sexta-feira, 21 de abril de 2017

Opinião do dia – Fernando Gabeira

A experiência de vida mostra que muitas coisas que eram proibidas no passado passam a ser permitidas com o tempo, como, por exemplo, o divórcio e a união de gays. Mas história é mais complicada. Muitas coisas, antes toleradas, passam a ser proibidas com o tempo, como o assédio sexual por exemplo.

Alguns fatores tornaram a corrupção conhecida de quem observava friamente o processo, mais vulnerável que no passado. Um desses fatores é a maior transparência impulsionada também pela revolução digital. Outro aspecto importante, talvez inspirado pela Justiça americana, é a tática de rastreamento do dinheiro de propinas através dos labirintos do sistema financeiro internacional.

Finalmente, certas mudanças de atitude, como a da Suíça, foram fundamentais. A Suíça se abriu, a polícia brasileira mudou, a tolerância das pessoas comuns mudou, foram tantas mudanças que é bastante compreensível que a bolha tenha estourado agora, e não antes, apesar de inúmeras tentativas frustradas.

Mesmo sem me importar com os risos pragmáticos, diria que Emílio poderia aprender com o escândalo uma lição mais valiosa que sua fortuna: a impermanência de tudo, o constante processo de mudanças.

*Fernando Gabeira é jornalista. “Fim do mundo, novo mundo”, O Estado de S. Paulo, 21/4/17.

'Triplex era do Lula'

‘Triplex era de Lula’, diz ex-presidente da OAS

Lava Jato. Pinheiro afirma a Moro que desde a obra já sabia que imóvel era de petista; segundo ele. Vaccari e Okamotto pediram para apartamento ficar em nome da construtora

Fausto Macedo, Ricardo Brandt, Julia Affonso e Luiz Vassallo | O Estado de S. Paulo

Em relato devastador para ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, afirmou categoricamente nesta quinta-feira, 20, que ‘o apartamento era do presidente Lula’. O executivo se referia ao tríplex 164-A do Condomínio do Edifício Solaris, no Guarujá, litoral de São Paulo.

“O sr. entende que deu a propriedade do apartamento para o presidente?”, indagou o advogado de Lula Cristiano Zanin Martins.

“O apartamento era do presidente Lula. Desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop já foi me dito que era do presidente Lula e sua família e que eu não comercializasse e tratasse aquilo como propriedade do presidente”, afirmou o empreiteiro.

Lula pediu destruição de provas, diz sócio da OAS

Léo Pinheiro diz que Lula pediu para ele destruir provas de propina

Mario Cesar Carvalho | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O empresário Léo Pinheiro, sócio da OAS, disse em audiência em Curitiba que o ex-presidente Lula pediu para ele destruir provas sobre propinas que a empreiteira pagou ao PT.

Segundo Pinheiro, Lula e ele discutiram sobre propina no Instituto Lula, entre abril e maio de 2014, dois meses depois que a Operação Lava Jato ter sido iniciada. Lula parecia "um pouco irritado" e teria perguntado se a OAS pagava propina ao PT no Brasil ou no exterior, segundo o relato feito pelo empreiteiro.

O empresário disse que respondeu que pagava no Brasil. O ex-presidente arguiu se ele mantinha os registros dos pagamentos feitos ao tesoureiro do PT à época, João Vaccari Neto. O empresário disse que mantinha.

Lula teria dito, segundo Pinheiro: "Você tem algum registro de algum encontro de contas, de alguma coisa feita com João Vaccari? Se tiver, destrua".

"Ele me disse 'olha, se você costuma ficar anotando documento, é melhor que você não participe de nada'. Ele foi muito duro na conversa comigo. Não sei lhe responder infelizmente por que ele estava tão irritado", disse o empreiteiro.

A pergunta sobre a discussão de propina com Lula foi feita pelo advogado do petista, Cristiano Zanin Martins. Após a resposta de Léo Pinheiro, Martins ficou quieto.

O empresário não esclareceu na audiência se ele seguiu o pedido de Lula ou não.

‘Se tiver, destrua’

Sócio da OAS revela que Lula o instruiu a dar fim a provas de pagamento de propina ao PT

Cleide Carvalho, Gustavo Schmitt, Tiago Dantas e Dimitrius Dantas | O Globo

A ordem do número 1

Léo Pinheiro, da OAS, diz a Moro que Lula pediu destruição de provas de propina ao PT

-SÃO PAULO- Numa espécie de delação informal, após meses de expectativa sobre o que poderia falar a respeito do esquema de corrupção envolvendo empreiteiras e o PT, o empreiteiro Léo Pinheiro, sócio da OAS, saiu para o ataque contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sem meias palavras, o empresário afirmou ao juiz Sérgio Moro que Lula pediu a ele destruição de provas referentes a pagamento de propina para o partido. No depoimento, Pinheiro relatou em detalhes o pedido feito por Lula:

— Eu tive um encontro com o ex-presidente, em junho (de 2014), tenho isso anotado na agenda, são vários encontros, onde o presidente textualmente me fez a seguinte pergunta: “Léo, o senhor fez algum pagamento a João Vaccari no exterior?” Eu (Léo) disse: “Não, presidente, nunca fiz pagamento a essas contas que nós temos com Vaccari no exterior”. (Lula): “Como você está procedendo os pagamentos para o PT?” (Léo): “Estou fazendo os pagamentos através de orientações do Vaccari de caixa 2, de doações diversas que nós fizemos a diretórios e tal”. (Lula): “Você tem algum registro de algum encontro de contas feitas com João Vaccari com vocês? Se tiver, destrua”. 

‘O apartamento era do presidente Lula’

Sete anos após revelação do GLOBO, construtor diz que tríplex era mesmo do líder petista

- O Globo

-SÃO PAULO- Preso desde setembro do ano passado, o empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, afirmou que o tríplex no Guarujá era do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo ele, o imóvel já estava reservado para o petista antes mesmo da negociação com a Bancoop, cooperativa que repassou o prédio para a empreiteira após problemas financeiros.

— O apartamento era do presidente Lula desde o dia que me passaram para estudar o empreendimento da Bancoop. Já foi me dito que era para o presidente Lula e sua família. Que eu não comercializasse e tratasse aquilo como coisa do presidente Lula — disse Pinheiro, afirmando ainda que a empresa só não teve prejuízos na reforma do apartamento porque as despesas foram pagas com a negociação de propina num contrato com a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

Ao longo do depoimento, Pinheiro deu detalhes do processo de compra e venda do apartamento. Segundo ele, inicialmente tratava-se de um imóvel de 80 metros quadrados, mas, logo depois, a família do ex-presidente decidiu por um de 240 metros.

Pinheiro contou que João Vaccari o procurou em 2009 pedindo que a OAS assumisse empreendimentos da cooperativa, que beirava a insolvência. O empreiteiro acabou aceitando a proposta e foi surpreendido por um pedido para que a empresa atuasse especificamente num empreendimento no Guarujá, litoral de São Paulo:

Palocci diz a Moro que está disposto a revelar ‘nomes e operações do interesse da Lava Jato’

Em depoimento, ex-ministro dos Governos Lula e Dilma afirmou ao juiz federal: 'Se o sr. estiver com a agenda muito ocupada, a pessoa que o sr. determinar, eu imediatamente apresento todos esses fatos para um ano de trabalho’

Julia Affonso, Ricardo Brandt e Fausto Macedo | O Estado de S. Paulo

O ex-ministro Antonio Palocci (Governos Lula e Dilma/Fazenda e Casa Civil) pediu a palavra nesta quinta-feira, 20, durante seu interrogatório na Operação Lava Jato, para fazer uma oferta enigmática ao juiz Sérgio Moro. Ao fim do depoimento, o petista sugeriu entregar informações ‘que vão ser certamente do interesse da Lava Jato’.

“Fico à sua disposição hoje e em outros momentos, porque todos os nomes e situações que eu optei por não falar aqui, por sensibilidade da informação, estão à sua disposição o dia que o sr. quiser. Se o sr. estiver com a agenda muito ocupada, a pessoa que o sr. determinar, eu imediatamente apresento todos esses fatos com nomes, endereços, operações realizadas e coisas que vão ser certamente do interesse da Lava Jato.”

Palocci diz estar disposto a revelar fatos e nomes

Em clara demonstração de que pretende conseguir o benefício da delação premiada, o ex-ministro Antonio Palocci disse estar à disposição para revelar “nomes, endereços e operações realizadas” de interesse da Lava-Jato. Em depoimento ao juiz Sérgio Moro, no inquérito em que é acusado de usar dinheiro de propina para pagar ao marqueteiro das campanhas dos ex-presidentes Lula e Dilma, Palocci admitiu a existência de caixa dois nas eleições e negou ter orientado pagamentos no exterior a João Santana e Mônica Moura. Preso desde setembro do ano passado, Palocci disse a Moro: “Posso dar um caminho que vai lhe dar mais um ano de trabalho, que faz bem ao Brasil.”

Palocci diz a Moro ter nomes e operações de interesse da Lava-Jato

Ex-ministro admite caixa dois e sinaliza delação com informações para ‘mais um ano de trabalho’ do juiz

Cleide Carvalho, Gustavo Schmitti, Tiago Dantas e Sérgio Roxo | O Globo

-SÃO PAULO- O ex-ministro Antonio Palocci dá mostras cada vez mais claras de que pode aderir à lista de delatores da Operação Lava-Jato. Em audiência ontem, em Curitiba, o petista admitiu a existência de caixa 2, negou ter determinado pagamentos no exterior aos marqueteiros João Santana e Mônica Moura — não falou sobre pagamentos no Brasil — e acenou com a possibilidade de contar fatos novos sobre o financiamento de campanhas políticas no Brasil, envolvendo agentes financeiros, mas não o PT. Ao juiz Sérgio Moro, disse que pode, a qualquer momento, apresentar mais informações.

— Apresento todos os fatos com nomes, endereços e operações realizadas. Posso lhe dar um caminho que vai lhe dar mais um ano de trabalho, que faz bem ao Brasil — disse Palocci, ao explicar que falaria sobre “nomes e situações” que, na audiência, não foram mencionados,

Disputa interna do PT tem avalanche de denúncias

Catia Seabra | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Quatro mortos estão na lista dos eleitores do 6º Congresso do PT na cidade de Arandu, no interior de São Paulo. Outros quatro, em Catanduva (SP).

Minas Gerais, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul também registram denúncias de fraudes nas eleições internas do PT, espécie de prévia para a disputa pelo comando nacional do partido, que ocorre em maio.

Os indícios de irregularidade afetam o partido às vésperas do depoimento do ex-presidente Lula ao juiz federal Sergio Moro, marcado para 3 de maio.

A coordenação da macrorregião de Rio Preto, responsável pela cidade de Catanduva, reuniu atestados de óbito de quatro pessoas cujos nomes constariam da lista de participantes da eleição interna do PT. O partido abriu investigação sobre o caso de Arandu.

A denúncia sobre Catanduva deve ser discutida em reunião da executiva estadual do PT, na próxima segunda-feira.

Também em Catanduva, integrantes do movimento Muda PT produziram um vídeo em que, confrontados, filiados não reconhecem as assinaturas a eles atribuídas na lista de votação do dia 9.

O mesmo vídeo traz o momento em que um representante da corrente Avante –que tem o deputado Arlindo Chinaglia entre seus líderes – é flagrado carregando a urna minutos antes do encerramento da votação.

Judiciário brasileiro não é a vara de Curitiba, diz Gilmar Mendes

Giuliana Miranda | Folha de S. Paulo

LISBOA - O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes rebateu as recentes críticas de morosidade da corte em contraposição a uma suposta rapidez das instâncias inferiores.

"O Judiciário brasileiro de primeira instância não é a 13ª vara de Curitiba [responsável pela Lava Jato]", disse Mendes.

O ministro destacou que as condições de trabalho da equipe responsável pela Lava Jato são bem diferentes da realidade da maioria dos tribunais brasileiros.

"Curitiba não é o padrão. E nem é o padrão da Justiça federal. O Moro está trabalhando sob condições especialíssimas, só faz isso", completou.

Para Mendes, comparar a atuação do Supremo com a vara de Moro é uma atitude "irresponsável".

Marcelo Odebrecht cita apoios financeiros à imprensa

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Como seu pai, Emílio, o ex-presidente do grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, também disse em sua delação que era comum a empreiteira dar apoio financeiro a veículos de mídia.

O empresário mencionou especificamente a revista "Carta Capital" e os jornais "Correio Braziliense", "Estado de Minas", "A Tarde" e "Jornal do Brasil". Genericamente, indicou todos os jornais da Bahia.

O depoimento do executivo foi prestado em relação ao tema "pedidos de ajuda financeira de Lula para terceiros".

Sobre esse assunto, Marcelo afirmou que a "Carta Capital" sempre teve uma "linha muito pró PT" e tinha problemas de prejuízos, então o ex-ministro Guido Mantega pediu a ele um auxílio da empresa para a revista.

Marcelo disse que concordou em dar o apoio financeiro, porém com a condição de que o nome da Odebrecht não aparecesse na operação.

Ministros do STF divergem sobre julgamento de foro

Para Marco Aurélio, Legislativo é que deve analisar alcance da prerrogativa: Gilmar Mendes diz que o momento não é ‘oportuno’

Rafael Moraes Moura | O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Contrário ao foro privilegiado, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse nesta quinta-feira, 20, que o Congresso Nacional deveria disciplinar o alcance do número de autoridades beneficiadas com esse direito. O tema será levado ao plenário da Corte no dia 31 de maio, quando os ministros julgarão uma ação penal proposta pelo Ministério Público contra o atual prefeito de Cabo Frio (RJ), Marcos da Rocha Mendes (PMDB), por crime eleitoral nas eleições de 2008.

Após a divulgação da data do julgamento do processo, o relator no Senado do projeto que extingue o foro privilegiado, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), avaliou que o STF deveria "aguardar" para analisar o tema contra "o risco" de que o STF acabe legislando em seu lugar.

O caso do prefeito fluminense já subiu e desceu para diversas instâncias por causa dos diferentes cargos ocupados pelo peemedebista no período.

Comissão da Reforma Política vai se limitar a criar fundo eleitoral

Andreza Matais | O Estado de S. Paulo

Sem consenso em torno do relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP), a Comissão da Reforma Política na Câmara será esvaziada. Vai votar apenas a criação de um fundo já para financiar 2018.

As modificações no sistema eleitoral vão ser direcionadas para uma comissão especial, que vai trabalhar com as propostas aprovadas no Senado.

Reforma incluirá servidores do Rio

Os servidores do Rio deverão ficar sujeitos às regras gerais de aposentadoria, avaliam gestores da Previdência, pois não haverá tempo hábil de criar regimes próprios.

No Rio, regras devem endurecer

Não há tempo hábil e espaço político para reforma regional, dizem presidentes de fundos de pensão

Bruno Dutra, Geralda Doca | O Globo

Servidores do Rio devem ter regras mais duras para aposentadoria. Isso porque, conforme afirmam os presidentes dos fundos estaduais e municipais que fazem a gestão da Previdência do funcionalismo, não há tempo hábil nem espaço político para aprovar uma reforma regional, o que fará com que, automaticamente, as regras do regime geral passem a valer para os servidores do Rio. A reforma da Previdência apresentada pelo governo federal prevê que estados e municípios têm seis meses para fazer suas reformas.

Reges Móises dos Santos, presidente do Rioprevidência, que gere os benefícios do servidor estadual, foi categórico ao afirmar que nenhuma reforma será feita na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj): — Vamos seguir as regras da União. Segundo Santos, as propostas que constam na reforma da União atendem às necessidades atuais do fundo estadual e podem ajudar a manter o equilíbrio atuarial nos próximos anos:

— As regras propostas são de mudança estrutural, que é o que o sistema previdenciário do estado necessita para ajudar a equilibrar suas contas no médio e no longo prazos. O aumento da idade mínima ajuda bastante, pois o servidor passa mais tempo contribuindo, e o Rioprevidência começa a pagar mais tarde.

A previsão é que o rombo no Rioprevidência em 2017 chegue a R$ 12 bilhões, subindo, até 2020, para R$ 17 bilhões.

A situação não é diferente no Previ-Rio, que faz gestão do Regime Próprio de Previdência Social do servidor municipal. Para este ano, a autarquia prevê déficit de R$ 2,6 bilhões.

— É preciso um projeto preparado pelo município, que respeite as peculiaridades do servidor. Porém, acredito que o prazo de seis meses é apenas retórico, pois é impossível aprovar mudanças neste prazo, especialmente em ano de eleições gerais — diz Luiz Alfredo Salomão, presidente do Previ-Rio.

Fim do mundo, novo mundo | *Fernando Gabeira

- O Estado de S. Paulo

O que essencialmente mudou o quadro de corrupção no País foi a eficácia da Lava Jato

A delação dos dirigentes da Odebrecht não trouxe tantas novidades para quem leu os vazamentos. No entanto, a forma como se apresentou – vídeos dos delatores, riqueza de detalhes e algumas surpresas – trouxe grande impacto mesmo para os que conheciam os dados principais da trama.

Para começar, alguns obstáculos técnicos: as denúncias não foram hierarquizadas e divididas em blocos. E o áudio das delações era bastante sofrível. Aliás, a qualidade do áudio é uma crítica que faço não apenas à Lava Jato. Parece que vivemos numa era pré-estereofônica, na contramão de uma tecnologia cada vez mais acessível.

Percebo à distância que grandes peixes passaram quase em branco, como o negócio dos submarinos com a França. Aliás, dos 200 depoimentos ainda em sigilo, quase todos tratam de aventuras internacionais e da participação do BNDES, algo que me interessa na proporção em que se esforçam para escondê-los. Nesse oceano de informações, algumas dolorosas, porque trazem também decepção sobre certas pessoas, escolhi uma frase de Emílio Odebrecht para comentar, aquela em que ele diz que a corrupção existe há 30 anos e ele não entende a surpresa da imprensa, que não a teria denunciado.

O papel da esquerda quando o Rei está nu | Vladimir Palmeira

- O Globo

O papel de uma esquerda transformadora deveria ser o de aproveitar a Lava-Jato para renovar a si e a suas práticas, e defender a reestruturação do sistema político

A divulgação das delações dos executivos da Odebrecht revelou o que já estava latente: o sistema político brasileiro está podre. Um dos delatores foi direto: “Não há quem tenha sido eleito sem caixa 2.” Mesmo quem não pegou diretamente, recebeu via partido.

Segundo as delações, Temer foi anfitrião e participou da reunião, junto a Cunha, dos acertos para o PMDB. Um terço de seus ministros será investigado agora pelo STF. Lula contrariou interesses da Petrobras (aquela que no slogan petista é defendida para defender o Brasil) para favorecer o Grupo Odebrecht no setor petroquímico. Aécio, Alckmin e Serra, do PSDB que dizia que era tudo obra do PT, estão também encalacrados. Até ao Fernando Henrique a coisa chegou. Um terço do Senado e um quinto da Câmara também estão na lista, que engordará se Cunha resolver abrir o bico.

A periferia e o PT | José de Souza Martins

- Valor Econômico

A Fundação Perseu Abramo, instituição de estudos do Partido dos Trabalhadores, acaba de divulgar os resultados de uma pesquisa qualitativa sobre as mudanças de mentalidade social e política na periferia de São Paulo que levaram à decadência da mítica do partido e à sua derrota nas últimas eleições.

A pesquisa reflete o binarismo ideológico do PT e, no geral, do impolítico partidarismo brasileiro. Basicamente, a análise propõe que, no apogeu do petismo, a população da periferia era orientada por horizontes "associativistas e comunitaristas". Com a expansão e o avanço do ciclo econômico, "novos valores (...) foram gestados entre as camadas populares, que passaram a se identificar mais com a ideologia liberal que sobrevaloriza o mercado".

Com "descenso e retração do ciclo econômico essa camada da população passou a reagir informada (...) mais por diretrizes marcadas pelo individualismo e pela lógica da competição, com uma tônica acentuada do mérito nos discursos". Esse dualismo metodológico e seu materialismo pobre facilitaram a conclusão de que a periferia acabou se identificando com o neopentecostalismo.

A análise se baseia num retrocesso teórico à polarização comunidade e sociedade, que já passou pela crítica teórica e por densas reelaborações na sociologia brasileira.

A crise e o fortalecimento da democracia | Fernando Abrucio

- Valor Econômico | Eu & Fim de Semana

O sistema político construído desde a Nova República, e cuja consolidação foi resultado do processo de impeachment do presidente Collor, teve sua morte decretada na semana passada. É bem verdade que PMDB, PT e PSDB tendem a sobreviver como agremiações partidárias, mesmo que com um tamanho menor. Mas é difícil que tenham a centralidade dos últimos 25 anos, seja na definição da eleição presidencial, seja como peças principais da governabilidade. O que virá no seu lugar e com qual modus operandi são duas questões estratégicas para o futuro de nossa democracia. Nada diz que saíremos melhores ou piores da crise. Tudo vai depender da leitura correta e parcimoniosa do tsunami que nos atingiu.

A reformulação das estruturas que geraram a crise é essencial, embora as soluções institucionais não caibam numa fórmula mágica. O diagnóstico envolve vários elementos. Primeiro, as campanhas políticas tornaram-se muito caras, especialmente com a centralidade que o uso do tempo de rádio e TV ganhou no jogo político. Terminar com o horário eleitoral gratuito, pura e simplesmente, não seria o correto, porque acentuaria o poder de quem tem mais recursos financeiros e organizacionais prévios, ou de quem já é mais conhecido, geralmente por conta do uso dos meios de comunicação de massa.

Segredo de Polichinelo | Merval Pereira

- O Globo

Lula é o verdadeiro dono do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia. E mandou o dirigente da empreiteira OAS Léo Pinheiro destruir qualquer tipo de documento que evidenciasse o pagamento do tríplex pelo então tesoureiro do PT João Vaccari, que, segundo Pinheiro, foi feito com propina resultante de obras da Petrobras.

O segredo de Polichinelo chegou ao fim com os depoimentos do ex-presidente da empreiteira OAS Léo Pinheiro e as delações dos executivos da Odebrecht. E Cristiano Zanin, o advogado do ex-presidente, ajudou a esclarecer as coisas com suas perguntas pretensamente ardilosas.

A certa altura, perguntou se Lula havia deixado algum objeto pessoal no tríplex, querendo provocar uma negativa que demonstraria que não seria o dono. Mas no sítio de Atibaia, há objetos pessoais de sobra para provar a propriedade. No Guarujá, não havia nada porque o tríplex estava em obras, esclareceu Léo Pinheiro.

Fala, Palocci! | Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

A defesa, o sítio e o triplex de Lula desabam e o foco se desloca para Palocci

Léo Pinheiro é a pá de cal na defesa do ex-presidente Lula, mas a bola da vez é o seu ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, que conseguiu a proeza de despencar não de um, mas de dois governos diferentes, e continuou aprontando das suas com uma desenvoltura tão surpreendente quanto seu inalterável ar de bom moço, até cair nas garras da Lava Jato e ser considerado hoje o futuro delator com potencial mais explosivo.

Em suas delações ao juiz Sérgio Moro e aos procuradores, Marcelo Odebrecht contou que era ele, Palocci, quem administrava a conta “Amigo” na empreiteira, um cheque em branco que abastecia as vontades e luxos da família Lula da Silva. E, no relato dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura, os acertos de valores, prazos e formas de pagamento para, primeiro, salvar a imagem do presidente Lula e, depois, os votos do candidato Lula, após o mensalão, foram feitos diretamente no gabinete da Fazenda.

Liquidação de penas | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

Depois da mãe de todas as delações, a da Odebrecht, especula-se quem serão os próximos a falar. Cunha, Palocci e Cabral frequentam as bolsas de apostas. A OAS também. É um bom momento para perguntar até onde isso vai.

Trago em meu socorro as sempre fundamentadas reflexões de Bruno Carazza, economista e advogado, que mantém o valioso blog "Leis e Números". Para Bruno, a delação da Odebrecht saiu barato. Em troca de uma série de garantias e imunidades, a empresa se comprometeu nos acordos de leniência firmados com as autoridades a pagar cerca de R$ 7 bilhões. É a maior multa jamais aplicada na história, mas não parece tanto diante do faturamento do grupo —R$ 132 bilhões em 2015— nem do esticado prazo de 23 anos para pagá-la.

Defesa de Lula | Miriam Leitão

- Globo

A estratégia de defesa do ex-presidente Lula foi desmontada. Seus advogados, desde o início, centraram ataques no juiz Sérgio Moro, dizendo que o magistrado o perseguia e cometia abusos. A delação da Odebrecht desmontou a estratégia e ontem a fala de Léo Pinheiro acabou de soterrá-la. O ex-presidente da OAS disse que Lula era dono do apartamento do Guarujá: “Usei valores de pagamento de propina.”

A partir de agora, Lula terá que encontrar outros argumentos em vez de ser um perseguido pelo juiz Sérgio Moro e pela imprensa. Seus advogados estavam em explícito confronto com o magistrado, e Lula, em suas declarações, tentava passar a ideia de que estava ansioso para ficar frente a frente com Moro e que o enfrentaria. Desde as delações da Odebrecht, contudo, o assunto foi muito além de Curitiba.

Desengessar as relações trabalhistas | Celso Ming

- O Estado de S. Paulo

Nos Estados Unidos não existe CLT, nem Justiça do Trabalho, FGTS, carteira de trabalho na qual registrar a contratação por uma empresa, seguro-desemprego, imposto sindical e tampouco previdência social.

E, no entanto, nenhum trabalhador reclama de falta de proteção, os sindicatos são fortes, os salários estão entre os mais altos do mundo e um dos problemas da política imigratória do governo é conter a entrada de gente de outros países que quer trabalhar nos Estados Unidos.
Aqui no Brasil, apesar de todo o arsenal protecionista e da parafernália legal que procura assegurar direitos do trabalhador, a insegurança é altíssima, tanto para o empregado como para o patrão, que nunca sabe a quantas anda o passivo trabalhista da empresa e a todo momento está sujeito a surpresas determinadas pela Justiça do Trabalho.

O país mudou, não voltará a ser o que era | Rogério Furquim Werneck

- O Globo

Em que medida o clamor pela renovação da representação política encontrará espaço para se manifestar nas eleições de 2018?

Por mais esperada que fosse, a divulgação do real teor das delações dos executivos da Odebrecht deixou a opinião pública estupefata, horrorizada com a desfaçatez com que, por anos e anos, a cúpula política do país foi tão escandalosamente subornada.

Levará algum tempo até que o sentimento de indignação e perplexidade, que perpassa todos os segmentos da sociedade, possa ser canalizado para a superação do gigantesco desafio de reconstrução do sistema político que o país tem pela frente. E, no entanto, com a opinião pública ainda mal refeita do seu estado de choque, já se ouvem críticas à suposta reação exagerada da mídia aos fatos que as delações trouxeram à luz.

Rumo à meta de 4%? | Fernando Dantas

- O Estado de S.Paulo

Fragelli, da EPGE/FGV, prefere que meta seja mantida em 4,5% para 2019

Em junho, o Conselho Monetário Nacional (CMN) decidirá qual será a meta de inflação de 2019. Desde 2005, a meta está fixada em 4,5%, mas agora há alguma expectativa de que possa ser baixada. Há uma corrente de economistas experientes em política monetária que considera que a meta deveria ser reduzida para 4%. Outra possibilidade seria um meio termo de 4,25%.

Os defensores da meta de 4% para 2019 têm como premissa básica que o custo de levar o IPCA, o índice oficial da meta, a esse nível já foi pago. Em outras palavras, a recessão gigantesca que atingiu o Brasil desde 2014 e causou profundos males teve, por outro lado, o efeito de “quebrar a espinha dorsal” das pressões inflacionárias, como costuma dizer o presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn.

A conta não fecha | José Paulo Kupfer

- O Globo

Já está claro que a reforma da Previdência, mesmo a original quanto mais a possível, não resolverá o problema do cumprimento do teto de gastos

Depois das resistências no Congresso e das flexibilizações na reforma da Previdência alinhavadas pelo relator Arthur Maia (PPS-BA), instalou-se uma disputa entre analistas de mercado e a equipe econômica do governo Temer, em torno dos impactos econômicos das alterações introduzidas no projeto de reforma. Nos cálculos oficiais, as regras mais frouxas do relatório de Maia resultariam, em dez anos, na perda de R$ 200 bilhões em relação à economia prevista na proposta original. Nas contas de bancos e consultores, a redução, no mesmo período, poderia chegar a R$ 350 bilhões.

A discrepância das estimativas remete para a linha demarcatória imaginada pelos técnicos do mercado a partir da qual a confiança nos efeitos da contenção de gastos com a Previdência, como parte da sustentação de uma recuperação virtuosa da economia, ganharia substância. Todos sabiam que seria impossível entregar 100% do previsto na reforma original, que, por sinal, já conteria gorduras — idade mínima sem diferença de gênero, regra de transição muito desnivelada, por exemplo — para serem lipoaspiradas nas negociações com o Congresso. Mas também havia um consenso de que estaria de bom tamanho aprovar uma reforma com pelo menos 70% da economia original estimada.

Generosidade custosa – Editorial | Folha de S. Paulo

Não há argumento melhor em favor da reforma da Previdência do que a necessidade de preservar as políticas públicas em saúde, educação e outras áreas prioritárias.

A constatação é singela, embora muitas vezes se dilua em meio à balbúrdia de teses e cifras em torno do tema: se não for estancado o desembolso com aposentadorias, já excessivo, os demais programas de governo terão de ser comprimidos, ano a ano, para que a despesa total do governo obedeça ao teto criado por emenda à Constituição.

Outra opção, na ausência de reforma, será revogar o teto para o dispêndio. Nessa hipótese, crescerá a dívida —dado que os gastos superam, por larga margem, a arrecadação— e, com ela, a conta também estapafúrdia dos juros.

Em qualquer cenário, o restante do Orçamento será sacrificado —e a severidade das restrições nos próximos anos dependerá do alcance dos ajustes previdenciários ora em exame pelo Congresso.

A reforma possível – Editorial | O Estado de S. Paulo

Em meio a fortes pressões para alterar ainda mais o projeto de reforma da Previdência encaminhado pelo governo, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, avisou que é muito difícil, a esta altura, aceitar novas mudanças nos pontos que a equipe econômica considera inegociáveis, pois isso acabaria por anular os efeitos da proposta. “Eu acho que nós estamos aqui mais ou menos no limite das mudanças que podem ser feitas sem alterar substancialmente o equilíbrio fiscal do País”, afirmou Meirelles.

Não se trata de intransigência do governo, que até aqui demonstrou disposição – em alguns casos até excessiva – para aceitar alterações em sua proposta. Trata-se de traçar uma linha clara a partir da qual a reforma perde seu sentido. E o sentido da reforma da Previdência, que já devia estar claro para todos os envolvidos, especialmente aqueles a quem cabe aprová-la no Congresso, é evitar a explosão das contas públicas nos próximos anos e, ao mesmo tempo, garantir a solvência do próprio sistema previdenciário.

Persiste tentativa de barrar a Lava-Jato no Congresso - Editorial | O Globo

A explicação para Renan e Requião insistirem com projeto para criminalizar juízes, procuradores e policiais pode ser o desespero

As memoráveis gravações feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, de conversas com próceres do PMDB sobre formas de conter a Lava-Jato, ilustram bem o que acontece no momento no Senado, com a tramitação do projeto de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), um dos gravados, para supostamente conter abusos de autoridade, com a relatoria de Roberto Requião (PMDB-PR), da tropa de choque de defesa de Lula e Dilma.

De intenção meritória — autoridades precisam mesmo ser contidas, no uso abusivo do poder —, o projeto, na verdade, é um ataque direto de políticos implicados em escândalos contra agentes públicos dedicados a reprimir a corrupção: juízes, procuradores, policiais e quantos mais forem.

Barrow-on-Furness | Fernando Pessoa

I
Sou vil, sou reles, como toda a gente
Não tenho ideais, mas não os tem ninguém.
Quem diz que os tem é como eu, mas mente.
Quem diz que busca é porque não os tem.

É com a imaginação que eu amo o bem.
Meu baixo ser porém não mo consente.
Passo, fantasma do meu ser presente,
Ébrio, por intervalos, de um Além.

Como todos não creio no que creio.
Talvez possa morrer por esse ideal.
Mas, enquanto não morro, falo c leio.

Justificar-me? Sou quem todos são...
Modificar-me? Para meu igual?...
— Acaba lá com isso, ó coração!

II
Deuses, forças, almas de ciência ou fé,
Eh! Tanta explicação que nada explica!
Estou sentado no cais, numa barrica,
E não compreendo mais do que de pé.

Por que o havia de compreender?
Pois sim, mas também por que o não havia?
Águia do rio, correndo suja e fria,
Eu passo como tu, sem mais valer...

Ó universo, novelo emaranhado,
Que paciência de dedos de quem pensa
Em outras cousa te põe separado?

Deixa de ser novelo o que nos fica...
A que brincar? Ao amor?, à indif'rença?
Por mim, só me levanto da barrica.

III
Corre, raio de rio, e leva ao mar
A minha indiferença subjetiva!
Qual "leva ao mar"! Tua presença esquiva
Que tem comigo e com o meu pensar?

Lesma de sorte! Vivo a cavalgar
A sombra de um jumento. A vida viva
Vive a dar nomes ao que não se ativa,
Morre a pôr etiquetas ao grande ar...

Escancarado Furness, mais três dias
Te, aturarei, pobre engenheiro preso
A sucessibilíssimas vistorias...

Depois, ir-me-ei embora, eu e o desprezo
(E tu irás do mesmo modo que ias),
Qualquer, na gare, de cigarro aceso...

IV
Conclusão a sucata! ... Fiz o cálculo,
Saiu-me certo, fui elogiado...
Meu coração é um enorme estrado
Onde se expõe um pequeno animálculo

A microscópio de desilusões
Findei, prolixo nas minúcias fúteis...
Minhas conclusões Dráticas, inúteis...
Minhas conclusões teóricas, confusões...

Que teorias há para quem sente
o cérebro quebrar-se, como um dente
Dum pente de mendigo que emigrou?

Fecho o caderno dos apontamentos
E faço riscos moles e cinzentos
Nas costas do envelope do que sou ...

V
Há quanto tempo, Portugal, há quanto
Vivemos separados! Ah, mas a alma,
Esta alma incerta, nunca forte ou calma,
Não se distrai de ti, nem bem nem tanto.

Sonho, histérico oculto, um vão recanto...
O rio Furness, que é o que aqui banha,
Só ironicamente me acompanha,
Que estou parado e ele correndo tanto ...

Tanto? Sim, tanto relativamente...
Arre, acabemos com as distinções,
As subtilezas, o interstício, o entre,
A metafísica das sensações —

Acabemos com isto e tudo mais ...
Ah, que ânsia humana de ser rio ou cais!