sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Eliane Cantanhêde: Operação Tabajara 3

- O Estado de S.Paulo

Insistir na candidatura Lula é repetir vexame no impeachment e no plantão do TRF-4

Tal como se uniu contra a tentativa de usar um plantão de fim de semana do TRF-4 para soltar o ex-presidente Lula em uma hora, o Judiciário brasileiro se une agora contra uma outra investida do PT: o registro da candidatura de Lula, gritantemente ilegal, de uma “inelegibilidade chapada”, como definiu o ministro Luiz Fux, do STF.

O registro da candidatura de Lula no final do último dia, sabendo que ela seria certamente impugnada, não é uma estratégia jurídica, mas sim uma articulação política. E o Judiciário, tomado em brios, não aceita ser usado em articulações políticas desse tipo.

O ministro Gilmar Mendes (STF) classificou de “Operação Tabajara” a tentativa de derrubar o impeachment de Dilma Rousseff, depois de aprovado pelo plenário da Câmara, com um papelzinho assinado pelo vice-presidente da Casa, Waldir Maranhão. As lideranças políticas e a opinião pública rechaçaram. Ficou patético.

Depois, veio a “Operação Tabajara 2”, quando o PT esperou o fim do expediente do TRF-4, numa sexta-feira, para jogar um pedido de habeas corpus no colo do plantonista, Rogério Favreto, ligadíssimo ao PT. O juiz Sérgio Moro, a PF, desembargadores, presidentes do STJ e do STF e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, negaram, zangados. Outro vexame.

Agora, a “Operação Tabajara 3”, definida dentro de uma cela da PF em Curitiba, onde Lula está preso: aguardar o último dia para registrar a chapa fake do PT, esticar ao máximo a “candidatura” Lula, constranger a Justiça, manter a militância petista gritando contra “os golpistas” e a favor do preso. Raquel Dodge, na condição de procuradora-geral eleitoral, não perdeu tempo. No mesmo dia, entrou com impugnação da chapa no TSE. E não foi a única.

Merval Pereira: Derrotas sucessivas

- O Globo

Faz sentido a posição de Raquel Dodge de impugnar a candidatura de Lula sem nem mesmo abrir um processo

O bom senso manda que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) resolva a questão da candidatura do ex-presidente Lula até o dia 31 de agosto, portanto, antes de começar a propaganda eleitoral no rádio e na TV; e há razões para isso: não é possível realizar uma campanha presidencial com dúvidas jurídicas e as chicanas que o PT está fazendo.

Lula, condenado em segunda instância, não pode concorrer à Presidência da República. A posição da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, de impugnar a candidatura sem nem mesmo abrir um processo, faz sentido, pois Lula está condenado em segunda instância pelo TRF-4 e enquadra-se na Lei da Ficha Limpa.

Há ainda uma medida mais rápida à disposição do TSE, a impugnação de ofício pelo relator do processo, o ministro Luís Roberto Barroso.

Essa medida é perfeitamente cabível, pois, como disse a procuradora-geral da República, o ex-presidente não preenche as exigências legais para ser elegível, “o que impede que ele seja tratado juridicamente como candidato e também que a candidatura requerida seja considerada sub judice, uma vez que inapta mesmo a causar o conhecimento do pedido de registro pelo Tribunal Superior Eleitoral”.

Porém, quando a procuradora-geral argumenta que o ex-presidente “não pode fazer propaganda eleitoral com o financiamento de sua candidatura com recursos públicos, que são destinados apenas a financiar campanhas dos elegíveis”, considero que está forçando a interpretação da lei.

Se até a data de início da propaganda eleitoral gratuita o TSE não tiver definido sua situação, Lula é candidato dentro da lei e poderá usar o Fundo Partidário para fazer campanha. Se e quando for impugnado (e o mais provável é que seja), perderá esse direito, mas não terá que devolver nada aos cofres públicos, porque atuou legitimamente dentro da lei.

Hélio Schwartsman: Precisamos falar sobre Lula

- Folha de S. Paulo

PT se lança em incoerências ao sustentar o insustentável

Partidos políticos competitivos operam com duas metas que são em certa medida contraditórias. Eles precisam atrair o eleitorado, que vota muito mais com o coração do que com a razão, e também oferecer uma visão de país que, se não chega a configurar um programa de governo detalhado, seja mais do que um amontoado de delírios. Afinal, se a agremiação conquistar o poder, terá de fazer algo pelo menos assemelhado àquilo que propunha.

A estratégia do PT de seguir com a candidatura de Lula, embora sejam remotíssimas as chances de que a Justiça o considere elegível, até atende ao primeiro objetivo. O ex-presidente, apesar de tudo, ainda está nas graças de cerca de um terço do eleitorado. O problema é que ela fracassa miseravelmente no segundo intento.

Para dar uma aura de decoro à candidatura de um condenado por corrupção, o PT pinta Lula como um perseguido pela Polícia Federal, Ministério Público, Justiça (1ª, 2ª, 3ª e 4ª instâncias), imprensa e empresariado. Até seria verossímil que uma dessas instituições tivesse se voltado contra ele, mas será crível que todas o tenham feito ao mesmo tempo?

Manter o discurso do complô exige negar legitimidade ao Judiciário, um dos três Poderes da República, o que, obviamente, não pode fazer parte do projeto de um partido democrático. Não dá para solapar as bases do Estado que se pretende administrar. Note-se que Lula poderia perfeitamente questionar o resultado de seus julgamentos sem contestar a instituição, mas isso enfraqueceria sua retórica.

E essa é só uma das muitas incoerências em que o PT se lança ao sustentar o insustentável. O efeito colateral mais grave, a meu ver, é que a insistência em Lula impede o partido e a própria esquerda de acertar contas com os graves erros éticos e econômicos cometidos nas gestões petistas e de seguir em frente. Enquanto estiver algemado a Lula, o PT terá grandes dificuldades em atualizar seu projeto de país.

Bruno Boghossian: Guerra de prazos

- Folha de S. Paulo

Ideal é que Justiça decida processo do petista o quanto antes, mas sem atropelos

Dois dias antes do registro da candidatura de Lula, Raquel Dodge já tinha em mãos uma certidão que confirmava a condenação criminal do ex-presidente. A procuradora-geral se antecipou e correu à Justiça para pegar o documento chave do processo que deve barrar o petista na disputa eleitoral.

Dodge não escondeu a pressa. Mal o pedido de Lula pingou no sistema do TSE e a procuradora-geral enviou um pedido para declará-lo inelegível. Passaram-se apenas 48 minutos entre um evento e outro.

O teatro do PT não era nenhum segredo. A procuradora poderia ouvir de seu gabinete o carro de som dos petistas estacionado no TSE. Era natural que Dodge se preparasse para impugnar Lula, mas poderia ao menos ter feito sua própria encenação.

A celeridade do Ministério Público e da Justiça já deu muita munição ao PT para alardear o que considera uma perseguição a Lula.

Ainda que uma velocidade diferente não alterasse o desfecho dos processos, cada passo apressado de procuradores e juízes mostra que não há sequer tentativa de disfarçar o tratamento diferenciado dispensado ao petista em múltiplas instâncias.

Cristian Klein: Haddad, sob o dedo de Lula e a sombra de Dilma

- Valor Econômico

Lulismo, fora do governo, é ainda mais personalista

Trânsito livre, sinal verde, o fluxo, de repente, é interrompido por batedores da escolta da guarda municipal que atravessam o cruzamento, na esquina do Balança Mas Não Cai. O motorista de táxi esbraveja contra o prefeito cujo carro oficial força a passagem. É o pior que já viu. Não é preciso circular muito pela cidade para se atestar o abandono e o asfalto carioca cheio de buracos. Mas o dono do veículo roda muito, o que lhe dá algum conhecimento de causa. "Nunca tinha rasgado um pneu em toda a minha vida, só com esse prefeito!". Na véspera da abertura da campanha oficial para presidente da República, a direção da prosa - quase um monólogo - arranca do desnivelado plano local para o nacional, numa guinada.

O taxista se queixa do destino de Lula. "Teve debate", começa, antes de reclamar da ausência do petista no primeiro encontro entre presidenciáveis. "É uma mordaça o que colocaram nele", continua. Preso em Curitiba, o candidato do PT foi convidado, avisara o apresentador da Band na quinta-feira, "mas está impedido pela Justiça de participar". O mesmo se dará no segundo debate, nesta sexta-feira. Na mesma manhã em que o condutor dirigia, inconformado, o juiz Sérgio Moro publicava despacho para adiar os depoimentos de Lula nos processos a que responde na vara federal da capital paranaense. A justificativa de Moro foi a de evitar a "exploração eleitoral dos interrogatórios".

Moro é escolado no estrago que as falas e os discursos de Lula podem causar. Um estrago que ressoa dentro do automóvel amarelo, enquanto se avança pela Avenida Presidente Vargas. O Judiciário que prende Lula e barra candidatura é o mesmo que se concede aumento de 16,38% em tempos de desemprego e crise econômica, aponta. O motorista vê, de um lado, o presidente em cujo governo a economia e o consumo lhe deram os melhores momentos na praça. De outro, enxerga o poder dos magistrados que julgam, mas não oferecem - porque não são - soluções políticas. "Eu sei como foi, a minha família sabe, em comparação com o que está agora", lamenta.

O taxista afirma já ter visto muitos presidentes, Garrastazu Médici, Geisel, Tancredo - "O neto é esse..." e, antes do impropério, lhe escapa o nome de Aécio Neves cujos eleitores em 2014 maldiz tanto quanto os de Crivella em 2016. Dos quase 60 anos de idade, conta que na maior parte deles ouviu que o problema do país era a enorme dívida externa. "Ninguém mais fala dela. Foi o burro, analfabeto, nordestino que pagou".

Para o eleitor frustrado, Lula "é o paraíba, quatro dedos" que tornou o Brasil respeitado mundo afora, elogiado por líderes mundiais. "E o que somos agora?", pergunta. Diante de tanto lulismo, o interlocutor tem curiosidade de saber ou apenas confirmar se, sem o ex-presidente nas urnas, o cidadão votará no candidato do líder petista. "Eu não. Voto em ninguém", freia o motorista. Nem mesmo se Lula indicar e pedir voto? "Ele indicou a Dilma, e olha no que deu", conclui.

Palavra de taxista não é pesquisa estatística. Mas pode dar pista do que ronda pela cabeça do eleitor. Mostra como não será fácil a missão de Lula de transferir votos para Fernando Haddad, no instante provável em que o Tribunal Superior Eleitoral impugnar a candidatura do ex-presidente. No que o voto tem de retrospectivo, a lembrança do governo Lula, do período de crescimento, conta a favor, mas não é tudo.

Fernando Abrucio: Democracia exige melhora das propostas

- Valor Econômico

A democracia é um regime político que exige constante aperfeiçoamento das regras e práticas políticas. Supõe-se que governantes e eleitores aprendam com o debate das ideias e, sobretudo, das propostas que se transformam em políticas públicas. Claro que nem sempre o avanço é linear. Muitas vezes são os erros que levam ao aprendizado. De todo modo, os países democráticos abrem mais espaço para melhorias do que as ditaduras, nas quais os problemas são escondidos da população e/ou o povo não pode punir nem trocar quem os governa. Esse argumento serve como base à seguinte questão: o quanto os brasileiros aprenderam com a eleição de 2014?

Para refrescar a memória de todos, os dois principais candidatos à Presidência da República praticamente negligenciaram a situação que o país vivia. A presidente eleita, Dilma Rousseff, pintou um cenário róseo na campanha e tomou medidas duras de ajuste quando começou a governar. Em grande parte das medidas, ela estava correta, mas como enganara o eleitorado, criou o caldo de cultura que gerou uma enorme mobilização social pelo impeachment. Esse episódio deveria servir de lição para os candidatos em 2018, que deveriam propor medidas exequíveis para não darem uma nova decepção ao povo brasileiro - e, de quebra, correrem o risco de perder o mandato.

Mas o aprendizado deveria se estender aos eleitores. Quando começa o processo eleitoral, vem uma onda de promessas. É preciso ter cuidado com as propostas que apresentam soluções aparentemente óbvias, capazes de resolver completamente os problemas. Num contexto de crises múltiplas como o atual, muitos eleitores, mesmo os com maior escolaridade, ficam suscetíveis a discursos que prometem uma nova forma de fazer de política. Para evitar que isso se transforme em método de enganação, os eleitores deveriam prestar atenção em pelo menos cinco aspectos: o diagnóstico apresentado, a consistência das ideias, a factibilidade das propostas, o time que acompanha o candidato e a trajetória do presidenciável, com impacto principal no seu estilo politico.

José de Souza Martins: O Brasil do general

- Eu & Fim de Semana | Valor Econômico

Na opinião do general Mourão, candidato a vice-presidente da República na chapa do capitão Bolsonaro, em discurso num almoço na Câmara de Indústria e Comércio de Caxias do Sul (RS), o Brasil herdou a "indolência" dos indígenas, a "malandragem" dos africanos e o afã de "privilégios" dos ibéricos. Um negro e brancos ouviram essa fala em silêncio.

Na atual composição do povo brasileiro, isso nos diz que um eventual governo do capitão e do general minimizará uns 75% desse povo, pois no ver do general estamos aquém do que deveríamos ser. Sobram-lhe só 25% para governar, aqueles que o candidato não estigmatiza com os defeitos que nos atribui.

O general se reconhece pardo. Mas a "antropologia" do general é pobre e nada antropológica. Ele repete os estereótipos estigmatizantes que nos vêm desde o período colonial, o que era uma técnica de degradação para dominação da pessoa do cativo. Já desmentidos por nossa realidade histórica. Questionado, disse que sua concepção dos brasileiros não é preconceituosa. Mas não disse que é desconhecimento da história social do Brasil.

Muita coisa ficou fora do elenco de suas concepções sobre o nosso povo. Para não parecer preconceituoso, ele poderia ter dito que no rol dos denunciados e processados no escândalo do mensalão não há pardos nem negros. E que foi um culto magistrado negro que levou o processo até o fim, o ministro do STF, Joaquim Barbosa. Como não há nem pardos nem negros entre investigados, processados e condenados da Lava-Jato.

É uma pena que ele não lembre que numerosos negros lutaram pelo Brasil na Guerra do Paraguai. Oferecidos pelos brancos senhores de escravos no lugar de seus filhos brancos, convocados. Escravos não podiam ser soldados. Eram, então, alforriados para lutar pela pátria no lugar de sinhozinhos privilegiados. Nessa iniquidade, a Guerra do Paraguai criou no Brasil a equivalência de branco e negro: um negro valia um branco. A única malandragem do negro, nessa guerra, foi a de lutar e até a de morrer em lugar de filhos de senhores de escravos. O general tampouco disse qual era a malandragem nos canaviais e no eito dos cafezais em que o tronco e a chibata misturavam suor e sangue para produzir a doçura do açúcar e o ouro do café.

*Almir Pazzianotto Pinto: Desenvolvimento com democracia, o legado de JK

- O Estado de S.Paulo

O que os candidatos à Presidência pretendem fazer concretamente a respeito do desemprego?

É assustadora a facilidade dos candidatos à Presidência da República de formularem promessas, na espinhosa tarefa de angariar votos. São cinco pretendentes a duas vagas que darão o direito de passagem ao segundo turno. O desencanto geral dos eleitores, aliado ao desprestígio dos partidos, indica que nenhum deles conseguirá alcançar, em 7 de outubro, a maioria absoluta exigida pela Constituição.

O panorama é trágico. Com o Tesouro Nacional exaurido, a saúde, a educação, a segurança, a infraestrutura, o mercado de trabalho em frangalhos, o próximo presidente receberá um país necessitado de reconstrução desde os alicerces, com o exíguo prazo de quatro anos para entregá-lo em razoáveis condições ao sucessor.

O Brasil já foi melhor. Embora na condição de subdesenvolvido, com extensas regiões de miséria, em determinados períodos deu demonstrações de força e conseguiu crescer entre 6% a 10% ao ano. Alcançou a posição de 6.ª potência econômica graças, sobretudo, à vitalidade do parque industrial, cuja expansão teve início no governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) com o plano de desenvolvimento conhecido como “50 anos em 5”, em que a construção de Brasília, no remoto planalto central, apresentava-se como objetivo mais arrojado.

Folheando velhas revistas da década de 1970, lembro-me do mercado de trabalho superaquecido, no qual escasseava mão de obra qualificada e não qualificada, necessária às indústrias automotivas, de autopeças, de máquinas e ferramentas, de fiação e tecelagem, da construção civil. São Paulo havia se transformado em vibrante canteiro de obras. Eram comuns as tabuletas com o título “procuram-se” e as ofertas de emprego em volumosos cadernos de anúncios classificados do Estadão aos domingos. Datilógrafos, arquivistas, ajudantes gerais, torneiros mecânicos, ferramenteiros, tipógrafos, desenhistas industriais, soldadores, ajustadores, mecânicos de manutenção, encanadores, carpinteiros, pedreiros, motoristas, eram algumas das categorias profissionais disputadas no mercado. Na próspera região do ABCD, um novo modelo de sindicalismo demonstrava a força da classe trabalhadora. No Estado de São Paulo, cidades do interior até então pacatas, como Campinas, Osasco, Guarulhos, Jundiaí, Americana, Santa Bárbara, Limeira, Sertãozinho e Piracicaba, convertiam-se em polos de desenvolvimento.

Recuso-me a discutir o problema da inflação no governo JK, por ser assunto alheio à minha seara de conhecimentos, adquiridos em longos anos de contato com problemas relacionados ao trabalho. Trata-se de matéria reservada a economistas habituados à arte da persuasão. Limito-me à discussão do grave problema do desemprego. Em menos de 50 anos, a curva de crescimento deu lugar ao rápido esfacelamento da economia. O País represou a inflação e a moeda aparentemente se estabilizou a partir do Plano Real, mas é inegável a extrema debilidade do mercado de trabalho.

Elena Landau: Não foi ninguém

- O Estado de S.Paulo

Os três Poderes estão em desordem, sem credibilidade, não oferecem rumo ao País

Escrevo de Copenhagen, onde passo por um choque civilizatório. Todo mundo para no sinal, até os passantes. Não se ouve barulho de buzinas. Bicicletas, carros e pedestres convivem de forma harmônica. Muito respeito e gentileza entre as pessoas. País conhecido pelo bem-estar social e pouca corrupção, e uma grande confiança da sociedade nas instituições e seus instrumentos. A Dinamarca supera a média de países da OCDE, em itens como conexões sociais, engajamento cívico, educação e habilidades. A carga tributária é elevada, mas a sociedade sente que recebe de volta os impostos pagos. Impossível não pensar no Brasil, no contraste com nossa realidade.

Me veio à cabeça um extraordinário artigo de João Moreira Sales (1) em que ele descreve com maestria a situação que vivemos hoje. O texto fala das pichações nos muros cariocas com os dizeres “Não fui eu” e de seu significado: “A culpa não é minha”. Eu não tenho sentimento de responsabilidade. Eu não ajudei a cavar o buraco. Se os outros fazem, eu também posso. Posso parar em fila dupla, avançar sinal, não pagar impostos, sentar em lugares reservados para grávidas e idosos. Um erro é justificado pelo erro dos outros. E no final estão todos insatisfeitos. Por aqui, percebe-se o oposto; um senso de comunidade e de pertencimento. Todos são responsáveis.

Como quebrar esse equilíbrio ruim que vivemos no Brasil? Como chegar num ambiente institucional que inverta a lógica? Se ninguém fecha o cruzamento, também não fecharei é obviamente um equilíbrio superior.

Não há muitas opções. Ou isso acontece culturalmente, educando a sociedade, fortalecendo instituições, integrando o cidadão, crescendo e reduzindo a desigualdade, um percurso longo e lento. Ou pelo caminho da punição. Há candidatos à Presidência que escolheram a segunda via, que em nada contribuirá para uma mudança cultural. Mas é compreensível o apoio de parte dos eleitores a propostas de repressão.

Estão com medo e apreensivos quanto ao seu futuro, num presente marcado pelo desemprego e pela violência. E pior, sem esperanças. Não têm a quem recorrer. Interesses corporativos se sobrepõem ao interesse difuso da sociedade. E as instituições que deveriam zelar pelo bem comum estão cada dia mais voltadas para seu próprio bem-estar. A defesa de privilégios inconcebíveis num país marcado pela desigualdade não enrubesce ninguém.

Ricardo Noblat: Santuário do PT

- Blog do Noblat | Veja

Espelho, espelho meu: haverá Estado mais lulista do que Pernambuco? Está por aparecer...

ciais, Políticas e Econômicas (Ipespe) do sociólogo Antonio Lavadera, Lula contaria hoje com o voto de 55% dos eleitores pernambucanos, contra 13% de Jair Bolsonaro e 7% de Marina Silva

Se o candidato do PT a presidente da República fosse Fernando Haddad, ele venceria a eleição no primeiro turno com 27% dos votos, contra 15% de Marina Silva e 14% de Bolsonaro.

Candidato a cargo algum em Pernambuco ousou até agora falar mal de Lula.
Os que não podem falar bem se calam.

Os demônios de Alckmin
Cada um ao seu modo, dois demônios perturbam Geraldo Alckmin a poucos dias de sua estreia no rádio e na televisão como candidato do PSDB à presidência da República.

Um deles atende pelo nome de Michel Temer. Nada assusta mais Alckmin do que o perigo de vir a ser identificado durante a campanha como o candidato de Temer.

Haveria razões de sobra para isso. O PSDB apoiou o governo Temer. Os partidos que apoiam Alckmin são os mesmos que sustentam o governo Temer. E Temer, sabe-se bem…

O segundo demônio de Alckmin chama-se Fernando Henrique Cardoso. Sempre que pode, e mesmo quando não deveria, o ex-presidente dá um chega para lá em Alckmin.

Dora Kramer: Lorota não tem ideologia

- Revista Veja

Lula e Bolsonaro mentem na aposta do embate entre direita e esquerda

Por motivos diferentes (ou não), Luiz Inácio da Silva e Jair Bolsonaro sonham com a mesma coisa: um enfrentamento entre o PT e o candidato do autoritarismo à deriva no segundo turno das eleições. Ambos têm a certeza de que o embate final entre extremados (vejam, não disse extremos) seria um caminho certo para a vitória, pois tanto um quanto o outro jogam com o receio do eleitorado de que o oponente seja o dono da chave da porta do abismo.

Trata-se do típico caso em que se aposta no medo do eleitorado de errar em detrimento da vontade das pessoas de acertar na escolha, no caso, do presidente. Os dois investem na divisão entre esquerda e direita. Ocorre, porém, que ou bem concordamos que os partidos brasileiros carecem de representação doutrinária e nessa toada se comporta o eleitorado, ou vamos de repente embarcar na fantasia de uma sociedade que pauta seu voto pela ideologia. São assertivas excludentes e não cabem no mesmo espaço.

Políticos de longa e larga experiência que são, Lula e Bolsonaro sabem perfeitamente que o corte ideológico alcança apenas uma minoria do universo de mais de 147 milhões de eleitores brasileiros. Daí, a opção pelo jogo nesse campo é artificial, não encontra correspondência sustentável na realidade da coletividade. Trata-se, portanto, de uma camuflagem. Nessa seara, os dois têm apresentado uma produção considerável de versões fantasiosas, desde sempre conhecidas como mentiras, hoje chamadas de fake news.

O uso de lorotas na política não é uma novidade nem obedece a ideologias. Serve direita, esquerda, centro e nenhuma das anteriores com a mesma falta de pudor. Não significa que devemos aceitá-¬las como regras válidas. Antes, convém apontá-las a fim de que não percamos a clareza e, se possível, contribuamos para a dissipação da névoa da enganação.

Luiz Carlos Azedo: O “tipo ideal”

- Correio Braziliense

‘Havia dois tipos de dominação no governo Lula: a “tradicional”, muito bem representada pelas oligarquias patrimonialistas, e a “carismática”, representada pelo líder petista’

Chave da sociologia de Max Weber, o conceito de “tipo ideal” é uma espécie de ovo de Colombo. Serve para equilibrar a relação entre a subjetividade do analista e a objetividade do fato social. Quando desenvolveu esse conceito, o sociólogo alemão não se enquadrava nas principais correntes de pensamento de sua época, que eram influenciadas por gigantes como Friedrich Hegel, Karl Marx e Immanuel Kant, mas respeitava a todos. As obras mais conhecidas de Weber são A Ética Protestante e O Espírito do Capitalismo, que analisa a relação entre as religiões e o desenvolvimento do capitalismo, e A Política como Vocação, que trata da relação Estado, partido e sociedade, e conceitua os tipos de dominação em “legal”, “tradicional” e “carismática”.

Como outros intelectuais alemães de sua geração, Weber foi um crítico do totalitarismo. Morreu de gripe espanhola, em 1920, logo após a I Guerra Mundial. Ele admitiu, “a priori”, que toda pesquisa tem um ponto de partida subjetivo, estabelecido por seu autor, mas a objetividade de seu trabalho poderia ser assegurada com sistematização e padronização, para que o ponto de chegada fosse realmente objetivo. O “tipo ideal” é uma construção subjetiva do pesquisador, feita a partir de seus interesses. Com base na definição de um determinado conceito, são selecionados certos elementos da realidade que, reunidos, formam um tipo idealmente perfeito.

Conceitos não emanam diretamente da realidade, nem são formados apenas pela abstração genérica. Na visão weberiana, servem para acentuar e tornar compreensíveis determinados elementos da realidade. A narrativa do “golpe” contra a presidente Dilma Rousseff é uma espécie de “tipo ideal”, a partir da qual se constrói toda a lógica de atuação do PT no sentido de deslegitimar o seu impeachment e varrer para debaixo do tapete as responsabilidades dos governos Lula e Dilma em relação à crise econômica que o país atravessa e ao escândalo da Petrobras, considerado o maior do gênero em todo o mundo.

A partir desse conceito, a realidade é interpretada de acordo com os interesses do partido e possibilita a construção de um discurso ideológico, que unifica os militantes petistas e seus aliados. A realidade é explicada de acordo essa narrativa, desprezando e distorcendo fatos que não se coadunam com as teses petistas. Por exemplo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) acaba de divulgar os números do desemprego: 3,16 milhões de brasileiros procuram emprego há mais de 2 anos. Trata-se do maior número da série histórica da pesquisa, iniciada em 2012.

Esse número corresponde a cerca de 24% do total de desempregados no país, que ficou em 13 milhões no segundo trimestre. Na comparação com o primeiro trimestre do ano, houve um aumento de 238 mil no número de brasileiros que estão desempregados há mais de 2 anos. Desde o início da crise econômica, em 2014, ano da reeleição de Dilma Rousseff, esse contingente cresceu 162%. Ao todo, segundo o IBGE, são 27,6 milhões de brasileiros subutilizados, o que representa 24,6% da força de trabalho. O grupo reúne os desempregados, aqueles que estão subocupados (menos de 40 horas semanais trabalhadas), os desalentados (que desistiram de procurar emprego) e os que poderiam estar ocupados, mas não trabalham por motivos diversos.

Alckmin defende fim de discriminação salarial contra mulheres

No primeiro dia oficial da campanha eleitoral, o candidato à Presidência da República pelo PSDB, Geraldo Alckmin, participou nesta quinta-feira (16) de evento em São Paulo organizado pelo grupo Mulheres do Brasil, presidido pela empresária Luiza Helena Trajano. Alckmin falou com indignação sobre a discriminação contra a mulher. “Não pode haver nenhum tipo de distinção entre homem e mulher, e muito menos discriminação, que é uma coisa inaceitável.”, destacou.

Geraldo Alckmin rechaçou a violência contra a mulher e salientou o trabalho que fez quando governador de São Paulo em defesa da mulher.

“É inaceitável a violência que ocorre contra as mulheres. São Paulo foi o primeiro estado do Brasil a instituir a delegacia de defesa da mulher para não haver nenhum tipo de impunidade. Hoje, temos um número de 133.”

Na primeira rodada do evento, no qual os candidatos ficaram lado a lado no trabalhadoras, caso seja eleito presidente do Brasil.

“A resolução 90 da OIT: fazer cumpri-la para não haver nenhum tipo de discriminação em relação a salário. E, finalmente, o compromisso com a educação infantil.”, garantiu.

O Mulheres do Brasil reúne cerca de 18 mil participantes —quase 10 mil delas conectadas por meio de um aplicativo privado. Embora seja um grupo suprapartidário e sem candidatas nestas eleições, pretende influenciar diretamente nas políticas que consideram relevantes para as mulheres. Geraldo Alckmin elogiou o movimento.

“Não há nada mais importante do que a sociedade civil organizada. Se a gente quiser mudar a sociedade, não são só pelas leis, é pelo exemplo. E vocês estão dando um grande exemplo de participação. Fico entusiasmado aqui.”, disse às mulheres que acompanhavam o evento.

*Ouça áudio  aqui.

Após fala de FHC, Alckmin grava vídeo e rejeita aliança com ‘radicais’

Ex-presidente sugere coligação com PT contra Bolsonaro no 2.º turno das eleições 2018; presidenciável diz que ‘acordo é com o eleitor’

Pedro Venceslau | O Estado de S.Paulo

Candidato do PSDB à Presidência da República, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin divulgou nesta quinta-feira, 16, em suas páginas nas redes sociais um vídeo no qual rejeita a possibilidade de aliança com o PT ou com o deputado Jair Bolsonaro (PSL) no segundo turno das eleições 2018. Na gravação, Alckmin se refere a ambos como “radicais”.

“Minha aliança é com você. PT e Bolsonaro são dois radicais. O Brasil não precisa de radicalismo, mas de equilíbrio e bom senso. Vou governar com você e para você”, disse o candidato tucano no vídeo.

Alckmin também defendeu novamente, no mesmo vídeo, a aliança com os partidos do Centrão, motivo pelo qual tem recebido críticas. “Somente com essa força podemos fazer as reformas que o Brasil precisa.” A mensagem foi divulgada após o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso dizer em entrevista à rádio Jovem Pan nesta quarta-feira, 15, que não descarta uma aliança entre PT e PSDB para enfrentar Bolsonaro, caso ele passe para a próxima fase da disputa presidencial. “Espero que o PSDB vá para o segundo turno e acho que o PT espera a mesma coisa, mas, dependendo das circunstâncias, eu não teria nenhuma objeção a isso”, disse FHC.

A declaração contrariou a cúpula da campanha de Alckmin e, segundo aliados, motivou a mensagem. Assessores do tucano, porém, dizem que o vídeo já estava gravado e não foi uma resposta ao ex-presidente.

Entre os estrategistas do ex-governador, a avaliação é de que o PT tem uma vaga assegurada no segundo turno da eleição presidencial. Até lá, o principal adversário é Bolsonaro. Pelo plano traçado na campanha tucana, Alckmin será preservado das críticas mais pesadas ao candidato do PSL. As “denúncias” contra Bolsonaro serão feitas em parte das 12 inserções diárias do partido no horário eleitoral de rádio e TV.

Roteiro. O ex-governador ainda não promoveu eventos públicos de campanha e vai fazer no sábado sua primeira viagem oficial, ao Pará. Ele desembarca em Itaituba e de lá vai de carro até Rurópolis e Santarém pela rodovia BR-163. A ideia é aproveitar a viagem para fazer vídeos de campanha mostrando os problemas de infraestrutura da região. Pelo roteiro, Alckmin deve seguir de Santarém para Mato Grosso do Sul, mas esse trecho ainda não foi confirmado.

Na semana que vem, o candidato tucano vai concentrar sua campanha no Nordeste, onde Alckmin apresenta os piores índices de intenção de voto.

Depois disso, a campanha também planeja fazer uma caravana pelo interior de São Paulo junto com o ex-prefeito de São Paulo João Doria, candidato ao governo pelo PSDB. Há também previsão de um evento a ser realizado em São Bernardo do Campo, na região do ABC paulista. A cidade foi berço do PT, mas hoje é governada pelo tucano Orlando Morando.

Tucanos recusam apoiar PT no segundo turno

Coluna do Estadão | O Estado de S. Paulo

Se por um lado tucanos admitem receber o apoio do PT no segundo turno, por outro não garantem reciprocidade aos petistas caso Geraldo Alckmin esteja fora dessa fase da disputa. “Se ele (Alckmin) não for para o segundo turno, o PSDB não terá unidade. O PT que está aí não é do Lulinha paz e amor, é com faca nos dentes, com rancor. O partido vai se dividir”, diz o secretário-geral da sigla, Marcus Pestana (MG). O debate sobre as composições no segundo turno foi levantado pelo ex-presidente FHC, para quem Alckmin deve buscar o apoio do PT contra Jair Bolsonaro.

Vício de origem. Notório antipetista e aliado de primeira hora de Geraldo Alckmin, o presidente do PTB, Roberto Jefferson, diz que FHC se equivocou. “O segundo turno será entre o Haddad e o Alckmin. Não corremos risco de uma aliança com o PT”, ironizou.

Bola de cristal. Os petistas também rebateram a previsão de que estarão fora do segundo turno. “Fernando Henrique é ruim de projeção. Tirou foto na cadeira do Jânio Quadros e perdeu a eleição e anunciou a vitória do Aécio contra a Dilma. Ele é o Mick Jagger da política”, alfinetou Paulo Pimenta, líder do PT.

Alas do PT disputam sobre quando lançar Haddad de vez

Grupo de Gleisi quer adiar ao máximo troca; governadores cobram rapidez

Sérgio Roxo | O Globo

SÃO PAULO - Um dilema se abateu no PT. O partido está dividido sobre qual o momento ideal para fazer a troca do ex-presidente Lula pelo ex-prefeito Fernando Haddad na cabeça da chapa que disputará a Presidência.

Liderada pela presidente do partido, senadora Gleisi Hoffmann (PR), uma ala, com forte adesão das correntes de esquerda, defende que a corda deva ser esticada ao máximo.

Para isso, avaliam, devem ser usados todos os instrumentos jurídicos possíveis, e a mudança só pode ocorrer perto do dia 17 de setembro, prazo limite da lei eleitoral.

Um outro grupo, representado pelos governadores do partido e dirigentes da corrente majoritária CNB que se aproximaram de Haddad nos últimos tempos, avalia que o ex-prefeito precisa ter pelo menos um mês para rodar o país como candidato oficial.

Divergências à parte, Haddad já colocou a campanha na rua. Ontem, depois de visitar Lula na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, aproveitou para gravar imagens na frente do prédio para serem usadas no horário eleitoral gratuito, que começa no dia 31.

Os petistas favoráveis a postergar a mudança acreditam que seria mais fácil transferir os votos na reta final. Para eles, mesmo que a Justiça impeça Lula de participar do horário eleitoral e de debates, essa adversidade pode ser explorada como perseguição judicial.

SINAL DE DODGE
Nesse grupo, há até quem acredite que o partido, a depender do cenário, possa optar por um caminho extremo. A ideia, nesse caso, seria tentar deslegitimar o processo e seguir com Lula, mesmo com a impugnação, convocando a população a votar 13 em protesto.

Por outro lado, partidários da mudança mais rápida avaliam que a apresentação do pedido de impugnação por parte da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, três horas após os petistas protocolarem o registro da candidatura, foi considerada positiva porque deve abreviar a novela.

— Melhor um fim horroroso do que um horror sem fim. Temos um problema pragmático de transferência de votos. O Haddad precisa correr o país com a candidatura definida. A transferência não é automática como alguns acreditam — afirma um petista.

Fantasia ministerial: Editorial | Folha de S. Paulo

Cortes ou pastas com superpoderes não suprimem o imperativo de negociar com o Congresso

O pensamento antipetista que floresceu no país ao longo dos últimos anos costuma dar importância exagerada à bandeira do corte de ministérios no Executivo federal —proposta encampada pelos presidenciáveis Jair Bolsonaro (PSL) e Geraldo Alckmin (PSDB), que disputam essa faixa do eleitorado.

Não que o tema seja irrelevante. O número de pastas chegou ao recorde de 39, dez acima da quantidade atual, no governo de Dilma Rousseff(PT), sem que se apresentasse nenhuma justificativa em termos de melhora da gestão pública.

Ao contrário, a proliferação de cargos de comando tende a provocar conflitos de atribuições e a atrasar o processo decisório. O problema talvez não tenha sido mais grave porque a maioria dos postos criados tinha poderes mais próprios do segundo escalão.

De todo modo, inutilidades como ministros da Pesca, da Aviação Civil ou da Pequena Empresa acabaram associadas à gastança que produziu a ruína do Orçamento, quando não aos múltiplos escândalos de corrupção do período.

O equívoco mais comum, devidamente explorado pelo mundo político, está em imaginar que a mera extinção de pastas corresponda a enxugamento do Estado ou combate ao desperdício —expressões que se encontram em documentos divulgados pelas campanhas de Bolsonaro e Alckmin.

Os cortes promovidos desde a redemocratização não passaram de realocações de órgãos, programas e servidores. Tome-se o exemplo da reforma promovida por Michel Temer (MDB), em que o antigo Ministério da Previdência, de longe o campeão de despesas da Esplanada, foi basicamente absorvido pelo Desenvolvimento Social.

Tribunal como palanque: Editorial | O Estado de S. Paulo

A incrível farsa protagonizada na quarta-feira pelo PT em nome de seu chefão Lula da Silva, registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) como candidato do partido à Presidência a despeito do fato incontestável de que ele é inelegível, teve um único objetivo: transformar o Judiciário em palanque petista.

Seguindo a estratégia desenhada pelo ex-presidente em sua cela em Curitiba, onde cumpre pena por corrupção e lavagem de dinheiro, os petistas parecem acreditar que qualquer desfecho jurídico a respeito da candidatura de Lula lhes será benéfico. Na remotíssima hipótese de que a Justiça Eleitoral dê sinal verde à candidatura, Lula chegará como favorito à disputa; no entanto, se sua candidatura for impugnada, o que é bem mais provável, Lula e sua claque denunciarão a decisão como prova cabal de que o ex-presidente é um “perseguido político” – e é isso, e apenas isso, o que alimentará a campanha petista.

Transformar seu encalacrado líder em vítima de uma trama jurídico-midiática foi o que restou a um partido que, de bastião da ética na política, se tornou símbolo da corrupção nacional e que, de promessa de inovação e de modernidade administrativa, passou à História como a agremiação que deu ao País seu pior governo de todos os tempos, o de Dilma Rousseff, felizmente afastada antes que completasse sua “obra”.

O problema é que a estratégia petista está indo de vento em popa. Na campanha eleitoral, pouca gente parece se lembrar que a crise política, econômica e moral que o País atravessa foi produzida pelos governos de Lula e de Dilma. Formou-se um consenso tácito entre quase todos os principais concorrentes que o nome a ser evitado na campanha é o do atual presidente, Michel Temer, que hoje sintetiza, para a esmagadora maioria da opinião pública, o que há de pior na política – malgrado o fato de que herdou de Dilma um país em frangalhos e entregará ao sucessor uma administração razoavelmente saneada.

Enquanto isso, a ex-presidente Dilma, a despeito de seu imenso passivo, aparece com bom desempenho na corrida ao Senado por Minas Gerais e o ex-presidente Lula, mesmo tendo sido o inventor desse desastre chamado Dilma, mesmo tendo sido o presidente sob cujo governo estouraram os maiores escândalos de corrupção da História nacional e mesmo sendo ele próprio um condenado por corrupção, surge como líder em todas as pesquisas de intenção de voto.

Os dois casos tripudiam da democracia e das instituições: Dilma só está concorrendo porque, a despeito de ter sofrido impeachment, manteve seus direitos políticos graças a uma incrível cabala de um ministro do Supremo Tribunal Federal com o presidente do Senado; e Lula, um presidiário com longa pena ainda a cumprir, faz troça do Judiciário e desafia os tribunais a mantê-lo preso e impedir que o povo seja “feliz de novo”.

A necessidade de diálogo depois das eleições: Editorial | O Globo

País requer reformas que precisam de entendimento entre as diversas forças políticas

Este início da fase mais intensa da campanha merece uma revisita aos últimos 16 anos de disputas eleitorais, a começar por 2002, quando Lula, em meados do ano, deu um cavalo de pau no transatlântico chamado Brasil e assinou a Carta ao Povo Brasileiro, com o compromisso de respeitar contratos e a sensatez em política econômica.

Não convenceu a todos —tanto que o câmbio disparou —, mas serviu para reduzir tensões. O PT partia para o terceiro embate consecutivo com o PSDB, pela primeira vez com reais chances de vitória. A eleição de Lula, e não de José Serra, levou Fernando Henrique Cardoso a organizar uma civilizada transição. Até parecia que o que os uniu no enfrentamento da ditadura militar e os levou a compartilhar palanques havia ressurgido.

A boa atmosfera dos preparativos para a transmissão do poderem certa medida foip reservada no início do governo Lula, quando os tucanos se identificavam como eixo da política econômica. O presidente cumpria oque prometera. O entendimento entre as duas forças políticas se mostrava essencial para a votação de questões-chave, como mudanças na Previdência.

O escândalo do mensalão, exposto em 2005, quebrou qualquer encanto que pudesse ter sido criado pelo entendimento relativo entre PSDB e PT ou pela simpatia nunca reprimida, até hoje, por FH em relação a Lula.

A campanha de reeleição de Lula, em 2006, tendo o tucano Geraldo Alckmin como adversário, apresentou uma temperatura mais elevada e ajudou a afastar mais ainda PT e PSD B. Entre erros tucanos—Alckmin sem defender as privatizações bem feitas por FH e querendo ostentar um papel de defensor de algumas estatais — e mais um escândalo petista, o dos “aloprados” (dossiê falso contra Serra), Lula se reelegeu, e qualquer possível ponte entre PT e PSDB para viabilizar um projeto responsável de reformas foi implodida.

Criticado, teto de gastos não tem substituto à altura: Editorial | Valor Econômico

O teto de gastos pode estar com seus dias contados, seja pela mudança de governo, seja por mudanças políticas, seja pela compressão de recursos mínimos para o funcionamento da máquina pública. O cerco político ao controle prescrito pelo teto é o mais evidente - ele será eliminado se ganharem os candidatos da esquerda, enquanto que os de centro com chances de vitória não morrem de amores por ele. Contábil e praticamente, o dispositivo tem um encontro com a verdade em 2019 ou 2020, anos em que a contração das despesas de custeio levará ao abandono de prestação de serviços em muitos setores, alguns deles de grande importância para os cidadãos.

O teto de gastos consolidou uma ideia simples para atacar um problema complexo, o do crescimento ininterrupto das despesas públicas - de 1997 em diante, com avanço real de 6% ao ano. O desastre fiscal da gestão de Dilma Rousseff, a brutal recessão subsequente e o limite que parece ter sido atingido para o aumento de impostos impuseram uma solução radical. A limitação das despesas à variação da inflação tem validade por pelo menos 10 anos e é mais que polêmica. Há quem julgue esse gradualismo perigoso - o Fundo Monetário, por exemplo -, enquanto há quem considere que o aperto é terrível já no curto prazo e insustentável politicamente. Dependendo das premissas, os dois lados podem ter razão.

O Congresso colocou na Constituição que abdicou por duas décadas de sua prerrogativa de aumentar despesas à brasileira - adequando seu montante a uma estimativa fictícia de receitas e jogando nos ombros dos malabaristas da Fazenda a responsabilidade por controlar gastos na boca do caixa. A gravidade da crise fiscal e política levou à mudança dos termos da questão, embora não tanto a disposição do Legislativo e do Judiciário. Os políticos, então, sem poder elevar despesas, passaram a dilapidar as receitas, com Refis múltiplos, por exemplo.

Míriam Leitão: Qual é o melhor papel do BNDES

- O Globo

O BNDES teve o melhor semestre desde 2014, quando começou a recessão, mas seu lucro de R$ 4,7 bilhões foi resultado de redução das despesas de provisão e de venda de ativos. Só a operação da Eletropaulo significou um lucro de R$ 1 bilhão. O presidente do banco, Dyogo Oliveira, acha que o melhor caminho para a instituição é de fato ir vendendo ações de empresas “maduras” para focar em firmas que tenham potencial de crescimento. “Entendo que esse é o papel do BNDES”, diz.

Dyogo criticou, em entrevista que me concedeu na Globonews, a política adotada nos governos Lula e Dilma de investir em grandes grupos:

— O erro foi a tentativa da instituição, da tecnocracia, de escolher quem são os vencedores. Essa estratégia é a que gera críticas, grandes reações e que geralmente leva a equívocos. O papel do BNDES é dar apoio para que as empresas cresçam, mas é o mercado que diz quem vai crescer. Quando o governo entra escolhendo o campeão nacional, a gente acaba cometendo erros e envolvendo a instituição em situações como vimos, que foram prejudiciais à imagem do banco.

Dyogo Oliveira teve posto alto no Ministério da Fazenda na administração Lula, foi secretário-executivo do Ministério do Planejamento no governo Dilma. Com Temer, chegou a ministro e agora comanda o BNDES. Como explicar essa passagem por governos diferentes entre si?

— Eu sou funcionário de carreira, o meu destino natural é voltar para as fileiras do governo a partir de janeiro.

Pelo seu tempo no Planejamento ele conhece o impasse em que vivem as contas públicas, por isso adverte que os candidatos devem deixar claro, agora durante a campanha, o que pretendem fazer:

— Tem que começar fazendo a reforma da Previdência e por isso é preciso deixar isso claro na campanha. Será muito difícil para o próximo governo fazer uma campanha dizendo que não vai fazer porque não é importante e aí ter que fazer. É muito importante ser honesto com o eleitor, porque essa reforma terá que ser feita. Dá tempo ainda de arrumar o discurso. É preciso olhar para uma planilha, a das Necessidades de Financiamento do Governo Central. Ela mostra tudo o que o governo tem que pagar e de onde sairá o dinheiro. É muito simples e fácil de ver que não há espaço para tocar a próxima administração sem a reforma da Previdência.

Claudia Safatle: Programas de governo entre slogans e bordões

- Valor Econômico

Programas se dividem em relação ao papel do Estado

Os programas de governo dos principais candidatos à Presidência da República, entregues à Justiça Eleitoral, não trazem informações suficientes sobre o que pretendem fazer, na economia, para tirar o Brasil do baixo crescimento. Em meio a promessas gerais, slogans e bordões há alguns caminhos desenhados e pistas de como persegui-los.

Ciro Gomes, do PDT e Geraldo Alckmin, do PSDB, se comprometem com a eliminação do déficit primário das contas públicas da ordem de R$ 139 bilhões, em 2020. Jair Bolsonaro (PSL) e Alvaro Dias (Podemos) assumem metas mais arrojadas, marcando a eliminação do déficit primário para 2019 e a realização de superávits à partir do ano seguinte. Dias vai além e sustenta que vai zerar em 2023 o déficit nominal, hoje de 6,5% do PIB, ou R$ 489,3 bilhões.

Ciro e Bolsonaro pregam o Orçamento base zero. "Não haverá mais dinheiro carimbado para pessoas, grupos políticos ou entidades com interesses especiais", adianta Bolsonaro. Por trás da defesa do Orçamento base zero há medidas duras e emendas constitucionais a serem propostas para desvincular as receitas de despesas preestabelecidas, que bate de frente com os interesses das corporações.

É difícil julgar se o presidente eleito terá força política para derrubar os carimbos do orçamento e para fazer as reformas necessárias.

Tal como o candidato do PSDB, Ciro quer criar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) no lugar de vários outros tributos. O PDT quer instituir o Imposto de Renda sobre lucros e dividendos e aumentar as alíquotas do imposto sobre heranças e doações.

Henrique Meirelles (PMDB) prega reforma para simplificar o sistema tributário e, como Marina Silva (Rede), Bolsonaro e Alckmin, defende a abertura do país, com revisão das tarifas de importações para que a economia se integre às cadeias globais de valor.

O programa do PT pretende a "refundação democrática" do país. Defende a convocação de uma Assembleia Constituinte; a regulamentação da mídia e o controle social de todos os poderes da União; a suspensão das privatizações; a revogação do teto para o gasto público e da reforma trabalhista e a "recuperação" do pré-sal.

Na largada, desemprego recorde desafia candidatos a presidente

No 1º dia de campanha, IBGE mostra que o número de pessoas que procuram emprego há mais de dois anos chegou a 3,16 milhões

- O Estado de S. Paulo.

A previsão otimista do fim do ano passado de que o desemprego cairia em 2018 não se confirmou e o tema será um dos desafios mais urgentes a ser enfrentados pelo próximo presidente da República. Dados divulgados ontem pelo IBGE, justamente no primeiro dia oficial de campanha eleitoral, mostram que, no 2.º trimestre, o número de pessoas que estão há mais de dois anos procurando emprego chegou ao recorde de 3,162 milhões. O contingente de desalentados – aqueles que desistem de buscar trabalho – também foi recorde: 4,833 milhões. A taxa de desemprego do País era de 11,8% em dezembro e fechou o 2.º trimestre em 12,4% – são quase 13 milhões de desocupados. Os candidatos convergem na ideia de que é necessário o País retomar a estabilidade econômica. Os programas de governo registrados no TSE falam em equilíbrio fiscal e no aumento de investimentos em educação e em obras de infraestrutura.

Desemprego recorde desafia candidatos a presidente

No fim do ano passado, ainda sob a perspectiva de aprovação da reforma da Previdência e com projeções de crescimento do PIB em 2018 que chegavam a superar os 3%, havia um certo otimismo em relação à queda do desemprego. Mas a realidade tem se mostrado bem diferente. A cada divulgação de dados sobre trabalho no País, consolida-se a convicção que o desemprego será um dos desafios mais urgentes a serem enfrentados por quem vencer a eleição para a presidência em outubro.

Dados anunciados ontem pelo IBGE mostram o tamanho desse desafio. No segundo trimestre, o número de pessoas que estão há mais de dois anos procurando emprego chegou ao recorde de 3,162 milhões. O total de desalentados, que são as pessoas que desistem de procurar emprego por acreditar que não vão mais encontrar, também foi recorde: 4,833 milhões. A taxa de desemprego do País, que estava em 11,8% em dezembro, fechou o segundo trimestre em 12,4% – são quase 13 milhões de desocupados.

Ironicamente, a própria disputa eleitoral é apontada como uma das causas da manutenção da desocupação em níveis tão altos. Com um cenário totalmente incerto, empresas seguram investimentos e, consequentemente, a abertura de novas vagas. “Estamos num momento de elevada incerteza, sem saber quem é o candidato com mais chances, o que vai fazer, o que propõe”, diz José Ronaldo de Castro Souza Júnior, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Isso obviamente segura a retomada.”

Faltam trabalho e perspectiva a 27 milhões de brasileiros

Desemprego de longo prazo é um dos principais desafios do próximo presidente

O contingente de brasileiros aos quais faltou trabalho no segundo trimestre, e a quem o próximo governo terá que apresentar soluções, chegou a 27,6 milhões, segundo o IBGE. É um desafio para o qual a maioria dos candidatos à Presidência tem propostas genéricas. O número de pessoas sem emprego há dois anos ou mais (3,1 milhões) e de desalentados (4,8 milhões) atingiu o maior nível desde 2012.

Políticas públicas terão de olhar para 27,6 milhões

Marcello Corrêa, Gabriel Martins e Pedro Amaral | O Globo

-O próximo governo terá de elaborar políticas públicas de criação de emprego para um contingente muito mais amplo do que os atuais 12,9 milhões de desempregados. De acordo com o IBGE, no segundo trimestre, faltou trabalho para 27,6 milhões de brasileiros.

O número engloba não só os desempregados, como os 4,8 milhões que desistiram de procurar uma vaga — o maior patamar de desalento desde o início da pesquisa, em 2012. Será preciso considerar também os 6,5 milhões que trabalham menos horas do que gostariam porque não encontram oportunidades no mercado. Há ainda outros 3,3 milhões que queriam estar empregados, mas se veem impossibilitados de assumir o posto no momento. Uma das explicaçõe sé o cuidado com filhos ou idosos.

A situação se torna ainda mais grave quando se leva em conta que 3,1 milhões dos que buscam um posto de trabalho estão à procura de uma vaga há dois anos ou mais —o maior contingente do chamado desemprego de longo prazo desde 2012.

O desemprego de longa duração é, segundo especialistas, um dos motivos para o aumento do desalento. Depois de procurar emprego por muito tempo e não conseguir, muitos acabam desistindo ou não tendo condições de continuar em busca de uma vaga, até por falta de recursos para despesas de transporte e outros custos.

Carlos Drummond de Andrade: A excitante fila do feijão

Larga, poeta, a mesa de escritório,
esquece a poesia burocrática
e vai cedinho à fila do feijão.

Cedinho, eu disse? Vai, mas é de véspera,
seja noite de estrela ou chuva grossa,
e sem certeza de trazer dois quilos.

Certeza não terás, mas esperança
(que substitui, em qualquer caso, tudo),
uma espera-esperança de dez horas.

Dez, doze ou mais: o tempo não importa
quando aperta o desejo brasileiro
de ter no prato a preta, amiga vagem.

Camburões, patrulhinhas te protegem
e gás lacrimogêneo facilita
o ato de comprar a tua cota.

Se levas cassetete na cabeça
ou no braço, nas costas, na virilha,
não o leves a mal: é por teu bem.

O feijão é de todos, em princípio,
tal como a liberdade, o amor, o ar.
Mas há que conquistá-lo a teus irmãos.

Bocas oitenta mil vão disputando
cada manhã o que somente chega
para de vinte mil matar a gula.

Insiste, não desistas: amanhã
outros vinte mil quilos em pacotes
serão distribuídos dessa forma.

A conta-gotas vai-se escoando o estoque
armazenado nos porões do Estado.
Assim não falta nunca feijão-preto

(embora falte sempre nas panelas).
Método esconde-pinga: não percebes
que ele torna excitante a tua busca?

Supermercados erguem barricadas
contra esse teu projeto de comer.
Há gritos, há desmaios, há prisões.

Suspense à la Hitchcock ante as cerradas
portas de bronze, guardas do escondido
papilionáceo grão que ambicionas.

É a grande aventura oferecida
ao morno cotidiano em que vegetas.
Instante de vibrar, curtir a vida

na dimensão dramática da luta
por um ideal pedestre mas autêntico:
Feijão! Feijão, ao menos um tiquinho!

Caldinho de feijão para as crianças...
Feijoada, essa não: é sonho puro,
mas um feijão modesto e camarada

que lembre os tempos tão desmoronados
em que ele florescia atrás da casa
sem o olho normativo da Cobal.

Se nada conseguires... tudo bem.
Esperar é que vale - o povo sabe
enquanto leva as suas bordoadas.

Larga, poeta, o verso comedido,
a paz do teu jardim vocabular,
e vai sofrer na fila do feijão.