sábado, 20 de julho de 2019

Merval Pereira: Em defesa da liberdade expressão

- O Globo

Presidente está se intrometendo na produção da cultura nacional, tentando direcioná-la para seu ponto de vista ideológico

A intolerância cultural é fomentada pela radicalização política que toma conta do país, da qual se tem notícia há alguns anos. A mesma Míriam Leitão que foi proibida de participar de uma festa literária em Jaraguá do Sul, Santa Catarina, devido a ameaças de grupos de extrema direita ligados ao bolsonarismo, foi agredida em 2017 em um voo de Brasília para o Rio por sindicalistas petistas que retornavam de um congresso do partido.

Da mesma maneira que o presidente Bolsonaro disse a jornalistas estrangeiros que Míriam era terrorista, e mente quando denuncia que foi torturada, os petistas do voo a chamaram de terrorista.

O ex-presidente Lula também tinha o hábito de anunciar a seu público os “inimigos” jornalistas, a mesma Míriam Leitão, William Bonner e, como diz o Gaspari, o signatário desta, entre outros.

Assim como a blogueira cubana Yoani Sánchez foi impedida de participar de um debate em 2013 na Livraria Cultura por esquerdistas, direitistas impedem autores e jornalistas vistos como de esquerda de participar de eventos públicos.

Diante do alastramento dessa cultura do ódio, a Academia Brasileira de Letras (ABL), em memorável solenidade de comemoração de seu 122º aniversário na quinta-feira, posicionou-se através da seguinte nota lida por seu presidente Marco Lucchesi:

“A ABL, sempre atenta à defesa da liberdade de expressão e condenando qualquer forma de censura, venha de onde vier, manifesta sua preocupação com recentes episódios de intolerância no âmbito de feiras de livros e festas literárias.

“Eventos desse tipo desempenham papel importante no estímulo à leitura no país, propiciando oportunidades de contato entre autores e leitores, além de expor as pessoas a uma salutar e desejada diversidade de pensamentos, experiências e pontos de vista — algo fundamental numa democracia e numa cultura de paz.

Demétrio Magnoli: Um conto de dois embaixadores

- Folha de S. Paulo

A nomeação de Eduardo Bolsonaro equivaleria a transferir as chaves da embaixada brasileira ao próprio Trump

Escrevi, para o Itamaraty, décadas atrás, um manual de Relações Internacionais destinado ao exame de ingresso na carreira diplomática.

O primeiro capítulo aborda as origens da diplomacia e as funções do diplomata. Se fosse reescrevê-lo, hoje, missão para a qual certamente não serei convidado, eu organizaria o texto em torno de Kim Darroch e Eduardo Bolsonaro.

O contraste entre as duas figuras esclarece a cisão conceitual que inaugurou a diplomacia contemporânea. Já a queda do primeiro e a ascensão do segundo iluminam o impacto do populismo sobre os corpos diplomáticos.

“O Estado sou eu” —nas antigas monarquias absolutas, o diplomata era um representante pessoal do soberano. Nessa condição, sua única qualificação indispensável era a fidelidade ao soberano. O círculo familiar do rei e a corte funcionavam como instâncias privilegiadas de recrutamento. O enviado era uma ponte entre duas cortes. Por isso, para sua escolha, pesavam positivamente eventuais relações de amizade estabelecidas por ele com os cortesãos estrangeiros.

A indicação de Eduardo obedece ao figurino do Antigo Regime. Candidamente, seu pai e ele mesmo explicaram que, na desolada planície de seu currículo, mais que o hambúrguer, destaca-se a amizade recente travada com o clã familiar de Donald Trump.

Darroch simboliza o oposto disso: representa uma nação, não um soberano. O embaixador britânico nos EUA, diplomata profissional culto e experiente, serviu a governos trabalhistas e conservadores, ocupando inúmeros cargos de alta responsabilidade. Paradoxalmente, na fonte do escândalo que provocou sua renúncia encontram-se os sinais distintivos da diplomacia do Estado-Nação.

Alvaro Costa e Silva: Vampiros de almas

- Folha de S. Paulo

Como Eduardo Bolsonaro defenderia a embaixada nos EUA de uma invasão alienígena?

Vamos supor que o deputado Eduardo Bolsonaro assuma a embaixada nos Estados Unidos. Atuando no posto mais importante da diplomacia brasileira no exterior, o que o filhão faria em caso de ameaça extraterrestre?

Calma. A pergunta é pertinente. Funda-se na informação do repórter Matheus Leitão, de que o curso do Itamaraty, para formação de oficiais de chancelaria, apresenta em sua apostilha a questão sobre os procedimentos que devem ser adotados em caso de "invasão de alienígenas oriundos de Beta Centauri". A hipótese aparece acompanhada de três outras não menos graves: terremoto, tsunami e bomba atômica.

Ao cair de paraquedas em Washington —nem mesmo o sigilo envolvendo a praxe do pedido de agrément foi respeitado—, Eduardo livrou-se de fazer qualquer curso, inclusive os de etiqueta. O que equivale a dizer que a pergunta segue sem resposta: como ele agiria diante de homenzinhos verdes, de peles rugosas, mãos em forma de garras, ondulando suas caudas?

Provavelmente não iria adiantar a tentativa de falar inglês e espanhol, ou mesmo de arranhar o português, pontuando as frases com "talquei". Pelo que imaginamos de sociedades mais avançadas, tampouco os afugentaria a pistola que o deputado costuma exibir na cintura quando posa para fotos ao lado de Silvio Santos. Grelhar um hambúrguer?Fritar um frango? Acredito que os ETs tenham paladar mais refinado. Em última instância, mandar um zap para o filho do Trump?

Fábio Zanini: Pluralismo radical

- Folha de S. Paulo

Escolha não é simples no choque entre iluminismo e pluralismo

Espírito crítico, apartidarismo e pluralismo são a Santíssima Trindade da Folha, reiterados no projeto editorial de 2017. Na era Bolsonaro, cumprir uma parte desse tripé apresenta desafios que nunca imaginaríamos até pouco tempo atrás.

Refiro-me ao pluralismo. Nos últimos meses, tenho me dedicado a ouvir a direita, e uma crítica frequente é que a Folha é esquerdista, comunista até. Por descabida que seja essa percepção, ela reflete a visão de que faltam vozes conservadoras no periódico mais diverso do país.

Não que a Folha ignore o mundo destro. Há reportagens quase diárias contemplando iniciativas como a criação de um grupo de professores universitários de direita, para dar um exemplo recente. Ou colunistas que defendem o Estado mínimo.

Mas a coisa se complica quando o centro do debate se aproxima do que era considerado uma franja. Escola Sem Partido, defesa do armamentismo, encarceramento, liberação de agrotóxicos (ops, defensivos), diluição de garantias ambientais estão na ordem do dia. É raro encontrar um colunista que defenda esses temas, por exemplo.

Fábio Fabrini: Por que só agora?

- Folha de S. Paulo

Ministro diz que paralisar investigações Brasil afora foi 'em defesa de todos'

A decisão de Dias Toffoli de paralisar investigações Brasil afora ficou com a cara daquelas iniciativas movidas pelo casuísmo, recorrente nos andares mais altos do Judiciário.

Foi há um ano e três meses que o Supremo definiu serem tema de repercussão geral as sucessivas queixas sobre a forma como os órgãos de controle dividiam dados com o Ministério Público em casos penais.

Era 13 de abril e o Brasil estava em chamas com a prisão de Lula, seis dias antes. Eleições pautadas por escândalos de corrupção se iniciariam.

Toffoli era relator de um processo que envolvia a Receita e, assim como os colegas, entendeu que seria pertinente decidir num julgamento só, no futuro, o destino daquele e de todos os outros com a mesma controvérsia: pode o Fisco, ou o Coaf, escarafunchar a vida financeira de um cidadão e enviar os detalhes à Procuradoria sem aval da Justiça?

Marcus Pestana: A socialdemocracia morreu. Viva a socialdemocracia!

- O Tempo (MG)

Ninguém mais tem dúvidas que o Século XXI embaralhou o mundo das ideias e abalou os paradigmas ideológicos. Após a Revolução Industrial vivemos sob a polaridade entre capital e trabalho, liberalismo e socialismo. O Estado mínimo cuidava apenas de assegurar curso à ordem constitucional e jurídica, preservar a estabilidade da moeda e da defesa nacional. O resto caberia à sociedade e aos indivíduos empreendedores. Era a famosa “mão invisível” de Adam Smith. As condições selvagens de organização do trabalho e da produção no mundo urbano-industrial, no entanto, despertava forte resistência dos movimentos dos trabalhadores e dos socialistas.

O fim da bipolaridade começa já no final do Século XIX, com o nascimento da tendência reformista liderada Lassalle. Começava a surgir a ideia não de uma ruptura revolucionária, mas de reformar por dentro a democracia liberal e a economia de mercado. Em 1917, o socialismo revolucionário passa a ser real com a experiência soviética. As duas grandes guerras e a profunda recessão de 1929 cristalizaram a divisão do movimento socialista. Nascia a socialdemocracia.

A dissolução da URSS e a queda do Muro de Berlim decretaram a falência do socialismo real. A globalização avançou. Vieram a internet e as redes sociais. As bases da democracia clássica começam a ser questionadas. Este é um processo em curso. Antes mesmo, o Estado assumiu configuração muito mais complexa, intervindo no mundo capitalista e democrático através da tributação, do gasto público, das políticas sociais e da regulação da economia de mercado. O fato é que os três grandes paradigmas ideológicos entraram em crise na morte do socialismo, na crise mundial de 2009 que colocou em xeque ingenuidades liberais e na crise fiscal do Estado de Bem Estar Social. Como disse outro dia o ex-deputado Roberto Brant: “Não foi a socialdemocracia que acabou, o que acabou foi o dinheiro”.

Sergio Fausto: Resquícios quentes da guerra fria

- O Estado de S.Paulo

O PT propiciou à ultradireita a chance de ressuscitar a ‘ameaça comunista’

Em palestra recente na Fundação Fernando Henrique Cardoso, o general de exército Sérgio Etchegoyen, hoje na reserva, ressaltou a importância de superarmos em definitivo o enquadramento ideológico típico da guerra fria. Em termos simplificados, este se caracterizou pela polarização entre o Ocidente cristão, capitalista e parcialmente democrático, liderado pelos Estados Unidos, e o bloco socialista, ateu e totalitário, sob a hegemonia da União Soviética. Adoto propositalmente os termos da época para ilustrar o denso caldo ideológico em que o mundo e o Brasil estavam mergulhados.

A observação do general Etchegoyen é espantosamente oportuna. Custa a crer que 30 anos após a queda do Muro de Berlim tenha não apenas sobrevivido, mas recobrado força entre nós o modelo mental que caracterizou a guerra fria.

O bolsonarismo reavivou o fantasma da comunização do País para conquistar corações e mentes pela manipulação de medos, ainda que imaginários. Culpar o bolsonarismo pode confortar o espírito, mas não explica por que a estratégia funcionou. A verdade é que o PT propiciou à ultradireita a possibilidade de ressuscitar a “ameaça comunista”. Mesmo com a Venezuela chavista e a presença cubana no país vizinho, ela teria caído no vazio não fossem a ambiguidade ideológica do PT e as simpatias de seus governos pelos de Chávez-Maduro e dos irmãos Castro. Não apenas o partido facilitou a retórica bolsonarista, como também a mimetizou, ao acusar a Operação Lava Jato de estar a serviço do imperialismo norte-americano.

Com o colapso da economia venezuelana e a perda de influência do chavismo na região, a verossimilhança da suposta ameaça comunista está em rápida decomposição.

João Domingos: A jogada de Toffoli

- O Estado de S.Paulo

Decisão amarrou o ministro Sérgio Moro e o presidente Jair Bolsonaro

A decisão do presidente do STF, Dias Toffoli, que suspendeu inquéritos e ações penais que utilizam dados compartilhados da Receita Federal e do Coaf sem autorização judicial, carrega em si muito mais do que a polêmica a respeito de danos à investigação sobre a suspeita de envolvimento do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na retenção de parte do salário dos servidores de seu gabinete nos tempos em que foi deputado estadual. Ou, por ter repercussão geral, por suspender também centenas de outros casos semelhantes em todo o País. Ou até mesma à especulação de que agora o golpe na Operação Lava Jato foi forte demais.

Na terça-feira, quando tomou a decisão de suspender as investigações com dados compartilhados a pedido do primogênito do presidente Jair Bolsonaro, Dias Toffoliatingiu por tabela o ministro da Justiça, Sérgio Moro, e uma porção de outros personagens da política.

Mesmo que o Congresso tenha retirado o Coaf do Ministério da Justiça, devolvendo-o ao Ministério da Economia a contragosto do ministro Paulo Guedes, Moro continua a ser o chefe informal do órgão de controle das atividades financeiras. A estrutura é a mesma do início do governo, quando a medida provisória que mudou a Esplanada dos Ministérios foi editada por Bolsonaro e fez a transferência do Coaf para a Justiça.

Adriana Fernandes: A velha e a nova CPMF

- O Estado de S.Paulo

Disputa de propostas de reforma tributária é gasolina pura

Jair Bolsonaro deu nesta sexta-feira um sonoro “não” à volta da CPMF. Mas a declaração do presidente não mudou em nada a intenção da equipe econômica de buscar a aprovação de uma contribuição incidente sobre os meios de pagamentos para bancar a desoneração da folha salarial das empresas.

É parte da estratégia do ministro da Economia, Paulo Guedes, justamente procurar distinguir a nova contribuição previdenciária da velha CPMF, que deixou de vigorar em 2007 depois que o Congresso rejeitou a proposta do governo Lula de prorrogar a sua vigência por mais quatro anos.

Ao dizer mais uma vez que a CPMF não volta, Bolsonaro, de certa forma, ajuda nessa estratégia da via da diferenciação. O discurso do presidente reforça o mote da área econômica de que uma coisa não é mesma que a outra, para convencer os parlamentares a encampar a ideia de uma nova contribuição na votação da reforma tributária.

A equipe econômica prepara a narrativa de que a velha CPMF é um tributo que veio em cima de vários outros tributos para aumentar a carga tributária e gerar mais arrecadação para o governo na época em que foi criada. Ela não eliminou nenhum tributo e, por isso, teria se transformado no vilão visto hoje pela sociedade. Um símbolo da pesada carga de impostos no Brasil.

O argumento usado é o de que a nova contribuição de pagamentos, a CP, como vem sendo chamada informalmente, seria um tributo mais amplo do que a CPMF. Viria como um “salvador” para eliminar outro imposto muito pior, a contribuição previdenciária das empresas, que hoje incide em 20% dos salários.

Sérgio Augusto: Exorbitâncias

- O Estado de S. Paulo

De todas as perversidades perpetradas por J. Edgar Hoover, nenhuma me enfureceu mais que o seu obstinado e mortífero acosso à atriz Jean Seberg

Vocês acompanharam. Primeiro, ele disse que o único fato grave seria a invasão dos celulares dos procuradores por um hacker. Sobre o conteúdo, silêncio. Depois, sem lograr materializar um bode expiatório nem encontrar respaldo legal para punir o mensageiro, alegou que as mensagens vazadas pelo InterceptBr seriam falsas ou adulteradas. E ainda que fossem verdadeiras, concedeu, nada tinham de ilegais.

Atolado em negaças e contradições, apelou para o seu último shazam: a teoria conspiratória segundo a qual imprensa e oposição se mancomunaram para favorecer a corrupção ou mesmo arruinar a Lava Jato.

Apelação bandida. Quero crer que só quem tem o rabo preso conspira contra a Lava Jato – e, por incrível que pareça, também contra os vazamentos, agora divulgados em cadeia. O que prevalece é a intenção de preservar a integridade da Lava Jato, apagar-lhe a imagem de uma operação judicial que parece ter virado uma holding ou uma sociedade secreta, para não usar correlatos mais próximos da esfera criminal e da avacalhação.

Assim como as denúncias contra o Banco Ambrosiano não destruíram o Vaticano, nem as pesadas críticas ao FBI e seu czar J. Edgar Hoover afetaram as atividades da PF americana, não há por que recear que imprensa e oposição possam – ou sequer pretendam – destruir a Lava Jato.

Míriam Leitão: Todos os Poderes devem obedecer a limites

- O Globo

Se Toffoli adiou o exame do tema pelo colegiado, não era urgente. Se decidiu sozinho o que antes adiara, tomou decisão intempestiva

O ministro Dias Toffoli disse que todos os órgãos de controle estão submetidos ao Judiciário. Isso é verdade, mas é mais amplo: todos estamos, inclusive o próprio ministro, porque a instituição é maior do que os seus integrantes. Ele pautou para discussão em plenário o delicado tema dos limites do compartilhamento de informações bancárias e fiscais, depois tirou de pauta e no recesso decidiu sozinho. A medida que favoreceu o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) teve o efeito de um gás paralisante sobre inúmeros inquéritos e investigações. O ministro diz que fez isso em favor do cidadão.

Um estado democrático toma extremo cuidado com os limites institucionais mesmo quando combate o crime. Mas muitas operações foram perdidas, no passado, por preciosismos habilmente explorados pelas defesas. Cabe ao Poder Judiciário saber o que é artifício e o que é defesa de princípio fundamental. Dias Toffoli pode estar certo, mas o fez da forma e na hora erradas. Se adiou o exame do tema pelo colegiado, não era urgente. Se decidiu sozinho o que antes adiara, tomou decisão intempestiva. E os efeitos colaterais foram imensos, porque está suspendendo combates a crimes como os da milícia e do tráfico de drogas.

Nesta quadra da nossa História, o Brasil está diante das muitas complexidades do combate ao velho crime da corrupção. Nada é simples, nada tem apenas dois polos. O governo Bolsonaro fez a apropriação indébita da bandeira anticorrupção. Essa luta só será efetiva se for do país. Não pertence a um grupo político. A ida do ex-juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça pareceu ser a certidão de propriedade da bandeira anticorrupção. Mas é um equívoco, e o caso do senador Flávio Bolsonaro revoga qualquer pretensão de posse.

Ricardo Noblat: Dia de cão!

- Blog de Noblat / Veja

Tudo isso em menos de 24 horas
* O presidente Jair Bolsonaro disse que a multa de 40% sobre o saldo do FGTS, em caso de demissão sem justa causa, é um peso para os patrões e dificulta o combate ao desemprego. (Depois, o governo divulgou uma nota negando a extinção da multa, por sinal prevista na Constituição.)

* Em conversa com o ministro Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, Bolsonaro chamou os governadores do Nordeste de “aqueles paraíbas”, e disse que o pior deles é o do Maranhão, Flávio Dino (PC do B). Orientou-o a não conceder nada a Dino. Em carta, os governadores nordestinos protestaram.

* “Se não puder ter filtro, vamos extinguir a Ancine (Agência Nacional do Cinema)”, ameaçou Bolsonaro. “Filtro” significa só financiar produções que estejam de acordo com os valores compartilhados pelo presidente com a ala mais extremista dos seus devotos. Doravante, nada de “Bruna surfistinha”.

* Ninguém passa fome no Brasil, disse Bolsonaro durante café da manhã com jornalistas estrangeiros. À tarde, admitiu que alguns passam fome. A 5 quilômetros do Palácio do Planalto, em uma espécie de acampamento, há pessoas com fome. Pelo menos 6 mil brasileiros morrem anualmente por desnutrição.

* Bolsonaro nomeou um delegado da Polícia Federal, ligado a produtores de terra, para a presidência da Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

* Três semanas após o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ter anunciado que o desmatamento na Amazônia aumentou 60% em junho em comparação com junho do ano passado, Bolsonaro disse que o dado deve estar errado. E ameaçou demitir o presidente do instituto que estaria “a serviço de alguma ONG”.

Tudo mentira

Hábito
O pai, Jair Bolsonaro, diz que o filho Eduardo fala inglês muito bem. Mentira!

Eduardo diz que fritou hambúrguer quando trabalhava numa lanchonete no interior dos Estados Unidos. Mentira! A lanchonete nunca vendeu hambúrguer.

Eduardo diz ser pós-graduado em economia. Mentira! Não concluiu o curso.

Essa gente mente sem pudor.

* Bolsonaro criticou a jornalista Míriam Leitão, das Organizações Globo. Acusou-a de ter mentido quando disse que foi torturada pela ditadura militar de 64. E de ter sido presa quando estava a caminho da Guerrilha do Araguaia, montada pelo PC do B no Pará. Bolsonaro mentiu, para variar. Míriam foi torturada, sim. E não foi presa quando ia para o Araguaia.

Em tempo: Bolsonaro foi afastado do Exército por indisciplina e conduta antiética. Como capitão, planejou explodir bombas em quartéis quando a ditadura militar de 64 estava nos seus estertores, e ele revoltado com isso. Até hoje, justifica a tortura e o assassinato de adversários do regime naquela época.

Bolsonaro diz que fome no País é uma ‘grande mentira’

Declaração é dada em resposta a pergunta sobre desigualdade e combate à pobreza; presidente recua depois e admite problema

Mariana Haubert / Matheus Lara / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que é uma “grande mentira” que há pessoas passando fome no Brasil, contradizendo dados da ONU e números do Datasus, do Ministério da Saúde (mais informações nesta página), em café da manhã com jornalistas estrangeiros no Planalto – a conversa foi transmitida nas redes sociais.

“Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não”, disse Bolsonaro, que, mais tarde, recuou e afirmou que “alguns passam fome”.

A declaração dada aos jornalistas estrangeiros, e que precisou ser corrigida, foi uma resposta de Bolsonaro a uma pergunta sobre desigualdade e combate à pobreza no País. “Você não vê gente, mesmo pobre, pelas ruas com físico esquelético como a gente vê em alguns outros países pelo mundo.”

O presidente também criticou políticas de cunho social de governos anteriores. “Adotou-se do governo FHC (Fernando Henrique Cardoso) pra cá, PSDB e depois o PT, (a ideia de) que distribuição de riqueza é criar bolsa”, disse Bolsonaro. “É o país das bolsas. O que faz tirar o homem da miséria, ou a mulher, é o conhecimento.”

Dados divulgados em setembro do ano passado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e um grupo de agências da ONU mostram que o combate à fome no Brasil se estagnou, apesar de o País ter saído do chamado mapa da fome em 2014.

Bolsonaro declara que fome no Brasil é mentira, mas recua após polêmica

Afirmação foi feita em café com jornalistas estrangeiros; mais tarde, presidente afirmou que alguns passam fome

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO E BRASÍLIA - Em um dia de declarações controversas em sequência, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que não existe fome no Brasil e criticou a multa de 40% do FGTS em caso de demissão sem justa causa.

A divulgação de dados sobre desmatamento e a Ancine (Agência Nacional do Cinema) também foram alvos do presidente.

Em um café com correspondentes da imprensa internacional na manhã desta sexta-feira (19), Bolsonaro negou que houvesse pessoas no Brasil passando fome.

“Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não.”

“Você não vê gente mesmo pobre pelas ruas com físico esquelético como a gente vê em alguns outros países pelo mundo”, disse o presidente, sem citar nominalmente quais nações seriam essas.

A declaração foi uma resposta a uma representante do jornal espanhol El País, que disse que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), havia manifestado preocupação com a desigualdade no Brasil e quis saber que medidas o governo tem tomado para reduzir a pobreza no país.

Mais tarde, Bolsonaro amenizou a fala. Ao fim de uma cerimônia em homenagem ao Dia do Futebol, o presidente reconheceu que “alguns passam fome” e afirmou que era inadmissível isso ocorrer em um país com as características naturais do Brasil.

Questionado se estava recuando sobre a afirmação de que não havia fome no Brasil, Bolsonaro se irritou com os jornalistas presentes.

“Ah, pelo amor de Deus, se for para entrar em detalhes, eu vou embora. Eu não tô vendo nenhum magro aqui [entre os jornalistas]. Temos problemas no Brasil, temos, não é culpa minha, vem de trás. Vamos tentar resolver”, afirmou.

'Daqueles governadores de 'paraíba', o pior é o do Maranhão', diz Bolsonaro

Declaração do presidente, que conversava informalmente com Onyx Lorenzoni, foi captada por microfones da TV Brasil

Gustavo Maia / O Globo

BRASÍLIA — Captada por microfones, uma declaração do presidente Jair Bolsonaro nesta sexta-feira provocou reações dos governadores do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), e da Paraíba, João Azevêdo (PSB). Bolsonaro conversava informalmente com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, segundos antes do início de entrevista coletiva a correspondentes de veículos de imprensa estrangeiros durante café da manhã, quando declarou:

— Daqueles governadores de... "paraíba", o pior é o do Maranhão. Não tem que ter nada com esse cara — disse o presidente para o ministro. Pelo áudio da transmissão — distribuída pela TV Brasil, que pertence ao governo federal — não é possível saber o contexto da conversa. Procurada pela reportagem, o Palácio do Planalto informou que não vai comentar o episódio.

Quando Bolsonaro citava "um picareta" e um "ex-deputado", a fala foi interrompida pelo porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, que fez uma saudação aos correspondentes estrangeiros que participaram do encontro.

Pelo Twitter, Flávio Dino escreveu que, "independentemente de suas opiniões pessoais, o presidente da República não pode determinar perseguição contra um ente da Federação". "Seja o Maranhão ou a Paraíba ou qualquer outro Estado. 'Não tem que ter nada para esse cara' é uma orientação administrativa gravemente ilegal", argumentou.

Ex-juiz federal, Dino disse que, por conhecer a Constituição e as leis brasileiras, continuará a "dialogar respeitosamente com as autoridades do governo federal e a colaborar administrativamente no que for possível". E fez referência ao artigo 37 da Carta Magna, que estabelece princípios da administração pública para dizer que respeita os princípios da legalidade e impessoalidade.

Já João Azevêdo comentou as declarações de Bolsonaro dizendo que condena "toda e qualquer postura que venha ferir os princípios básicos da unidade federativa e as relações institucionais deles decorrentes".

"A Paraíba e seu povo, assim como o Maranhão e os demais estados brasileiros, existem e precisam da atenção do Governo Federal independentemente das diferenças políticas existentes. Estaremos, neste sentido, sempre dispostos a manter as bases das relações institucionais junto aos entes federativos, vigilantes à garantia de tudo aquilo a que tem direito. Pelo seu povo. E pela sua história", escreveu o governador da Paraíba, em dois tuítes.

Bolsonaro usa informações falsas para atacar a jornalista Míriam Leitão

Em café da manhã com a mídia estrangeira, presidente acusa a colunista do GLOBO de mentir sobre ter sido torturada e afirma, equivocadamente, que ela integrou a luta armada

- O Globo

RIO — Em café da manhã com jornalistas da mídia estrangeira, na manhã desta sexta-feira, o presidente Jair Bolsonaro usou informações falsas para atacar a colunista do GLOBO Míriam Leitão. 

Ele afirmou que a jornalista integrou a luta armada contra a ditadura militar instalada no país em 1964 e dirigia-se à guerrilha do Araguaia quando foi presa, na década de 1970. Disse ainda que Míriam mente ao afirmar que sofreu abusos e foi torturada na prisão.

Na última terça-feira, a 13ª Feira do Livro de Jaraguá do Sul, em Santa Catarina, anunciou ter cancelado a participação da jornalista e de seu marido, o sociólogo Sérgio Abranches, "para garantir a segurança dos convidados" no evento, após receberem uma petição de repúdio à presença deles devido a seu "viés ideológico e posicionamento".

Intelectuais criticaram a exclusão da jornalista e do sociólogo da feira e classificaram o episódio de intolerância como "inaceitável".

Na entrevista desta sexta, ao ser questionado sobre o episódio da feira, Bolsonaro se disse "completamente aberto à liberdade de imprensa". Em seguida, acrescentou que Míriam Leitão deveria aprender a receber críticas — como ele, sustentou o presidente, teria aprendido. E, de forma equivocada, afirmou que a jornalista "tentou impor a ditadura no Brasil na luta armada".

— Ela estava indo para a guerrilha do Araguaia quando foi presa em Vitória. E depois (Míriam) conta um drama todo, mentiroso, que teria sido torturada , sofreu abuso etc. Mentira. Mentira — disse ele aos correspondentes de veículos estrangeiros.

Bolsonaro disse ainda que Míriam serve a um "império" que não tem mais "aquela força que tinha no passado", em referência à mídia tradicional, que pratica jornalismo profissional. E, com o celular na mão, o presidente exaltou o que chamou de "mídia completamente livre", em referência às redes sociais.

Presa em 1972
Em 1972, Míriam Leitão era, aos 19 anos, estudante universitária e militante do PCdoB, atuando no Espírito Santo. Suas atividades consistiam em reuniões, distribuição de panfletos e pichação de muros com palavras de ordem contra a ditadura militar instalada no país em 1964, após golpe de Estado. Durante sua militância, Míriam não integrou nem cogitou integrar a guerrilha do Araguaia.

— Não estava indo para a guerrilha do Araguaia. Nunca fiz qualquer ação armada — afirma a colunista.

Míriam foi presa em 3 de dezembro de 1972 quando ia para a praia com o então companheiro e levada para o 38º Batalhão de Infantaria do Exército, instalado no Forte de Piratininga, em Vila Velha, cidade vizinha a Vitória. Lá, grávida, foi torturada por diversos métodos e ficou encarcerada por três meses.

Em 1973, no Rio, Míriam Leitão prestou depoimento à Primeira Auditoria da Aeronáutica, onde foi julgada. Grávida então de sete meses, ela denunciou a brutalidade a qual foi submetida, mesmo correndo riscos.

— Narrei a tortura aos militares e ao juiz auditor, que fez constar nos autos um trecho do relato. Fui absolvida (das acusações) em todas as instâncias — afirmou Míriam Leitão, que, apesar da legislação após a redemocratização permitir, nunca pediu indenização pela perseguição política, a prisão e a tortura por agentes do Estado brasileiro.

Em 2014, o GLOBO publicou extenso depoimento de Míriam Leitão sobre sua prisão e tortura no 38º Batalhão de Infantaria do Exército. Leia aqui a íntegra deste relato.

Faltou governo, sobrou fiasco: Editorial / O Estado de S. Paulo

Qualquer dia, quando ninguém atrapalhar e o governo souber como executar a medida, será anunciada a prometida injeção de recursos para ativar o consumo e reanimar a economia – se a ideia ainda estiver valendo. Será na próxima semana, segundo o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, mas qualquer previsão é arriscada, depois do fiasco da quinta-feira. O lançamento oficial do plano estava previsto para aquela data, na celebração dos 200 dias de mandato do presidente Jair Bolsonaro. 

Para explicar a mudança, fontes do Executivo deram destaque a dois obstáculos inesperados: pressões de empresários da construção civil e despreparo da Caixa para cuidar da liberação do dinheiro. Esses dois fatos bastariam para caracterizar improvisação e amadorismo. Mas houve mais que isso. Ainda faltavam cálculos sobre as condições de saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

“Será uma medida muito importante para as famílias e os trabalhadores, e os detalhes técnicos ainda estão sendo ajustados”, disse na quinta-feira o ministro da Casa Civil, segundo informou o Estado. Dois dias antes o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente da República haviam falado sobre a oficialização, em breve, das medidas de estímulo.

A tendência, segundo se informou em Santa Fé, na Argentina, onde participavam de reunião do Mercosul, era apresentar a novidade na quinta-feira, em cerimônia em Brasília.

Pelas declarações iniciais, poderiam ser liberados cerca de R$ 63 bilhões de recursos do FGTS e do PIS-Pasep. Mas ainda faltavam informações a respeito dos limites e do calendário dos saques. Na sexta-feira, um dia depois de suspenso o anúncio oficial, o roteiro continuava obscuro. Mas uma novidade parecia haver-se consolidado: os titulares de contas do FGTS poderiam candidatar-se a retiradas anuais, mas, nesse caso, perderiam direito ao saque total em caso de demissão sem justa causa. De repente, o plano pareceu ganhar dimensão maior, ultrapassando o objetivo inicial de um impulso à reativação dos negócios.

Remendo econômico: Editorial / Folha de S. Paulo

Governo deixa receita liberal com ideia defensável de liberar recursos do FGTS

Em uma inusual cerimônia para celebrar 200 dias de governo, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) frustrou os que esperavam, com base em informações oriundas do próprio governo, o anúncio de medidas de estímulo à economia.

Em vez disso, o mandatário preferiu defender a indizível ideia de fazer um filho embaixador nos EUA e rechaçar a possibilidade de financiamento público para filmes como “Bruna Surfistinha”.

Enquanto isso, o país flerta com uma nova recessão —o índice de atividade do Banco Central só registrou sua primeira evolução positiva do ano em maio, depois de quatro recuos consecutivos.

A perspectiva de aprovação da reforma da Previdência é positiva, mas mesmo os mais ardorosos devotos do ministro Paulo Guedes (Economia) apontam que isso, por si só, não irá retirar o Brasil da pasmaceira em que se encontra.

De imediato, restou à equipe liberal da pasta sacar coelhos da cartola do incentivo estatal ao consumo das famílias. Anunciaram-se, nesse sentido, estudos para a liberação de R$ 30 bilhões de contas ativas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

Investimentos impulsionados pela reforma: Editorial / O Globo

Existem muitos projetos no setor de infraestrutura, prontos ou em fase de acabamento, a serem licitados

A condução de uma política econômica não pode se compor de departamentos estanques. Não se toma uma medida para surtir um determinado efeito apenas a partir do esgotamento de ações anteriores.

São processos que se entrelaçam para gerar empregos e renda de forma contínua. Nem sempre funciona, mas é imperioso tentar.

No momento, a economia brasileira ainda está presa ao atoleiro fiscal da estagnação — dois anos em que a expansão do PIB não se afastou do 1%, e o terceiro, o atual, cujas projeções são até mais pessimistas. Daí a relevância da reforma da Previdência, a primeira de outras.

Mas a retomada do crescimento também precisa de medidas de indução, no momento certo, sem voluntarismos —, como infelizmente ocorreu no passado, a partir do segundo mandato de Lula e durante o período de Dilma, sua sucessora. A expansão obtida desta forma sempre tem fôlego curto, é o chamado “voo de galinha”, de baixa altitude.

João Cabral de Melo Neto: Catar feijão

Catar feijão se limita com escrever:
Jogam-se os grãos na água do alguidar
E as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo;
pois catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

Ora, nesse catar feijão entra um risco,
o de que, entre os grãos pesados, entre
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a com risco.