sábado, 5 de dezembro de 2015

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

Eu acho que impeachment não deve ser objeto de desejo. Acontece. No caso, precisamos ver, se acontecer mesmo vamos ter que levar a fundo porque o Brasil não pode ficar paralisado e neste momento ele está.

Claro que existe (lógica para o impeachment), é constitucional. Não temos o que discutir.

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Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República, entrevista em Lisboa, O Estado de S. Paulo, 5.12.2015.

Para o Planalto, parte do PMDB atua contra Dilma

• Braço-direito do vice Michel Temer, Padilha entrega carta de demissão

Presidente convoca ministros para reunião de emergência com o objetivo de analisar comportamento do partido aliado; ministro Henrique Alves é pressionado a deixar a pasta do Turismo

Operação desembarque

• Padilha deixa Ministério por lealdade a Temer, e ala do PMDB pressiona Henrique Alves a sair

Simone Iglesias e Júnia Gama - O Globo

-BRASÍLIA- A demissão do ministro Eliseu Padilha (Aviação Civil), o peemedebista mais próximo do vice-presidente Michel Temer, alarmou o Palácio do Planalto, que viu na decisão a disposição dele atuar como articulador do movimento pró-impeachment. No fim da tarde de quinta-feira, depois de tentar, sem sucesso, uma audiência com a presidente Dilma Rousseff e com o ministro Jaques Wagner (Casa Civil), Padilha protocolou a carta com sua exoneração e viajou para Porto Alegre.

Em razão da demissão, Dilma reuniu ministros na tarde de ontem para analisar o cenário que se apresenta, com parte do PMDB passando a trabalhar pelo impeachment. Auxiliares presidenciais avaliam que a saída de Padilha aponta para um desembarque peemedebista e reduz as pontes com integrantes do partido, que já são consideradas frágeis. Integrantes do governo dizem que as opções para ajudar Dilma na Câmara são o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), e o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão.

Segundo pessoas próximas a Padilha, o ex-ministro dizia estar se sentindo “constrangido” por não poder criticar nem defender o processo de abertura de impeachment. Na noite de quarta-feira, em conversa com peemedebistas no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice, Padilha considerou a ideia da saída por convicção política e lealdade a Temer, já que teria, mais cedo ou mais tarde, que optar por um lado da guerra do impeachment. Somado a isso, acumulava motivos relacionados à sua pasta para deixar o cargo.

No dia seguinte, quando Dilma e o vice conversaram, e auxiliares da presidente fizeram um relato da reunião que foi desmentido por Temer, Padilha sacramentou a decisão pelo desembarque. Ainda assim, participou da reunião de coordenação política com a presidente e outros 22 ministros. Neste encontro, mais um motivo de incômodo: Wagner cobrou de todos os presentes uma posição pública em favor da garantia do mandato de Dilma. Horas mais tarde, Padilha indagou a um aliado:

— Como eu, que sou ministro, não vou falar nada? Não vou defendê-la?

— Foi um dia de muitos desmentidos. O Planalto decidiu a posição de Temer. O ambiente passou a ser de muitos imprevistos — disse ao GLOBO uma pessoa próxima a Padilha.

Seu último desgaste na Secretaria da Aviação Civil foi o fato de a presidente ter desautorizado uma indicação dele para a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O ministro encaminhou o nome de Juliano Noman, atual secretário de navegação aérea do ministério, para uma diretoria da Anac com o aval de Dilma. No entanto, na última quarta-feira, quando a Comissão de Infraestrutura do Senado aprovaria Noman, a presidente retirou a indicação.

Um peemedebista da cúpula afirmou que outro ministro ligado a Temer, Henrique Eduardo Alves (Turismo), já está sendo pressionado para também desembarcar do governo.

Na última reforma ministerial, em setembro, Alves trabalhou muito para emplacar seu nome na Esplanada, o que dificultaria sua saída. Na mesma reforma, outro ministro do PMDB, Hélder Barbalho, que era da Pesca e foi remanejado para Portos, passou a ser da “cota” de Temer. Barbalho estava de saída do governo, mas se aliou a Padilha e Alves.

Governo vai avaliar nomes da comissão
Barbalho decidiu não deixar o governo neste momento e espera ser acompanhado por Alves, “em prol da governabilidade”. Barbalho almoçou com Padilha na última quinta-feira, quando ele apresentou os argumentos para deixar o Ministério.

O governo quer avaliar os nomes de deputados que os partidos da base aliada indicarão para a comissão especial do impeachment. Dos 65 titulares, 39 são de partidos do núcleo governista. Os líderes aliados se comprometeram com os ministros Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) e Jaques Wagner a apresentar nomes confiáveis e menos suscetíveis à pressão, para evitar surpresas na votação.

Os líderes combinaram com o Planalto de voltar a Brasília no domingo à noite para evitar atrasos ou contratempos na reunião marcada para segunda-feira, às 10h, quando os nomes serão submetidos ao crivo dos ministros.

— Há uma preocupação imediata com os membros do conselho. É claro que queremos colocar pessoas que tenham capacidade de argumentação e de debate na comissão — disse Wagner na última quinta-feira, após reunião da coordenação política do governo, na qual a composição da comissão especial foi discutida.

Na bancada do PMDB, o grupo que faz oposição ao governo Dilma entregou ao líder do partido, Leonardo Picciani, um ofício com nomes de deputados que desejam integrar a comissão especial. A reivindicação é que o PMDB, por ter uma bancada “plural” em suas posições, tenha representantes das diversas alas. Segundo relataram esses deputados, Picciani limitou-se a dizer que exercerá sua “prerrogativa de líder” e não se mostrou inclinado a atender ao pleito dos rebeldes. (Colaboraram Danilo Fariello e Chico de Góis)


Presidente é notificada do processo e fala em golpe

Dilma: ‘Temos que defender a nossa democracia contra o golpe’

• Presidente é recebida com gritos de apoio por plateia de servidores e sindicalistas

Catarina Alencastro, Sérgio Roxo, Stella Borges - O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Recebida por servidores públicos e sindicalistas com gritos de apoio como “Olê, olê, olê, olá, Dilma, Dilma” e “Não vai ter golpe”, a presidente Dilma Rousseff aproveitou a solenidade de encerramento da 15ª Conferência Nacional de Saúde para fazer ontem discurso em defesa do seu mandato. Disse que o processo de impeachment não tem fundamento, e que vai lutar com todos os instrumentos democráticos para se manter no cargo. Dilma chegou a classificar de “golpe” a tentativa de demovê-la da Presidência, e foi categórica ao afirmar que fica no governo até 2018.

— Temos que defender nossa democracia contra o golpe. Essa luta vai nos exigir muito diálogo e trabalho. Até 2018 eu e meu governo seremos incansáveis para cuidar da saúde de todos os brasileiros — disse Dilma, que ontem foi formalmente notificada sobre a aceitação do processo de impeachment pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha.

Segundo a presidente, a aceitação do impeachment foi o ápice de uma luta dos que não aceitaram até hoje sua reeleição, no ano passado. E que, desde o primeiro dia de seu segundo mandato, têm feito movimentos sistemáticos para “afundar o país”. Ela citou as pautas-bomba como exemplo.

— Não tem fundamento o processo do meu impedimento. Eu vou fazer a defesa do meu mandato com todos os instrumentos previstos no estado democrático de direito — disse Dilma.

Nada fiz que justificasse o pedido”
Ela disse que continuará dialogando com os segmentos da sociedade para mostrar que a luta não é em favor de uma pessoa ou de um partido ou grupo de partidos:

— É uma luta em defesa da democracia deste país, construída com muito esforço ao longo das últimas gerações. Não vamos nos enganar. O que está em jogo agora são as escolhas políticas que fizemos nos últimos 13 anos. São 13 anos em favor da soberania do Brasil, em defesa sistemática do povo, do emprego, da renda, da oferta de serviços de qualidade. Eu vou lutar contra esse pedido de impeachment porque nada fiz que justificasse esse pedido e porque tenho compromisso com a população deste país que me elegeu.

A presidente repetiu o que tinha dito no pronunciamento de quarta-feira: não tem conta na Suíça, não cometeu atos ilícitos e, em sua biografia, não há “nenhum ato de uso indevido de dinheiro público”. Neste momento, foi interrompida pelos presentes com gritos de “Fora, Cunha”. Dilma se emocionou no início do discurso. Ela foi recebida com palavras de ordem logo ao ter seu nome anunciado para ocupar o palco.

— Vocês não imaginam quanto isso que vocês estão fazendo faz bem para a alma da gente. Um abraço apertado, um abraço de irmã — disse Dilma, num tom pouco usual em seus discursos.

Aderindo à estratégia de não deixar provocações sem resposta, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), reagiu ontem aos ataques de Dilma:

“Não me sinto atingido pelas palavras da presidente e lamento que o maior escândalo de corrupção, de desvio de dinheiro público, do mundo esteja na maior empresa do governo dela; dirigida por ela desde 2003, seja como ministra, seja como presidente do conselho ou seja, ainda, como presidente da República", disse Cunha, por meio de assessoria.

Em São Paulo, a Executiva do PT decidiu ontem colocar o partido em estado permanente de mobilização para barrar o processo de impeachment. A avaliação é que a posição contra Eduardo Cunha reconectou a sigla com sua base e com os movimentos sociais.

— A decisão de que os nossos deputados negassem apoio a Cunha no Conselho de Ética foi sinalização efetiva para todos. E com esses movimentos que saudaram a decisão do PT, isso reunificou a base e trouxe de volta uma luta comum — disse o presidente do PT, Rui Falcão.

No fim de semana vão ocorrer atos no Ceará e em São Paulo. Segunda-feira, está previsto um encontro da CUT com a presença do ex-presidente Lula. Na resolução aprovada, o PT classifica o impeachment como “sórdida vingança” e “ameaça golpista”.

Mais um problema ação contra presidente no TSE volta a andar

- O Globo

Foi publicada ontem a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de manter aberta a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime) contra a presidente Dilma Rousseff e o vice, Michel Temer. Com isso, começam a correr os prazos da tramitação do processo.

A defesa de Dilma terá três dias para recorrer da decisão. Passado esse prazo, se o processo continuar aberto, a lei determina que os advogados dos investigados sejam notificados. Em seguida, eles terão sete dias para contestar as acusações, juntar documentos, indicar testemunhas e requerer a produção de outras provas, inclusive documentais.

Depois disso, os quatro dias seguintes serão dedicados ao depoimento de testemunhas da defesa e da acusação — no caso, o PSDB.

Passada essa fase, a relatora do processo, a ministra Maria Thereza de Assis Moura, terá cinco dias para determinar as diligências finais. Ao fim desse prazo, PT, PSDB e Ministério Público Federal terão cinco dias para apresentar alegações finais ao TSE.

Planalto age para evitar debandada do PMDB

• Ministro da Saúde afirma que atuará na estratégia de defesa de Dilma

Júnia Gama- O Globo

-BRASÍLIA- Preocupado com possível debandada do PMDB depois que o ministro Eliseu Padilha (Aviação Civil) decidiu deixar o cargo, o Planalto se mobilizou ontem para garantir que os demais representantes do partido na Esplanada permanecerão. Interlocutores da presidente Dilma telefonaram ao líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), para assegurar que os dois ministros indicados pela bancada, Marcelo Castro (Saúde) e Celso Pansera (Ciência e Tecnologia), continuarão no governo.

O líder procurou os dois ministros e obteve a resposta de que não haverá mudanças.

— Há chance zero de eles saírem — informou Picciani a auxiliares palacianos.

Ao GLOBO, Pansera disse ontem que permanece enquanto Dilma determinar, e se disse contra o impeachment. Para o ministro, as divisões no PMDB são “naturais” e mostram que parte da legenda vai trabalhar pelo impedimento a partir de agora:

— Sou contra o impeachment, sempre fui. Acho que o Brasil tem de aprender a conviver com crises e sobreviver a elas. É normal que um partido de centro como o PMDB se divida em momentos de pressão como este. Mas hoje a maioria no partido é contra o impeachment, em que pese ter alguns quadros que vão trabalhar pelo impeachment.

Castro também afirmou que não pretende deixar o ministério e que participará, inclusive, da estratégia de defesa de Dilma na Câmara. O ministro defende que o PMDB indique apenas deputados contrários ao impeachment para integrar a comissão especial que analisará o processo:

— Estamos traçando a estratégia para o PMDB fazer a defesa de Dilma no Congresso. O PMDB foi às urnas com Dilma, que se reelegeu e tem o direito e o dever de exercer seu mandato. O PMDB faz parte do governo e não houve nenhum fato que fizesse o partido mudar de opinião. Não há fato que sustente o impeachment, não houve crime por parte da presidente. O PMDB tem compromisso com o estado democrático de direito. Seria o último partido a entrar numa aventura dessas.

Questionado se acreditava que o vice Michel Temer deveria fazer defesa mais clara de Dilma, o ministro respondeu:

— Ele é o vice. O partido dele está no governo. Ele vai se pronunciar na hora certa.
A ala governista do PMDB na Câmara quer que Dilma preencha o cargo de Padilha com outra indicação da bancada para firmar o apoio dos deputados nessa fase. A avaliação é que, hoje, a bancada está dividida.

A tendência é que os nomes saiam da bancada mineira no PMDB, que ficou fora da distribuição de ministérios e da liderança na Câmara. Já há inclusive nomes sendo cogitados: Newton Cardoso Junior, Mauro Lopes e Leonardo Quintão.

Há percepção de que trabalhar pelo impeachment é “jogo de alto risco”. Há dúvidas, porém, sobre a permanência de Henrique Alves no Turismo, pela pressão sobre o ministro, ligado ao grupo de Temer, para que faça o mesmo que Padilha.

Oposição afina discurso para eventual governo de transição

• Após reunião com Temer, Aécio fala em coesão para salvar país da crise

Maria Lima - O Globo

BRASÍLIA - A partir da próxima semana o comando do PSDB deverá aprofundar o debate com partidos aliados e todas as instâncias tucanas sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff e os desdobramentos de um eventual governo de transição do vice-presidente Michel Temer. O PSDB foi o principal suporte do governo de transição do expresidente Itamar Franco, que assumiu após o impeachment do ex-presidente Fernando Collor. A participação de Fernando Henrique Cardoso como chanceler e depois ministro da Fazenda, com a implantação do Plano Real, catapultou o PSDB para o Planalto no pleito seguinte.

Um dos assuntos que o senador e presidente nacional do partido Aécio Neves (MG) vai discutir com os tucanos e partidos aliados, na terça-feira, é sobre a defesa da manutenção do recesso parlamentar. Ele acusou ontem o governo e a presidente Dilma de desejarem a convocação do Congresso durante o recesso para calar as ruas com um rito sumário, a fim de enterrar logo o impeachment sem a mobilização da opinião pública.

Após encontro regional em Juiz de Fora, Minas Gerais, Aécio repetiu o discurso que vem se firmando no partido e respondeu às cobranças de que o PSDB nada faz para ajudar: agora a prioridade é tirar o Brasil da crise.

— É muito importante que haja uma enorme coesão de todos nós para buscar saídas. O Brasil vive um processo de instabilidade enorme — disse Aécio em Juiz de Fora.

Depois do encontro com Michel Temer na quarta-feira, senadores tucanos fizeram coro a esse discurso de apoio a um eventual governo de transição, dependendo do programa de governo e do compromisso de que o peemedebista não leve adiante um projeto de disputa eleitoral em 2018.

Entretanto há entre os tucanos o temor de que, apoiando o eventual governo Temer, com a necessidade de continuar o duro ajuste, o PSDB passe a ser atacado pelo PT do ex-presidente Lula em 2018 como sócio das dificuldades no país.

— Tem que ver com cautela nosso papel nesse day after. Não dá para embarcar de qualquer jeito. A prioridade agora é ver como salvar o país da crise, mas nós temos que enxergar para além dela — disse Aécio, que conversou com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no último domingo.

Para o senador Tasso Jereissatti (PSDB-CE), a prioridade agora é arrumar o país, pois as indicações são de que a economia vai se deteriorar muito nas próximas semanas.

— A preocupação agora é salvar o país do caos econômico que caminha para o caos social. Lá na frente, se todos estivermos vivos, a gente vê o que faz — disse Tasso, presente à reunião com Temer.

— Ficou implícito na conversa que em caso de um governo de união nacional não se pode misturar projetos políticos de 2018. O problema é salvar o país — ecoou o senador José Serra (PSDB-SP).

Aliado de Temer, Padilha pede demissão e Planalto se preocupa com afastamento do PMDB

• Em meio ao início da discussão do processo de impeachment de Dilma, ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, encaminhou à Casa Civil carta em que entregou o cargo

Erich Decat, Vera Rosa, Isadora Peron e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dos principais aliados do vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), o ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha (PMDB), encaminhou à Casa Civil da Presidência da República carta com seu pedido de demissão do cargo. Pela manhã, ele avisou a correligionários que deixaria o governo. A decisão ocorre em meio ao início da discussão do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso e foi interpretada no Palácio do Planalto como o primeiro passo para o descolamento do vice e o desembarque do PMDB da equipe.

Segundo relatos, Padilha tentou se reunir com a presidente nesta quinta-feira, 3, mas não teve êxito. A conversa deve ocorrer na próxima segunda-feira, 7. Nesta sexta, Padilha permaneceu no Rio Grande do Sul, seu Estado de origem, sem compromissos públicos. Um posicionamento oficial por parte dele deve ocorrer apenas após a conversa com a presidente.

Padilha é um dos principais aliados do Temer e foi braço direito do vice-presidente no período em que o peemedebista assumiu no primeiro semestre a condução da articulação política do governo. A saída de Padilha do governo neste momento em que Dilma necessita de apoio dos aliados na condução do processo de impedimento demonstra, para integrantes da cúpula do PMDB no Congresso, que o grupo de Temer opera pelo afastamento da petista.

Também tem chamado a atenção dos parlamentares da legenda pró-Dilma o fato de, até o momento, o vice-presidente não ter dado declarações públicas contra o impeachment e preferido se resguardar sobre o tema.

Outro aliado próximo de Temer, o ex-ministro Moreira Franco (PMDB), afirmou nesta sexta ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, que a decisão do ministro de Padilha pode ser seguida por outros integrantes do primeiro escalão do partido. "É evidente que toda atitude dessa natureza é uma referência, define rumos e impacto nos outros", disse. Segundo ele, Padilha entregou sua carta de demissão ao Planalto após, segundo ele, terem atribuído a Temer declarações de que ele respaldaria Dilma na defesa contra o impeachment.

Em meio ao desembarque de Eliseu Padilha, outros ministros ligados a Temer, como o do Turismo, Henrique Eduardo Alves, também têm sido constrangidos a tomar o mesmo caminho.

“Amigo@HenriqueEAlves,agora é hora de gente q construiu toda sua bela hist noPMDB,ñ permitir q constranjam nosso partido Viva Eliseu Padilha”, postou Geddel Vieira Lima, integrante da Executiva Nacional do PMDB, no seu perfil do Twitter.

Planalto. O ministro da Comunicação Social, Edinho Silva, disse confiar no empenho de Michel Temer no trabalho de reunificação do PMDB e tentou pôr panos quentes na nova crise política. "Eu penso que a maior liderança do PMDB é o vice-presidente Michel Temer e ele vai trabalhar para unificar o partido, que, depois do PT, é o que tem maior número de ministérios e possui papel fundamental na governabilidade", afirmou o ministro da Comunicação Social ao Estado. Atualmente, o PMDB comanda 7 dos 31 ministérios.

O líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), também afirmou, nesta sexta-feira, que a saída de Padilha foi uma movimentação individual e não partidária. "Um ou outro militante de qualquer partido pode tomar a decisão que quiser, mas não entendo como uma decisão partidária, portanto respeito mas vamos tratar com o PMDB", disse Sibá.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) também minimizou a saída de Padilha do ministério. O petista disse conhecer bem Temer e que duvida que ele entre no "barco furado" que a seu ver é o processo de impeachment contra a presidente. "Conheço há muitos anos o vice-presidente Michel Temer, ele é um homem com enorme experiência política e ele não entra em barco furado. Esse processo de impeachment é um barco furado. Sabemos que ele não entrará e o próprio PMDB, pelo seu líder (Leonardo Piccianii), já disse que não defende o impeachment", disse. / Com reportagens de Ricardo Galhardo e Ana Fernandes

Rede e PSOL decidem apoiar presidente

• Partidos fecham questão contra o processo de impeachment; PSB, que conta com 26 deputados, promete decisão para a próxima semana

Pedro Venceslau – O Estado de S. Paulo

Partidos de oposição ao governo Dilma Rousseff no Congresso Nacional, a Rede Sustentabilidade e o PSOL não apoiarão o pedido impeachment acolhido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A decisão tem um peso simbólico, já que, juntas, as duas siglas somam apenas dez deputados – ao todo a Casa é composta por 513 parlamentares.

Já o PSB, que conta com 36 deputados federais e indicará quatro integrantes para a comissão que avaliará o impedimento, deve definir sua posição na segunda-feira. A maioria da cú- pula do partido e os governadores rechaçam a iniciativa.

A posição do líder da bancada, Fernando Bezerra Filho (PE), porém, ainda é uma incógnita. Caberá a ele a palavra final sobre os quatro nomes que representarão o PSB na comissão.

Aliado do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), o vice-governador Márcio França, que integra a direção executiva do PSB, se manifestou contra o parecer.

“O PSB ainda não tem uma posição formal, mas eu penso que não há elementos para o impeachment no parecer que foi acolhido”, diz França.

Diante da perspectiva de uma disputa acirrada entre governo e oposição, o partido pode ser o fiel da balança na Câmara.

Sem entusiasmo. A decisão da Rede foi tomada anteontem depois de uma reunião em Brasília da qual participaram, além da ex-ministra Marina Silva, os cinco deputados da legenda, o senador Randolfe Rodrigues (AP) e os dirigentes nacionais da agremiação. “Não há entusiasmo da Rede com o impeachment. Marina discutiu com a bancada e disse que não pode haver revanche eleitoral. A tendência que votemos contra”, afirma o deputado Miro Teixeira (RJ).

Um documento divulgado na manhã de ontem e assinado pela Comissão Executiva Nacional da Rede declara que a petição aceita pela Câmara “não apresenta matéria nova em relação à anterior, já analisada pela Rede como insuficiente para redundar em impeachment”. Em outro trecho, porém, o partido ressalta que o pedido “não é golpe, é um direito garantido pela Constituição”. A posição foi reforçada por Marina (veja entrevista abaixo). Para os “marineiros”, o melhor cenário seria que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidisse pela cassação da chapa Dilma-Temer, o que abriria caminho para que a ex-ministra se candidatasse.

Pesquisa Datafolha divulgada em novembro mostra que, se a eleição fosse hoje e o candidato do PSDB fosse o senador Aécio Neves (MG), o tucano seria o líder tendo a preferência de 31% e, em seguida, viriam Lula, com 22%, e Marina Silva (Rede), com 21%, em situação de empate.

Em um cenário com o governador Geraldo Alckmin como candidato, Marina lidera com 28% e, em seguida, aparecem Lula (22%) e Alckmin (18%)

Fundado por ex-petistas, o PSOL fechou questão contra o impedimento de forma contundente. “Destituir Dilma, a cujo governo antipopular nos opomos, para colocar em seu lugar Michel Temer (vice-presidente, do PMDB), significaria aprofundar uma ponte para o futuro, que é mera continuidade do presente, pavimentada pelos materiais do privatismo puro”, destaca o partido em nota

Marina Silva: 'Pedido de impeachment é insuficiente’

• A melhor solução, segundo a ex-candidata à presidência, é que TSE casse tanto Dilma quanto o vice Michel Temer, o que abriria caminho para uma nova eleição

Candidata derrota à Presidência em 2014, a ex-ministra Marina Silva, fundadora da Rede Sustentabilidade, disse ao Estado que o pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff acolhido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não tem elementos suficientes para justificar o afastamento. " O processo já está contaminado pela acusação de chantagem por parte do governo", diz. A melhor solução, segundo ela, é que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) casse tanto Dilma quanto o vice presidente Michel Temer (PMDB), o que abriria caminho para uma nova eleição.

Estado - A sra. defende o pedido de impeachment que foi acolhido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha?

Marina Silva - A Rede vai participar da Comissão (do impeachment) com total isenção e autonomia e vai firmar suas convicções no âmbito do processo. Nós apoiamos totalmente as investigações. Entendemos que a Operação Lava Jato está desmontando um caso de corrupção que tem na sua origem os partidos que compõem o governo: o PT, PMDB e PP. O pedido de impeachment não é golpe. Está previsto na Constituição.

O teor do pedido de impeachment que foi acolhido é público. Ele tem fundamentos para o impeachment?

Marina - A Rede compreende que é insuficiente. O processo já está contaminado pela acusação de chantagem por parte do governo, do vice-presidente e pela tentativa de barganha da oposição. Ambos queriam blindar o Cunha. Entendemos que a melhor coisa a se fazer é dar sustentação ao julgamento da ação de impugnação de mandato eletivo movida contra a chapa que está no TSE. Esse é o caminho que tira o espaço da chantagem e da barganha. Os partidos da presidente e do vice estão envolvidos. Não podemos achar que a substituição de uma cara da mesma moeda é a solução para o problema.

Defende que o recesso parlamentar seja adiado?

Marina - Minha posição pessoal é que não se pode protelar indefinidamente uma coisa com essa complexidade.

Deputados da Rede na Câmara dizem que o partido votará contra o pedido...

Marina - Vamos participar do debate com independência. Estamos abertos a formar uma convicção considerando todos os elementos do debate. Mas a pilastra mais importante para orientar nosso voto será a Constituição. Não vamos arredar um mílimetro da Constituição. Os elementos que ali estão ainda são insuficientes. Não caracterizam o envolvimento direto da presidente.

Impeachment não deve ser um objeto de desejo, diz FHC

• Para ex-presidente, caso aconteça, impedimento deverá ser levado 'a fundo' para que o País não fique paralisado como está neste momento

Lucas Rohan - O Estado de S. Paulo

LISBOA - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou nesta sexta-feira, 4, que impeachment não deve ser “objeto de desejo”. Ele fez as declarações ao chegar para abrir um debate sobre o futuro mundial na Fundação Champalimaud, em Lisboa. “Eu acho que impeachment não deve ser objeto de desejo. Acontece. No caso, precisamos ver, se acontecer mesmo vamos ter que levar a fundo porque o Brasil não pode ficar paralisado e neste momento ele está”, disse FHC.

O ex-presidente comentou a disputa entre o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha e o governo. Na opinião de FHC, houve “um jogo” entre os dois lados e ambos saíram “prejudicados”. “Na verdade não se discute mais isso, precisamos ver se há motivo ou se não há motivo (para o impeachment)".

Questionado se há lógica no processo aceito por Eduardo Cunha, FHC opinou que o pedido de abertura de processo “é constitucional”. “Claro que existe (lógica para o impeachment), é constitucional. Não temos o que discutir”, afirmou.

Fernando Henrique Cardoso disse que estava em Portugal quando soube que o presidente da Câmara havia aceito o pedido. “Foi para mim uma surpresa”, comentou.

Ontem, o ex-presidente havia avaliado que a reação do mercado financeiro à aceitação do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff como um sinal de preferência dos agentes econômicos pelo afastamento da petista. “Eu vi que o mercado reagiu subindo, o que significa que prefere que haja o impeachment”, afirmou o ex-presidente na noite de quinta-feira, 3, em Lisboa, onde participa nesta sexta-feira da abertura de um debate sobre o futuro mundial na Fundação Champalimaud.

O tucano disse ter acompanhado as notícias dos últimos dias no Brasil “com certa apreensão” e fez um prognóstico de semanas "tensas no Brasil". “O processo de impeachment é difícil para o País”, afirmou FHC no saguão do hotel onde está hospedado na capital portuguesa. Com semblante de preocupação, o ex-presidente observou que o processo de julgamento e eventual cassação de um chefe do Executivo “não é uma coisa simples”.

Na opinião de FHC, a ação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de acatar o pedido de afastamento de Dilma enseja “um grande debate sobre a viabilidade política” do impeachment. “Também é preciso discutir com a população”, afirmou o tucano. Para ele, “se o sentimento se generalizar, a presidente terá muita dificuldade de evitar o impeachment”.

Presidente de honra do PSDB, Fernando Henrique disse que seu partido votará a favor do impedimento de Dilma porque o pedido de abertura do processo tem como um dos autores o jurista Miguel Reale Júnior, que foi ministro da Justiça de sua gestão e também um dos advogados que fundamentou uma ação do PSDB contra a petista no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Acho que provavelmente a votação (do PSDB) será favorável ao impeachment.”

‘Dilma se comparou a Cunha’, afirma FHC

• Na Europa, ex-presidente diz que defesa feita pela presidente não trata das acusações de crime de responsabilide fiscal

Lucas Rohan - O Estado de S. Paulo

LISBOA - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fez críticas nesta sexta-feira, 4, à defesa apresentada pela presidente Dilma Rousseff após o anúncio da abertura do processo de impedimento contra ela na Câmara, quarta-feira passada. “Eu acho que ela mesma se comparou ao Eduardo Cunha e não deveria ter feito isso porque ninguém está dizendo isso. O que está sendo dito não é sobre ela como pessoa, é como presidente, que teria havido um abuso na lei de responsabilidade fiscal. Não existe nenhuma acusação menor a ela”, disse FHC, durante evento em Lisboa.

Na quarta-feira, Dilma afirmou que não mantém contas na Suíça, numa referência direta ao presidente da Câmara, alvo de inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF).

Questionado sobre fundamentos jurídicos, FHC afirmou que a abertura do processo de impeachment da presidente é “constitucional”. “Claro que existe(lógica para o impeachment), é constitucional. Não temos o que discutir.”

Segundo ele, “impeachment é sempre um processo delicado. Agora é preciso ver os fundamentos. Os advogados que o fizeram são competentes. E, depois, é preciso ver a questão política, se a maioria se dispõe a votar a favor da abertura do impeachment”, comentou.

Fernando Henrique classificou de “manobra” a discussão do PSDB sobre a possibilidade de cancelar o recesso parlamentar. Para FHC, é natural que haja esse debate, mas ele acredita que não vai haver cancelamento das férias do Congresso.

“Algum recesso sempre há, temos o Natal etc. Por mais que as pessoas fiquem aflitas, há. Isso são manobras de um lado e do outro. A situação é muito grave, não precisa de manobra. Eu acho que vai se impondo a realidade progressivamente e quanto mais debate houver, quando mais aberto for o Congresso, melhor”, defendeu o ex-presidente.

Ainda de acordo com FHC, o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff não pode ser “objeto de desejo”. “Eu acho que o impeachment não deve ser objeto de desejo. Acontece. No caso, precisamos ver. Se acontecer mesmo, teremos que levar a fundo porque o Brasil não pode ficar paralisado e neste momento ele está”, disse FHC. Para ele, “ninguém no Brasil quer golpe”. “Não há quem possa dar sustentação ao golpe no Brasil. Ninguém quer golpe. O Brasil quer mais eficiência na ação, mais legitimidade no Congresso. Ninguém quer golpe, está fora de cogitação”, afirmou. A democracia, declarou, está “viva”. “A Justiça está funcionando, a mídia funciona, temos liberdade, faltam instituições mais sólidas e mais representativas, mas não há risco para a democracia. ”

Impeachment pode fazer Brasil caminhar novamente, diz FHC

Folha de S. Paulo/ Da BBC Brasil /

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu nesta sexta-feira (4), em Lisboa, o uso do impeachment como "instrumento constitucional" e afirmou que o processo pode fazer o Brasil "caminhar novamente".

"O Brasil não pode ficar paralisado. E, no momento, ele está", disse o tucano à BBC Brasil.

"Existe uma lógica em fazer o pedido de impeachment. [...] É um instrumento constitucional, e não há o que se discutir sobre isso", acrescentou o tucano.

"O impeachment não deve ser nunca um objeto de desejo. Mas é um instrumento constitucional, é algo que acontece."

Dilma Rousseff é alvo de um processo de afastamento iniciado na quarta-feira pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB). Ele acolheu um pedido apresentado por advogados, que acusam a petista de irregularidades fiscais e de corrupção por causa do escândalo da Petrobras.

Desde então, a presidente tem repetido que não cometeu nenhuma irregularidade passível de impeachment. Aliados impetraram ações no STF (Supremo Tribunal Federal) contestando a validade do processo deflagrado pelo peemedebista.

'Processo delicado'
Embora tenha dominado o noticiário nos últimos dias, a troca de acusações entre Dilma e Cunha não deve ser vista como mais importante que o processo de impeachment, avaliou FHC.

"Houve um jogo entre Cunha e a presidente, no qual ambos podem sair prejudicados. Mas isso não importa agora. O que importa é discutir se há ou não motivo para o impeachment", afirmou o tucano, que defendeu a competência dos responsáveis por formular o pedido –o jurista Hélio Bicudo, que já foi filiado ao PT, e os advogados Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal.

"Impeachment é sempre um processo delicado, é preciso analisar se há fundamentos para ele, mas os advogados que o pediram são competentes", disse.

"Depois, há a questão política, se a maioria estará disposta a votar a favor e, votando a favor, se há ou não razão para o impeachment", concluiu.

Governo e Cunha disputam controle de comissão sobre impeachment

Gustavo Uribe, Ranier Bragon – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em esforço para controlar o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, o Planalto e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), iniciaram disputa pelos cargos de comando da comissão especial que elaborará parecer pelo arquivamento ou abertura de processo contra a petista.

Para evitar que seja produzido documento favorável ao impeachment, o núcleo duro da presidente articula com a base aliada a eleição de nomes afinados ao governo federal, mas que não causem rejeição entre partidos atualmente divididos sobre a necessidade da saída da petista, como PMDB e PSD.

Em movimento oposto, o presidente da Casa Legislativa atua para viabilizar deputados federais da base governista, mas que sejam seus aliados, tenham o respaldo da oposição e defendam o afastamento da presidente.

Na segunda (7), as siglas indicarão os 65 membros da comissão e, no dia seguinte, irão eleger, em votação secreta, o presidente e o relator.

A maioria dos membros será de partidos da base aliada, o que não significa apoio imediato à petista, já que há divergências em relação ao impeachment dentro de siglas que controlam ministérios.

Os dois campos concordam que dificilmente serão eleitos para presidente e relator nomes de partidos da oposição –como PSDB e DEM–, do PT e do PMDB, já que o vice-presidente Michel Temer (PMDB) seria o principal beneficiado com o afastamento da petista.

Em articulação iniciada na quinta (3), Cunha tem costurado a indicação para a presidência do líder do PTB, Jovair Arantes (GO), e para a relatoria do líder do PSD, Rogério Rosso (DF).

Em troca do apoio para que o PTB controle a comissão, os aliados do peemedebista negociam que o partido vote pelo arquivamento do processo de cassação do mandato de Cunha no Conselho de Ética. Rosso disse a aliados, porém, que não foi sondado e que não aceitará a função.

Além do PTB, os aliados de Cunha tentam acordo com o DEM e com o PSDB, o que garantiria a salvação do mandato do presidente da Câmara. Na terça-feira (8), a sessão do Conselho de Ética ocorrerá simultaneamente à instalação da comissão especial.

Em esforço pelo arquivamento do impeachment, o Planalto defende a indicação do deputado federal Paulo Magalhães (PSD-BA) para a presidência da comissão especial. Aliado do senador Otto Alencar (PSD-BA), ele tem boa relação com o ex-governador da Bahia e ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, e já saiu publicamente em defesa do mandato da petista.

A avaliação do Planalto é a de que, por já ter sido filiado ao DEM e ter bom trânsito na oposição, seria um nome que poderia agregar apoio fora do campo governista. Para a relatoria, o esforço é eleger um líder partidário contrário ao impeachment da petista, como Affonso da Motta (PDT-RS) ou João Bacelar (PTN-BA).

A batalha do PSDB para voltar ao poder

• No conturbado cenário político Brasileiro, o principal partido de oposição se apresenta como uma força que tem perspectiva real de conquistar o Planalto novamente, mas ao mesmo tempo enfrenta conflitos para a construção de uma coesão interna

Por Malu Delgado – Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Era tarde de uma quarta-feira no Congresso Nacional. Em meio aos muitos compromissos da atividade parlamentar, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que disputou a eleição presidencial de 2014 como candidato a vice de Aécio Neves, teve de dobrar o expediente, acumulando as funções de líder do partido no Senado - o titular do cargo, Cássio Cunha Lima (PB), estava de licença médica. Na sala do gabinete da liderança do PSDB na Casa, Aloysio teceu ao Valor análises sobre a disposição de seu partido para uma certa "disputa judaica" e relembrou a última pendenga na capital, em 2012, quando o ex-presidenciável José Serra, a despeito da "dimensão do nome", teve de ser submetido a uma prévia partidária para só então se credenciar como candidato à Prefeitura de São Paulo.

Afiado nas metáforas e com humor requintado, Aloysio disse que os interessados em disputar a prefeitura da capital deveriam "colocar suas cabeças para fora". "Como diria Mao Tsé-tung, floresçam cem, mil flores. Claro que se a pessoa botou a cabeça pra fora ele cortou todas." E caiu na gargalhada. No PSDB, as "cabeças das serpentes" - parafraseando o ditador chinês - não costumam ser colocadas à mostra. Movem-se internamente e nos bastidores do partido com destreza, preservando-se.

No conturbadíssimo cenário político atual, em que não apenas as tradicionais agitadas quartas-feiras, mas todos os dias do calendário, acumulam horas incendiárias no Congresso, o PSDB apresenta-se como a força que tem perspectiva real de retomar o poder em 2018. Mas, como na Palestina, segue-se a tradição de conflito eterno: engrenagens internas da sigla já estão afetadas e contaminadas pela dúvida sobre o nome do candidato: se Aécio Neves, se Geraldo Alckmin ou, numa hipótese mais remota, se José Serra. A última pesquisa Datafolha, divulgada no fim de semana, revelou que, independentemente do nome, os tucanos venceriam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa eventual disputa em 2018.

A clara perspectiva de vitória do partido esbarra, porém, em obstáculos que vão além da definição de um nome competitivo, o que todos os tucanos são unânimes em afirmar que há de sobra na legenda. Com derrotas eleitorais acumuladas desde 2002 e jogado há mais de uma década na oposição, o PSDB perdeu, na opinião de tucanos históricos, sua capacidade de inovação política e cristalizou-se apenas como o antípoda do PT.

"O partido perdeu suas raízes, seu ímpeto reformista, seja na área política, na econômica ou na social", confidenciou um membro da legenda. No ringue da política, o debate nacional restringiu-se à alternância de poder. "A discussão acaba sempre girando apenas em torno das candidaturas", continuou a refletir, sob reserva, a fonte tucana.

A degradação galopante do governo da presidente Dilma Rousseff e da imagem de seu partido, o PT, abriram caminho para que forças de oposição se capitalizassem politicamente, mas a insatisfação generalizada da sociedade com políticos e partidos não permitiu que o PSDB automaticamente se beneficiasse da crise. O partido focou na agenda de um impeachment da presidente e só recentemente, quase um ano depois de declarações divergentes de seus principais quadros, é que os tucanos aparentemente se acertaram sobre o assunto.

"Todas as lideranças do PSDB sabem de uma coisa: qualquer saída para essa gravíssima crise que o PT envolveu o Brasil se dará dentro da Constituição. Não vamos embarcar nunca nesta tentativa do PT de quase criminalizar a ação da oposição como se fosse golpe", justificou o senador Aécio Neves (PSDB-MG). O papel do PSDB, assinalou o principal dirigente da sigla, "foi blindar o Tribunal de Contas da União [TCU] para que pudesse fazer seu trabalho, como fez, e garantir que o Tribunal Superior Eleitoral [TSE] possa fazer as investigações de denúncias de cobrança de propinas na campanha eleitoral".

Nessas duas trincheiras, no TCU e no TSE, se concentram os debates sobre a existência de um crime de responsabilidade que possa expurgar a presidente Dilma do cargo. "Impeachment não depende da oposição, nós nem sequer temos número para isso. Depende das instituições. Se comprovados os crimes e o Congresso Nacional achar que foram cometidos, obviamente isso é uma previsão constitucional. Não podemos fugir dela, ter receio dela. Mas o que nós nos preparamos é para cada vez mais apresentar ao Brasil um projeto alternativo ao que está aí", emendou Aécio.

O cientista político Sérgio Fausto, superintendente-executivo do Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC), conhece bem as entranhas do partido, o que não lhe impede de fazer reflexões equilibradas sobre os dilemas atuais que seus dirigentes terão de resolver. "O partido já há algum tempo foi perdendo sua capacidade de gerar diagnósticos abrangentes, de longo prazo, sobre a situação política e a situação do país e de, a partir desses diagnósticos, formular programas. Na medida em que essa capacidade não foi desenvolvida, o partido passa a viver dos impulsos momentâneos do embate político", afirmou Fausto.

O fato de quase ter ganhado a Presidência da República em 2014 deixou o PSDB com um gosto amargo na boca, disse o cientista político. "A crise que se seguiu ao processo eleitoral foi de uma velocidade sem precedentes. Isso teve um impacto enorme, e não poderia deixar de ter em qualquer partido político."

A ideia de que o governo se desmancharia ao longo do primeiro ano do segundo mandato de Dilma era perspectiva real e não fantasia política. "Isso estimulou as lideranças partidárias a jogar um jogo de mais curto prazo com a possibilidade concreta de uma alternância precoce de poder. É natural, qualquer partido viveria esse dilema. O que acho é que o PSDB ficou muito concentrado no debate de curto prazo e perdeu a perspectiva mais ampla. O senador Aécio Neves é parte desse contexto. Ele, como líder partidário, deveria, na minha avaliação, ter sido capaz de olhar de maneira um pouco mais abrangente, mais a longo prazo, e não se deixar levar muito intensamente pela dinâmica de curto prazo."

O superintendente-executivo do iFHC avalia que Aécio deixou as rédeas soltas demais, em especial na Câmara, o que provocou danos tanto à imagem do próprio senador quanto à do partido. "Em certos círculos da elite, elite em sentido amplo, de jornalistas, da opinião pública e de empresários, que acompanham mais diretamente a política, e grande parte dos quais são simpáticos ao PSDB, acho que é forçoso reconhecer que a imagem do senador Aécio declinou no último ano", observou Fausto. O aliado Aloysio Nunes discorda com veemência: "O Aécio nunca deixou a peteca cair".

Confrontado com críticas sobre um comportamento errático do partido - como a decisão tardia de se desvincular do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) -, o presidente do PSDB considera normal o partido passar pelo escrutínio interno e externo, por sua importância nacional. Mas rebate as críticas de maneira enfática: "O PSDB vive o melhor momento da sua história. O partido se conectou com setores importantes da sociedade brasileira do qual nós estávamos absolutamente divorciados nos últimos anos. O PSDB passou a ser intérprete de um sentimento amplo da sociedade e hoje vai além dos quase 50% dos votos que nós recebemos em 2014".

O cenário político é tão complexo, completou Aécio, que não se pode exigir um posicionamento padrão das lideranças políticas do partido. "Não se pode querer que governadores de Estado tenham a mesma postura combativa que têm parlamentares na Câmara dos Deputados, onde o debate se dá de forma mais intensa." A polarização com o PT, intensificada no último pleito, não foi escolha partidária, vaticinou o mineiro. "Foi escolha da sociedade brasileira."

Sobre a posição do partido em relação a Cunha, Aécio ressaltou que não há e não houve complacência. "O PSDB não apoiou a eleição de Eduardo Cunha, apoiou o deputado Júlio Delgado [PSB-MG], mesmo sabendo que seria difícil de ser vencida." Os acordos sobre espaços cedidos ao PSDB na Câmara foram feitos "à luz do dia" com o presidente da Casa, disse o dirigente tucano. "As denúncias contra Eduardo Cunha são extremamente graves. Percebo hoje que o PSDB votará com as provas que chegarem. Nós continuamos onde sempre estivemos. Começamos nossa trajetória como oposição ao PT e somos hoje oposição ao PT", afirmou o senador mineiro.

Para dirimir questionamentos sobre a perda de protagonismo do PSDB no cenário nacional em meio à crise política, Aécio citou pesquisas qualitativas feitas recentemente pelo partido que apontam o PSDB como a legenda preferida da sociedade, superando a posição antes ocupada pelo PT. A sondagem mostrou que quase 59% dos brasileiros não se filiaria em hipótese nenhuma ao PT; 8,6% considerariam a filiação ao PSDB. Em uma outra pergunta, sobre qual partido político teria mais chance de receber a filiação do entrevistado, 45,6% disseram que não entrariam para nenhum partido. E quase 16% não souberam responder. Mas o PSDB, entre as legendas, é a que mais atrairia filiados: 14,5%. Só 6,3% disseram ter alguma chance de se filiar ao PT.

A direção nacional do PSDB quer ter em mãos, até fevereiro, um mapeamento de possíveis candidatos do partido ou de aliados nas 250 maiores cidades do país. Uma comissão nacional composta por oito parlamentares do PSDB ficou encarregada de levantar realidades locais. Ou o partido vai tentar novas filiações de nomes competitivos antes de abril, prazo para um novo filiado disputar pelo partido, ou vai apoiar aliados fortes.

"Tem muita gente querendo vir disputar a eleição do nosso lado", disse Aécio. "Se em determinada cidade há um nome qualificado, correto, com maiores chances de derrotar o PT, temos que fazer aliança em torno desse nome." Aécio também deixa claro que as disputas municipais precisam pavimentar o caminho para 2018. Os candidatos, afirmou, precisam "dar um sentido mais homogêneo à campanha". "Claro que questões locais são sempre decisivas numa eleição municipal. Mas é muito importante para eles [candidatos] poderem dizer que são aliados do partido que se coloca como alternativa real e talvez até a mais provável de governar o país", explicou o presidente do PSDB.

O secretário-geral nacional do PSDB, Sílvio Torres, quadro alinhado ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, admite a existência de falta de coesão do partido por causa da turbulência política, mas também aposta numa onda positiva para os tucanos pós-2016. "Com o partido muito mais bem-estruturado e uma enorme rejeição ao PT, naturalmente isso canaliza [votos] para a gente." Em São Paulo, os tucanos trabalham com a perspectiva de eleger mais de 400 prefeitos, com atenção especial para a região metropolitana. "O PT vai perder todas as prefeituras que tem na Grande São Paulo."

O caminho para a construção de uma unidade interna, reconheceu o senador Aloysio Nunes, ainda precisa ser construído, e as eleições de 2016 devem ajudar. "Coeso o PSDB é. Mas não temos preocupação com racha no partido. Nós temos que encontrar um meio de dar uma coesão interna, partidária, de modo que a gente tenha algo semelhante ao que tem a Igreja Católica. O bispo fala, o papa fala, e isso repercute nas paróquias."

No cafezinho do Senado, outra figura tarimbada do partido refletia sobre o cenário político. "O PSDB também é vítima deste fenômeno: ninguém sabe o que vai acontecer. 'Cem Anos de Solidão' é livro sem imaginação perto da realidade que está se mostrando no Brasil", afirmou o senador José Serra (PSDB-SP), que disputou a eleição presidencial em 2002 com Lula e em 2010 com Dilma. O senador paulista vê a instabilidade política como persistente. "Em quase todos os quadrantes da política e da sociedade, praticamente ninguém acha que a presidente Dilma Rousseff terminará o mandato. O Brasil não pode ficar três anos sem governo. Ninguém acha que com Dilma se fará um programa de união nacional", completou.

Entre os três presidenciáveis do PSDB, Serra é hoje o que teria menos força política para se credenciar à disputa de 2018 pelo partido. Porém, o debate sobre o impeachment aproximou o senador de dirigentes do PMDB e o recolocou na arena da disputa. O tucano poderia ser, entre as inúmeras especulações que se desenham sobre o futuro, o candidato do PMDB à Presidência caso Dilma deixe o cargo antes da hora. Serra desconversa e acha "surrealista" antecipar o debate de 2018. "Não tem sentido."

Amigos do tucano paulista argumentam que ele tem um excelente trânsito com todos os quadros do Senado e boas amizades no PMDB, e a predileção partiu da legenda de Ulysses Guimarães (1916-1992) e de Tancredo Neves (1910-1985), sem precisar que Serra se articulasse nos bastidores para procurar uma saída fora do PSDB. Ser a opção pemedebista coloca Serra numa zona de conforto. O governador Mário Covas (1930-2001) costumava dizer que Serra, quando entrava numa sala, jogava o chapéu sobre todas as cadeiras. O tucano tem perfil individualista, atestam seus correligionários, e nunca descarta peremptoriamente uma candidatura à Presidência. Serra quer sempre estar no páreo e não pode ver uma cadeira vazia, brincam os tucanos.

"Esquece o Aécio. O candidato do PSDB vai ser o Alckmin. E dá para comparar a atividade parlamentar do Serra com a do Aécio aqui no Senado?", perguntou um parlamentar pemedebista, desqualificando ações do senador mineiro. Nos bastidores, tucanos sem ligações com Aécio também não amenizam as críticas: o mineiro estaria dedicando as 24 horas do seu dia para "controlar o partido" e garantir que será o próximo presidenciável. Por causa do foco, não teria ocupado o papel de líder nacional da oposição. Esse papel, analisam esses segmentos tucanos, está sendo ocupado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Além disso, o fato de Aécio ter sido derrotado em Minas acendeu o alarme no PSDB. "Ele não tem Minas para mostrar e não está conseguindo liderar a oposição. Por isso estamos vivendo um tempo muito perigoso para o PSDB. A coisa pode escapar da mão da gente", refletiu um membro da cúpula do partido.

Procurado pela reportagem do Valor por intermédio de sua assessoria, Alckmin não respondeu aos pedidos de entrevista para falar sobre o atual momento do PSDB.

A despeito das dificuldades internas que começa a sentir, Aécio adquiriu incontestável densidade eleitoral em 2014 e conta com o apoio do ex-presidente Fernando Henrique e de outros importantes nomes da legenda. O ex-presidente refuta teses sobre a falta de coesão do PSDB. Em sua sala no iFHC, no intervalo do seminário A Economia do Mar: Desafios ao Desenvolvimento Sustentável no Brasil, ele recebeu o Valor, enquanto fazia um rápido lanche para aguentar a pesada jornada.

O tucano, especialmente após o lançamento de seu último livro, "Diários da Presidência", tem rotina e agenda de celebridade. Na mesma pesquisa citada por Aécio sobre a predileção do PSDB em segmentos da sociedade, FHC e Lula aparecem tecnicamente empatados como o melhor presidente que o Brasil já teve: o tucano foi escolhido por 44,3% e o petista por 46,1%. "O PSDB tem muita gente com personalidade forte. São líderes. E o PSDB não tem um dono. Então, é natural que as pessoas que têm o que dizer digam. E não necessariamente que tenham conformidade umas com as outras. Agora, isso não tem atrapalhado que em momentos cruciais o PSDB tome uma posição comum."

Para FHC, a história do partido tem mostrado que na hora da eleição todos se unem. A experiência política de dois mandatos de presidente da República pôs Fernando Henrique na linha de frente do PSDB para pedir ponderação aos tucanos que, açodadamente, defendiam a tese do impeachment. "O PSDB nunca se dispôs a sair à frente com a bandeira do impeachment. Se houver uma convocação do plenário para discutir o impeachment, é porque tem uma base. E, nesse caso, a gente acompanha, vota. Mas nós não achamos que devemos capitanear a campanha do impeachment. Essa é a posição."

O sociólogo tem alertado o PSDB sobre a necessidade de haver não apenas clara caracterização de crime de responsabilidade para levar adiante um processo de impeachment, mas sobretudo suporte político. "E o suporte político depende também da sociedade. Você tem que ter uma narrativa para explicar por que alguém que teve milhões de votos e ganhou a eleição vai sofrer impeachment. Não é uma coisa simples. É muito complexo. O partido não deve entrar nessa aventura", observou.

Fernando Henrique não vislumbra um PSDB sem José Serra e Geraldo Alckmin. "Eu acho impensável. Conheço bem o Serra. Imagina! Ele sabe as dificuldades. Imagina uma pessoa que sai do partido para ser candidato... Sai mal. O povo vai achar que saiu apenas por razão pessoal. O Serra é um homem inteligente e tem lealdade", frisou. "Não acho que isso esteja em jogo."

Sobre uma eventual filiação de Alckmin ao PSB, faz a mesma profecia. "O PSDB não tem dono. Então, quem se capacitar, se credenciar na sociedade - e não no partido só - e também no partido, vai ser o candidato. Que partido tem hoje três presidenciáveis?" Obviamente, a existência de três nomes cria "problemas de gestão política do partido". É por isso que ele se coloca. "O fato de eu ser ostensivamente não candidato, desde que deixei a Presidência, e não ser dono do partido, nem querer ser, ajuda, porque tenho a possibilidade de ajudar a conduzir no sentido da convergência."

É também de Fernando Henrique que parte outra reflexão que o PSDB parece ainda não ter encarado. "As pessoas querem discutir causas. Eu tenho dito reiteradamente que os partidos precisam aprender a tomar partido. E os partidos, por cálculo eleitoral, preferem silenciar sobre tudo o que divide." O PSDB também padece desse pecado? "Sim, padece."

Críticos do PSDB argumentam que o partido não consegue lançar uma proposta clara e contundente para o país e, por isso mesmo, foi atropelado pelo protagonismo do PMDB, que lançou um programa intitulado Ponte para o Futuro, defendendo sobretudo ações econômicas, na esfera liberal, para retomar o desenvolvimento do país. Para criar um contraponto, o senador Aécio Neves vai divulgar, na terça-feira, a proposta do PSDB na área social, abordando o polêmico debate sobre transferência de renda e o Bolsa Família. O PSDB quer, com isso, assumir o protagonismo na área social, deixada de lado pelo PMDB, resgatando, ao mesmo tempo, contornos mais progressistas do partido presentes desde a época de sua fundação.

Os programas de transferência de renda, advogam os tucanos, começaram na gestão de Fernando Henrique. Segundo Aécio, é imperativo discutir o tema abertamente e revelar um discurso falacioso do PT. "Vamos desmitificar um pouco a síntese política da distribuição de renda feita pelo PT. É parte da solução, mas a emancipação tem que se dar aliada a outras políticas, que estimulem as pessoas. Vamos mostrar que o Bolsa Família, apenas, é insuficiente. Não somos contra [o programa], sempre expliquei que o DNA dele está na gestão do Fernando Henrique", disse Aécio, recusando-se a adiantar mais detalhes da proposta. O partido também quer liderar um debate mais inovador na área ambiental, fazendo um contraponto com a ex-ministra Marina Silva, que provavelmente ressurgirá na disputa presidencial de 2018.

Com seu jeito intempestivo, o tucano José Aníbal, presidente do Instituto Teotônio Vilela, que cuida dos debates mais programáticos do PSDB -, afirmou que "é coisa de analista político desocupado" achar que o PMDB está surfando na onda do vácuo político nacional. "O Aécio apresentou um programa de governo em 2014 e temos feito ajustes [na proposta] cotidianamente. O Brasil precisa é de um novo governo e o PSDB é, sem dúvida, o partido mais qualificado para assumir o comando do país", defendeu.

Fernando Henrique é bem menos ácido e aproveita o fato para tentar compor com o PMDB. O ponto de partida da "agenda tucana", diz FHC, é o programa proposto por Aécio em 2014. "Vejo com alegria que o PMDB endossou uma parte disso. Isso que o PMDB fez agora, a Ponte para o Futuro, em grande parte está no programa do Aécio. Não acho isso ruim. Acho isso bom. Porque do jeito que estamos no Brasil temos que criar um novo consenso nacional. Vejo a manifestação do PMDB se aproximando das posições do PSDB como uma coisa positiva."

Para FHC, é bom ver a classe política e a sociedade assimilando duas discussões cruciais para o futuro do Brasil: a necessidade de reforma previdenciária e a clareza de limites para o gasto público federal.

Agenda nacional quem faz, ponderou o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), é o governo. "E o Congresso, seja oposição ou situação, segue essa agenda. Só que não existe uma agenda nem existe uma liderança de governo. O PT até hoje não quis assumir o papel de governo. Então, se o governo não tem partido, não tem governo", apontou. "Não existe em democracia parlamentar nenhuma do mundo um governo sem o suporte de seu partido. Da reeleição para cá, o governo e o PT passaram a viver uma crise de identidade."

O ajuste fiscal, disse o senador, é como um órgão transplantado no corpo petista. "O organismo deles rejeitou aquele corpo estranho [o ajuste] e isso causou a desorganização geral." Ao lado de FHC, Jereissati é um dos mais moderados tucanos e ainda insiste em defender uma pactuação nacional. Ele tem sido procurado pelo ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, para tentar construir pontes entre o governo e a oposição.

"Nós estamos pedindo um rumo, porque não cabe a nós fazer uma proposta. Nós somos oposição. Temos uma proposta recente, divulgada para o Brasil inteiro em 2014. Não temos nem maioria, nem poder, nem mandato para dar o rumo. Estamos pedindo ao governo e ao PT que façam isso, porque eles são governo", disse o cearense.

Ele admitiu que uma "meninada afoita" do PSDB forçou a barra pelo impeachment. Mas vê-se claramente que o experiente senador também teme as consequências de um afastamento de Dilma. "O PSDB ficou refém não só do debate do impeachment, mas refém de uma perplexidade de um ministro da Fazenda fazendo o oposto do que fez o governo anterior. E da falta de coordenação do PT. E da falta de assunção do PT dessa política. O Congresso ficou atordoado por uma atuação errática. É o PT que tem uma crise e tem que assumir isso", observou Tasso Jereissati.

O nome Partido da Social Democracia Brasileira é algo que incomoda o sociólogo FHC desde a origem da legenda. Ele revelou que, assim como Franco Montoro (1916-1999), não gostava do nome. Achava que a realidade brasileira tinha um contexto bastante distinto do que ocorria com os partidos sociais democratas que surgiam na Europa, atrelados aos sindicatos. Reparos à parte, o PSDB surgiu, segundo Fernando Henrique, para questionar a oposição entre Estado e mercado.

"Nós dissemos que não. Não adianta achar que pode substituir o Estado pelo mercado. E nem tampouco pensar que, para resolver o problema da pobreza e da sociedade, precisa ter só o mercado. Precisa ter uma relação nova entre mercado e Estado. O que o PSDB fez, ou tenta fazer, é isto: não negar as regras do mercado e, ao mesmo tempo, dizer que eles não vão resolver tudo. E dizer para o Estado: olha, você tampouco tem recursos para resolver sozinho tudo. Vocês têm que ter regras, têm que se articular com o mercado. Isso é o PSDB."

O fundador mais ilustre do PSDB espera que, diante da atual crise, o partido não perca suas raízes progressistas. Um outro lado sombrio do PSDB é o flerte com partidos mais radicais à direita e seu distanciamento da pauta progressista. "Sempre gostei muito de repetir uma frase que ouvi do Sergio Buarque de Holanda [1902-1982]: 'Aqui no Brasil, o problema não é dos conservadores, não é a direita. É dos atrasados. Você tem que comandar o atraso'." O PT, afirmou o ex-presidente, foi engolido por setores atrasados. O tom do slogan que deve balizar o discurso eleitoral do PSDB parte, também, de FHC: "Não é esquerda e direita. E é preciso o PSDB, assim como o PT botou em cima de nós a ideia de que somos elite, dizer que eles são incompetentes, além de ladrões. Eu não generalizo ladrões. Mas a incompetência é bastante ampliada."

Para Sérgio Fausto, "o PSDB foi empurrado para a direita pelo PT, mas mais do que ser empurrado parte do PSDB se deixou levar, sem resistência, para a direita." A geração original de líderes do PSDB, recordou o cientista político, "tinha paixão pela liberdade e paixão também pela redução das desigualdades" - "a tradição da democracia cristã, com Montoro, a militância de centro-esquerda pré-64, que Mário Covas expressava, e a vertente de centro-esquerda que o Serra e o FHC representavam desde o PMDB autêntico".

Já as novas gerações tucanas, assinala, perderam densidade programática, com algumas exceções. "Como núcleo dirigente de fato, pode-se dizer que o PSDB perdeu densidade programática e se tornou mais conservador. Se o PSDB vai nessa direção, talvez possa até fazer sentido eleitoral. Agora, dizendo de uma maneira muito simples e franca, esse não é o PSDB com o qual eu simpatizo. Eu prefiro uma outra trajetória. Reconheço que os ventos não têm soprado nessa direção."

Ronaldo Vainfas: Nova face do autoritarismo

• Proposta da comissão do MEC para o ensino da História em 2015 é uma aberração. Mutila os processos históricos globais, aposta na sincronia contra a diacronia

- O Globo

Não é de hoje que o Estado brasileiro tenta estropiar o ensino da História no país. No regime militar, a principal tentativa veio com a obrigatoriedade do ensino de Estudos Sociais, fundindo a História e a Geografia em uma mesma disciplina, em detrimento de ambas. Foi uma decisão do governo Médici, em 1971, no auge da ditadura, restrita ao atual ensino fundamental, antigo primeiro grau. O modelo era o do Social Studies dos EUA, que concebia o estudo da História a partir de círculos concêntricos: família, escola, bairro, cidade, país. Um modelo limitado, ao mesmo tempo individualista e nacionalista. O combate à História como disciplina se alastrou para o antigo secundário, atual ensino médio, com a imposição das disciplinas Organização Social e Política do Brasil (OSPB) e Educação Moral e Cívica. Tais reformas foram executadas nas gestões dos ministros Jarbas Passarinho e Ney Braga no MEC, ambos militares reformados engajados no golpe de 1964.

A sociedade brasileira reagiu, e a História foi restaurada como disciplina específica, entre 1984 e 1993, em meio ao processo de redemocratização do país. Atualmente, ela integra o currículo mínimo do ensino fundamental e do ensino médio. Os diversos Parâmetros Curriculares Nacionais garantiram a interdisciplinaridade, sem rejeitar a especificidade do conhecimento histórico: a diacronia, as particularidades.

Eis que agora vem à baila a discussão da Base Curricular Comum, urdida pelo Estado desde o primeiro governo lulopetista. Nunca se soube como foram escolhidos os membros da comissão encarregada do trabalho, cujos nomes só agora vêm a público, muito menos as instruções que receberam deste governo cara de pau. O fato é que os trabalhos da comissão foram consolidados em 2014, ano eleitoral, e publicizadas em 2015. O conceito de Base Curricular Comum é, por si mesmo, discutível, ao presumir uma uniformidade de conhecimentos desejáveis, sobretudo em História, para um país gigantesco e diverso.

O mais grave, porém, é a retomada da postura autoritária, ainda que invertendo a chave da ditadura militar. A disciplina História prevista pelo regime lulopetista estabelece para o fundamental I o ensino de sujeitos, grupos sociais, comunidades, lugares de vivências e, por fim, o dos “mundos brasileiros”. Conceitos abstratos e anódinos, impossíveis de serem ensinados a crianças, salvo como doutrina. Os primeiros dois anos do fundamental II prosseguem nesta linha abstrata de “processos e sujeitos”.

Imagine-se o aluno que ingressar no ensino médio com tais “conhecimentos” incertos. E logo no primeiro ano, terá aulas sobre os “os mundos ameríndios, africanos e afro-brasileiros”, matéria aprofundada no ano seguinte, com o estudo dos “mundos americanos”, para culminar com os “mundos europeus e asiáticos” no terceiro ano. Nunca houve, na história deste país, parafraseando o “grande líder”, um ataque deste jaez ao ensino da História.

O ensino da História do Brasil sempre foi problemático entre nós, brasileiros, sendo ora admitida como disciplina específica, ora inserida na História Geral. Reaparece, na versão lulopetista, de maneira desastrosa. A comissão encarregada de formular o currículo comum não se avexa de escrever que “enfatiza-se a História do Brasil como o alicerce a partir do qual tais conhecimentos serão construídos ao longo da educação básica”.

Nem mesmo a reforma do ministro Francisco Campos, em 1931, ou a de Gustavo Capanema, em 1942, ministros de Getúlio Vargas, ousaram perpetrar tal decreto, entronizando o Brasil como o centro do mundo. E o tempo era revolucionário, golpista, ditatorial — depende da interpretação.

A proposta da comissão do MEC para o ensino da História em 2015 é, portanto, uma aberração. Mutila os processos históricos globais, aposta na sincronia contra a diacronia, é fanática pelo presentismo. Incentiva ódios raciais e valores terceiro-mundistas superados. Estimula a ignorância, ao colocar a História ocidental como periférica, na realidade como vilã. Combate o eurocentrismo com um brasilcentrismo inconsistente. É uma aposta no obscurantisamo, inspirada por um modelo chavista de política internacional. Que Deus salve o Brasil desta praga — só apelando a Deus, et pour cause.

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Ronaldo Vainfas é historiador

O povo x Dilma Vana Rousseff: ITV

• Dois de cada três brasileiros querem a saída da presidente do cargo. Se quer batalhar pelo seu mandato, é melhor ela deixar de lado as mentiras e ater-se ao mérito das acusações

É ridiculamente enganoso querer transformar o processo de impeachment movido contra Dilma Rousseff em um confronto entre ela e Eduardo Cunha. Não são duas pessoas físicas que estão se digladiando. O que há são acusações e suspeitas reais de que a presidente da República cometeu crimes de responsabilidade no exercício do cargo. É isto o que está em jogo, é a isto que a petista terá de responder.

O presidente da Câmara apenas cumpriu o papel institucional que a Constituição lhe reserva e deu início ao trâmite. Agora, caberá a colegiados - primeiro a comissão especial, depois os plenários da Câmara e do Senado - decidir sobre o mérito da ação movida por três juristas, segundo a qual Dilma feriu a norma orçamentária, atropelou a lei fiscal e fez vista grossa perante a corrupção.

São milhões os brasileiros que comungam da opinião de que Dilma não tem condições de continuar na presidência do país. E não apenas por sua evidente inaptidão para o cargo. A prática dos crimes é flagrante e reiterada. A omissão diante da roubalheira vem de longa data, e a acompanha desde o primeiro cargo que ocupou no governo federal.

Ontem, nas suas primeiras tentativas de desmerecer a ação, o governo saiu derrotado. Para começar, a própria presidente distorceu a história, ao negar que havia barganhado com Cunha até a véspera do acolhimento do impeachment. Em seguida, o STF reforçou o respaldo ao mérito do pedido de afastamento, ao negar provimento a ações da base governista. E, para completar, o governo ainda foi pego num monte de mentiras.

Até as palmeiras da Praça dos Três Poderes sabem que o Palácio do Planalto negociou intensamente com o presidente da Câmara para demovê-lo de acolher o processo de impeachment. Tanto havia a barganha que, só depois que os petistas no Conselho de Ética resolveram tomar outro rumo e condenar Cunha, o desfecho irrompeu.

No STF, dois pedidos movidos por parlamentares da base governista não foram acolhidos, em mais uma evidência de que não há reparo jurídico ao mérito do pedido de afastamento aceito na quarta-feira. Além disso, Michel Temer negou declaração de Jaques Wagner, porta-voz de Dilma, de que não veria "nenhum lastro" para o pedido de impeachment.

A saraivada de distorção da realidade não estaria completa sem a participação de Lula. Em declaração feita no Rio, o petista tentou atribuir ao processo de impeachment e às ações da oposição a responsabilidade pelo Brasil estar em pandarecos. De tão contraditório, acabou admitindo que o governo de sua pupila transformou o país num "trem descarrilhado".

O fato incontestável é que dois de cada três brasileiros são favoráveis ao impeachment e querem a saída de Dilma Rousseff do cargo. Se quer batalhar pelo seu mandato, é contra estes brasileiros que a presidente deve se debater. A presidente não tem apenas o cidadão Eduardo Cunha contra si. Tem milhões de pessoas que, democraticamente, querem vê-la pelas costas, num processo ao qual o presidente da Câmara somente deu acolhimento.

Miguel Reale Júnior*: É a hora da sociedade civil

- O Estado de S. Paulo

O Estado Democrático de Direito está gravemente ferido. É necessário reconstruir a democracia, da qual um dos alicerces consiste na confiança da população nos agentes políticos que elege. Hoje, justificadamente, essa confiança inexiste no Brasil.

A democracia destaca-se por viver e conviver com as divergências, a serem superadas pelo diálogo e pela persuasão para a formação de uma maioria parlamentar legítima, respeitada pelas minorias. Todavia o confronto de ideias e de perspectivas, próprio da democracia, desapareceu do cenário político, substituído por entendimentos promovidos graças a arranjos financeiros com dinheiro público subtraído de empresas como Petrobrás, Sete Brasil, BR Distribuidora, Angra 3, Belo Monte.

Não se fez política, nem se praticou a democracia. Apenas se transitou num bazar de venda de apoios por dinheiro vivo ou graças à ocupação de cargos na administração, colocando apaniguados em postos estratégicos para obtenção de vantagens ou para demonstração de prestígio. Instalou-se a desabusada prática de exercer o poder para institucionalizar a ação corrosiva da corrupção como normalidade. A democracia foi corroída por dentro ao se obter uma maioria marrom, enlameada pela compra de consciências e do convencimento.

O poder econômico privado aliou-se a administradores públicos venais, abocanhando serviços superfaturados cujos frutos reverteram em parte para deputados e senadores, bem como para seus partidos, visando a assegurar ao Executivo uma maioria comprada. Os partidos da base governista fizeram caixa para enfrentar, com muitos recursos, as futuras eleições.

Formou-se um círculo pernicioso com o dinheiro público desviado desde o mensalão e consolidado no petrolão, pois esses numerários, em conluio com empresários, saíram dos cofres de órgãos do Executivo, pela ação de diretores, indicados por líderes políticos, e foram usados para manutenção de apoio parlamentar ao próprio Executivo.

Uma organização criminosa passou a dominar o País e suas instituições políticas, levando ao cúmulo de se eliminar a divisão de Poderes e o jogo de contrastes de perspectivas próprio da democracia. Parlamentares e administradores uniram-se na festança da fruição do dinheiro público desviado. A corrupção tornou-se o denominador comum por via do qual se compuseram Executivo e Legislativo visando à apropriação de vantagens indevidas de toda ordem.

Tão grave quanto era o liame tentado entre Presidência da República e presidência da Câmara dos Deputados, com vista a um acordo espúrio para garantia de mútua impunidade: o apoio de deputados do PT à absolvição do presidente da Câmara em troca da rejeição liminar dos pedidos de impeachment. Todavia, ao se recusar o PT a apoiá-lo, Eduardo Cunha acolheu o pedido de impeachment, escrevendo certo por linhas tortas.

A defesa do Estado Democrático de Direito é dever do advogado, como assinala o artigo 2o do novo Código de Ética. Hoje o mais frágil e mais urgente cliente do advogado é o Estado de Democrático de Direito. A sua defesa incumbe a todos nós advogados, bem como às nossas instituições.

Agora não se trata de lutar contra uma ditadura, nem de resistir às afrontas às liberdades civis e políticas, mas, sim, em ir mais a fundo, pois os alicerces, fincados pela Constituição de 1988, apodreceram. É preciso, portanto, reconstruir suas bases. Não é só o governo que está em crise, é o regime democrático que está. Como principais defensores do Estado Democrático de Direito, aos advogados cumpre assumir a dianteira para salvar a democracia, reestruturá-la, não só afirmando a necessidade de punição daqueles que a destroem pelo mal da corrupção, observado o devido processo legal, mas pugnando, mais do que já se fez, por medidas impeditivas da corrosão da democracia.

Os advogados, valendo-se de sua história de lutas, devem exigir, pressionar com força por mudanças de fundo urgentes, para tanto mobilizando novamente a sociedade, já mobilizada pelos diversos movimentos contra a corrupção que levaram milhões às ruas, agora tendo por pauta a reforma estrutural do Estado. Não basta afastar Dilma. É preciso também preparar o futuro.

É hora de nos engajarmos nessa luta pela democracia no Brasil, sem meios-termos, sem receios, conclamando as demais entidades da sociedade civil que congregam administradores de empresas, contadores, engenheiros, médicos, auxiliares de saúde, arquitetos, promotores e juízes, trabalhadores da indústria, comerciários, etc., bem como entidades do terceiro setor e os inúmeros participantes dos movimentos construídos pelas redes sociais, para em uma só voz exigir mudanças no sistema eleitoral, fonte de muitos males, e no regime de governo, com a adoção, pelo menos, de presidencialismo parlamentarizado, visando a facilitar a responsabilização dos governantes.

Cumpre, também, estabelecer eficaz e sério Programa de Integridade, com inamovível e bem qualificado fiscalizador dos demais servidores em cada setor da administração pública, bem como nos partidos políticos, a serem responsabilizados pelos atos de seus membros. A eliminação de dois terços dos cargos em confiança na administração direta e indireta, assim como a aplicação de testes de honestidade e garantia de confidencialidade para informantes de práticas de corrupção são outras propostas positivas.

Além do mais, é importante o fortalecimento dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Ministério Público Eleitoral, para fiscalizar a estrutura de campanha dos candidatos e suas contas durante o processo eleitoral.

Só assim se pode refazer a confiança do povo no processo democrático. Dessa forma, cumpre aos advogados tentar salvar, em conjunto com várias forças sociais, o seu cliente preferencial, o combalido Estado Democrático de Direito. É a hora da sociedade civil!

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* Miguel Reale Júnior é advogado, professor titular sênior da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras, foi ministro da Justiça