correm por fora o novo diretor-geral da EBC, Américo Martins, o deputado federal Alexandre Molon (PT-RJ), ligado ao ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e o assessor de imprensa Olímpio Cruz Neto, que hoje acompanha Dilma nas viagens.

A saída de Traumann, o terceiro ministro a deixar a equipe no segundo mandato — o primeiro foi Marcelo Nery, substituído por Mangabeira Unger na Secretaria de Assuntos Estratégicos —, mostra que o governo está se autodissolvendo, como leite em pó instantâneo, sem que a oposição tenha nada a ver com isso.

Jarbas de Holanda - Alívio de um lado, sufoco do Lava Jato, pesquisas e manifestações

• O alívio pelo grau de investimento. E o sufoco com a Lava-Jato, pesquisas e manifestações

A possibilidade de perda do grau de investimento do país se reduziu com a decisão, anteontem, por uma das três grandes agências internacionais de avaliação de risco, a Standard & Poor’s, de mantê-lo, a um degrau do nível de especulativo. Simultaneamente, a nota desta agência para a Petrobras foi rebaixada para esse nível. Com a manutenção do grau de investimento do Brasil, a Standard &Poor’s manifesta aposta na viabilidade de aprovação pelo Congresso das medidas básicas do ajuste fiscal, fazendo referência expressa ao papel do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e contando com forte respaldo (a rigor, incerto) do governo.

Já no plano político, a primeira lista de réus da Lava Jato, com Renato Duque e João Vaccari, e o envolvimento maior de José Dirceu nas investigações, colocou o PT no centro do petrolão. Aproximando-o mais da cúpula dos três governos dirigidos pelo partido. Ao grande desgaste da presidente Dilma com esta relação junta-se o decorrente do avanço dos efeitos da inflação, sobretudo nas camadas de menor renda, combinados com a escalada do desemprego. Num contexto em que o duro ajuste fiscal, necessário para a correção do descalabro das contas públicas no governo anterior, agrava o quadro recessivo com amplo corte de gastos estatais e a inibição de investimentos privados.

Cenário com todos os ingredientes – do megaescândalo de corrupção na Petrobras à incapacidade administrativa, à fragilidade política do governo e à elevada rejeição social à presidente (constatada nas pesquisas do Datafolha e da CNT/DMA, e com provável reiteração na do Ibope, a ser divulgada) – que potencializam as manifestações de protesto da população. Como as novas previstas para o domingo, 12 de abril. Acentuando a necessidade imperativa de mediação político institucional e dos partidos (centralmente o PMDB e o PSDB) por uma saída – provavelmente, ainda, sem o impeachment da presidente –, que evite a explosão de grave crise de governabilidade.

Virada do PMDB chegando a São Paulo
A reorientação do PMDB no sentido do fim da aliança com o PT foi sinalizada, já, na convenção do início do segundo semestre de 2014, quando mais de 40% dos delegados reunidos em convenção se colocaram contra o apoio à reeleição de Dilma Rousseff; ao que se seguiu a montagem de dissidências pró-Aécio Neves por vários diretórios estaduais. Essa reorientação configurou-se claramente na disputa da presidência da Câmara, com a vitória de Eduardo Cunha, baseada na aglutinação do antipetismo dominante entre os deputados. E desdobrou-se em atos das mesas diretoras desta e do Senado, explicados – e basicamente justificados por suas implicações institucionais – como retomada da autonomia do Congresso diante do Executivo, bem como de sua agenda intervencionista e esquerdista. 

Atos dos quais foram e seguem sendo emblemáticas a abertura de uma CPI de deputados sobre o petrolão (não chapa branca como as anteriores), o desencadeamento da reforma política pelo Legislativo, o bloqueio a projetos do lulopetismo para a criação de “conselhos populares” e “controle social” da mídia, o avanço da chamada PEC da Bengala, a devolução ao Palácio do Planalto da MP das Desonerações. E foi progressivamente assumida por meio do lançamento de proposta de redução para 20 ou 25 dos 40 ministérios atuais (39 mais o do marqueteiro João Santana) e corte também nos mais de 20 mil cargos de livre nomeação. Coincidente a da campanha de Aécio, e com a qual a direção do PMDB, à frente Michel Temer, evolui da barganha por “espaço bem maior” na máquina federal, a que é induzida pelo expresidente Lula, para uma séria reestruturação do governo. Buscando, assim, refletir cobranças da sociedade e uma melhoria da imagem (fisiológica) nas elei- ções municipais de 2016.

Tal reorientação vai chegando ao diretório de São Paulo. Sob o impacto do desastre local do petismo no pleito presidencial do ano passado, Lula virou de ponta-cabeça a administração do prefeito petista paulistano Fernando Haddad a fim de atrair com secretarias e outros postos vários partidos, especialmente o PMDB, ao qual, ademais, num acerto com Temer, garantiu a candidatura a vice numa chapa para reeleição de Haddad. Mas esse acerto já ameaça desfazer-se, desmoronar, em face do crescente conflito nacional entre os dois partidos e com os baixíssimos índices de popularidade do prefeito. Que refletem a precariedade de sua gestão e a postura do eleitorado de São Paulo de epicentro do desgaste do governo Dilma e do petismo. Por tudo isso, a sedução daquele acerto para o PMDB começou a erodir-se com a presença de Temer (acompanhado de Gabriel Chalita, feito secretário de Haddad e seu futuro companheiro de chapa) a evento na casa da senadora Marta Suplicy, preparatório, sob medida, da ruptura dela com o PT e de sua candidatura a prefeita pelo PSB.

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Jarbas de Holanda é jornalista