domingo, 21 de maio de 2017

Opinião do dia – O Estado de S. Paulo

Aos que consideram o Congresso e o governo frágeis – ilegítimos, diriam – para aprovar as reformas, vale lembrar que sua legitimidade se baseia na Constituição, e isso é mais que suficiente. Ao mesmo tempo, as reformas são o sustento do governo e também desse Congresso. É a única ponte que o País tem para atravessar esses tempos revoltos. Abandonar as reformas seria condenar o País ao desgoverno, no desvario de achar que a anarquia possa trazer alguma estabilidade. Não é disso que o País precisa.

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Editorial | O Estado de S. Paulo, 21/5/17

'Fui vítima de bandidos que saquearam o País', diz Temer

Temer: ‘Fui vítima de armação de bandidos que saquearam o País e querem sair impunes’
Em entrevista exclusiva à colunista do Estadão Vera Magalhães, o presidente afirmou estranhar que delação da JBS tenha sido selada 'no momento em que a economia começa a se recuperar'

Vera Magalhães, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Minutos depois do pronunciamento que fez sobre a crise que atinge seu governo, Michel Temer reafirmou ao Estadão sua recusa a renunciar à Presidência, se disse vítima de “armação”, negou que tenha participado de um plano para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha e disse estranhar que a delação da JBS, que o atingiu, tenha sido selada “no momento em que a economia começa a se recuperar”.

Temer concedeu uma entrevista exclusiva ao Estadão por telefone. Disse estar convencido da capacidade de rearticulação política do governo, deu sua versão para o encontro que teve com Joesley Batista, da JBS, em março — que foi gravado e entregue ao Ministério Público Federal, o que desencadeou a delação do grupo, e criticou os termos da colaboração negociada com o empresário pela Lava Jato.

STF decidirá 4ª feira sobre suspensão de inquérito de Temer; áudios foram para perícia

O gabinete da presidente da Corte, Cármen Lúcia, informou que o pedido de suspensão do inquérito 'foi oficiado pelo ministro relator à presidência do STF'

Beatriz Bulla | O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) vai analisar em plenário, na próxima quarta-feira, o pedido da defesa do presidente Michel Temer para suspender o inquérito contra o peemedebista. O gabinete da presidente da Corte, Cármen Lúcia, informou neste sábado, 20, que o pedido de suspensão “foi oficiado pelo ministro relator à presidência do STF, e será levado ao colegiado na próxima quarta-feira”. Com isso, os 11 ministros do Supremo irão decidir sobre a continuidade ou paralisação do inquérito.

O ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte, também encaminhou para a Polícia Federal os autos do inquérito para perícia no áudio gravado pelo delator Joesley Batista em conversa com Temer. Neste sábado, em pronunciamento no Palácio do Planalto, Temer anunciou que iria pedir a suspensão, alegando que a gravação foi “manipulada e adulterada”.

Áudio, benefício e vazamento deixam PGR sob pressão

Planalto e aliados do presidente Temer apontam inconsistências no processo de delação da JBS e cobram explicação dos procuradores

Alberto Bombig | O Estado de S.Paulo

As críticas e as possíveis inconsistências no processo de delação premiada da JBS deixaram a Procuradoria-Geral da República (PGR) em sua posição mais vulnerável desde o início da Operação Lava Jato, há três anos, numa disputa pública e de bastidores com o Executivo.

Os procuradores da Operação Lava Jato, em Brasília, enfrentam ataques públicos da coalização liderada pelo presidente Michel Temer (PMDB). Nos bastidores, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e advogados também criticam procedimentos.

Os governistas e a defesa de Temer apontam supostas incongruências na delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, e a oposição vem criticando a PGR desde os vazamentos das delações de Delcídio Amaral, ainda em 2015, que atingiu os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva.

Anexar áudio de Temer sem perícia foi inaceitável, dizem peritos da PF

Rubens Valente, Letícia Casado | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em nota divulgada neste sábado (20), a APCF (Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais) considerou "inaceitável" que a PGR (Procuradoria Geral da República) tenha anexado o áudio da conversa mantida entre o presidente Michel Temer e o delator Joesley Batista sem uma perícia técnica por peritos federais.

Afirmou ainda que é "temerária" a homologação de acordos de delação premiada "sem a devida análise pericial".

Antes de anexar o áudio ao pedido de abertura do inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal), acolhido pelo ministro Edson Fachin, a PGR submeteu o áudio ao setor técnico do órgão, mas não para uma perícia técnica completa na Polícia Federal.

JBS teve 'aula de delação' 15 dias antes de gravar conversa com Temer

Raquel Landim, Renata Agostini | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - No dia 19 de fevereiro, um domingo, às 12 horas, Anselmo Lopes, procurador da República no DF, recebeu uma ligação inesperada. Do outro lado da linha, Francisco de Assis e Silva, diretor jurídico da JBS, comunicou uma decisão que abalaria o país: Joesley e Wesley Batista iriam confessar seus crimes e colaborar com a Justiça.

A conversa durou só 19 minutos e eles agendaram um encontro para o dia seguinte. Na segunda-feira, Lopes e a delegada Rubia Pinheiro, que lideram a Operação Greenfield, da PF, deram uma "aula de delação": explicaram em detalhes ao advogado, profissional da estrita confiança dos Batista, como funcionaria a colaboração premiada.

Duas semanas depois, Joesley entrou no Palácio do Jaburu dirigindo o próprio carro, com um gravador escondido no bolso, para um encontro com o presidente Michel Temer. Durante 40 minutos, arrancou diálogos constrangedores, que, ao serem revelados, deixaram o mandato de Temer por um fio.

Ex-procurador atua em banca contratada pela J&F

Ex-braço direito de Janot, Marcelo Miller deixou MPF para trabalhar em escritório que negocia leniência um dia antes de gravação no Jaburu

Vera Magalhães | O Estado de S. Paulo

O ex-procurador Marcelo Miller, um dos principais auxiliares de Rodrigo Janot no Grupo de Trabalho da Lava Jato até março deste ano, passou a atuar no escritório que negocia com a Procuradoria-Geral República os termos do acordo de leniência do grupo J&F, que fechou colaboração premiada na operação.

A decisão de Miller de deixar o Ministério Público Federal para migrar para a área privada, que pegou a todos no Ministério Público Federal de surpresa, veio a público em 6 de março, véspera da conversa entre Joesley Batista e Michel Temer, gravada pelo empresário, no Palácio do Jaburu, que deu origem à delação.

Miller passou a atuar no escritório Trench, Rossi & Watanabe Advogados, do Rio de Janeiro,
contratado pelo grupo J&F, que controla a JBS, para negociar a leniência, acordo na área cível complementar à delação.

O acordo de delação de Joesley e dos demais colaboradores da JBS é considerado inédito, seja pelo fato de ser a primeira vez que foi utilizado o instituto da ação controlada na Lava Jato, seja pelos termos vantajosos negociados pelos delatores – que não precisarão ficar presos, não usarão tornozeleira eletrônica, poderão continuar atuando nas empresas e teriam anistia nas demais investigações às quais respondem. A leniência, inclusive os valores que serão pagos pela JBS no Brasil e no exterior, ainda está em negociação. A íntegra do acordo homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não veio a público, apesar de o ministro Edson Fachin ter levantado
o sigilo da delação da JBS.

Temer muda estratégia, ataca dono da JBS e tenta parar inquérito

A pedido do presidente, Fachin determina perícia na gravação da conversa com Joesley

Peemedebista faz novo pronunciamento, mas não explica diálogo com empresário; ministro do Supremo Tribunal Federal submeterá ao plenário da Corte a decisão de suspender ou não a investigação

Em seu segundo pronunciamento em três dias, o presidente Temer utilizou como defesa o ataque a Joesley Batista, dono da JBS, e tentou desqualificar a gravação da conversa entre os dois, mas não explicou e não negou o diálogo. A nova estratégia é pedir a suspensão do inquérito contra ele no STF, com o argumento de que as gravações foram adulteradas. Peritos divergem sobre suposta edição da fita, mas afirmam que no trecho mais polêmico, sobre anuência a pagamento de mesada a Eduardo Cunha, não há adulteração. Também o trecho em que Joesley fala em cooptar juízes foi confirmado pelo presidente. “Essa gravação clandestina foi manipulada e adulterada com objetivos nitidamente subterrâneos”, disse ontem Temer, que deixou vários pontos sem explicação no pronunciamento. Para ele, Joesley praticou o “crime perfeito” e não foi punido. O dono da JBS negou edição da gravação. O ministro Edson Fachin, do STF, pediu perícia na fita, mas vai submeter ao plenário o pedido de suspensão do inquérito.

NO ATAQUE
Temer pede suspensão de inquérito

‘Política não pode paralisar a economia’

Prefeito de SP diz que áudio ‘compromete’ Temer, apesar de não ser conclusivo, e que País deve manter reformas

Entrevista com
Prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB)

Alberto Bombig e Adriana Ferraz | O Estado de S. Paulo

Um dia após o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizar que o presidente Michel Temer seja investigado pelos crimes de corrupção, participação em organização criminosa e tentativa de obstrução da Justiça, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou ao Estado anteontem que a situação de Temer é “comprometedora”, mas que a economia não pode ser contaminada pela crise política.

Para o tucano, o áudio divulgado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) – no qual o peemedebista conversa com o empresário Joesley Batista, dono da JBS, sobre a suposta compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) –, é inconclusivo, mas compromete em função do tipo de diálogo ocorrido dentro do Palácio do Jaburu, tarde da noite.

Independentemente da solução a ser tomada, Doria apela ao Congresso para que separe a política da econômica a fim de as reformas não serem paralisadas. Sobre a situação do senador Aécio Neves, afastado das suas funções parlamentares e também da presidência do PSDB, o prefeito diz que ele não pode ser comparado a Lula, mas deve ser investigado.

Qual é o diagnóstico que o senhor faz desse momento?

Democratas de esquerda – a hora e a vez? | *Luiz Sérgio Henriques

- O Estado de S.Paulo

A esquerda brasileira gira em círculos em torno de seus anacronismos e tabus

O quadro partidário em ruínas e o destino incerto de tantos personagens de primeiro plano tornam particularmente opaca a cena pública a pouco mais de um ano de eleições gerais. Não há muitos termos de comparação para nossas agruras e a referência inevitável para este nó aparentemente insolúvel entre questões judiciais e questões políticas continua a ser a Operação Mãos Limpas, italiana, na década final do século passado.

Diferentemente do caso brasileiro, em que partidos frouxamente organizados conduziram a transição e dominaram o poder central até 2002, a Primeira República Italiana, que nasceu no segundo pós-guerra, era uma República de partidos de massa, dois dos quais se tornaram reconhecidos até fora do país: a Democracia Cristã (DC) e o Partido Comunista (PCI). Ambos portavam visões de mundo comunitaristas, não necessariamente antagônicas, admiravelmente retratadas na arte culta ou popular. Para dar um exemplo divertido, foram tempos de Don Camillo e Peppone, o pároco e o prefeito comunista – criaturas de Giovannino Guareschi – que se comportavam expressivamente ora como adversários, ora como aliados.

Antonio Candido (1918-2017) | *Celso Lafer

- O Estado de S.Paulo

Grande presença na vida brasileira pela limpidez da conduta ética e pelo empenho em ser justo

Antonio Candido foi uma das maiores referências intelectuais do Brasil. São de indiscutível envergadura suas contribuições para o entendimento do País, de sua literatura e do fenômeno literário. Foi um notável professor de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP. Suas aulas eram uma obra de arte. Generosa foi sua dedicação aos seus muitos alunos, como posso dar testemunho. Transformou-se no correr do tempo de sua vida numa grande presença na vida brasileira pela limpidez de sua conduta ética e pelo empenho em ser justo (uma faceta do seu ser socialista) no trato das pessoas e das situações.

Afonso Arinos, no depoimento que deu para Esboço de Figura, livro que organizei para celebrar os 60 anos de Antonio Candido, qualificou-o como um grande mestre que amadureceu no exercício de sua mestria por “uma serenidade sem frieza, uma tolerância sem concessão, uma firmeza sem rusticidade”.

Conteúdo inalterado | Merval Pereira

- O Globo

O empresário Joesley Batista utilizou uma tática para marcar o dia e a hora em que teve a conversa no Palácio Jaburu com o presidente Michel Temer, e essa estratégia foi definitiva para dar credibilidade a seu relato. Ele começou a gravação ao chegar à residência presidencial com o som do carro sintonizado na rádio CBN às 22h32m e terminou às 23h08m, mais uma vez ouvindo a CBN.

Tudo indica que Joesley utilizou uma técnica de identificação que era muito usada em sequestros, quando o sequestrado posava para fotos com um jornal do dia para indicar que estava vivo. O presidente da JBS marcou sua gravação clandestina com os programas da CBN do dia 7 de março.

A tentativa de reverter a situação política de fragilidade do presidente Michel Temer, denunciando supostas manipulações do áudio gravado pelo empresário Joesley Batista, só demonstra que não há condições de questionar o conteúdo da conversa, que é o que realmente importa.

Fora Temer, ok, mas para colocar quem? | Elio Gaspari

- O Globo

Há um ano, quando a rua gritava “Fora Dilma”, se sabia que para o seu lugar iria o vice-presidente Michel Temer. Ele apresentou-se ao país propondo um governo de união nacional e tornou-se um campeão de impopularidade. Prometeu um ministério de notáveis, cercou-se de suspeitos e perdeu dois ministros (Romero Jucá e Geddel Vieira Lima) por flagrantes malfeitorias.

Pode-se não gostar de Temer, mas o doutor chegou à cadeira pelas regras do livrinho. Agora grita-se “Fora Temer”, mas não se pode saber quem irá para o lugar. Pela Constituição, o novo doutor seria eleito indiretamente pelos senadores e deputados. Basta que se ouçam as conversas de Temer, Aécio Neves (presidente do PSDB) e Romero Jucá (presidente do PMDB), grampeadas por Joesley Batista e Sérgio Machado, para se ver que, sem a influência da opinião pública, daquele mato não sai coisa boa.

Os novos cenários | Míriam Leitão

- O Globo

Temer acerta os defeitos de Joesley, mas não se explica. O que o presidente Michel Temer falou do empresário Joesley Batista é verdade. E sempre foi. Curioso é que só agora ele viu os defeitos da pessoa. O caminho escolhido por Temer é o de praxe na defesa em processos criminais, tentar desqualificar as provas. Ele só não explicou por que seu visitante noturno usou codinome para entrar no Jaburu, e sua preocupação foi de que ninguém o visse.

Foi inteligente somar-se ao sentimento do país que reclama do acordo que deu ao corruptor a vantagem de espiar de Nova York o país em chamas. O que não está claro é como isso vai ajudar o presidente politicamente. Se ele não renunciar, pode ser atingido por sentença do TSE.

Estouro da boiada | Eliane Cantanhêde

- O Estado de S.Paulo

O colapso das lideranças dificulta saídas, e pode vir o 'se não tem tu, vai tu mesmo'

Com todo respeito, o grande Brasil está parecendo a pequena Bolívia, que teve 17 presidentes em 28 anos, três apenas em 1979 e quatro entre 2001 e 2005, até que Evo Morales assumiu em 2006 e de lá não arreda pé tão cedo. O problema brasileiro não é apenas tirar Michel Temer da Presidência, é nomear alguém que se sustente e toque as reformas até 2018. Aí, seja o que Deus quiser!

Dilma Rousseff caiu por crime de responsabilidade, inapetência política e incompetência administrativa. Temer está ‘balança-mas-não-cai’ por relações nada republicanas com bandidos milionários e agora delatores, por um partido que é ‘maria-vai-com-as-outras’ dependendo de quem paga mais e por um entorno que se dividiu em dois: uma parte tem o poder, a outra está na cadeia ou a caminho dela.

Campeões da delação | Vera Magalhães

- O Estado de S. Paulo

Os irmãos Batista foram para lá de generosos: financiaram de tucanos a petistas

Michel Temer vai cair? É provável que sim, dada a rápida sucessão de acontecimentos e a deterioração de suas condições políticas desde a última quarta-feira. Ele merece cair? Certamente, dado seu alto grau de comprometimento com uma clara tentativa de obstrução à Lava Jato e com um esquema criminoso de arrecadação de propina que atuava livremente, com seu conhecimento e participação ativa.

Dito isso, e muito mais haveria a dizer a respeito e haverá a dizer a posteriori, uma vez que o segundo afastamento de um presidente em um ano não é algo que não cause traumas profundos a qualquer país, é preciso analisar o fato desencadeador dessa provável queda: a delação da JBS.

Caminhos demais | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

O que fazer? Michel Temer já disse que não vai renunciar. Se a sociedade concluir que ele deve mesmo deixar o posto de presidente da República, teríamos pelo menos três caminhos constitucionais para afastá-lo: impeachment, ação penal por crime comum e cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE.

E tirá-lo é só a metade do problema, pois ainda precisaríamos colocar alguém em seu lugar. Também aqui temos mais de uma possibilidade. Se Temer for apeado por impeachment ou processo penal, ele seria substituído provisoriamente pelo presidente da Câmara, e o Congresso deveria realizar uma eleição indireta em 30 dias. Isso ao menos é o que a Constituição (art. 81) prevê.

Três homens e um destino | Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

"O presidente Michel sempre acreditou, e eu acho que o Eduardo e o Lúcio também sempre acreditou [sic], que eu era meio que obrigado a sustentá-los."

A queixa é de Joesley Batista, em depoimento à Lava Jato. Acostumado a pagar as contas de políticos de múltiplos partidos, ele admitiu ter se espantado com a gula do trio.

A delação do dono da JBS expôs as entranhas do grupo que tomou de assalto a Presidência da República. Está tudo lá: da roubalheira no Porto de Santos, antigo feudo de Temer, até a compra de deputados para instalar Cunha no comando da Câmara.

Como enterrar Temer e fazer negócios | Vinicius Torres Freire

- Folha de S. Paulo

A elite não sabe o que fazer do governo quase zumbi de Michel Temer. É o que transparecia até sexta-feira (19), fosse entre donos do dinheiro ou políticos.

Percebia-se muita má vontade com a tarefa talvez incontornável de substituir o governo e muito medo de desastre econômico renovado. Havia desorientação e reticência, até porque o restante dos políticos ainda não tivera tempo ou informação para calcular o dia depois de amanhã. Ainda não há canoas para embarcar.

Mesmo PSDB e DEM estão perdidos e rachados. Combinaram de amar ou deixar Temer em decisão conjunta, mas temem que o aliado fuja, deixando um partido ou o outro a segurar a alça do caixão. Devem discutir neste domingo o que fazer.

A crise chega ao Supremo | Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

Temer perdeu a blindagem constitucional ao ser investigado no exercício do mandato, mas quer reverter a decisão de Fachin no plenário do STF, se diz vítima de uma grande armação

Sempre é bom identificar as linhas de força do processo para imaginar aonde as crises podem chegar. E levar em conta que o governo é sempre a forma mais concentrada de poder, mesmo quando está fraco, desmoralizado, isolado, porque as funções de Estado funcionam no piloto automático. Não há força capaz de suplantá-lo enquanto for capaz de arrecadar, normatizar e coagir. Como num baile que vira rififi, a orquestra não pode parar. É mais ou menos o que acontece nessa crise.

Ao primeiro sinal de que a economia poderia destrambelhar novamente, diante do boato de que o presidente Michel Temer renunciaria, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, patrioticamente, anunciou que permaneceria no posto caso isso acontecesse. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, permaneceu no cargo, e os comandantes militares mandaram o recado: políticos e magistrados, resolvam isso aí! Foi o bastante para acalmar o mercado, até que outra turbulência sinalize que a política econômica esteja em risco. Segue o baile.

Eh boi | Fernando Gabeira

- O Globo

Estava no meio de um artigo sobre a conversa com Deltan Dallagnol no Teatro do Leblon, a respeito dos livros que publicamos. Mandei o artigo para o espaço. Durante muitos anos trabalhei, no Congresso, para proibir bombas de fragmentação. Elas ficam no terreno, às vezes parecem um brinquedo e, de repente, bum: explodem. Nesse terreno minado, no entanto, a JBS nunca me enganou. Faz alguns anos que a menciono em artigos. Ela recebia muito dinheiro do BNDES. E doava também muito dinheiro para as campanhas políticas. O PT levava a maior parte, mas não era o único.

A Polícia Federal já estava no rastro, investigando suas fontes de renda, BNDES, FGTS, todos esses lugares onde o dinheiro público flui para o bolso dos empresários. Assim como no caso da Odebrecht, as relações com o mundo político eram muito amplas. Elas são suficientes para nos jogar, pelo menos agora, numa rota de incertezas.

Temer foi para o espaço, Aécio foi para o espaço, embora este já estivesse incandescente, como aqueles mísseis da Coreia do Norte no momento do voo. O PT e Lula já sobrevoam o mar do Japão. Tudo isso acontece num momento em que há sinais de uma tímida recuperação econômica. Como navegar nesses mares em que é preciso desmantelar o grande esquema de corrupção e não se pode perder o foco nos 14 milhões de desempregados?

Adeus às ilusões | Cacá Diegues

- O Globo

Não temos onde depositar esperança. A sensação que sinto diante disso tudo é de enorme desalento. Sempre me surpreendi com quem só pensa no poder, nunca entendi direito esse desejo doentio de mandar nos outros. E, de preferência, em todos. Mas nunca deixei de aceitar a necessidade de um governo, de uma concertação em torno da vida em comum, num mesmo espaço geográfico e cultural a que chamamos nação. Não tem outro jeito.

Essa ideia abstrata de nação é que nos mantém juntos, em torno do projeto simples de sermos felizes, uns com os outros. Por isso que o fracasso da nação nos faz tanto mal, nos faz sofrer tanto. Porque ele é a constatação de que fomos incapazes de realizar o sonho a que estávamos generosamente destinados. Essa distância entre destino e logro, entre o que almejamos e o que conseguimos, nos faz penar por que ainda acreditamos (ou acreditávamos) em nós mesmos.

PSDB, DEM e PPS optam: ou governo ou suicídio com apoio da Globo | Reinaldo Azevedo

- Veja

Líderes dessas legendas se reúnem hoje para deliberar se continuam ou não na base de apoio a Temer. Se caírem fora, eis um sinal de que não merecem existir

Representantes do PSDB, do DEM e do PPS se reúnem neste domingo para definir se as legendas continuam ou não no governo. Na verdade, leio de outro modo: esses partidos vão decidir se merecem existir ou não. O PPS, na prática, já caiu fora. Roberto Freire entregou o Ministério da Cultura antes mesmo de saber que diabos havia na fita. Ironia: às vezes, sinto certa nostalgia dos tempos em que esquerdistas não acreditavam em tudo “o que sai na mídia”…

Caso decidam desembarcar, devem, em seguida, perguntar às Organizações Globo que rumo tomar. Hão de aderir imediatamente à tese da deposição do presidente — o golpe de Janot —, com a outorga do cargo a Cármen Lúcia, ou há espaço para algum fingimento antes de cair na farra?

O que esperar da crise e de seus desdobramentos | Celso Ming

- O Estado de S.Paulo

Depois de tudo o que aconteceu, o quadro confuso não dissipa as incertezas.

As gravações apresentadas pelo empresário Joesley Batista não permitem concluir que o presidente Temer aprovou a compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. Mas o conteúdo lá exposto e todo o resto não têm nada de edificante nem poderiam ser tolerados por um presidente do qual se espera defesa intransigente dos valores republicanos. É dinheirama pra lá e pra cá; deputado de confiança encarregado de pagar mesadas. E há relatos, verdadeiros ou não, de controle pelo empresário de juízes e de procurador. A tudo o presidente Temer reage quase monossilabicamente, com expressões que em nenhum momento revelam nem desaprovação nem espanto.

A crise e as reformas – Editorial | O Estado de S. Paulo

Ainda que a revelação do áudio da conversa de Joesley Batista com Michel Temer no Palácio do Jaburu não tenha trazido prova da anuência presidencial à suposta compra do silêncio de Eduardo Cunha e de Lúcio Funaro, é certo que o vazamento da delação do empresário da JBS colocou uma vez mais o País em clima de profunda crise política e moral. Com os acontecimentos dos últimos dias, os defensores da purificação nacional pela via da devastação da política dão mais um passo em sua empreitada de extinguir qualquer resquício de confiança no sistema político.

Diante desse quadro preocupante, onde vicejam irresponsabilidade e oportunismo, não poucos vaticinam que as reformas previdenciária e trabalhista, levadas a cabo com tanto custo até agora pelo governo federal, se inviabilizaram. Já não haveria qualquer ambiente político-institucional para sua aprovação. Seria perda de tempo – apregoam – insistir nas reformas com essa crise política instaurada.

Recomeço | Samuel Pessôa

- Folha de S. Paulo

Governo Temer parece ter perdido a capacidade de governar; é necessário recomeçar

Dizem que Tom Jobim afirmava que o Brasil não é para principiantes. Adiciono que, além de experiência, o Brasil demanda paciência.

O governo Temer dava mostras de grande capacidade de aprovar no Congresso Nacional as reformas absolutamente necessárias e impopulares para pavimentar o caminho da retomada do crescimento em bases sustentáveis.

Tanto a reforma trabalhista quanto a reforma da Previdência avançavam no Congresso. A economia, com enorme dificuldade, melhorava.

Na quarta-feira (17), foi noticiado que havia uma gravação em que o presidente pedia ao dono do grupo JBS o pagamento de uma mesada ao ex-deputado Eduardo Cunha para comprar seu silêncio.

O áudio divulgado no fim da tarde de quinta-feira (18) mostrou algo distinto: não há tentativa de obstrução da Justiça por parte de Temer, mas há, de fato, crime de prevaricação.

Delações expõem engrenagens da velha política | Editorial | O Globo

O conjunto de testemunhos do empresário do grupo JBS é uma aula sobre como funcionam, na prática, o suborno e a compra de políticos e de favores

As delações do empresário Joesley Batista, do grupo JBS, começaram a estarrecer o país no início da noite de quarta-feira, quando O GLOBO publicou trechos da explosiva conversa entre Batista e o presidente Michel Temer, em uma noite de março no Palácio do Jaburu.

O presidente reagiria no dia seguinte, com um discurso veemente, anunciando que não renunciaria, embora a Procuradoria-Geral da República, responsável pela negociação da colaboração do empresário, pedisse abertura de inquérito ao STF para investigá-lo. Aceito pelo ministro Edson Fachin.

A divulgação, na sexta, de vídeos em que Joesley relata passagens de seus testemunhos, inclusive a conversa com o presidente, confirmou o relato do jornal: Temer de fato estimulou o empresário a continuar a dar mesadas aos encarcerados Eduardo Cunha e Luís Funaro, operador financeiro do ex-deputado. E assim, Temer perdeu as condições de continuar no Palácio do Planalto.

Mais um solavanco – Editorial | Folha de S. Paulo

Não há dúvida de que o brusco enfraquecimento político do presidente Michel Temer (PMDB), de evolução ora imprevisível, lança dúvidas consideráveis sobre o processo de retomada da economia que mal dá seus primeiros passos.

Dissipou-se a melhora de humor dos mercados que era nítida nas últimas semanas. Dada a incerteza quanto ao andamento da agenda de reformas no Congresso, o setor produtivo tende a postergar projetos de investimento.

Mesmo antes de vir à tona a delação do empresário Joesley Batista, da JBS, a expectativa de crescimento neste ano não passava de 0,5%. Uma taxa tão modesta é, naturalmente, vulnerável a quaisquer solavancos de percurso.

Procura da Poesia | Carlos Drummond de Andrade

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.