quinta-feira, 2 de abril de 2015

Opinião do dia - Cássio Cunha Lima

O governo perdeu credibilidade porque mentiu para a população durante a eleição.

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Líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB),

Taxa de reprovação do governo Dilma se iguala à do pior momento de Sarney

• Após três meses de 2º mandato, gestão da presidente é considerada ruim ou péssima por 64% dos brasileiros, índice igual ao obtido em julho de 1989 por peemedebista, até então recordista isolado de rejeição na série histórica do instituto Ibope

Daniel Bramatti - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - A taxa de reprovação ao governo federal chegou em março ao ponto mais alto dos últimos 26 anos, de acordo com pesquisa Ibope divulgada ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). A gestão da presidente Dilma Rousseff é considerada ruim ou péssima por 64% dos brasileiros, índice igual ao obtido em julho de 1989 por José Sarney, até então recordista isolado de rejeição na série histórica do instituto.

No levantamento realizado entre 21 e 25 de março – ou seja, após quase três meses de governo no 2.º mandato da petista –, só 12% dos entrevistados disseram ver a gestão como boa ou ótima. Desde dezembro, quando o Ibope fez a pesquisa anterior, a taxa de aprovação ao governo caiu 28 pontos porcentuais. Já a de reprovação subiu 37 pontos.

Além de avaliar o governo federal, o Ibope colheu opiniões sobre o desempenho pessoal da presidente. Nesse caso, 78% disseram desaprovar a maneira de governar de Dilma, e 19% afirmaram o contrário.

O desgaste acelerado de Dilma e de seu governo contrasta com o aumento de popularidade registrado durante a campanha eleitoral do ano passado. Na época, entre junho e setembro, as taxas de aprovação à presidente e ao governo subiram sete e oito pontos porcentuais.

Resgate. A propaganda da campanha havia ajudado Dilma a recuperar parte da popularidade que havia perdido após os protestos de junho de 2013, marcados por manifestações de massa em grandes capitais.

Antes dos protestos, Dilma estava nas alturas: em março de 2013, segundo pesquisa CNI/Ibope, seu governo era aprovado por 63%, taxa superior à obtida, no mesmo período da gestão, por seus antecessores Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

A explosão da impopularidade de Dilma no início de seu segundo mandato já havia sido revelada pelos institutos Datafolha e MDA, na segunda quinzena de março. As taxas de ruim e péssimo apontadas foram de 62% e 65%, respectivamente.

O apoio à presidente sofreu um processo de corrosão após a posse, com o anúncio de medidas de ajuste fiscal que contrariam o discurso de campanha. Somaram-se a isso a corrupção na Petrobrás e as denúncias de que parte do dinheiro desviado foi canalizada para o PT, em forma de doações oficiais ao partido. Em 15 de março, uma multidão foi às ruas mostrar sua insatisfação, na manifestação política mais volumosa em São Paulo desde a campanha das Diretas-Já, em 1984.

Cinema. O ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, comparou ontem a pesquisa CNI/Ibope a uma fotografia “ruim” do atual momento do governo. Ele ressalvou, porém, que o “filme” do segundo mandato será “muito bom”. “O governo tem de ter humildade, trabalho, trabalho e trabalho. Nosso compromisso é com quatro anos – e três meses de governo é o início de um processo. A fotografia não é boa, mas o filme vai ser muito bom”, disse o ministro, durante entrevista coletiva no Palácio do Planalto.

O líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), avaliou a queda na popularidade da presidente como falta de “credibilidade” do governo. “O governo perdeu credibilidade porque mentiu para a população durante a eleição”, disse o tucano.

“Estamos num momento ruim. Não reconhecer isso seria dar uma de avestruz, enfiando a cabeça na areia até a tempestade passar”, disse o senador Paulo Paim (PT-RS). / Colaboraram Rafael Moraes Moura, Lisandra Paraguassu e Nivaldo Souza


Ibope: governo Dilma tem só 12% de aprovação

• É o pior índice da série de pesquisas divulgadas pela CNI; os que acham a gestão ruim/péssima chegam a 64%

Washington Luiz – O Globo

BRASÍLIA - Após um mês com protestos, derrotas no Congresso e demissões inesperadas de ministros, o governo Dilma recebeu ontem mais uma notícia negativa: pesquisa do Ibope, encomendada pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI), mostrou que apenas 12% dos entrevistados consideram o governo "ótimo ou bom", contra 64% de "ruim ou péssimo" (em dezembro, quando foi divulgada a última consulta, o índice era de 27%). É o pior índice da série histórica divulgada pela CNI desde 1995.

Até então, o pior resultado para o mês de março havia ocorrido em 1999, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso teve 22 % de "ótimo ou bom".

Já a aprovação da maneira de governar de Dilma caiu 33 pontos percentuais, passando de 52%, em dezembro, para 19%. Os que desaprovam o governo totalizaram 78%. Quando começou o mandato, em março de 2011, a petista tinha 73% de aprovação.

O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, disse que, diante do resultado, será preciso ter humildade e trabalhar mais. Mercadante afirmou que os números refletem três meses de governo, mas o projeto é de quatro anos. Segundo o ministro, a fotografia mostrada pela pesquisa "não é boa, mas o filme vai ser muito bom".

- O governo tem de ter humildade e trabalho, trabalho e trabalho. Nosso compromisso é para quatro anos, e três meses de governo é apenas o início de um processo. Portanto, a fotografia não é boa, mas o filme vai ser muito bom - disse.

O percentual dos que não confiam em Dilma cresceu de 24% para 74%. Em todas as áreas de atuação avaliadas na pesquisa, a desaprovação é superior a 60%. As questões econômicas aparecem como os fatores com o maior índice de reprovação. As políticas de taxa de juros e impostos são reprovadas por 89% e 90% da população, respectivamente. Já o combate à inflação é reprovada por 84% e as ações na área de saúde por 85%. O Nordeste foi a região onde a presidente teve melhor resultado: 34% de aprovação. No Sul, apenas 8% avaliaram o governo de forma positiva.

Para a oposição, a manutenção de baixos índices de popularidade é sinal de que se cristalizou, na população, o sentimento de falta de competência da presidente para governar. Para o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), a pesquisa consolida o quadro de ingovernabilidade:

- Com mais essa pesquisa, está consolidado o quadro de ingovernabilidade. Por não ter comando, a sociedade não vê condições de Dilma implantar reformas e ajustes necessários para o país. Isso está comprovado com os 74% que não confiam em Dilma - afirmou.

Apenas 24% da população confia em Dilma, diz Ibope

• Percentual de 24% é o mais baixo em 16 anos

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A confiança da população na presidente Dilma Rousseff inverteu-se em quatro anos, segundo pesquisa CNI-Ibope divulgada nesta quarta-feira (1º).

Em março de 2011, início de seu primeiro governo, ela tinha a confiança de 74% da população. Agora, o mesmo percentual diz não confiar em Dilma, contra 24% que dizem confiar na petista.

A sondagem mostra ainda que a reprovação a Dilma chegou a 64%. Na última pesquisa CNI-Ibope, de dezembro, ela tinha 40% de aprovação e 27% de reprovação.

Agora, apenas 12% avaliam o governo positivamente.

O levantamento foi realizado entre 21 e 25 de março com 2.002 pessoas em 142 cidades. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

O ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) afirmou nesta quarta que a fotografia do momento exige do governo "humildade e trabalho".

Mas ponderou: "Três meses de governo é apenas o início. A fotografia não é boa, mas o filme vai ser muito bom".

Ministro - Panelaços não farão a presidente Dilma se intimidar

• Novo ministro da Comunicação social, Edinho Silva reconhece que o governo está 'perdendo a narrativa' da crise política

Marina Dias, Natuza Nery – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Escolhido pelo perfil político para comandar a Secretaria de Comunicação Social, algo inédito na administração Dilma Rousseff, o novo ministro da Secom, Edinho Silva (PT-SP), 49, reconhece que o governo "está perdendo a narrativa" quando o assunto é crise política, mas afirma que os "fatos" falarão mais alto e devolverão à presidente da República a popularidade perdida.

Em sua primeira entrevista exclusiva, Edinho, como é conhecido pelos colegas no PT, afirma que a presidente da República não se assustará diante de protestos contra sua administração.

"Ela [Dilma] já colocou sua integridade física a serviço desse projeto, não é panelaço que vai fazer a presidente se intimidar", diz.

Homem de confiança de Lula e aposta dos petistas para melhorar a relação entre o ex-presidente e Dilma, Edinho terá assento na coordenação do governo, o grupo que toma as principais decisões políticas na gestão.

Ele promete critérios técnicos na distribuição de verbas publicitárias, sem privilegiar veículos de comunicação alinhados com o Planalto.

Confira a seguir os principais trechos:

Folha - O PT defende que recursos publicitários irriguem mais veículos de comunicação afinados com o governo. Concorda?

Edinho Silva - Os critérios estabelecidos são técnicos e vou segui-los. Mas quero racionalizar a execução orçamentária [a verba é de cerca de R$ 200 milhões ao ano] para ampliar ao máximo a extensão de nossas campanhas. Quanto mais você conseguir que recursos cheguem a vários veículos, a comunicação se torna mais eficiente.

Mas hoje há um descasamento entre audiência e dinheiro recebido...

Sou um ministro que teve uma história de vida vinculada ao PT, mas assumo a Secom para fazer a gestão dos recursos públicos pautado pelos interesses públicos. Pedi um levantamento da composição dos critérios da mídia técnica e, se há distorções, que a gente possa atualizar.

A presidente sugeriu um aumento de verbas publicitárias. E o ajuste fiscal?

O que a presidente quis expressar é que há uma necessidade de o governo se comunicar e a comunicação não é pautada só pela publicidade. Pensar isso é um erro. A comunicação efetiva se dá no cotidiano. O governo tem que dialogar o tempo todo com a sociedade.

A avaliação geral na classe política é de que o governo se comunica muito mal.

O governo se comunica dentro da realidade que está vivendo. Por estarmos em um momento de muita turbulência, muitas vezes o governo não consegue fazer chegar à sociedade todas as informações necessárias. Mas não quero lançar iniciativas olhando pelo retrovisor. O que foi feito, foi feito. Vou me nortear por alguns princípios: valorizar os veículos de comunicação, construir uma estrutura na qual todas as demandas sejam atendidas e unificar a comunicação do governo. Se os ministros não falarem a mesma linguagem, é evidente que vamos falhar na comunicação.

Seu antecessor, o ex-ministro Thomas Traumann, pediu demissão após um documento interno da Secom dizer que há um "caos político". Há?

Não li o texto.

Ah, ministro, por favor!

Não li e não me interessa ler. Quando se olha muito pelo retrovisor, você bate o carro. Vejo um momento de turbulência política, isso é inegável, que precisa ser trabalhado politicamente com diálogo.

O texto também defende o uso de robôs que atuaram na eleição para multiplicar notícias positivas sobre o governo. Vai usar robôs nas redes sociais?

Não. O governo utiliza as redes sociais da forma institucional. Os robôs são usados no submundo da internet e essa não pode ser a esfera de atuação de um governo.

O documento também diz que "a comunicação é o mordomo da crise". Vivemos em uma crise. Por que então aceitou esse, digamos, "abacaxi"?

Tenho um compromisso com esse projeto político que é o projeto da minha vida. Sei que não é tarefa fácil, mas jamais recusaria uma missão em um governo liderado pela presidente Dilma.

Acha que o desgaste do governo está ligado à deterioração de imagem que o PT sofreu após o mensalão e a corrupção na Petrobras?

Os fatos precisam falar mais alto e serem mais sólidos do que as narrativas. Acredito que, no médio prazo, serão. Qual fato existe contra o governo Dilma?

Nenhum. Portanto, o que estamos perdendo é a narrativa, porque não há fato contra ela. O enfrentamento só interessa à oposição. É na calmaria que esse governo vai deslanchar e as informações vão chegar sem ruído à sociedade.

Os panelaços intimidam Dilma?
Nada intimida a presidente da República. Quem já passou por tudo o que ela passou... não é uma crise conjuntural que vai intimidá-la. Ela já colocou sua integridade física a serviço desse projeto, não é panelaço que vai fazer a presidente Dilma se intimidar.

Como o governo tem que comunicar o ajuste fiscal?

Tem que fazer a informação chegar da forma mais simples possível. Ajuste fiscal não é programa de governo, são medidas a serem tomadas para que a economia possa crescer de forma sustentável, gerando emprego e distribuindo renda.

Maior ala do PT faz críticas ao ajuste fiscal

• Grupo majoritário dentro do partido lamentou que o peso das medidas tenha "recaído mais sobre os trabalhadores"

• Documento feito para congresso da sigla, porém, nega que Dilma tenha promovido um "estelionato eleitoral"

Catia Seabra, Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Em documento divulgado nesta quarta-feira (1º), a chapa PMB (Partido que Muda o Brasil), maior força interna do PT, fez críticas ao modelo de ajuste fiscal proposto pela gestão Dilma Rousseff (PT).

O grupo majoritário --formado pelas correntes CNB (Construindo um Novo Brasil), Novo Rumo e PTLM-- lamentou que o peso das medidas econômicas tenha "recaído mais sobre os trabalhadores do que sobre outros setores das classes dominantes".

Elaborado para o 5º Congresso do PT, que será realizado em junho, o manifesto questiona ainda por que a sociedade não foi previamente consultada sobre o ajuste fiscal do governo petista.

"Essas práticas foram em grande parte responsáveis pelo mal-estar de muitos movimentos sociais que lutaram pela eleição da presidente e que, hoje, se encontram perplexos e frustrados com as primeiras medidas", avalia.

O texto, no entanto, defende a presidente ao negar que Dilma, ao propor mudanças econômicas, tenha cometido "estelionato eleitoral", e garante que ela não renunciou às promessas feitas na campanha eleitoral.

"Faltou explicar, contudo, e no momento adequado (talvez antes mesmo do 1º de janeiro), que não era mais possível continuar aplicando, da mesma forma, as políticas contra cíclicas adotadas no primeiro mandato", pondera.

A maior chapa do partido admite que as recentes denúncias de corrupção "acabaram por golpear duramente a imagem da legenda" e defende que a sigla "não pode cair nessa vala comum".

"É imprescindível que a continuada ação dos poderes da República e a própria vigilância do partido cortem a corrupção na sua raiz, se necessário na própria carne. O PT necessita sair das páginas policiais do noticiário e ficar apenas naquelas dedicadas à política", ressalta.

Na avaliação do grupo majoritário, o "fenômeno da corrupção" poderia ter sido enfrentado de maneira distinta caso fosse realizada uma reforma política no país.

O texto coloca ainda como um desafio para o partido entender como a mobilização que garantiu a reeleição da presidente foi revertida em "tão curto prazo".

"Parte da maioria que elegeu a presidente está perplexa e desmobilizada", admite.

As críticas ao governo federal também foram vocalizadas em documento divulgado pela tendência Mensagem ao Partido, a segunda maior força interna da sigla.

Segundo o texto, o segundo governo da presidente teve início com uma "clara inflexão conservadora" que, na avaliação da corrente interna, é "contraditória" ao programa eleitoral apresentado pela então candidata petista.

"É preciso superar esse impasse ou o segundo governo trabalhará, na melhor das hipóteses, com um cenário de baixo crescimento [da economia] e eventual crescimento do desemprego", ressalta.

Para a tendência petista,"os maiores erros" nos últimos anos, e que "podem se repetir agora", foram cometidos pela gestão do Banco Central. "Desestabilizou tentativas de retomada econômica, onerando a carga fiscal."

Lula volta a criticar a condução do governo

• Petista reclamou mais de Aloizio Mercadante

Catia Seabra e Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Em mais um sinal de insatisfação com o governo Dilma Roussef, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou, na noite de terça-feira (31), o desempenho dos ministros que compõem a chamada "cozinha" do Palácio Planalto _ os que cercam a petista em seu dia-dia.

Numa conversa com sindicalistas, Lula reclamou especialmente do chefe da Casa Civil, Alozio 
Mercadante.

O desabafo aconteceu na quadra do sindicato dos bancários, minutos antes de um ato organizado pelos movimentos sociais em defesa da presidente Dilma Rousseff.

Os sindicalistas se queixaram da permanência de Manoel Dias, do PDT, à frente do Ministério do Trabalho e reivindicaram maior espaço.

Segundo participantes da conversa, Lula alegou que não adianta mudar a configuração da Esplanada enquanto Dilma mantiver a atual equipe na articulação política do governo.

Na conversa, os sindicalistas afirmaram que são recrutados para defender governo, mas nunca ouvidos para a tomada de decisões. Lula reproduziu a queixa em seu discurso, momentos depois.

"Dilma, se estiver ouvindo, gostaria de dizer o seguinte. Você precisa lembrar sempre que quem está aqui é o seu parceiro, nos bons e nos maus momentos. A gente não quer ser convidado só para festa, não. A gente quer ser convidado para discutir coisas sérias, para fazer boas lutas e boas brigas".

Concentração
Cercado por um pequeno grupo de sindicalistas, Lula disse ainda que a presidente precisa superar problemas no relacionamento com o Congresso e se aproximar dos movimentos sociais em vez de ficar isolada no Palácio.

Na véspera, numa reunião com dirigentes petistas, Lula também reclamou da concentração de poder nas mãos de Mercadante. Ainda segundo participantes, Lula disse que Dilma é asfixiada por assessores, e algumas de suas sugestões são ignoradas.

Corrente de Lula no PT quer programa emergencial para governo sair da crise

• Manifesto pede mudanças em ajuste fiscal e diz que o partido precisa se 'reinventar'

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Em documento intitulado "Manifesto", a corrente Construindo um Novo Brasil, majoritária no PT, convoca os partidos de esquerda, os movimentos sociais e os intelectuais a contribuírem com um "programa emergencial para sair da crise". Ao fazer um mea-culpa por muitas das turbulências do atual cenário político, a tendência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirma que o PT precisa se "reinventar" e defende mudanças no ajuste fiscal proposto por Dilma Rousseff.

"Não se pode fazer da necessidade de sanear a situação fiscal a ocasião para a apologia de uma política econômica conservadora, cujas consequências bem conhecemos", diz um trecho do documento, ao qual o Estado teve acesso.

O manifesto será debatido no 5.º Congresso do PT, que vai discutir os rumos do partido e do governo Dilma entre os dias 11 a 13 de junho, em Salvador (BA). Após os escândalos de corrupção que abalaram a imagem do PT, os petistas admitem que o partido ficou "prisioneiro" do "presidencialismo de coalizão", passa por uma "crise de identidade" e necessita mudar.

A ser apresentado como "tese" da CNB e de outras correntes que apoiaram Rui Falcão para o comando do PT, o documento critica as medidas que reduzem os direitos trabalhistas, como o seguro desemprego e o abono salarial.

"O governo está pressionado pela necessidade de uma solução de curto prazo para seus problemas fiscais. Os meios econômicos e financeiros internacionais querem que o "ajuste" seja o ponto de inflexão de nossa política econômica em direção ao conservadorismo. (...) Esse movimento não se pode fazer confrontando os trabalhadores", insiste a tese.

O texto foi escrito por Falcão e pelo assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia. Ao convocarem as "esquerdas" e os "democratas" para a construção de um programa de emergência, os grupos que detêm a hegemonia do PT pregam a formação de uma frente para impedir "o avanço da direita" e dizem que o partido precisa "voltar às ruas".

O manifesto não menciona como deveria ser o programa, mas diz que "um fator de enorme convergência de todos esses setores é, sem dúvida, a figura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a maior liderança popular das últimas décadas da história brasileira".

Dilma e Vaccari. Com um tom bem mais ácido, o documento produzido pela corrente Mensagem ao Partido, grupo do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirma que o segundo mandato de Dilma começou com "uma clara inflexão conservadora na gestão macroeconômica, contraditória com o programa eleito".

Redigido pelo ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro, o texto "Mudar Mais: por um ciclo de mudanças democráticas no País" diz que os maiores erros, nos últimos anos, foram cometidos pelo Banco Central, define a taxa básica de juros (Selic) como "escandalosa" e cobra a rejeição das tentativas de desmontar a política de desenvolvimento.

"É preciso superar esse impasse ou o segundo governo Dilma trabalhará, na melhor das hipóteses, com um cenário de baixo crescimento e eventual crescimento do desemprego (...), em um contexto de ajuste fiscal vicioso", destaca o documento da Mensagem ao Partido.

Mesmo sem citar o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, o grupo de Cardozo e Tarso deixou claro que defende o afastamento do dirigente. Vaccari se tornou réu numa ação penal da Operação Lava Jato, acusado de participar do esquema de desvio de dinheiro na Petrobrás. Ele responde a processo por corrupção e lavagem de dinheiro e nega as denúncias.

"(...) Combateremos sem trégua a corrupção, a conciliação com a corrupção e a convivência com a corrupção. Além disso, filiados com função dirigente na condição de réu ou sob inquérito criminal em processos de apuração de corrupção devem ser afastados preventivamente, garantindo direito de defesa, enquanto perdurar esses processos", diz o texto.

Há três dias, Tarso já havia externado sua opinião sobre a necessidade de afastamento de Vaccari. "Se ele não se afastar, o PT terá de fazer o afastamento preventivo", argumentou o ex-governador.

Embora petistas estejam pressionando Vaccari a deixar o cargo, a corrente dele (CNB) no espectro ideológico do petismo não foi tão explícita como o grupo de Tarso e Cardozo. Ao mencionar que é imprescindível cortar a corrupção "na raiz", e, se necessário, "na própria carne", o manifesto fez, porém, uma advertência. "O PT necessita sair das páginas policiais do noticiário e ficar apenas naquelas dedicadas à política, onde tem muito a dizer", observou.

Produção industrial volta a cair e reforça previsão de PIB negativo

• Perda foi de 0,9% entre janeiro e fevereiro e de 9,1% em relação a 2014

Clarice Spitz – O Globo

Depois de uma leve trégua em janeiro, a produção industrial brasileira voltou a registrar resultado negativo em fevereiro. A queda de 0,9% frente ao mês anterior, segundo a Pesquisa Industrial Mensal, do IBGE, foi menor do que as projeções de analistas, que esperavam -1,5%. A revisão do resultado de janeiro - a alta de 2% baixou para apenas 0,3% - ajudou a amenizar a queda de um mês para o outro.
Já na comparação com fevereiro de 2014, a produção foi 9,1% menor, na décima segunda queda consecutiva e a mais intensa desde julho de 2009. A retração mais acentuada de bens de capital, que sinalizam os investimentos, aliada à uma deterioração da confiança de empresários, ao aumento do desemprego e à elevação dos estoques indicam um primeiro trimestre negativo para o Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país).

Máquinas e equipamentos: -25%
Para o economista Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria, estima queda de 1,5% para a produção industrial e recuo de 2% no PIB do primeiro trimestre, puxados pela indústria de transformação e pela construção civil.

Nas projeções do economista do Bradesco Igor Velecico, a produção industrial deve fechar o primeiro trimestre com queda de 2,6% frente aos últimos três meses de 2014. Velecico lembra que os dados da produção industrial de fevereiro mostraram queda nos insumos para construção civil e bens de capital, exatamente os setores que ganharam peso na nova metodologia do IBGE para cálculo do PIB. A produção de bens de capital (máquinas e equipamentos, que são um termômetro dos investimentos) caiu 4,1% frente a janeiro e 25,7% na comparação com fevereiro do ano passado. Com isso, ele espera queda de 0,7% no PIB do primeiro trimestre ante o quarto trimestre de 2014.

- Apesar da média da indústria vir melhor, os investimentos parecem ter uma tradução pior para o PIB, seja pelos bens de capital como pelos insumos típicos da construção, que estão em um nível 6% pior do que a média de 2014 - afirma Velecico.

Segundo o estrategista-chefe do banco Mizuho Luciano Rostagno, os indicativos são de forte contração na indústria no primeiro trimestre. Ele estima uma queda de 2% no primeiro trimestre em relação ao último.

- A alta dos juros, o aperto fiscal, a inflação alta e o aumento do custo da mão de obra têm reduzido a margem de lucro das empresas. No primeiro trimestre, o setor industrial, a construção estão cortando forte, o cenário é de alta do desemprego.

O cenário negativo da indústria contou com a deterioração de indicadores como o emprego, a confiança e os estoques. O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostrou fechamento de 25,8 mil vagas na construção civil em fevereiro. Dados de março da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostram queda de 9,2% no índice de confiança da indústria, e a Sondagem da Confederação Nacional da Indústria (CNI) apontou estoques maiores em fevereiro.

A pesquisa mostrou recuo generalizado de categorias de uso. Dos 805 produtos pesquisados, 70,2% caíram em relação a 2014, a maior disseminação negativa desde o início dessa série, em janeiro de 2013. Foram destaques negativos veículos automotores, reboques e caminhões (-30,4%), equipamentos de informática (-33,9%) e confecção de artigos de vestuário (-19,7%).

Para o gerente da pesquisa, André Macedo, a queda da indústria pode ter sido potencializada pela greve de caminhoneiros e pelo feriado de carnaval. Ele admite, porém, que, há uma clara "trajetória descendente da produção industrial".

Empresas de telefonia demitem 3.700

Bruno Rosa – O Globo

O emprego no setor de telecomunicações no Brasil sofreu um baque neste início de ano. O processo de fusão entre as empresas de telefonia e a contração da economia brasileira já resultaram na demissão de ao menos 3.700 funcionários da Telefônica Vivo, da Nextel e da Oi em todo o país. E o fechamento de vagas pode aumentar. Com a compra da GVT pela Telefônica, fontes do mercado estimam que os cortes devem oscilar entre 4.500 e 5 mil, como reflexo da união das duas operadoras. No grupo América Móvil, que está unificando as atividades de Embratel, Claro e Net, a expectativa é a mesma: redução no quadro de colaboradores nos próximos meses.

Por lado outro, especialistas em defesa do consumidor e do setor de telecomunicações temem que a qualidade no serviço prestado pelas empresas possa ser afetada com o grande volume de demissões, que eles consideram como o maior desde a privatização do setor, em 1998. Almir Munhoz, presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores de Empresas de Telecomunicações (Fenattel) e do Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações de São Paulo (Sintetel), diz que está preocupado com a onda de fusões.

- As demissões são causadas por todas as fusões que estão acontecendo, o que é preocupante. Além disso, todos os setores da economia estão demitindo, como montadoras, comércio e bancos. Então, o momento é esse - disse Munhoz. - Estamos atentos às demissões e conversando com as companhias para o volume de cortes ser o menor possível.

Ontem, a Oi demitiu 1.070 funcionários, reduzindo, assim, em cerca de 20% suas despesas com pessoal neste ano. A empresa, que cita, em nota, o ano de 2015 como "desafiador em todo o contexto macroeconômico do país e também no setor de telecomunicações", ainda congelou todas as vagas que estavam em aberto neste ano. A maior parte dos desligamentos ocorreu no Rio. Para compensar, a empresa estendeu benefícios como plano de saúde e seguro de vida por até quatro meses para os demitidos.

Na Oi, luz é desligada às 19h
A companhia carioca disse ainda que estão em curso 250 ações para reduzir seus custos. Na lista, estão a redução dos gastos com viagens aéreas e deslocamentos de táxi, controle rigoroso da jornada de trabalho, renegociação de contratos com fornecedores e o corte de fornecimento de energia elétrica às 19h.

Na Nextel, foram demitidos em fevereiro 1.500 funcionários do setor de Call center . Desse total, mil estavam em São Paulo e 500 no Rio de Janeiro. Munhoz, do sindicato, lembrou que a empresa decidiu terceirizar a central de atendimento e transferir para o Piauí. Em nota, a Nextel disse que "reestruturou sua área de serviço de atendimento ao cliente com o objetivo de otimizar recursos e consolidar um modelo sustentável para suas operações".

Na Telefônica Vivo, já foram 1.200 demissões. Segundo uma fonte, parte foi ocasionada pelo programa de demissões voluntárias (PDV). Mas, agora, com a união com a GVT, mais cortes já são esperados. Em nota, a Telefônica disse que os ajustes foram feitos em São Paulo, Rio e Minas Gerais. Em relação às demissões de 4.500 a 5 mil com a união com a GVT, a empresa disse que "não há qualquer definição".

- As demissões vão atingir a Vivo e a GVT. A GVT tem 4.500 funcionários no Call center e mais 7 mil instaladores (funcionários de rua). Parte disso deve ser terceirizada, assim como ocorre com a Vivo - disse uma fonte do setor que não quis se identificar.

Na América Móvil, funcionários esperam cortes também. Segundo uma fonte, a migração de funcionários da Claro, em Botafogo, para a Embratel, no Centro, já começou. Procuradas, Embratel, Claro e Net afirmaram que não comentam rumores. Com a redução nos quadros, especialistas acreditam em uma queda na qualidade dos serviços. O consultor Virgílio Freire afirma que, ao terceirizar, as empresas passam a ter problemas de qualidade, já que muitas subcontratam outras companhias com profissionais sem a devida qualificação.

O advogado João Luiz Mendonça, especialista em defesa do consumidor, também vê o quadro com preocupação.

- Como as empresas vão melhorar a qualidade do serviço se estão demitindo e cortando todos os custos? A conta não fecha. Por isso, o consumidor deve sempre reclamar se estiver insatisfeito com o serviço prestado - disse ele.

Queiroz Galvão demite em obra da Rio 2016

• Setenta já foram dispensados, e outros mil podem ser desligados. Obra olímpica corre risco de atraso

Danilo Fariello – O Globo

BRASÍLIA - A Queiroz Galvão demitiu ontem cerca de 70 funcionários e colocou em aviso prévio mais de mil trabalhadores do Complexo Esportivo de Deodoro, local que sediará 11 modalidades das Olimpíadas no próximo ano. A obra teve início em 2014 e será convertida em um parque depois dos Jogos, mas há atrasos em pagamentos referentes à construção desde janeiro.

Do total de trabalhadores avisados sobre o risco de demissão ontem, cerca de 500 cumprirão os 30 dias de aviso prévio previstos em lei e outros 500 foram comunicados informalmente, uma vez que estão em período de experiência e podem ser desligados mais rapidamente. Estes foram avisados ontem de que podem ser afastados já na próxima semana se não houver perspectiva de pagamento.

Responsável pela obra, a construtora vem sofrendo com atrasos em pagamentos devidos pela Prefeitura do Rio, que repassa recursos federais para o empreendimento. Segundo fontes do mercado, a Queiroz Galvão teria recebido no começo do ano um único pagamento, de cerca de R$ 60 milhões. Outros R$ 80 milhões já deveriam ter sido pagos à empresa desde o começo do ano por avanços na obra, com orçamento total de R$ 640 milhões.

Risco de atrasos
O ritmo do empreendimento está adequado para sua conclusão antes dos Jogos. No entanto, se os pagamentos não forem colocados em dia até o fim de abril, os funcionários em aviso prévio poderão ser dispensados a partir dos próximos dias, começando por aqueles em experiência.

Os mil trabalhadores informados ontem sobre a situação do consórcio, composto por Queiroz Galvão (99%) e OAS (1%), compõem praticamente toda a mão de obra envolvida diretamente na construção do complexo. As demissões, portanto, colocariam em risco a sua conclusão para a realização das Olimpíadas.

A situação do complexo esportivo não é a única em que a Queiroz Galvão vive situação delicada. Pagamentos com origem no orçamento federal também estão em atraso para a conclusão do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) da Baixada Santista, do qual cerca de 450 trabalhadores foram colocados em aviso prévio ontem e mais 70 demitidos. No consórcio estão Queiroz Galvão (66%) e Trail Infraestrutura (34%).

O empreendimento de mobilidade urbana faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e recebeu o último pagamento ainda em 2014. Procurada, a Queiroz Galvão, envolvida na operação Lava Jato, não quis se manifestar.

A Caixa Econômica Federal (CEF) informou que, nos dois empreendimentos, não possui relação direta com os construtores, apesar de repassar recursos. "O banco esclarece que existem recursos disponíveis para liberação na conta dos empreendimentos." A Caixa afirmou ainda que "para as etapas de obras que tiveram projetos alterados, aguarda a regularização da documentação para que possa analisar e liberar os recursos".

A regularização desses documentos seria, portanto, de responsabilidade da Prefeitura do Rio e do Estado de São Paulo. A Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU), que está à frente do VLT, reconheceu que um repasse de R$ 30 milhões da Caixa ainda não foi feito devido a ajustes no projeto. A previsão é de que os pagamentos sejam realizados na primeira quinzena deste mês.

A Prefeitura do Rio inicialmente disse não saber sobre as demissões. Depois, questionada sobre participação de funcionários da Empresa Municipal de Urbanização (RioUrbe) em reunião sobre o tema na segunda-feira, não apresentou nova resposta. O município também não respondeu ao GLOBO sobre os atrasos em pagamentos.

Ministério nega cortes
O Ministério do Esporte informou que "não há nenhum corte de recursos federais para as obras olímpicas" e que "a Caixa aprovou duas medições recentes que somam R$ 25 milhões, cujos pagamentos estão autorizados". De acordo com o ministério, esse novo pagamento para o Complexo de Deodoro "deve ocorrer nos próximos dias".

Segundo o Ministério das Cidades, que acompanha as obras do VLT, nos últimos meses o governo de São Paulo vem "solucionando questões técnicas e contratuais no projeto com a Caixa, o que diminuiu o ritmo da obra". O ministério diz que, até o momento, o governo federal liberou R$ 208 milhões dos R$ 400 milhões prometidos para o VLT. O governo paulista repassou outros R$ 269 milhões, conforme informou a pasta.

Os atrasos em repasses de obras com recursos federais, consequência do aperto fiscal, têm sido percebidos em todo o país, colaborando para a disparada das demissões na construção civil.

Presidente da CPI contraria PT e confirma depoimento de Vaccari na próxima semana

Daniel Carvalho – O Estado de S. Paulo

O isolamento do PT na CPI da Petrobras ficou ainda mais evidente nesta quinta-feira, 2, quando o presidente da comissão instalada na Câmara para investigar o esquema de corrupção na estatal, Hugo Motta (PMDB-PB), confirmou a convocação do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, para prestar depoimento na quinta-feira da próxima semana (dia 9).

A data havia sido anunciada ao final da sessão da última terça-feira (dia 31), pelo primeiro vice-presidente da CPI, Antônio Imbassahy (PSDB-BA), que presidiu a sessão no lugar de Motta, na Itália em viagem pessoal. O anúncio provocou indignação entre os petistas que participam da comissão.

Eles acusaram o tucano de acelerar a ida de Vaccari para que o depoimento do tesoureiro acontecesse antes da manifestação antigoverno marcada para o próximo dia 12 em diversas cidades brasileiras.

"O que chegou até mim foi que o Imbassahy marcou a data da convocação para o dia 9. A decisão dele tem amparo regimental e deve ser respeitada, já que ele estava na condição de presidente no dia que anunciou. É uma praxe minha não desautorizar os demais membros componentes da mesa (diretora da CPI)", afirmou Motta em comunicado. "Manterei o cronograma estabelecido pelo presidente em exercício, Imbassahy, acreditando que Vaccari virá em uma boa hora para a CPI e terá a oportunidade de esclarecer as diversas acusações feitas, inclusive na primeira oitiva realizada por esta CPI".

A reportagem apurou que o anúncio feito por Imbassahy havia sido combinado anteriormente por Motta com os tucanos. Sob influência do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um dos investigados na Operação Lava Jato, o PMDB e a oposição têm se unido nesta CPI para isolar o PT.

Em relação à data, Motta deu esperanças ao PT de que a convocação ficaria para o dia 23, após as manifestações. Na noite anterior ao anúncio da data, o peemedebista chegou a mandar uma mensagem de celular ao relator da CPI, Luiz Sérgio (PT-RJ), em que informou estar tentando postergar o depoimento. No texto, ele afirma que Imbassahy estava "irredutível".

No início da sessão de terça-feira, Luiz Sérgio informou que o depoimento aconteceria no dia 23. A assessoria de Motta chegou a confirmar a data, mas, instantes depois, voltou atrás, deixando a data em aberto e só a confirmando dois dias depois.

Merval Pereira - Uma questão delicada

- O Globo

Para escapar da armadilha do impeachment, que considera aventureiro, e da inércia oposicionista, o deputado federal do PPS Raul Jungmann está empenhado em transformar em debate político a questão da possibilidade de investigação da presidente da República, levando o caso até o plenário do Supremo Tribunal Federal.

Em nome da oposição, ele está entrando com um recurso no STF contra a decisão reiterada do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de não investigar a presidente. Janot se baseia no artigo 86 da Constituição Federal, que diz que "o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções" (CF, art. 86, § 4º). [...]".

No meio desse debate, Janot mudou sua maneira de abordar o assunto, alegando que mesmo que seja superado o óbice constitucional, que segundo ele impede a investigação, não tem "suporte fático" para uma investigação. Na conversa com os representantes da oposição, Janot acrescentou um "por enquanto" que deu esperanças a Jungmann de que, resolvida a questão constitucional, será possível investigar a presidente se novos fatos surgirem nas investigações da Operação Lava-Jato.

Todo grande objetivo da oposição é que a questão seja discutida pelo pleno do Supremo Tribunal Federal, e quem vai decidir é o ministro Teori Zavascki, relator do processo. Ele já deu sua opinião no primeiro despacho, alegando que não apenas a presidente da República não pode ser investigada como não há no momento fatos a serem apurados.

A oposição já entrou com um recurso no STF dizendo que: a jurisprudência defende a investigação; esse é um tema que deve ser decidido pelo plenário; Janot deu tratamento desigual a outros nominados. Jungmann acha que a oposição está a reboque do PMDB, esperando que Eduardo Cunha ou Renan Calheiros criem fatos.

A esperança dele e da oposição é que prevaleça a jurisprudência do Supremo, com base em parecer do decano Celso de Mello, que no Inquérito nº 672/6, disse o seguinte: [...] De outro lado, impõe-se advertir que, mesmo na esfera penal, a imunidade constitucional em questão [aquela do Presidente da República] somente incide sobre os atos inerentes à persecutio criminis in judicio. Não impede, portanto, que, por iniciativa do Ministério Público, sejam ordenadas e praticadas, na fase pré-processual do procedimento investigatório, diligências de caráter instrutório destinadas a ensejar a informatio delicti e a viabilizar, no momento constitucionalmente oportuno, o ajuizamento da ação penal".

Também o ex-ministro Sepúlveda Pertence tem parecer nesse sentido. Mesmo que Zavascki decida levar para o plenário a questão, o que não é líquido e certo, a oposição já entra com outro voto contra, além do de Zavascki. Ontem, o ministro do Supremo Marco Aurélio, que há alguns meses tinha dúvidas sobre a questão e achava que ela merecia um debate mais aprofundado no plenário do STF, disse que a Constituição veda a responsabilização de um presidente durante o mandato, a fim de proteger o cargo.

O comentário que fez lateralmente dá bem a ideia da delicadeza da questão, que certamente será levada em conta se o tema for debatido pelos ministros do Supremo: "Já está tão difícil governar o país, imagine então se nós tivermos um inquérito aberto contra a presidente da República?".

Para o ministro Marco Aurélio, não há perigo de impunidade, pois, após seu governo, Dilma poderá ser investigada pela primeira instância. Caso vá adiante, o debate será saudável para a democracia, mas é improvável que a oposição consiga tirar do Supremo a permissão para investigar a presidente, sobretudo porque até o momento não surgiram indícios claros de seu envolvimento, embora mais de 70% da população esteja convencida de que ela tem culpa.

Se, no decorrer das investigações surgirem novas informações envolvendo a presidente, que desde 2003 coordena a área de energia do governo e ficou à frente do Conselho de Administração da Petrobras durante os anos em que o esquema funcionou, a questão poderá ser reaberta.

O deputado Raul Jungmann acha que seria mais sábio que o Supremo desse a permissão para investigar, confirmando sua jurisprudência, ficando à cargo do procurador-geral da República a definição sobre o momento em que os fatos exigirão uma investigação. Ou não.

Jose Roberto de Toledo - Maioria perdeu esperança de o governo melhorar

- O Estado de S. Paulo

Ao alinharmos as pesquisas Ibope e Datafolha sobre avaliação do governo Dilma Rousseff, vemos que repetiu-se em 2015 o fenômeno de acumulação de tensões e explosão abrupta da insatisfação – como ocorrera em 2013. A diferença é que, desta vez, a avalanche foi mais ampla e profunda. Atingiu camadas que antes resistiram à onda de criticismo. Agora, a avalanche não apenas soterrou a popularidade da presidente. Ela corroeu a esperança da maioria da população de que ela possa vir a recuperá-la.

Se recordes 64% acham a segunda gestão Dilma ruim ou péssima – igualando o ponto mais baixo do governo Sarney – e 76% avaliam que ela está pior do que foi no seu primeiro mandato, 55% dizem que o restante será também ruim ou péssimo. O pessimismo dobrou desde dezembro, e é o principal obstáculo para a presidente. Quando traduzidas para a economia, as previsões negativas tendem a se autorrealizar, pois inibem consumo e investimento.

Daí a necessidade de Dilma aprovar a qualquer custo o ajuste fiscal no Congresso – o que levou-a a engolir as críticas veladas do ministro Joaquim Levy, e fez o ex-presidente Lula ir a uma reunião com sindicalistas da CUT e militantes do PT para tentar vender o ajuste ortodoxo para sua base política.

O desmoronamento da aprovação de Dilma em 2015 vai mais fundo do que em 2013 porque solapou as bases de apoio à presidente entre os mais pobres (60% de ruim/péssimo entre quem tem renda familiar mensal até 1 salário mínimo), entre os menos escolarizados (56% de ruim/péssimo) e no Nordeste (55%). São segmentos que votaram em peso nela em 2014, em 2010 e em Lula.

Ao final da campanha eleitoral de 2014, Dilma tinha saldo de 22 pontos na opinião pública. Foi o fato de ter mais gente achando seu governo ótimo ou bom (42%) do que ruim ou péssimo (20%) que permitiu a ela reeleger-se. Mas logo após o pleito ela começou a perder prestígio. Seu saldo caiu para 13 pontos em meados de dezembro. A virada aconteceu ao longo de janeiro, pois no começo de fevereiro Dilma já tinha saldo negativo de 21 pontos. Foi a menos 49 pontos há duas semanas e chegou a menos 52 agora.

Nenhum presidente brasileiro após a ditadura desceu abaixo dos 53 pontos negativos de saldo que Sarney conseguiu em julho de 1989, segundo o Ibope. Dilma é candidata a tomar-lhe o recorde.

Luiz Carlos Azedo - E agora, caiu a ficha?

• O índice de confiança em Dilma contabiliza apenas 24%. Sua aprovação caiu de 63% para 22%, mesmo entre os eleitores que afirmaram ter votado nela

- Correio Braziliense

Não faz tanto tempo assim, a maioria dos adultos ainda se lembra dos orelhões, os antigos telefones públicos, que já são peças de museu.
Ele funcionava por um sistema de fichas, mais ou menos como essas máquinas que vendem café expresso mediante a colocação de moedinhas. O sujeito tirava o telefone do gancho, colocava a ficha e discava o número. Quando a ligação se completava, ficava esperando ela cair. Só depois que isso acontecia poderia começar a conversa. É daí que vem a expressão que intitula a coluna.

Parece que a ficha finalmente caiu no Palácio do Planalto. Os sinais de que isso aconteceu foram dados pela presidente Dilma Rousseff esta semana, mas o fator decisivo foi a pesquisa CNI/Ibope divulgada ontem, que estava pronta desde sexta-feira e chegou ao conhecimento da Presidência no fim de semana. Segundo o Ibope, o governo é considerado “ruim/péssimo” para 64% dos entrevistados. A maneira de Dilma governar é desaprovada por 78%, enquanto 74% não confiam na presidente.

Os números confirmam a tendência já apontada pelas pesquisas anteriores do Datafolha e da CNT/MDA. Mostram que a popularidade da presidente parece ter chegado ao piso de aprovação: 12%. Segundo o Ibope, também é esse o percentual de avaliação positiva do governo. No Datafolha, o índice foi de 13%. Na CNT/MDA, atingiu 10,8%. O governo Dilma é desaprovado em todas as áreas, principalmente na economia. Apenas 23% consideram o governo “regular”.

Coube ao ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, comentar a pesquisa: “O governo tem que ter humildade, trabalho, trabalho e trabalho. Nosso compromisso é para quatro anos e três meses de governo. É apenas o início de um processo. Portanto, a fotografia não é boa, mas o filme vai ser muito bom”. A mensagem é de que o governo não perdeu a perspectiva, mas a verdade é que a situação é muito difícil.

Entre as pesquisas CNI/Ibope de dezembro do ano passado e de março deste ano, houve uma inversão entre os percentuais de avaliação positiva e negativa do governo. O índice “ótimo/bom” caiu 28 pontos, enquanto o percentual “ruim/péssimo” cresceu 37 pontos. Já a avaliação regular caiu nove pontos.

Quem avaliava o governo de forma positiva ou regular, agora o desaprova. Analistas consideram muito difícil uma recuperação em razão de dois fatores: o agravamento da situação da economia e os desdobramentos da Operação Lava-Jato, que investiga o escândalo da Petrobras. São duas variáveis que o governo não controla e que vão perdurar no processo ao longo dos próximos anos, talvez por todo o mandato de Dilma.

Estelionato eleitoral
Uma dessas variáveis foi subestimada por Dilma. Não estava no seu horizonte a contaminação da imagem dela pelo escândalo da Petrobras. A presidente da República, desde a famosa carta na qual tirou o corpo fora da compra superfaturada da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), procurou manter distância regulamentar dos chamados malfeitos da estatal. Mas não conseguiu evitar os danos de imagem.

Havia até uma grande expectativa de que a revelação da famosa lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, levaria a borrasca que atingiu a Petrobras para o Congresso, mas deixaria ao largo o Palácio do Planalto. Não foi o que aconteceu. Dilma não conseguiu encarnar o papel de reserva moral diante dos políticos envolvidos.

O maior problema, porém, é a contradição entre o discurso de campanha eleitoral, no qual mascarou os problemas e prometeu uma vida cor-de-rosa para os eleitores, e a dura realidade. A “desconstrução” dos adversários na campanha eleitoral cobra agora o seu preço. De acordo com o Ibope, 76% entendem que o segundo governo Dilma é pior do que o primeiro.

Aumentos das tarifas de energia e combustíveis, alta da inflação e dos juros, reajuste dos remédios… Muitos dos indicadores negativos da economia têm impacto direto no bolso dos eleitores. Resultado: o índice de confiança em Dilma contabiliza apenas 24%. Sua aprovação caiu de 63% para 22%, mesmo entre os eleitores que afirmaram ter votado nela na eleição presidencial do ano passado.

O estrago é generalizado. O combate à fome e à pobreza e as medidas para evitar o aumento do desemprego são desaprovados por 64% e 79%, respectivamente. Nessas duas áreas, a aprovação é de apenas 33% e 19%. A educação também é fortemente rejeitada (73%). A esmagadora maioria desaprova o combate à inflação (84%), a taxa de juros (89%) e os impostos (90%). Sobre o futuro do governo, 55% têm uma expectativa negativa (“ruim/péssimo”) contra apenas 14% que demonstram otimismo (“ótimo/bom”).

Bernardo Mello Franco - Gabrielli e o punho cerrado

- Folha de S. Paulo

A crônica do petrolão já havia produzido uma frase para os livros de história. Foi pronunciada por Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, ao ser preso pela Polícia Federal no Rio: "Que país é este?".

Nesta terça-feira, apareceu a melhor imagem do escândalo até aqui. É uma foto de José Sergio Gabrielli, ex-presidente da estatal, em ato promovido pelo PT e pela CUT na Quadra dos Bancários de São Paulo.

A cena foi fabricada pelo próprio personagem. Estrategicamente posicionado atrás do ex-presidente Lula, Gabrielli se levantou e ergueu o braço direito com o punho cerrado.

O petista imitava o gesto de José Dirceu e José Genoino, seus colegas de partido, ao serem presos no fim do processo do mensalão.

Gabrielli já teve os bens bloqueados pela Justiça e pelo Tribunal de Contas da União, que investigam sua participação na compra da notória refinaria de Pasadena.

Sob seu comando, atuavam três diretores da petroleira presos na Lava Jato: Duque, Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró. Um quarto diretor, Jorge Zelada, acaba de ter R$ 40 milhões bloqueados em Mônaco.

O ex-presidente da Petrobras ainda não é réu na Lava Jato, mas quem acompanha as investigações não se surpreenderá se ele aparecer na próxima leva de denúncias.

Além de inoportuno, o gesto de Gabrielli revelou falta de originalidade. Há um ano, o então deputado petista André Vargas também imitou os mensaleiros na Câmara. Não deu sorte: pouco depois, ele caiu na teia da Lava Jato e teve o mandato cassado.

No mesmo ato, Lula atribuiu a má fase do PT em São Paulo ao conservadorismo dos paulistas. "Eles são fortes aqui. Primeiro forte era o Jânio. Depois virou o Maluf. (...) Aqui tem um povo mais conservador", disse. Será interessante ver se o ex-presidente voltará à casa de Maluf no ano que vem para pedir apoio à reeleição de Fernando Haddad.

Eugênio Bucci - De pernas para o ar, de trás pra frente

- O Estado de S. Paulo

Na abertura de um breve ensaio que leva o título de São Paulo, Claude Lévi-Strauss se recorda de uma boutade filosófica: "Um espírito malicioso definiu a América como sendo uma terra que passou da barbárie à decadência sem conhecer a civilização". A caracterização serviria especialmente para as cidades do Novo Mundo, que vão "da frescura à decrepitude" sem ter tempo de amadurecer.

Hoje, um espírito menos corrosivo e mais otimista diria a mesma coisa sobre o segundo governo de Dilma Rousseff. O mandato da presidente está em plena decadência. Parece um malogro do avesso, um filme chato projetado no sentido inverso, do fim para o começo, frustrando a plateia, que aos poucos se vai retirando da sala. A sensação generalizada é uma só: o governo pôs o ponto final em seu epílogo antes mesmo de iniciar o prólogo.

O anedótico, o pitoresco e o bizarro se entrelaçam num palco de anomia e caos, a ponto de os melhores analistas em atividade baterem cabeça para sintetizar o que se passa. Abandonados pelas categorias convencionais da ciência política, alguns se socorrem no teatro do absurdo, tentando extrair humor de onde não conseguem extrair sentido. Há os que se sentem tentados a citar Karl Marx, dizendo que a História se repete como farsa, mas ficam mudos quando verificam que boa parte dos acontecimentos é perfeitamente inédita. Ninguém que não seja o ministro da Fazenda se arrisca a fazer previsões. Só o que se sabe é que a decadência que acabou de começar não tem hora para começar a acabar.

Está em curso uma epopeia ao contrário, uma saga sem heróis nem heroísmo, e seus sinais são diários e contundentes. Na segunda-feira, Dilma Rousseff apressou-se a declarar que o ministro Joaquim Levy (que não é Strauss) foi mal interpretado quando disse, como disse, que ela, Dilma, nem sempre "age da forma mais efetiva". Em outros tempos, o titular da Fazenda apenas levaria um pito ou um "até breve". Agora a presidente assimila a crítica, sorri e faz papel de bombeiro. É como se ela fosse subordinada a ele, e não o oposto. É como se Dilma dependesse mais de Levy do que Levy depende de Dilma. Vai ver, é isso mesmo.

Outro indício de que os acontecimentos se encadeiam numa cronologia invertida aparece nas relações entre o Planalto e o Congresso Nacional. Virou um chavão esse negócio de dizer que quem governa o Brasil é a dupla Eduardo Cunha e Renan Calheiros, que teriam o poder de fazer e desfazer ministros e ministérios. O primeiro, não nos esqueçamos, anunciou em primeira mão para o País, do alto de seu microfone na presidência de uma sessão plenária na Câmara dos Deputados, que Cid Gomes estava demitido do Ministério da Educação. Não é uma inversão desprezível. Antes, o Poder Legislativo gritava contra as ingerências vindas do Executivo. Agora, é o Executivo que tem de provar que é independente do Legislativo.

Que tipo de narrativa está em marcha? Como decifrar um espetáculo em que os atores principais mal conseguem ser espectadores e os espectadores podem ser protagonistas?

As interpretações baseadas na fórmula do homem cordial (Renan Calheiros, por exemplo) ajudam, mas não bastam. A promiscuidade patrimonialista entre o público e o privado é conhecida, mas não resolve o enigma. Dizer que as ideias estão fora do lugar soa brando demais. E também não adianta apostar no trocadilho de que o Brasil é um lugar fora de todas as ideias. As inversões em pauta são maiores, subvertem as cronologias, desautorizam o bom senso e nos põem cara a cara com um paradoxo de outra ordem-fora-de-ordem, na qual o negativo, o invertido e o contrafluxo constituem não uma exceção, mas a regra maior.

Sem nenhum culto exagerado de Macunaíma, é bastante razoável considerar a hipótese de sermos um país de caráter dissimulado, que vai para um lado como se fosse para o outro, com o carro na frente dos bois. No Brasil, a instituição da censura nasceu antes da instituição da imprensa: a primeira tipografia a operar regularmente nesta terra foi trazida pelas naus de dom João, em 1808, mas isso só depois da instalação da Mesa Censória na cidade do Rio de Janeiro. No Brasil, a Contrarreforma fixou residência muito antes de a Reforma dar o ar de sua graça. Aliás, o ideário da Reforma só se tornaria uma realidade nacional no século 20, e não por obra de prelos protestantes, mas pelos milagres tecnológicos da televisão de sinal aberto.

E se você quiser retroceder um pouco mais, lembre-se de que, no Brasil, a cartografia precedeu o continente. O projeto de dividir a América do Sul é anterior à chegada de Pedro Álvares Cabral às costas brasileiras. O Tratado de Tordesilhas, de 1494, traçou uma linha de polo a polo, 370 léguas a oeste do Arquipélago de Cabo Verde, e fez a partilha prévia: as terras do lado ocidental do meridiano pertenceriam aos reis de Aragão e Castela; o lado de cá ficaria para Portugal.

Não é por acaso que todos repetem: no Brasil o Estado nasceu antes de a sociedade existir, o que também é uma inversão constitutiva, por assim dizer. Tão constitutiva que talvez nos ajude a entender as razões pelas quais a política, por aqui, veio a ser a atividade daqueles que se associam para retalhar e repartir entre si a máquina estatal, essa carcaça cheia de dinheiro que chegou até nós vinda de fora para dentro.

Isto tudo posto, qual o problema de o governo Dilma viver o epílogo antes de escrever o prólogo? Aos nossos olhos, as narrativas que andam para a frente, mas deixam pegadas na direção oposta, como o Curupira, não deveriam ser surpreendentes. No meio da alegoria que aí está, em que foliões de ponta-cabeça contemplam com ares de descoberta o lugar de onde acabaram de sair, não nos contentemos em repetir que o Brasil não é para principiantes. Na apoteose do anticlímax, esperemos que Levy (que não é Claude) nos conduza à civilização.

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*Eugênio Bucci é jornalista e professor da ECA-USP

Carlos Alberto Sardenberg - Privatizando na bacia das almas

• Estatal, superendividada, está desesperada atrás de caixa; o petróleo está em baixa forte e, parece, duradoura

- O Globo

Não faltam manifestações a favor da Petrobras e contra sua privatização. O PT, sindicatos e associações de petroleiros atribuem a sanha privatista às elites e aos mercados.

Mas a Petrobras já está sendo privatizada, e isso desde a época de Graça Foster. Chamam a operação de “vender ativos” ou “desinvestimento”, mas o nome é privatização na forma mais clássica: alienar patrimônio para pagar dívidas e fazer caixa.

E mais: privatizam no pior momento. A estatal, superendividada, está desesperada atrás de caixa; o petróleo está em baixa forte e, parece, duradoura, o que desvaloriza todos os ativos do setor. Privatizam na bacia das almas.

Parece ser a sina dos desenvolvimentistas: obrigados a tocar políticas ortodoxas para corrigir os estragos causados por suas políticas supostamente desenvolvimentistas. Com um agravante: são estranhos à ortodoxia, não a estudaram, não a praticaram, acabam fazendo tudo mal feito.

Pensaram no atual momento do governo Dilma?

Pois é isso mesmo, com uma diferença importante. A presidente chamou um legítimo ortodoxo, assim celebrado no Brasil e lá fora, para tocar esse serviço.

Para quem considera que o ajuste é necessário, trata-se de uma vantagem. Mas os conflitos são inevitáveis.

A presidente e o ministro Levy até que se esforçam para não criar atritos e/ou para desarmar os que aparecem. Mas toda vez que uma ou outro fala espontaneamente, quando deixam fluir as ideias, dá trombada.

Levy respeita e ouve os mercados. Dilma diz que não governa para especuladores.

O ministro considera que o ajuste das contas públicas é questão de princípio, que não há vida sem equilíbrio fiscal e monetário. Dilma acha que o ajuste é um atalho, um mal necessário para um problema momentâneo.

Levy escreveu diversas vezes sobre os equívocos da política do governo Dilma-1. Previu os desastres quando disse, por exemplo, que o crescimento dos salários sem ganhos de produtividade levaria fatalmente ao aumento do déficit das contas externas e da inflação. Dilma acha que o crescimento dos salários é seu mérito e que os problemas vieram não disso, mas da crise internacional.

Levy tem dito que a crise já acabou. Dilma ainda sustenta que a Europa está estragando tudo com sua austeridade.

Então, poderão perguntar, por que a presidente aplica aqui a mesma austeridade? Não é a mesma, sustenta a presidente. Lá é questão de princípio, aqui é mal passageiro.

Levy disse que a alta de salários sem ganhos de produtividade aperta o lucro das empresas, o que não é bom, porque estas param de investir. Dilma acha que o ajuste tem que ser mais em cima das empresas.

Levy diz que os bancos públicos vão elevar suas taxas de juros, as taxas que Dilma mandara derrubar.

Levy quer um amplo programa de privatização de estradas, portos, aeroportos, para o qual considera que as tarifas devem ser atraentes, ou seja garantir o bom lucro dos investidores. Para Dilma, o mais importante é a tarifa baixa.

Mentiricídio
Muita gente no governo diz que Levy comete sincericídio. Querem, pois, que cometa mentiricídios.

Ele não tem feito isso, mas dá umas voltinhas. Por exemplo: diz que o ajuste das contas públicas tem como objetivo o crescimento econômico.

Não é bem assim. Difícil ter crescimento sustentado com desajuste das contas públicas. Mas contas em ordem não garantem crescimento. É perfeitamente possível ter orçamento equilibrado e estagnação.

O que garante crescimento é investimento, especialmente em infraestrutura e, no nosso caso, via privatizações — quer dizer, perdoem, concessões.

Bom para a China
A política externa da China tem um grande objetivo: garantir o abastecimento de comida, matérias-primas e petróleo. Na outra mão, abrir e consolidar mercado para seus produtos industrializados.

Com enorme poupança, a China paga adiantado e assim financia a produção do que vai receber lá na frente. A petroleira que recebe o financiamento fica amarrada ao credor por muitos anos.

Com a Argentina, a China fez um monte de acordos desse tipo, de financiar a troca de alimentos por industrializados. A Argentina está sem acesso aos mercados internacionais de crédito e assim se agarra ao dinheiro chinês.

Por isso, a Petrobras precisa explicar muito bem como foi esse acordo pelo qual vai receber US$ 3,5 bilhões do Banco de Desenvolvimento da China.

Não pode
Parece que a gente está anestesiada diante de tanto malfeito. Mas convém reparar: o presidente da Vale, Murilo Ferreira, não pode ser o presidente do Conselho de Administração da Petrobras.

As duas têm negócios e operações conjuntas que podem levar a conflito de interesses. Além disso, a Vale tem um pé no governo — ou o governo tem um pé na Vale. E tudo bem com o mesmo executivo como chairman e CEO das duas maiores companhias?
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Carlos Alberto Sardenberg é jornalista

Roberto Macedo – Já em recessão o PIB por habitante

- O Estado de S. Paulo

Os dados do produto interno bruto (PIB) de 2014, divulgados pelo IBGE na semana passada, sintetizam o péssimo resultado da equivocada política econômica praticada pelo governo Dilma 1, inspirado por seu antecessor como nunca antes neste país.

Não veio apenas mais uma taxinha de "crescimento" anual do PIB total, a qual foi de 0,1% no ano e resulta de um levantamento estatístico comumente sujeito a pequenos erros e omissões. Note-se que as taxas de 2001 a 2013 foram recentemente revisadas pelo IBGE. Uma revisão da de 2014 poderá vir no futuro e ela revelar-se até um pouco maior. Mas no seu valor atual não difere significativamente de zero, ou seja, o PIB total está estagnado.

Já o PIB médio por habitante entrou claramente em recessão. Hoje a população cresce bem menos que em meados do século passado, mas ainda assim o aumento é significativo, perto de 0,8% ao ano, o que leva a um número próximo de 1,7 milhão de habitantes, cerca de metade da população do Uruguai. Com isso o PIB por habitante caiu 0,7% em 2014, um dado até mais relevante que o do PIB total, pois mostra que em média os brasileiros se tornaram mais pobres. Mas isso não teve maior destaque nas manchetes. Falta de atenção da imprensa? Se houve, começou no IBGE, pois seu comunicado deixou o PIB por habitante em segundo plano.

E mais: segundo o último boletim Focus, do Banco Central, a previsão é de que o PIB total cairá 1% em 2015, e essa previsão vem caindo persistentemente há 13 semanas. Se no final a taxa ficar próximo dela, a queda do PIB por habitante será próxima de 2%, e ainda mais lamentável.

Acrescente-se que há meses também vêm caindo os índices de confiança no futuro da economia por parte dos consumidores e de empresários da indústria, do comércio e dos serviços. E neste início de ano a crise chegou ao mercado de trabalho, tanto na parte em que os contratos de trabalho são formalizados como nos levantamentos que também alcançam atividades informais.

Trata-se de uma ressaca a que a economia foi levada por um governo inebriado por um único propósito, o de ganhar a qualquer custo a recente eleição presidencial, pois não há outra explicação para os imensos disparates revelados por sua política econômica. Os objetivos de uma digna do nome são: controlar a inflação, manter preços sem desequilíbrios nos mercados mais relevantes, como o de insumos energéticos (derivados do petróleo e eletricidade, entre outros), buscar uma taxa de câmbio adequada a contas externas em equilíbrio sustentável, inclusive nos seus movimentos de capital, assegurar resultados prudentes quanto ao déficit fiscal e à dívida pública e uma taxa satisfatória de crescimento econômico, ao lado de seguir todo esse caminho também focado numa ampliada equidade social.

Mas o governo Dilma 1 tomou direção contrária e colheu maus resultados: inflação em alta, hoje particularmente pela correção de preços que estavam contidos nos citados mercados, e também pelo ajuste de uma taxa de câmbio que sobrevalorizava o real; déficit fiscal fortemente ampliado com impacto expansionista na dívida pública, mais o PIB total estagnado e em clara recessão o médio por habitante.

Mesmo no item de seu currículo de que os governos petistas ainda se vangloriam, a busca de maior equidade social, o balizamento por nítidos propósitos eleitoreiros trouxe resultados que distorceram esse objetivo.

Tome-se o caso da educação, agora o novo mote do governo, com o tal "Pátria Educadora". Qual o programa educacional que mais teve acréscimo de recursos nos anos recentes? Pelo que está nos jornais, foi o Fies, o Programa de Financiamento Estudantil. Segundo este jornal (25/3, A17), os valores desembolsados saltaram 647% (!) entre 2011 e 2014, atingindo neste último a espantosa cifra de R$ 13,7 bilhões.

Mas quem são os estudantes beneficiados por esse programa? Somente os do ensino superior, já eleitores. Enquanto isso, as crianças pobres têm sua vida prejudicada logo no início por um ensino básico público de baixa qualidade, altamente carente de recursos e relegado a Estados e municípios sem condições de aprimorá-lo. Será preciso estender o direito de voto a crianças para que o Brasil seja efetivamente uma pátria educadora?

O Fies também se transformou numa "fies-ta" para as instituições de ensino superior privadas que acolheram os estudantes financiados. Vi num jornal o balanço de uma delas mostrando que seus lucros duplicaram de 2013 para 2014.

Voltando ao PIB, seus últimos dados também revelam a gastança governamental e outra distorção de que ela padece. Assim, do lado da demanda o componente que mais cresceu foi o consumo do governo, com uma ampliação de 1,3%, ou 13 vezes a taxa de crescimento do PIB total, ampliando a participação governamental no consumo do que foi produzido. Isso deve ter vindo principalmente do governo federal, com o enorme déficit final que suas contas mostraram no ano passado.

O componente que teve maior queda foram os investimentos. Embora altamente necessários, caíram 4,4%. Os dados não separaram os públicos do total, como no caso do consumo. Mas o IBGE mostrou que pesaram nessa queda a redução da produção interna e da importação de bens de capital e o desempenho negativo da construção civil.

Ora, os impactos da má política econômica federal também atuaram aí. Primeiro, porque ela gerou uma séria desconfiança nos empresários quanto ao futuro da economia, inibindo assim os seus investimentos. Segundo, porque o governo federal não se empenhou com o devido vigor em realizar e concluir investimentos, como na expansão da infraestrutura de estradas, ferrovias e em projetos como o da transposição do Rio São Francisco. Com isso a construção civil também não se expandiu como desejável pela via dos investimentos públicos.

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*Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard) e consultor econômico e de ensino superior

Vinicius Torres Freire - Chuva, suor e menos cerveja

• Produção de cerveja cai no primeiro trimestre, um sintoma da crise da economia da vida cotidiana

- Folha de S. Paulo

No verão de 2015, o Brasil produziu menos cerveja. Para ser preciso, a produção de cerveja caiu mais de 4% no primeiro trimestre deste ano, na comparação com 2014. E daí, cerveja? Também ontem a gente soube que a produção de máquinas e equipamentos, bens de capital, caiu 21% no primeiro bimestre de 2015 sobre 2014. A indústria caiu 7%. Etc. Desastres.

A numeralha da crise é vasta, mas a recessão da cerveja causa uma impressão vívida, ainda que impressionista, de que o caldo entornou. Quer dizer, que a gente parou de entornar.

Dados mensais precisos sobre a produção existem faz pouco tempo. Mas, de 2002 a 2012, a produção crescia no ritmo de uns 6% ao ano. Houve a caída de 2013, segundo ano da inflação forte do preço da cerveja. Em 2014, alta de quase 5%, raridade em meio à estagnação. Portanto, 2015 por ora está com jeito de ser o pior também até na mesa de bar, em uma década ou década e meia. No caso dos refrigerantes, a queda foi maior no trimestre, 5,5%.

Há crise nas gôndolas também, para ficar na economia da vida cotidiana. No primeiro bimestre, as vendas nos supermercados cresceram menos de 2% sobre 2014. No ano passado de estagnação do PIB, nesta época as vendas cresciam 3,7%.

A Confederação Nacional do Comércio, por sua vez, crê que o crescimento do número de empregos nas lojas será zero neste ano, conforme estimativa divulgada ontem. Zero.

A empresa do governo encarregada de pesquisar e planejar o setor elétrico estimava que o consumo de eletricidade cresceria 3,2% neste ano. Nesta semana, a projeção virou para queda de 0,5%. Tivemos a sorte de um pouco mais de chuva no Sudeste, com o que irresponsavelmente passamos a prestar menos atenção à escassez de água. Mas o que talvez deve nos livrar mesmo do racionamento de energia é a recessão combinada ao tarifaço da conta.

A confiança do consumidor é a menor desde janeiro de 2009 e teve o maior colapso desde o final de 2008, dado da FGV.

A venda de carros deve ter caído 18% no trimestre. A produção da indústria paulista caiu uns 6% nos últimos 12 meses (dado da Fiesp). A capacidade ociosa da indústria não era tão grande desde fevereiro de 2009 (dado da CNI), quando havia demissões em massa e queda brutal da produção porque se disseminava o pânico da crise de 2008.

Verdade que a produção da indústria nacional mergulhou rapidamente no abismo no final de 2009, chegando a baixar 10% em outubro daquele ano (no acumulado de 12 meses). Agora, o tombo ainda está na casa dos 6%.

Os indicadores de produção e vendas despencam, portanto, quase como em 2009, ano da recessão mundial. No entanto, o mergulho de 2009 foi breve. Agora, nem começamos a viver os efeitos da recessão que virá com o arrocho, necessário para consertar o estrago de Dilma 1.

Em 2009, de resto, havia crédito aos borbotões, estímulos de gastos do governo, dinheiro baratinho nos bancos públicos; agora, o governo corta mais de 30% do seu investimento "em obras".

Enfim, apesar do pessimismo econômico momentâneo, embora agudo, havia alguma gordura para queimar instrumentos para lidar com a crise, econômicos e políticos.

Agora, o povo está cortando até a cerveja.