sábado, 3 de novembro de 2018

Opinião do dia: Hannah Arendt

Além desses três elementos de toda ação política – o fim que ela persegue. O objetivo que tem em mente e pelo qual se orienta e o significado que se revela no curso da ação – existe um quarto elemento, que, embora nunca seja a causa direta da ação, é o que a coloca em movimento. Seguindo a discussão de Montesquieu sobre os sistemas de governo em O Espírito das Leis, proponho chamar este quarto elemento de o “principio de ação”. Em termos psicológicos, poder-se-ia dizer que se trata da convicção fundamental compartilhada por um grupo de pessoas. Há um bom número de tais convicções que desempenharam um papel no curso de ações políticas e chegaram até nós através da história, embora Montesquieu só conheça três: a honra nas monarquias, a virtude nas repúblicas e o medo sob as tiranias. A esses princípios podemos, sem dúvida, acrescentar a fama, tal como a conhecemos no mundo de Homero: a liberdade, como encontrada no período clássico de Atenas: a justiça: e até a igualdade, se por isso entendermos a crença no valor inato de todo ser humano. A extraordinária importância de todos esses princípios reside em que eles não apenas levam seres humanos a agir, mas são também a fonte que alimenta continuamente as suas ações."

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Hannah Arendt (1906-1975), ‘A promessa da política’, pp. 258-9, Difel, 2008

Miguel Reale Júnior: No alto das redes sociais

- O Estado de S. Paulo

É preciso abrir frentes de interlocução com a sociedade, para não ser um presidente solitário

Na primeira eleição direta depois da ditadura, em 1989, os candidatos dos principais partidos – Ulysses Guimarães, Paulo Maluf, Aureliano Chaves, Leonel Brizola, Mário Covas – naufragaram. O povo queria o novo. Foram para o segundo turno Collor e Lula. Collor, candidato pelo pequeno PRN, apresentou-se como o caçador de marajás, em luta contra a corrupção do governo Sarney. O populismo prevaleceu sobre a força dos partidos políticos.

De similar com aquela eleição, na deste ano busca-se o novo e há ilusão de que as dificuldades serão superadas pela figura mítica do ungido, sem nenhuma avaliação racional, como crença a pairar longe de qualquer motivo objetivo.

O sentimento antissistema e anti-PT, ao simbolizar esse partido o aparelhamento do Estado, foi um dos fatores determinantes do processo eleitoral deste ano, principalmente nos municípios mais populosos e de maior índice de desenvolvimento humano (IDHs). Entre os mil municípios com maior IDH, Bolsonaro ganhou em 967; nos mil de menor índice, Haddad venceu em 975.

A população que se sentia mais independente da tutela estatal tendeu a votar em favor do novo, ou seja, contra o sistema. Isso repercutiu na eleição de governadores novéis na política, concorrendo por partidos sem expressão. Destaque-se o inexperiente Romeu Zema, na tradicional Minas Gerais, candidato pelo Novo, vencendo o ex-governador Anastasia. Novatos, sem vivência na administração pública, surpreenderam em Estados importantes como Rio de Janeiro e Santa Catarina e no Distrito Federal, bem como em Roraima e Rondônia. Ao lado disso, velhas raposas foram derrotadas: Romero Jucá, Eunício Oliveira, Roberto Requião.

João Domingos: O presidenciável

- O Estado de S.Paulo

Ao aceitar o Ministério da Justiça, o juiz Sérgio Moro se torna candidato ao Planalto

No momento em que aceitou o convite para assumir o Ministério da Justiça, o juiz Sérgio Moro credenciou-se para se candidatar à sucessão do próprio chefe, caso prospere a ideia de Jair Bolsonaro de acabar com a reeleição. Ou até para concorrer com Bolsonaro, se a reeleição for mantida e o capitão reformado do Exército se sentir tentado a buscar um outro mandato.

Esse será o caminho de Moro. Por mais que ele e Bolsonaro digam que o cargo de ministro serve para que o governo central assuma o combate à corrupção e ao crime organizado, e que, depois, o juiz de Curitiba será nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) quando uma vaga surgir, o fato é que, hoje, Moro está credenciado a disputar a próxima eleição para a Presidência da República.

A nomeação de Sérgio Moro para um superministério da Justiça a ser criado é também o pagamento de uma promessa de campanha feita por Bolsonaro ao eleitor que o elegeu, um eleitor que parece dar mais importância ao combate à corrupção do que às questões econômicas. Não que o nome do juiz estivesse vinculado à promessa. Mas, ao nomeá-lo, a identificação de uma coisa com a outra foi imediata. O eleitor talvez não tenha votado em Bolsonaro porque ele gosta de Bolsonaro. Ele votou no capitão porque este assumiu um discurso anti-PT e anticorrupção, e se propôs a ser aquele que virá demolir tudo para que algo novo nasça. Essa é a visão que uma boa parte do eleitorado vencedor tem daquele a quem deu o voto.

Alguém pode discordar de tudo isso. E certamente muitos vão discordar. O fato é que Bolsonaro venceu a eleição ao se opor ao PT, ao sistema político, aos esqueminhas e esquemões que costumam capturar governos e os tornam reféns do fisiologismo. Tanto é que, ao nomear Moro, Bolsonaro foi criticado por aliados e opositores, pois ele pôs no jogo político um nome que tem tudo para construir uma carreira política a partir de agora. O eleitor vibrou, ao contrário do status quo político, que aguarda a hora de botar a faca no pescoço de Bolsonaro em nome da governabilidade.

Merval Pereira: Os mesmos erros

- O Globo

Bolsonaro monta um governo baseado em reivindicações da sociedade como combate à corrupção e ao crime organizado

A última vez que isso aconteceu foi em 2003, quando houve uma troca de guarda na política brasileira, saindo o PSDB que governara o país por 8 anos, chegando o PT. Os que saiam cometeram o mesmo erro que os perdedores de agora, jogavam no fracasso dos entrantes. Era voz corrente entre tucanos que Lula e seus sindicalistas, por falta de experiencia, não conseguiriam governar sozinhos e procurariam os primos da social-democracia para uma ampla aliança política. O mesmo Aloisio Mercadante que levou o PT a não apoiar o Plano Real, chamando-o de estelionato eleitoral, agora comanda a estratégia de acusar Moro por ter aceitado ser ministro de Bolsonaro.

Deu no que deu. O PT ficou 13 anos no poder, e enraizou-se de tal maneira na máquina administrativa brasileira que, das tarefas principais do novo governo, está a de desaparelhar o Estado. E ainda esnobou os companheiros de esquerda política, empurrando-os para a direita do campo partidário, acusando-os de terem legado uma “herança maldita”.

Roubou ideias originais dos governos tucanos e melhorou-as, acabando por ter o Bolsa-Família como carro chefe de seu programa de governo, que o salvou da derrota política quando a classe média e o eleitorado das cidades grandes começaram a abandoná-lo devido às denúncias de corrupção.

O PT foi para o Nordeste e lá fincou raízes que o permitiram manter um naco ponderável do eleitorado, o que levou Fernando Haddad para o segundo turno em 2018. Um mérito inegável do governo de Lula foi trazer para o centro do debate político a desigualdade social, graças ao faro político desse que ainda é, mesmo da cadeia, o maior líder popular do país.
A desordem econômica instaurada no governo Dilma, poste que Lula pensava comandar, e a corrupção que financiava o projeto de poder permanente do PT desde os primeiros momentos do primeiro governo Lula, provocaram a maior crise econômica que o país já viveu, e levaram pelo ralo os avanços sociais conseguidos.

Daniel Aarão Reis: O guarda da esquina

- O Globo

Bolsonaro conseguiu a proeza de apresentar-se como uma alternativa a um sistema do qual fazia parte

Para o desgosto e medo de muitos, consumou-se a vitória de um candidato de extrema direta — inédita na história brasileira. As tentativas anteriores — empreendidas por Plínio Salgado e Enéas Carneiro — não haviam chegado a 10% dos votos, apesar das tradições conservadoras. O próprio Jair Bolsonaro era considerado um azarão histriônico. Sua candidatura vagava no reino do inimaginável. Como em relação aos que o precederam, previa-se uma inevitável derrota, dado seu nível de rejeição. Mesmo que chegasse a um improvável segundo turno, seria vencido por um poste, diziam os adversários mais otimistas.

Mas não foi o que aconteceu.

Trata-se, agora, de explicar e interpretar o inesperado.

O sistema político falido foi, sem dúvida, um dos principais fatores. Incapaz de representar as demandas da sociedade, desqualificou-se. A cegueira dos principais partidos em propor sua reforma foi um suicídio. Envolvidos em conchavos eleitoreiros, tomados por um irritante aristocratismo, alérgicos a qualquer autocrítica, partidos e lideranças mostraram-se insensíveis à onda de descontentamento que crescia.

A crise econômica e os milhões de desempregados agravaram o quadro, acirrado pelos péssimos serviços públicos — transportes, saúde e educação —, cuja situação foi denunciada — em vão — pelas grandes multidões em 2013. Contribuiu também a situação ameaçadora da (in) segurança pública, encolhendo as pessoas, temerosas de bandidos, policiais e balas perdidas, num cotidiano infernal que ninguém aguenta mais. Para coroar o divórcio com grande parte da opinião pública, uma gestão mal conduzida de questões morais delicadas — a respeito das quais prevaleceram a omissão e a corrida sem princípios pelos votos dos religiosos conservadores —jogou no colo dos tribunais a decisão sobre assuntos que deveriam ser discutidos abertamente.

Míriam Leitão: Está tudo muito confuso, tá ok?

- O Globo

Boa comunicação faz parte da arte de bem governar, por isso o presidente eleito deveria migrar para outro estilo de transmitir suas ideias e decisões

O presidente eleito Jair Bolsonaro gosta de uma comunicação de frases curtas, vocabulário estreito, ideias simples e uma interjeição final. O seu “tá, ok?” costuma se seguir a ideias controversas e é posto muitas vezes como uma prévia interdição ao contraditório. Nessa primeira semana após a eleição tudo foi muito confuso. É natural. O governo nem começou. A decisão de barrar jornais numa coletiva mostra autoritarismo. A cena de Paulo Guedes e Sérgio Moro, na sexta-feira, desistindo da entrevista, em frente ao pelotão de jornalistas exibe o improviso.

Bolsonaro acredita na força do seu próprio canal de comunicação e se baseia no fato de ter sido com a mídia alternativa, criada pelo filho 02, que ele contornou a falta de recursos eleitorais tradicionais, como acesso ao fundo partidário e tempo de televisão. Só que agora tudo mudou. Ele é o presidente eleito e a boa comunicação faz parte de bem governar.

Após o primeiro turno, em vez de falar com os repórteres como fazem todos os candidatos que vencem essa etapa inicial, Bolsonaro fez um live no Facebook. Ao vencer o segundo turno, teve que fazer três falas de vitorioso para cumprir de forma incompleta o ritual democrático de qualquer eleição, que é se comunicar com o país após as urnas. Sua primeira fala foi ainda de conflito, via Facebook. Na segunda, que foi mais organizada pelo esforço dos órgãos de imprensa que se uniram para isso, ele preferiu ler um texto em que faltavam pontos importantes, como uma palavra indispensável aos eleitores que não votaram nele. Na terceira, Bolsonaro voltou ao Facebook para completar o que havia esquecido. No meio de tudo isso, uma oração, que seria normal sendo feita internamente, mas exposta como primeira cena do governante eleito parecia revogar a sadia separação entre Igreja e Estado, um dos primados da Reforma Protestante de 500 anos.

Demétrio Magnoli: Vozes das trincheiras

- Folha de S. Paulo

Defesa da resistência pode dar a Bolsonaro triunfo não teve na campanha

Um presidente autoritário não é o mesmo que um regime autoritário. O primeiro pode até levar ao segundo, mas o percurso exige ingredientes especiais. Na Turquia, demandou anos de uma insurgência separatista. Não somos a Turquia. As vozes que, em nome do espantalho do “fascismo”, desceram às trincheiras da “resistência” evidenciam profunda ignorância do significado da democracia.

“A tristeza tem que se transformar em resistência”, tuitou Manuela D’Ávila na hora da proclamação do resultado, pronunciando a senha clássica da política sectária.

Em 2010, batido por Dilma, Serra falou em “resistência”. Mas resistir a um governo escolhido em eleições livres equivale a negar a soberania popular. Haddad quase seguiu pela mesma trilha, negando o telefonema simbólico de congratulações que o derrotado deve ao vitorioso, mas corrigiu-se num tuíte, no dia seguinte.

Na direção oposta, Guilherme Boulos, ícone de um PSOL que retorna ao berço lulista, conclamou à “resistência” —e foi imitado pelo pobre Eduardo Suplicy. Serra falava só para emitir sons. Ele não pretendia “resistir”, mas apenas reativar sua crônica guerra interna pela legenda do PSDB na eleição seguinte.

Já o lulismo e seus satélites parecem decididos a cavar trincheiras. Gleisi Hoffmann atribuiu a Haddad a função de articulador de uma “frente de resistência” e chegou perto de negar a legitimidade do eleito. Ela classificou os resultados eleitorais como um “fato” (alguém duvida disso?), mas qualificou as eleições como “processo eivado de vícios e de fraudes” que “consolidam” o “golpe” do impeachment. Daí ao “Fora Bolsonaro!”, o passo é curto.

Hélio Schwartsman: Deus acima de todos

- Folha de S. Paulo

É interesse das religiões que Deus seja mantido longe das engrenagens do Estado

“Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” foi o lema da campanha de Jair Bolsonaro (PSL), que ele continua utilizando em seus pronunciamentos pós-eleitorais. O “Deus acima de todos” me incomoda mais do que o “Brasil acima de tudo”, do qual já não gosto muito (nacionalismos têm se mostrado uma força mais destrutiva do que construtiva).

É evidente que, numa democracia como é o Brasil, as pessoas, incluindo o presidente eleito, têm o direito de professar a fé religiosa que preferirem, privada ou publicamente. Não me parece inteligente, porém, trazer Deus para a política. Ele até pode ser um bom cabo eleitoral, mas é do interesse das próprias religiões que seja mantido tão longe quanto possível das engrenagens do Estado.

O laicismo, afinal, embora seja do agrado de ateus e agnósticos, é um princípio que visa primordialmente a proteger as religiões. É só quando o Estado se mantém neutro em relação a todas as fés que os grupos minoritários podem estar seguros de que não sofrerão nenhum tipo de perseguição nem verão seus concorrentes sendo favorecidos pelas autoridades.

Julianna Sofia: Em dois tempos

- Folha de S. Paulo

Votar remendo de reforma da Previdência neste ano será desperdício de capital político

Difícil prefigurar a votação de uma reforma forçosa e impopular como a da Previdência ainda neste ano, sob o signo de um Congresso de inúmeros derrotados nas urnas. Não é por menos que líderes partidários despejam ceticismo sobre as pretensões temer-bolsonaristas de aprovar até dezembro alguma mudança nas regras das aposentadorias e pensões.

O presidente e seu sucessor deverão discutir na próxima semana, no primeiro encontro que terão após as eleições, o destino da reforma previdenciária. Para Michel Temer, qualquer remendo avalizado em 2018 pelo Parlamento incrementará sua avariada biografia presidencial. Para Jair Bolsonaro, uma investida nesse sentido é aposta de risco.

A proposta do futuro governo, que prevê alterar normas do atual modelo de repartição e criar um regime de capitalização para gerações futuras, carece de detalhamento. Ao passo que excedem informações desencontradas e por vezes desautorizadas por Bolsonaro. Militares serão submetidos às mudanças? A desvinculação do salário mínimo entrará no debate? Qual será a idade mínima a ser defendida? Incorporará uma nova contribuição para financiar o sistema? Aceitará alguma das alternativas sugeridas no estudo do economista Armínio Fraga?

Ricardo Noblat: Que Lula fique onde está

- Blog do Noblat

Cumpra-se a lei

Uma coisa é Sérgio Moro, que jamais admitiu trocar a toga pela política, dar o dito pelo não dito e passar a serviçal do governo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Outra, bem diferente, é o ex-presidente Lula merecer por causa disso a graça, o perdão ou a anistia pelos crimes que cometeu.

O PT faz seu papel quando diz ou sugere que Moro condenou Lula para beneficiar Bolsonaro. Mas o juiz de Curitiba não foi o único a condenar Lula. Quatro juízes de Porto Alegre, e por duas vezes, também o condenaram e aumentaram sua pena.

A defesa de Lula recorreu aos tribunais superiores para anular a sentença de 12 anos 1 um mês de cadeia pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Todos os recursos foram negados pelo Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal.

Nem mesmo o Comitê de Direitos Humanos da ONU, em decisão tomada apenas por dois dos seus 11 membros, pediu a anulação da sentença. Pediu apenas ao Estado brasileiro que permitisse a Lula concorrer às eleições. O pedido não foi levado em conta porque Lula virou um “ficha suja”.

Por mais que os devotos de Lula insistam em tratá-lo como um preso político, preso político ele não é. Foi condenado por crimes comuns. É um preso comum. E, como tal, obrigado a pagar pelos crimes que cometeu de acordo com a lei. Por que se abriria uma exceção? Por Lula ser Lula?

Lula já foi a esperança que derrotou o medo. Acabou derrotado pela ambição de ficar rico e de querer mandar no país até dizer basta.

O desemprego e a transição: Editorial | O Estado de S. Paulo

As festas de fim de ano poderão ser um pouco mais animadas, graças à criação recente de postos de trabalho, mas o desemprego, embora em queda, continua dificultando uma retomada mais veloz do consumo e da produção. Iniciativas corretas do presidente eleito, apoiadas por seu antecessor, poderão animar os empresários e destravar planos de investimento. Mas ainda há mais esperanças do que certezas sobre como será a transição. Os melhores sinais, por enquanto, são de uma recuperação continuada, mas lenta. A desocupação caiu no terceiro trimestre para 11,9% da força de trabalho. Essa taxa é menor que a do trimestre anterior (12,4%) e a do período de julho a setembro do ano passado (também de 12,4%). Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, produzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Doze e meio milhões de trabalhadores continuaram em busca de ocupação no trimestre encerrado em setembro. Entre abril e junho haviam sido 13 milhões, mesmo número do terceiro trimestre de 2017. Houve um recuo considerável desde o começo do ano passado, quando o País começou a sair da recessão e 14,2 milhões procuravam alguma atividade.

Impasses políticos criaram insegurança, travaram a pauta de reformas e afetaram a recuperação econômica. Isso dificultou a abertura de vagas. Pior: o desemprego aumentou de novo durante meses, no fim de 2017, e só neste ano voltou a diminuir. Centenas de milhares de famílias poderiam ter melhorado de vida mais prontamente, mas continuaram por mais tempo assombradas pela desocupação. Essas famílias foram vítimas, aparentemente esquecidas ou menosprezadas por membros do Ministério Público e do Judiciário, de manobras irresponsáveis contra o presidente da República. Os lances fracassaram, mas os custos econômicos e sociais foram enormes.

Desdesarmamento: Editorial | Folha de S. Paulo

Carregada de ideologia, bandeira de Bolsonaro na área da segurança pública não se afigura solução eficaz

Entre as principais bandeiras do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), está a revisão do Estatuto do Desarmamento —uma lei, aprovada em 2003, que limitou as situações em que os brasileiros podem comprar armas de fogo e obterem licenças de porte.

Compreende-se o apelo da proposta, cujo objetivo declarado no programa de governo é "garantir o direito do cidadão à legítima defesa". As taxas de criminalidade no Brasil, afinal, mostram-se alarmantes, com agravamento em grande parcela dos estados.

Entretanto nada leva a crer que essa possa ser uma política eficaz de segurança pública.

Poucas questões vêm tão carregadas de ideologia quanto a da posse de armas. Para o pensamento à direita, trata-se do direito sagrado à autoproteção; à esquerda, considera-se que estabelecer controles rígidos sobre armamentos é vital para o controle da violência.

Encontram-se no mercado, ademais, estudos de solidez variável destinados a sustentar os diferentes posicionamentos.

A cobrança de Mano Brown e Capão Redondo: Editorial | O Globo

Bairro do rapper paulistano sustenta as críticas que ele fez ao PT em discurso no Rio

Embora seja uma prática histórica na esquerda, a autocrítica passa ao largo do PT. A falta de qualquer reconhecimento formal do cometimento de erros graves nos 13 anos de poder em Brasília afastou aliados e ajudou a esvaziar o plano da “frente democrática”, para atrair outros segmentos políticos a fim de enfrentar Jair Bolsonaro no segundo turno.

Não deu certo. Fernando Henrique (PSDB) executou um drible de corpo em Haddad e no PT, enquanto Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) formalizaram um “apoio crítico” e desapareceram. Ciro, pela porta de embarque de um voo para a Europa. Derrotado de forma incontestável, o PT é forçado a fazer uma autocrítica. Que ainda será a portas fechadas, é certo. Entende-se a dificuldade de o partido reconhecer a falha fatal da adesão à corrupção federal, com ramificações até internacionais, enquanto o líder carismático da legenda está preso em Curitiba. Por corrupção. Soaria como reconhecimento de culpa. Mas o mea culpa terá de ser feito. Os petistas continuarão a se deparar com esta questão.

O partido deve também se debruçar sobre os mapas de votação e tentar entender por que Haddad perdeu para o direitista Jair Bolsonaro em áreas que já foram cativas da legenda. Em um comício na Lapa, no Rio, no dia seguinte à vitória de Bolsonaro no primeiro turno, entre discursos típicos, o rapper Mano Brown, de Capão Redondo, periferia da Zona Sul de São Paulo, outrora cativa do PT, quebrou o “clima de festa” e, entre outras frases, soltou estas: “Não gosto de clima de festa. O que mata a gente é o fanatismo e a cegueira. Deixou de entender o povão, já era”. Vaias à lucidez.

Fernando Pessoa: Navegar é preciso

Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:
"Navegar é preciso; viver não é preciso".

Quero para mim o espírito [d]esta frase,
transformada a forma para a casar como eu sou:

Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha de ser o meu corpo
e a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;
ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue
o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir
para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa raça.