sábado, 11 de maio de 2019

João Domingos: Em estado de anarquia

- O Estado de S.Paulo

Atualmente, os líderes partidários não lideram e o baixo clero reina

Pergunta-se muito por que um Congresso tido como o mais inexperiente da História, em que as lideranças políticas influentes podem ser contadas nos dedos, tem conseguido emparedar o governo como o atual tem emparedado. Não dá para destacar nenhuma vitória do presidente Jair Bolsonaro no Parlamento neste governo. Derrotas há aos montes. Nem um decreto presidencial que tratava da ampliação do número de funcionários com poder para determinar o que é documento secreto e ultrassecreto escapou. E olha que decreto é ato normativo do presidente da República, sem necessidade de passar pelo crivo dos congressistas. Mas estes têm o poder de sustá-lo caso o considerem abusivo. Foi isso que fizeram. Outro decreto, este sobre a facilitação do porte de arma para diversas categorias profissionais, assinado nesta semana por Bolsonaro, corre o risco de cair. A Mesa da Câmara já encontrou nele diversas irregularidades.

Volta-se à pergunta: por que um Legislativo inexperiente, tido como o mais fraco se comparado com os anteriores do período pós-redemocratização, mostra-se tão forte diante do Executivo? É possível que a resposta esteja na forma como Bolsonaro decidiu se relacionar com deputados e senadores e seus respectivos partidos. Já durante a campanha boa parte do eleitor de Bolsonaro foi contaminada pela ideia de que tudo o que havia no Congresso era ruim, fazia parte da velha política, ladra e corrupta. Eleito, Bolsonaro anunciou que não faria acordos políticos e partidários para montar seu governo. Cumpriu a palavra.

Bolsonaro, no entanto, não conseguiu impor à Câmara seu candidato preferido, o deputado João Campos (PRB-GO). Não porque não tivesse tentado. É que os partidos de centro e de centro-direita logo perceberam que, se já tinham sido escanteados na montagem do Ministério, se eram a cada dia mais mal-afamados, seriam reduzidos a pó se permitissem a vitória de um candidato do Palácio do Planalto. Juntaram-se em torno de Rodrigo Maia (DEM-RJ), conhecido articulador, naquelas alturas já com a experiência de dois mandatos de presidente da Câmara, líder e presidente do DEM por anos.

Vera Rosa: Balbúrdia do tsunami atinge o Congresso

- O Estado de S.Paulo

O tsunami citado pelo presidente Jair Bolsonaro provocou curiosidade na Praça dos Três Poderes. Afinal, o que ele quis dizer quando afirmou que talvez tenhamos uma onda gigante na semana que vem? Sem o vice Hamilton Mourão para “traduzir” frases enigmáticas de Bolsonaro – como fazia antes de ser bombardeado pelo vereador Carlos, o “zero dois” –, a legenda desta vez não apareceu após o discurso, mas o Congresso vestiu a carapuça.

Nos bastidores, deputados e senadores avaliaram que Bolsonaro prepara uma espécie de “vacina” para jogar a culpa no Legislativo, se não conseguir aprovar a reforma administrativa, prevista na medida provisória que até hoje não foi votada.

A MP diminui o número de ministérios de 29 para 22 e, se não passar até 3 de junho, a Esplanada será desfigurada. Nesse cenário, todas as fusões de pastas serão desfeitas e aí, sim, haverá uma “balbúrdia”, termo em moda ultimamente. Um tsunami para ninguém botar defeito.

O problema é que o governo nada fez, até hoje, para evitar esse desfecho. Sem reação, o Planalto viu o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sair das mãos do ministro da Justiça, Sérgio Moro, e migrar para a Economia. A ordem era votar a MP no plenário da Câmara, assim mesmo. Não deu. Agora, outras medidas devem ser apreciadas antes, atrasando o cronograma.

Diante de tanta confusão, até aliados dizem que o Planalto também quer tirar o Coaf de Moro, sem deixar digitais na manobra. Ao que tudo indica, há mesmo um tsunami por vir, mas o governo tenta a todo custo virar essa rota para o Congresso.

Bolívar Lamounier: Quatro meses de Jair Bolsonaro

- O Estado de S. Paulo

O presidente precisa urgentemente controlar a cacofonia quase diária em seu governo

Decorridos 120 dias da posse de Jair Bolsonaro na Presidência da República, já dá para fazer um balanço razoável. É o que me proponho a fazer neste artigo.

O fato mais importante da eleição foi, a meu ver, a derrota do PT. Mesmo com um candidato “manso” como Fernando Haddad, mais quatro ou mais oito anos de PT na Presidência seriam um desastre. O Brasil ficaria muito perto de um ponto de não retorno, uma vez que a política econômica petista insistiria nos desatinos a que o partido sempre se devotou. A miríade de “movimentos” que o integram ou apoiam manteria o País num permanente clima de ameaça às instituições, afugentando investidores e impedindo a retomada do crescimento. O futuro seria a quase total estagnação que temos tido desde que a exportação de commodities para a China perdeu seu poder de arrastre.

Por intermédio principalmente dos ministros Paulo Guedes e Sergio Moro, o presidente tem condições de colocar as políticas econômica e de segurança no rumo certo. De efeitos práticos, por enquanto, há pouco a mostrar, mas pelo menos a reforma da Previdência parece bem encaminhada. Sem ela o Brasil simplesmente não tem futuro. Já passa da hora de os que a ela se opõem caírem na real. Reformar a Previdência é o primeiro passo, outras reformas cedo ou tarde terão de entrar na agenda; reformas duras, que finalmente nos permitam superar a “armadilha” (melhor seria dizer a “maldição”) da “renda média”. Com a renda por habitante crescendo no ritmo medíocre dos últimos tempos - na faixa de 2% a 3% ao ano -, levaremos algo entre 25 e 30 anos para dobrá-la, um resultado que beira o impensável. O que se requer é, portanto, uma reforma abrangente do Estado e do gasto público, a energização do setor privado e uma forte injeção de ânimo para a sociedade encarar a montanha de problemas que se acumularam nas últimas décadas.

*Dom Odilo P. Scherer: Assembleia da CNBB: escutar os jovens

- O Estado de S. Paulo

Nos seus desafios e nas suas expectativas se mostram os rumos da sociedade do amanhã

O Santuário Nacional de Aparecida sediou, de 1.º a 10 de maio, a 57.ª Assembleia-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), com a participação de cerca de 330 bispos católicos, representantes das 275 dioceses do Brasil. Realizada anualmente, a assembleia tem o objetivo principal de tratar de assuntos relevantes para a vida, a organização e a atuação da Igreja Católica no País, de forma a atender às demandas da missão da Igreja em todas as suas dimensões, sempre em sintonia com as orientações do papa Francisco e da Santa Sé.

Os principais assuntos tratados foram a definição das diretrizes quadrienais da ação da CNBB e da Igreja no Brasil, o acompanhamento da vida social, econômica e política do País, assuntos de doutrina da fé e liturgia, a preparação do sínodo da “Pan-Amazônia”, a ser realizado em Roma no próximo mês de outubro, e a situação religiosa no Brasil, especialmente no que se refere aos jovens. Durante a sua assembleia, a CNBB também elegeu o seu novo quadro diretivo para o próximo quadriênio. E não faltou muita oração e também um dia de retiro espiritual, pregado por dom José Tolentino, bispo português responsável pelo arquivo secreto do Vaticano e pela biblioteca pontifícia.

A pluralidade de assuntos e temas abordados durante a assembleia denota a amplitude e a riqueza dos campos de atuação da Igreja Católica no Brasil, que, atenta à sua missão religiosa, não deixa de dar a sua contribuição para o bem comum, estimulando e orientando seus membros a serem cidadãos participativos nas suas comunidades, em vista da edificação de comunidades locais bem constituídas e atentas às mais diversas realidades humanas em que estão inseridos. Um bom cristão também há de ser um bom cidadão.

José Márcio Camargo*: O mínimo de desemprego

- O Estado de S.Paulo

Revogar a lei do salário mínimo não vai resolver a situação atual, mas, pelo menos, para de piorar

Entre 2005 e 2012, a economia mundial vivenciou um importante boom de commodities, gerado pelas elevadas taxas de crescimento econômico da China, que, no período, atingiu 12,5% ao ano. Os preços das commodities dispararam no mercado internacional (carne, soja, minério de ferro, petróleo, etc.). Sendo o Brasil um dos maiores produtores mundiais desses bens, foi um dos principais beneficiários deste processo.

O aumento dos preços dos bens produzidos e exportados pelo País resultou em aumento da renda dos setores exportadores, que se espalhou por outros setores da economia via aumento da demanda por bens e serviços produzidos e consumidos internamente. Com o aumento da demanda, caiu a taxa de desemprego e o rendimento real do conjunto dos trabalhadores aumentou.

Esse processo foi acompanhado por uma política de aumento do salário mínimo real, que teve início com a estabilização, em 1994, foi aprofundada a partir de 2008 e transformada em lei em 2011. Segundo esta lei, que expirou no início de 2019, o reajuste do salário mínimo não poderia ser inferior à taxa de inflação do ano anterior mais a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes, desde que positiva. Entre 1994 e 2018 o salário mínimo real quase triplicou (aumentou 165%).

Existe uma regra básica em Economia que diz que uma empresa somente contrata um trabalhador se o valor do produto por ele gerado for igual ou maior que o custo de contratá-lo. O valor do produto gerado pelo trabalhador é igual a quanto ele produz por unidade de tempo (a produtividade), multiplicado pelo preço do produto. Já o custo de contratá-lo é igual ao salário pago mais os encargos sociais incidentes sobre este salário. Caso desrespeite essa lei, a empresa caminhará para a falência.

Elena Landau*: É a lama, é a lama

- O Estado de S.Paulo

Ampliar o acesso ao saneamento básico é questão de justiça social

Esta semana o relatório do senador Tasso Jereissati para a MP 868 foi aprovado na Comissão Especial. É um assunto urgente. No Brasil, quase 35 milhões de pessoas não têm acesso à água tratada e quase metade da população não tem serviço de coleta de esgoto. Espero que esse quadro vergonhoso sensibilize os nossos parlamentares, porque a votação nas duas Casas tem de ocorrer até dia 3 de junho para que a medida provisória não caduque.

É espantoso como um projeto de lei de tamanha importância possa enfrentar dificuldades para sua aprovação. A resistência maior vem dos ditos “partidos progressistas”. A ampliação do acesso ao saneamento básico é uma questão de justiça social. Vivendo no esgoto não há igualdade de oportunidades possível. Hoje ainda convivemos com dois Brasis: no Sudeste, o índice de abastecimento de água é 91,2% e o de coleta de esgoto 78%; no Norte é 55,4% e 10,5%. Numa ponta, o Amapá tem a pior estatística do País, com investimento per capita de R$ 30, na outra, São Paulo com dez vezes mais.

A MP desenha um novo marco regulatório. É um passo gigante para a superação do fosso entre cidadãos brasileiros. Traz soluções para os problemas que afastam as empresas privadas. Elas atuam em apenas 6% do setor, mas respondem por 20% do investimento total. Ou seja, proporcionalmente, aplicam bem mais que o setor público. A consequência são indicadores de qualidade, em média, melhores do que as estatais.

*Marcus Pestana: Olavo de Carvalho militares: populismo ou institucionalismo

- O Tempo (MG)

Não teria importância se não fosse o apoio do núcleo familiar

Daron Acemoglu e James Robison, em seu livro “Por que as Nações Fracassam”, após exaustiva pesquisa histórica, em que cotejaram a experiência de diversas sociedades com as diversas teorias do desenvolvimento, concluíram que a prosperidade ou a miséria são determinadas, em última instância, pela qualidade das instituições.

Mal ou bem, no Brasil, aos trancos e barrancos, entre dois impeachments, turbulências políticas e crises econômicas agudas, consolidamos, nos últimos 34 anos, instituições democráticas e republicanas. Mas tropeços e soluços continuam a ocorrer. É preciso ter claro que nossa democracia é ainda tenra e não tem a solidez institucional dos países avançados europeus e dos Estados Unidos. É preciso cuidar com carinho da herança deixada pela redemocratização de 1985.

Construímos um presidencialismo rígido, com um Congresso forte, acompanhado de um sistema político e partidário frágil, inconsistente e pulverizado. É cada vez mais difícil erguer um ambiente saudável de governabilidade e convivência. Quando os governos perdem sua capacidade de governar, instala-se grave impasse. O parlamentarismo precisa voltar à pauta de debates.

Diante de quadro tão complexo e preocupante, o governo Bolsonaro parece às vezes brincar com fogo, testando a nossa resiliência institucional. A convivência descoordenada, improvisada e sem bússola estratégica entre os núcleos econômico-liberal, militar, familiar-fundamentalista-olavista, jurídico-morista e técnico-político produziu crises desnecessárias e perigosas em curto espaço de tempo. A percepção sobre o futuro não pode ser uma roleta-russa permanente.

Míriam Leitão: O novo plano de socorro aos estados

- O Globo

Governadores, prefeitos e até o presidente da República não poderão dar aumento de salários escalonados

O Plano de Equilíbrio Fiscal (PEF) incluirá a proibição para que governador, prefeito e até presidente da República concedam aumento salarial fora dos seus mandatos. Hoje, a lei proíbe concessão nos últimos seis meses, mas o governante dava reajuste escalonado e assim burlava a proibição. Pelo PEF, que será divulgado em breve, nem todos terão direito a empréstimos com garantia do Tesouro. Os que têm letra C de crédito poderão ter acesso a essa facilidade, desde que se comprometam a ter poupança corrente positiva até 2022.

Esse plano é a proposta do governo Bolsonaro aos estados para complementar o Regime de Recuperação Fiscal no qual só o Rio de Janeiro se enquadrou. Mas não deu certo. Minas e Rio Grande do Sul também se candidataram. O novo plano é mais bem formulado, mas ele está sendo visto como uma panaceia e não será. Na reunião desta semana no Planalto, os governadores apresentaram uma lista de seis pedidos. A divulgação deste plano encabeçava a lista.

A principal contrapartida do PEF é que os estados saiam de uma situação de poupança negativa para poupança positiva em quatro anos. E isso é muito difícil. É receita corrente, menos despesa corrente, ou seja, pessoal, custeio e serviço da dívida. Hoje, só os estados com letras A ou B podem ter crédito com aval da União, agora os de letra C também poderão, mas em valor menor e com essa exigência. O empréstimo será parcelado para que a União acompanhe o esforço do estado.

*Demétrio Magnoli: Retirada tática

- Folha de S. Paulo

É provável que a 'revolução' bolsonaro-olavista provoque a implosão do governo

A vitória de Temístocles em Salamina (480 a.C) preservou o mundo grego ameaçado pela Pérsia. O triunfo do macedônio Filipe 2º em Queroneia (338 a.C) unificou as cidades gregas e assentou as bases para a difusão cultural do helenismo. A invasão normanda foi concluída por William, o Conquistador na batalha de Hastings (1066), fonte mítica da moderna Britannia. Segundo uma interpretação exagerada, a civilização ocidental deve sua existência a esse trio de batalhas icônicas. Os generais do alto escalão do governo Bolsonaro certamente as estudaram —e, com elas, aprenderam o valor militar da retirada tática. É hora de aplicar a manobra à política.

O pacto dos generais com o capitão reformado nasceu de um equívoco fatal: os primeiros não entenderam a natureza do segundo. Bolsonaro jamais deixou de ser o fanfarrão estéril, turbulento e indisciplinável, afastado da corporação em 1988. A novidade é que, na curva final rumo ao Planalto, acercou-se de correntes populistas de extrema direita fundamentalmente hostis às mediações institucionais da democracia. Os generais pretendiam participar de um governo "normal", enquadrado na moldura do Estado de Direito. De fato, participam de um governo cujo núcleo almeja subverter o Estado de Direito.

Na rua ao lado, uma faixa da vovó Jurema promete trazer seu amor de volta. A "filosofia política" do Bruxo da Virgínia vale tanto quanto os búzios da vovó —e sua pregação era, até há pouco, um mero golpe de charlatanismo, com implicações exclusivas para seus seguidores ignorantes. Desde a ascensão de Bolsonaro, converteu-se em programa de governo. Os generais começam a entender que o conflito não é com o espalhafatoso bobo da corte, mas com o presidente e seu clã familiar. Falta-lhes, ainda, entender que a conciliação é impossível.

Julianna Sofia: À espera do tsunami

- Folha de S. Paulo

Após semana de tombos e derrotas, presidente faz mistério sobre novos problemas

Num arroubo de hermetismo, o presidente Jair Bolsonaro alertou sobre o risco de seu governo ser atingido por um tsunami nos próximos dias. Soou cataclísmico, após uma semana agitada, em que o Palácio do Planalto foi engolfado seguidas vezes pelo Congresso Nacional.

“Talvez tenhamos um tsunami na semana que vem, mas a gente vence o obstáculo com toda a certeza. Somos humanos, todos erram. Alguns erros são perdoáveis, outros não”, afirmou nesta sexta (10). Do que fala Bolsonaro? De onde virá o maremoto? A que erros se refere?

Nos últimos dias, o bolsonarismo levou uma sova no Parlamento. Na tentativa de aprovar a medida provisória que reconfigurou a Esplanada dos Ministérios, o governo foi derrotado com a transferência do Coaf(Conselho de Controle de Atividades Financeiras) da pasta de Sergio Moro (Justiça) para o Ministério da Economia. Sofreu o revés mesmo depois de ter aceitado recriar dois ministérios que historicamente serviram de abrigo ao fisiologismo: Cidades e Integração Nacional.

Murillo de Aragão: A primeira liberdade

- IstoÉ

Apesar da deseducação e do preconceito — independente da origem ideológica —, o direito de livre expressão irá triunfar. Sem tolerância não iremos a lugar algum

Uma das lutas da humanidade é para podermos falar o que pensamos sem sermos punidos, coagidos ou até mesmo mortos. A essência da evolução é a liberdade de expressão, que precede a liberdade de imprensa. Na constituição norte-americana, a primeira das liberdades é a de expressão, conhecida como a liberdade das liberdades. Sem ela, as demais não se realizam.

Observando a história recente da humanidade — para não irmos muito longe —, a supressão desse direito é o objetivo dos regimes de exceção. Hitler, Stalin, Mussolini, Tito, Perón, Vargas, Castro, Mao, Chávez e tantos outros ditadores trataram de limitá-la. Muitos deles usaram das franquias democráticas para chegar ao poder. E lá, trataram de suprimi-la. No entanto, a resistência às ditaduras se dá no exercício, ainda que precário, da livre expressão das ideias. Algo tão relevante que muitos projetos de poder buscam influir na formulação de conceitos de liberdade para, no final das contas, controlar a circulação da informação.

*Eliana Cardoso: Depois dos 65

- Eu &Fim de Semana / Valor Econômico

Da população do país, 10% são pessoas com essa idade ou mais: precisamos saber como vivem os velhos ao discutir a nova previdência.

Qualquer um de nós, não importa que idade tenha, nega que seja velho, palavra transformada em ofensa. Entretanto, precisamos saber como vivem os velhos no Brasil ao discutir a nova previdência. A reforma do regime previdenciário é urgente, porque as contribuições da população ativa não cobrem os gastos das aposentadorias e pensões.

Porque há necessidade de ajustar o regime previdenciário à realidade da rápida mudança demográfica, muitos defendem a reforma usando o argumento falso de que o regime atual seria concentrador de renda. Entretanto, a evidência não sustenta o clamor de que nosso regime previdenciário tenha se transformado em "máquina de distribuir renda dos pobres para os ricos". Antes de entrar nessa discussão, quero falar do envelhecimento da população e traçar um breve retrato da população acima dos 65 anos.

Envelhecimento da população
O significado da velhice depende do sentido que a sociedade confere à vida e da maneira pela qual a sociedade se comporta. A Política Nacional do Idoso define o brasileiro com mais de 60 anos como idoso. Na Itália, os médicos apontam para os 75 anos. A percepção da velhice vem mudando aqui e lá. A expectativa de vida ao nascer, que hoje supera os 82 anos em alguns países da Europa, era de apenas 18 anos entre os romanos. Ela era de 25 anos no século XVII: em 100 crianças, 25 morriam antes de um ano, outras 25 antes dos 20. Daquelas 100, apenas uma dezena atingia 60 anos.

Dos fenômenos contemporâneos, o menos contestável é o envelhecimento da população. Segundo a teoria da transição demográfica, a população de um país pobre exibe taxas altas de natalidade e mortalidade. Os progressos na agricultura e cuidados de saúde levam à queda da mortalidade e a aumentos populacionais. Nesse estágio o país é jovem.

Em seguida, a taxa de natalidade cai e o bem-estar econômico aumenta, porque muitos adultos, com menos filhos dependentes e poucos aposentados para cuidar, formam uma nação de trabalhadores fisicamente capazes. À medida que o país enriquece e se urbaniza e mais meninas estudam, as crianças deixam de ser um ativo econômico. As pessoas passam a ter bebês, não por precisão ou costume, mas por gostar de criá-los. Em seguida, a queda da taxa de natalidade cai abaixo da taxa de mortalidade e o país envelhece.

Vários fatores, como a renda e a urbanização, se correlacionam com famílias menores. O mais importante é a educação das meninas. Se as mulheres começam a ter filhos tarde, terão menos crianças. O aumento dos anos de escolaridade reduz a taxa de fecundidade, também porque dá à mulher mais escolhas. Esse aumento se reflete em chances de encontrar trabalho remunerado. Equipa a mulher para questionar tradições e usar métodos anticoncepcionais. Transforma as ambições da mãe em relação aos filhos e, portanto, a escolha do número de filhos que deseja ter.

Em todos os países, o envelhecimento da população deriva dos mesmos fatores: a queda da mortalidade infantil (que contribui fortemente para o aumento da expectativa de vida ao nascer) e a queda da natalidade. O envelhecimento da população não significa, portanto, que a longevidade (isto é, o limite da vida) tenha se estendido de forma acentuada. Esse limite ainda se situa em torno dos 120 anos. Quando se diz que a população envelheceu, isso significa que aumentou a proporção de pessoas idosas na população total.

Da população total do Brasil em 2017, 10% representam as pessoas com 65 anos ou mais. E, nos 20 anos entre 1997 e 2017, a participação de pessoas com 75 anos ou mais na população total dobrou de 2% para 4%. Houve, portanto, um aumento importante da expectativa de vida das pessoas que já tinham alcançado 60 anos ou mais. Mas o fenômeno mais importante por trás do envelhecimento da população ainda é o aumento da expectativa de vida ao nascer. Nos últimos 19 anos, enquanto o aumento da expectativa de vida ao nascer subiu oito anos (de 68 para 76 anos), a expectativa de vida para quem já completou 70 anos subiu apenas quatro.

No regime previdenciário brasileiro, como em outros sistemas de repartição, o envelhecimento da população significa uma redução do número de trabalhadores ativos que financiam a parcela de aposentados ou pensionistas. Um sistema sustentável exige alguma combinação do adiamento da idade de aposentadoria, redução do benefício dos aposentados (em relação ao salário dos ativos) e aumento das alíquotas de contribuição dos trabalhadores.

Mapeando o conceito de velhice
"Envelhecimento da População e Desigualdade" - um "Trabalho para Discussão" no site da EESP-FGV, do qual sou coautora com Thais Peres Dietrich e André Portela de Souza - traça a linha dos idosos aos 65 anos, embora reconheça que traçar as fronteiras da velhice apresenta dificuldades.

Além de fenômeno biológico, a velhice tem dimensão existencial, pois modifica a relação do indivíduo com o tempo e, portanto, com o mundo. A sociedade estabelece o status do idoso. A situação do velho é muito diferente se ele é rico e se preparou para a velhice ativa ou se é pobre, despreparado e sem assistência.

Apesar da enorme variedade das experiências, podemos separar as principais visões refletidas na literatura, umas desalentadas, outras enaltecedoras.

Amarga é a visão do "teatro do absurdo". Em "As Cadeiras", de Eugène Ionesco (1909-1994), um velho casal, preso à lembrança engrandecida do passado, tenta trazer de volta os dias que se foram. Dão uma recepção à qual ninguém comparece, acolhem convidados invisíveis e circulam entre cadeiras vazias. No fim, saltam pela janela, porque entendem que a vida não tem sentido.

Em "Fim de Partida", Samuel Beckett (1906-1989) mostra, entre uma e outra lata de lixo, um casal de velhos evocando amores passados. Beckett também trata com crueldade o desmoronamento da memória em "Dias Felizes". As lembranças aparecem em desordem, mutiladas, arruinadas. É como se nada tivesse acontecido e o presente emergisse do vazio. Ainda de Beckett, o herói já idoso do romance "Molloy" vê uma das pernas endurecer e perde a metade dos dedos do pé. Arrasta-se. Rasteja. Ocupa-se com lembranças que desmoronam, nebulosas, inconsistentes, falsas. A vida é apenas a memória que temos dela, e a memória não vale nada.

Ricardo Noblat: Bolsonaro não está nem aí

- Blog do Noblat / Veja

Um presidente incidental
Jair Bolsonaro comporta-se como se pouco ligasse para o destino do seu governo. Jamais imaginou que se elegeria. Atribui sua eleição a Deus que o salvou também da morte em Juiz de Fora.

Não estava preparado para governar, e a essa altura até o boy da Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, admite isso, quanto mais o patrão dele que apostou todas as suas fichas no capitão.

Não estava preparado e não se esforça para ficar. Faltam-lhe paciência e gosto para as exigências do cargo. Carece de um plano mínimo de governo. Vai tocando de qualquer jeito, aos trancos.

Se conseguir chegar ao fim, bom para ele e para seus filhos, não necessariamente para o país. Se conseguir chegar em razoável estado, melhor. Poderá então influir na escolha do seu sucessor.

Mas se chegar mal já sabe o que fazer. Jogará a culpa nos adversários, no PT de preferência. E irá desfrutar da vida com os benefícios de deputado federal e de presidente aposentado.

Se por qualquer razão for impedido de concluir o mandato, e a hipótese existe, não será o fim do mundo. Para um capitão punido por indisciplina e conduta antiética, foi longe demais.

Passará então à história como um presidente incidental de triste memória. O país é que terá perdido com seu insucesso. Ele, não. De todo jeito sairá no lucro.

Decreto marcado para morrer

Só uma lei pode modificar outra
Outra coisa não poderia ter dito o ministro Onyx Lorenzoni, da Casa Civil. Ele assegura que o decreto presidencial que ampliou o porte de armas é perfeitamente legal, e assim será reconhecido.

Sem empenho e com base dispersa, Bolsonaro acumula derrotas no Congresso

Cem primeiros dias de atividade parlamentar foram marcados pela dificuldade de articulação, que agora ameaça reforma administrativa

Angela Boldrini / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA- Sem base consolidada, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) acumula derrotas e pena para entender a lógica de funcionamento do Congresso durante os cem primeiros dias da 56ª Legislatura, completados neste sábado (11).

O presidente conseguiu alavancar um grande número de candidatos de seu partido, o PSL, formando a segunda maior bancada da Câmara, com 54 deputados. A sigla é, porém, a única que formalmente integra a base de seu governo. Outras 20 legendas são consideradas independentes e votam com os bolsonaristas esporadicamente.

São 325 deputados dispersos que, insatisfeitos com o tratamento dispensado pelo Executivo ao Legislativo, têm enviado uma série de recados a Bolsonaro e agido por vezes como aliados improváveis da oposição —que formalmente conta com 134 membros.

A primeira delas aconteceu em 15 de fevereiro, quando a Câmaraderrubou o decreto que alterava a LAI (Lei de Acesso à Informação)para aumentar o número de servidores que poderiam declarar sigilosos documentos.

A mais recente veio às vésperas da efeméride: na quinta-feira (9), comissão mista aprovou a medida provisória que altera a estrutura ministerial, devolvendo o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para o Ministério da Economia. Pior ainda: o texto do governo ameaça caducar caso não seja votado até o dia 3 de junho.

Se isso acontecer, a Esplanada voltará a ter o tamanho que possuía no governo Michel Temer, com 29 pastas.

Questionado na quinta se seria possível cumprir o prazo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alfinetou o Planalto: “Já vi governo com bom diálogo votar 30 medidas provisórias num dia. O governo do PT, do presidente Lula”, afirmou.

O episódio mostra outra faceta desta Legislatura: a centralização do poder de Maia, eleito com ampla maioria por seus pares —à revelia do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que trabalhou contra sua recondução ao posto.

Congresso freia decreto das armas

Câmara e Senado veem ilegalidades no texto; STF pede explicações a governo

Eduardo Bresciani, Amanda Almeida, Daniela Pereira, André de Souza e Thiago Herdy / O Globo

O Congresso reagiu ao decreto do presidente Jair Bolsonaro que facilitou o porte de armas. Parlamentares veem ilegalidades na ampliação de categorias profissionais que ganham acesso ao porte, sem aval do Legislativo. A ministra Rosa Weber, do STF, deu cinco dias para o governo se explicar, em ação protocolada pela Rede. “Se for inconstitucional, (o decreto) tem que deixar de existir”, disse Bolsonaro. Documentos do Ministério da Justiça indicam que dez categorias foram incluídas no direito a porte de arma após o decreto já estar assinado.

O decreto que facilitou a concessão de porte e liberou a importação de armas corre o risco de ser alterado ou até mesmo anulado pelo Congresso. Câmara e Senado reagiram ontem ao ato editado esta semana pelo presidente Jair Bolsonaro, apontando ilegalidades na ampliação, sem aval do Legislativo, das categorias profissionais que podem ter acesso ao porte.

Numa ação protocolada pela Rede Sustentabilidade questionando a constitucionalidade do decreto, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu cinco dias para o governo dar explicações sobre o texto. Um parecer elaborado pela Secretaria-Geral da Câmara afirma que é ilegal o decreto que ampliou o porte de armas para cerca de 20 categorias. O documento, publicado ontem, deve subsidiar a análise da Casa sobre o tema.

O parecer diz que as mudanças feitas por Bolsonaro contrariam dispositivos previstos em lei e, portanto, não poderiam ser feitas apenas por decreto. O Senado também produziu um documento sobre o tema — nele, está escrito que Bolsonaro “extrapolou” seus poderes com a medida. Segundo a nota técnica, o parágrafo do decreto que lista 20 categorias que têm o direito de andar armadas é o “mais sensível, no que diz respeito à extrapolação do poder regulamentar”.

Congresso vê ilegalidades em decreto de porte de armas

Para técnicos, presidente extrapolou suas atribuições; STF dá 5 dias para explicações

Mariana Haubert, Breno Pires, Camila Turtelli, Daniel Weterman e Naira Trindade / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Pareceres técnicos da Câmara e do Senado apontam que as mudanças na legislação que facilitaram o porte de armas teriam de passar pelo Congresso. A ministra do STF Rosa Weber deu cinco dias para que Jair Bolsonaro apresente explicações. O governo diz que decreto não tem ilegalidades.

O decreto do presidente Jair Bolsonaro que facilitou o porte de armas de fogo para 19 categorias – incluindo políticos e jornalistas – passou a ser alvo de questionamentos no Congresso e no Supremo Tribunal Federal. Ontem, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou que o governo não deve alterá-lo.

Pareceres elaborados por técnicos da Câmara e do Senado apontaram ilegalidades no documento, pois vai de encontro à legislação atual. Segundo as análises de consultores legislativos, as mudanças feitas por Bolsonaro só poderiam ocorrer se fossem feitas via nova legislação, aprovada pelo Congresso, por contrariar o Estatuto do Desarmamento. Juristas, entidades do terceiro setor e partidos políticos de oposição já haviam feito esse alerta.

Diante das dúvidas, a ministra do STF Rosa Weber deu cinco dias para que Bolsonaro apresente explicações sobre o decreto. O pedido se deu após o partido Rede Sustentabilidade entrar com ação para derrubar o decreto.

País já vive risco de entrar em recessão técnica

Analistas projetam queda do PIB no 1º trimestre, o que aumenta o risco de recessão

Cássia Almeida e Bárbara Nóbrega / - O Globo

Caso as estimativas de queda do PIB no primeiro trimestre se confirmem, o Brasil corre risco de entrar em recessão técnica, com dois períodos seguidos de índice negativo, situação que o país não vive desde 2016. Para analistas, os números ruins podem convencer o Congresso da urgência da reforma da Previdência. O governo Bolsonaro vai começar com queda no Produto Interno Bruto( PIB ), se as projeções de analistas para o primeiro trimestre se confirmarem. As previsões vão de -0,4% a -0,1%. E não está descartada a recessão técnica, quando há dois trimestres seguidos de redução no PIB, se houver revisão dos números do último trimestre de 2018, quando o crescimento foi de apenas 0,1%. É uma situação que o país não vive desde o fim da recessão em 2016.

A gravidade dos números, acreditam analistas, evidencia a necessidade de reformas estruturais e deve ajudar os parlamentares a levarem adiante a reforma da Previdência. O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, cortou a previsão de desempenho da economia entre janeiro e março deste ano de positivo para queda de 0,1% frente ao fim de 2018. No ano, sua expectativa caiu de 1,5% para 1,4%: —Os números foram muito ruins. O varejo dá sinais bastante fracos em março. O quadro é de estagnação, mas pode haver a surpresa de dois trimestres de queda. Não dá para descartar essa possibilidade. Talvez esses números negativos ajudem o Congresso a vera urgência da situação e aprovar a reforma da Previdência.

PIORA GENERALIZADA
O corte nas projeções do ano foi generalizado. O Boletim Focus, que reúne previsões de mais de cem analistas de mercado, mostrou que as estimativas baixaram de 1,7% para 1,49% em apenas uma semana. O próprio governo atualizou sua estimativa diante do crescimento menor para 1,5% este ano. Aqueda de 1,3% na produção industrial de março foi um dos principais motivos para o corte nas previsões: —A indústria teve o papel de trazer o crescimento par abaixo. Do lado da demanda, consumo, investimento e exportação estão ruins. Quase a totalidade dos setor esvai vir pi ordo que no quarto trimestre do ano passado. É uma piora generalizada —afirma Vale.

Economia lenta é desafio para cumprir regras e fechar contas públicas

Marcello Corrêa / O Globo

BRASÍLIA - Ao mesmo tempo em que trabalha pela aprovação da reforma da Previdência no Congresso, a equipe econômica trava uma dura batalha pelo fechamento das contas pública sem 2019 e 2020. Coma economia em marcha lenta, que prejudica a arrecadação de impostos, o governo terá o desafio de cumprir três regras de responsabilidade diferentes.

Para isso, terá que tomar medidas adicionais. A principal regra é a meta fiscal. Neste ano, o déficit do governo não pode superar os R$ 139 bilhões. Em março, o ministério da Economia anunciou um bloqueio de R$ 30 bilhões em gastos para garantir que essa regra seja cumprida. O contingenciamento ocorreu porque houve menos receitas e mais despesas do que eram esperadas inicialmente.

A medida deve se repetir no fim deste mês, porque a expectativa de crescimento caiu ainda mais. Em outra frente, a equipe precisa resolver um problema herdado da gestão anterior: o desequilíbrio da regra de ouro.

A norma prevê que o governo não pode se endividar para pagar gastos correntes, como salários de servidores e benefícios previdenciários. O endividamento só pode ser usado para investimentos. O problema é que, para cumprir o teto de gastos, foi preciso cortar justamente investimentos, uma vez que praticamente todo o resto do Orçamento é de despesas obrigatórias. Isso deixou um descasamento de R$ 248 bilhões nas contas deste ano. 

Para evitar que esse desequilíbrio resultasse em desrespeito à lei, o governo mandou ao Congresso um projeto de lei pedindo autorização para emitir o equivalente a R$ 248 bilhões em dívida par apagar despesas obrigatórias a partir do segundo semestre de 2019.

O básico do fundo: Editorial / Folha de Paulo

País deve preservar mecanismo de distribuição de verbas às regiões mais pobres

Gestado em 1996 para financiar o ensino fundamental e ampliado em 2007 a todo o ensino básico, o Fundeb constitui exemplo de política pública bem concebida e executada, ainda que cercada de conflitos entre os entes federativos.

Em termos simples, o fundo reúne recursos de União, estados e municípios, que são alocados de modo a viabilizar uma meta de gasto mínimo por aluno em todo o país. Para tanto, promove-se uma distribuição de verbas em favor das regiões mais pobres, o que redunda também em menor desigualdade salarial entre professores.

Só no ano passado, o mecanismo mobilizou R$ 148 bilhões, o que, segundo estimativa, representa mais de 40% da despesa pública total da creche ao ensino médio.

Ocorre que, segundo as disposições transitórias da Constituição, o Fundeb só vigorará até o próximo ano —e o debate legislativo para sua renovação, recém-iniciado formalmente, se dá em circunstâncias orçamentárias dramáticas.

Parece claro, ao menos, o consenso em torno da necessidade de manter o instrumento redistributivo. Dadas as agudas desigualdades regionais do país e a indiscutível prioridade a ser conferida à educação infantil, é o certo a fazer.

Menos inflação na mesa: Editorial / O Estado de S. Paulo

Com os preços da comida subindo mais devagar, a inflação atormentou as famílias um pouco menos em abril e a tendência parece confirmar-se em maio. Esta é uma das poucas notícias positivas do noticiário econômico, ainda carregado de informações muito ruins sobre o emprego, o consumo e a produção industrial. Os primeiros quatro meses do novo governo foram muito difíceis em quase todas as frentes da economia. No lado interno, os negócios permaneceram emperrados. No externo, as exportações têm perdido impulso e o superávit comercial tem diminuído. Mas pelo menos o orçamento familiar ficará menos pressionado, se a inflação continuar a acomodar-se e convergir de novo para a meta anual de 4,25%. Entre março e abril a chamada inflação oficial passou de 0,75% para 0,57%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

As taxas acumuladas no ano (2,09%) e em 12 meses (4,94%) ainda são muito altas, mas parece confirmar-se a tendência de arrefecimento prevista há algum tempo pelo Banco Central (BC). O custo do item alimentação e bebidas, principal motor do IPCA nos primeiros meses do ano, começa a perder impulso. Em abril, subiu 0,63%, menos de metade da taxa contabilizada no mês anterior, de 1,37%. Esse item, o mais importante na composição do índice, contribuiu em março com 0,34 ponto da taxa total de 0,75 ponto. Em abril, o impacto ficou em 0,16 ponto.

Recuos no combate à impunidade: Editorial / O Globo

Volta do Coaf à Economia e limitação aos auditores fiscais se somam a decisões polêmicas do STF

Não significa aderir a teses conspiratórias reconhecer que os últimos dias têm sido negativos para o combate à corrupção e às organizações criminosas que atuam em grandes cidades e no exterior.

Uma sucessão de decisões tomadas no Supremo e no Congresso pode causar forte retrocesso no enfrentamento de criminosos do colarinho branco, de bandidos que atuam no tráfico e exploram outros ramos do dito crime comum.

Na comissão especial que examina a MP 870, da reforma administrativa proposta pelo governo Bolsonaro, duas derrotas do Planalto fraturam a base da estrutura para reprimir a criminalidade em geral. A devolução do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, do ex-juiz Sergio Moro, para a esfera da pasta da Economia, do ministro Paulo Guedes, prejudica a integração de organismos de inteligência e forças de segurança pública do Estado para enfrentar com mínimas chances de êxito o crime organizado.

O Coaf, ao rastrear dinheiro sujo e detectar remetentes e destinatários, tem sido chave nas investigações de corrupção e acontecerá o mesmo no enfrentamento do tráfico. Sob a Justiça, o Coaf pode ser mais efetivo. Porém, uma aliança entre o Centrão e a oposição (PT à frente) retirou o Conselho de Moro —pelo menos até a votação em plenário.

O que o “mito” tem contra quem pensa?: Editorial / Revista IstoÉ

(A ideia é impor a era do emburrecimento e da alienação coletiva para manipular as massas? Já vimos esse filme)

Na guerra cultural, o clima de revanchismo ficou claro. O extermínio de ciências humanas, o corte de verbas da educação, o aniquilamento dos incentivos à arte fazem parte da mesma doutrina ideológica de retrocesso

Messias, o capitão reformado, ora na posição de mandatário da República — que, para ele, cada dia mais, vai se mostrando uma condição deveras extravagante —, resolveu expor abertamente seu decálogo de aberrações contra a Educação e a Cultura no País. Tal qual um profeta com suas tábuas da lei escritas em pedra, condizentes com os mandamentos típicos da era paleolítica, tem exaltado o evangelho da ignorância. Decapitou os recursos do ensino superior e básico. Impôs a abolição, por encolhimento de incentivos, dos cursos de Filosofia e Sociologia nas unidades públicas, tidas por ele como sem utilidade prática.

Asfixiou a Cultura limitando o alcance da Lei Rouanet. Proibiu campanhas publicitárias saudando a diversidade. Retaliou financeiramente a mídia que não lhe é simpática. Convocou alunos a filmar professores em sala de aula, ressuscitando a espionagem macarthista que perseguia supostos comunistas nos idos de 50. Fez de tudo um pouco para impor a doutrinação ultraconservadora e regressiva que marca seu interregno de poder. Isso em menos de 150 dias no Planalto.

O que ainda pode estar por vir? Os linchamentos virtuais contra tudo e todos viraram rotina. Basta se opor ao governo para automaticamente ser tachado de esquerdopata e sofrer perseguições. Na guerra cultural, o clima de revanchismo ficou claro.

Acadêmicos, músicos, artistas, autores, jornalistas, historiadores, filósofos, o conjunto de intelectuais classificados por sua turba de “comunistas” — de mais a mais uma alcunha já praticamente extinta, restando como fantasma apenas na cabeça desses bolsominions — têm de ser combatidos implacavelmente. Verdadeiras milícias torquemadas foram montadas com o intuito de responder a qualquer um que questione os métodos de Messias.

Ideólogos e gestores do bolsonarismo já esvaziaram mecanismos de avaliação dos estudantes, desmontaram instrumentos de execução do Censo de 2020, fizeram revisionismos históricos da grade curricular, estabeleceram censuras obscurantistas sob o lema da “Escola sem Partido”, cravaram a ideologia dirigida no novo regime de educação domiciliar e só não impuseram o mantra marqueteiro de campanha “Brasil acima de tudo…” nas escolas porque a grita foi grande.

Vinícius de Moraes: O amor em paz

Eu amei
E amei ai de mim muito mais
Do que devia amar
E chorei
Ao sentir que iria sofrer
E me desesperar
Foi então
Que da minha infinita tristeza
Aconteceu você
A razão de viver
E de amar em paz
E não sofrer mais
Nunca mais
Porque o amor
É a coisa mais triste
Quando se desfaz
O amor é a coisa mais triste
Quando se desfaz