sábado, 19 de outubro de 2019

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso*

• A democracia está em risco?

Sempre existe risco. Como dizia Octavio Mangabeira, a democracia é uma planta tenra, que precisa ser regada sempre. Se você não cultiva a democracia e a liberdade, elas morrem. A democracia não é só o formalismo, a eleição. É a crença num conjunto de valores e instituições. Essas instituições estão funcionando.

O Congresso existe, o Supremo está funcionando, a imprensa é livre. Os partidos estão meio arrebentados, mas existem. Temos que usar esses instrumentos para expressar opinião, não para acelerar o ritmo da História. O cara foi eleito.

Eu sei o que é viver num regime sem liberdade. Não é o caso atual. Você tem liberdade para concordar ou discordar do governo. Todo mundo sabe que eu não votei no Bolsonaro nem no candidato do Lula (Fernando Haddad), com quem me dou pessoalmente.


*Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República. Em entrevista: ‘Ainda não temos uma cultura realmente democrática’. O Globo, 18/10/2019

Merval Pereira - Gente fina

- O Globo

Áudio vazado tem o mesmo teor das negociações com o baixo clero político que levaram ao mensalão e ao petrolão

O áudio vazado por um deputado federal da bancada do PSL que revela o presidente Jair Bolsonaro cabalando votos para a destituição do líder Delegado Waldir tem o mesmo teor das negociações com o baixo clero político que levaram ao mensalão e ao petrolão.

A diferença é que o Fundo Partidário é fruto de dinheiro de origem controlada, o nosso dinheiro colocado no Orçamento para financiar os partidos políticos. O dinheiro do PT também era nosso, porém desviado das empresas estatais. Mas o caminho é o mesmo trilhado pelo PT com outros partidos, atraídos para sua base política por favores e dinheiro. Que acabou em escândalo e prisões.

Bolsonaro, na conversa gravada que tem sua legalidade garantida pelo Supremo Tribunal Federal, que já decidiu que o participante de uma conversa tem o direito de gravá-la sem a autorização da outra parte, mostra toda a sua habilidade política, muito diferente do parlapatão que surge em público sem travas na língua.

Em nenhum momento o presidente oferece vantagens ao interlocutor, mas sugere que o seu lado é mais confiável para concedê-las: “Que poder tem na mão, atualmente, o presidente, o líder aí? É o poder de indicar pessoas, de arranjar cargo no partido, é promessa para fundo eleitoral por ocasião das eleições. É isso que o cara tem, mas você sabe que o humor desse cara muda, de uma hora para outra, muda”, comentou Bolsonaro, durante a conversa com o deputado federal.

Bernardo Mello Franco - Fernando Henrique se diz dividido entre Huck e Doria

- O Globo

Fernando Henrique Cardoso continua a estimular as ambições presidenciais de Luciano Huck. No entanto, faz um alerta ao apresentador de TV:

— A decisão é dele. Vai ser político ou celebridade? Não é uma coisa fácil de se resolver. Para ser político, tem que sair na chuva e se molhar. Há espaço para ele? Há — disse o ex-presidente à coluna.

O tucano disse que precisa ser cauteloso porque o PSDB já tem um pré-candidato: o governo de São Paulo, João Doria.

— O Doria tem chance. Tem que ser realista. Na próxima eleição, o que vai estar em jogo é o Bolsonaro. Quem tiver capacidade de ganhar dele é com quem eu vou lidar.

Míriam Leitão - Como preservar e desenvolver

- O Globo

Há saídas sustentáveis para desenvolver a Amazônia. O cientista Carlos Nobre propõe a “bioeconomia com a floresta em pé”

Bioeconomia. Essa é a sugestão do climatologista Carlos Nobre no que ele chama de Amazônia 4.0. Ele foi um dos cientistas convidados a falar no Sínodo da Igreja Católica no Vaticano e conta o que ouviu e o recado que deixou. Nobre propõe que se aposte num modelo que já está se formando na Amazônia, a produção em sistemas agroflorestais. Neles, a biodiversidade é protegida até porque ela será parte do sucesso do negócio.

Carlos Nobre é um dos maiores climatologistas do mundo e já fez muitos estudos científicos sobre a região e seus impactos no clima. Desta vez, ele está falando de algo concreto para tentar responder à inquietante pergunta sobre como preservar a floresta, produzindo renda e desenvolvimento para seus habitantes.

— Chamamos de bioeconomia da floresta em pé. É a exploração de produtos da região plantados dentro da floresta, método que já se mostrou muito mais produtivo. Castanha, açaí, cacau, babaçu e outros que são exportados como produtos primários, mas que após um processo de industrialização teriam mais valor agregado. A ideia é industrializar esse potencial de biodiversidade — me disse Carlos Nobre em entrevista na Globonews.

Ricardo Noblat - Bolsonaro e a caça ao tesouro

- Blog do Noblat | Veja

Quem se habilita a dar abrigo a um presidente e aos seus filhos?

Onde já se viu um presidente da República recém-eleito brigar com o partido pelo qual se elegeu e não encontrar abrigo em nenhum outro de médio ou de grande porte?

Onde? Aqui, no país que o compositor Tom Jobim disse que não é para principiantes. Exagero ou apenas uma tirada espirituosa do autor de “Garota de Ipanema”?

Não é o que parece.

Depois de filiar-se e desfiliar-se de oito partidos em 28 anos como deputado federal, o ex-capitão Jair Bolsonaro, afastado do Exército por conduta antiética, ingressou no PSL em janeiro de 2018.

Havia rejeitado o convite de outros partidos nanicos porque eles não cederam a todas às suas exigências de mando. Alguns até se dispuseram a mudar de nome, mas isso não bastava.

Fez um bom negócio com Luciano Bivar, à época ex-deputado federal e antes candidato derrotado a presidente da República. Bivar cedeu-lhe o PSL sem impor maiores restrições.

O PSL era um partido de um único deputado federal. Bolsonaro crescia nas pesquisas de intenção de voto. E Bivar queria pegar carona na sua candidatura para voltar à Câmara.

O acerto de conveniência dos dois superou as expectativas de Bivar. O PSL elegeu 54 deputados. Mais tarde perderia um – Alexandre Frota (SP), que se mudou para o PSDB. Não faria falta.

Mas Bolsonaro precisava de um partido para chamar de seu, um partido disposto a curvar-se às suas ordens, e que contasse com muita grana para ele gastar ao seu gosto nos próximos anos.

Marcus Pestana - Ajuste fiscal e privatizações (II)

- O Tempo (MG)

Na última semana falamos sobre as privatizações como uma das ferramentas para o enfrentamento do estrangulamento fiscal e sobre o uso nobre de seus frutos contribuindo para o ajuste patrimonial de longo prazo. Não é razoável vender o patrimônio público para pagar despesas correntes.

Registramos também o ambiente contaminado por visões políticas e ideológicas anacrônicas que levantam polêmicas sem fundamento sólido ou evidências empíricas. Como foi dito, o cidadão não quer saber se a luz ou a água é estatal ou privada. Quer segurança no abastecimento, qualidade e tarifa justa. O conceito de “empresa estatal estratégica” funciona como um biombo para idiossincrasias, preconceitos e equívocos.

As empresas de serviços públicos, que não têm a natureza do serviço alterada pela privatização, precisam ser reguladas. É assim nas telecomunicações reguladas pela ANATEL, no petróleo, após a quebra do monopólio da Petrobrás, regulado pela ANP e na energia elétrica regulada pela ANEEL. Empresas privatizadas que não são de serviços públicos são reguladas pelo mercado. É assim com a Vale do Rio Doce, a EMBRAER, a CSN, a USIMINAS e a antiga AÇOMINAS.

Vou usar o exemplo de Minas no setor energético como exemplo concreto para tentar iluminar a polêmica e suas mistificações. A CEMIG e Furnas são símbolos do processo de desenvolvimento do estado com claras digitais de nosso maior estadista, JK. Cabe perguntar: a geração, transmissão e distribuição de energia elétrica sempre foram estatais? A resposta é não. A primeira usina hidrelétrica da América Latina, inaugurada em 1889, foi fruto de investidores privados que fundaram na minha cidade, Juiz de Fora, a Companhia Mineira de Eletricidade, tendo a frente o grande empresário inovador e empreendedor, Bernardo Mascarenhas. O objetivo era substituir a iluminação pública a gás pela elétrica na cidade e gerar energia para a Cia. Têxtil Bernardo Mascarenhas e outras empresas da região. Portanto, o argumento histórico não alimenta o forte preconceito contra as privatizações.

João Domingos - Jogar para perder?

- O Estado de S.Paulo

Difícil entender a estratégia de Bolsonaro na crise do PSL

A coluna deste sábado poderia se referir à aprovação da reforma tributária, uma proposta tão moderna e desburocratizante que se tornará modelo para o mundo. Ou sobre a reforma administrativa que acabou com privilégios e deixou a máquina pública enxuta e pronta para servir ao cidadão que paga impostos. Talvez a respeito do novo plano industrial. Quem sabe sobre o sucesso do programa de combate ao desemprego, que levou ao pleno emprego, fez a renda crescer e devolveu ao cidadão brasileiro esperança e felicidade.

Mas não será a respeito de nenhum desses temas. O governo nem conseguiu montar seu projeto de reforma tributária. A reforma administrativa é um sonho mais do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do que do presidente Jair Bolsonaro. O plano industrial, se existe, existe só no papel. O programa de criação de empregos ainda não apareceu. E a renda do cidadão é uma tragédia. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) com dados de 2018, divulgada na quarta-feira, 16, mostra que mais de 100 milhões de brasileiros – quase a metade da população – vivem com apenas R$ 413 mensais.

A vergonha nacional revelada pelo estudo da Pnad Contínua, com aumento ainda maior da desigualdade entre ricos e pobres, nem foi tão comentada porque um outro tema a encobriu. Trata-se da crise do PSL, o escândalo da arapongagem que grampeou todo mundo, até o presidente da República, e suas possíveis consequências para o projeto de reformas do País. Como até agora só a reforma da Previdência entrou na pauta, e esta parece estar resolvida, pois depende apenas da votação do segundo turno, pelo Senado, pode-se deixar as considerações sobre a agenda econômica para um futuro próximo. E ater-se ao comportamento político do presidente Jair Bolsonaro na crise do PSL.

José Eduardo Faria* - Negociação política e interesse coletivo

- O Estado de S.Paulo

Como pode negociar um governante que despreza a política e as regras democráticas?

A deterioração do ambiente político, decorrente da sucessão de decisões erráticas, intempestivas, insensatas e irresponsáveis do chefe do Executivo, vem tendo como consequência visível a perda da confiança dos mercados na aprovação de reformas estruturais convincentes, como a previdenciária. Isso decorre da percepção de que o capitão reformado, além de vulgar, ignaro e incompetente, não tem a habilidade necessária para negociar essas reformas com o Congresso Nacional. Os efeitos menos visíveis são a articulação cada vez mais eficiente, porém discreta, das corporações do funcionalismo na defesa de seus interesses e o modo como elas estão tratando o princípio da responsabilidade fiscal.

Essa polêmica envolve o sistema de representação de interesses e de relações entre a sociedade e o Estado. Em que medida esse sistema tem propiciado o estabelecimento de prioridades e metas com base em negociações entre os agentes representativos da sociedade brasileira?
Evidentemente, a resposta é negativa. Mas o que está ocorrendo entre nós não é muito diferente do que aconteceu em outros países em outros períodos históricos, como Portugal, depois da Revolução dos Cravos, a Grécia e a Espanha, após a crise bancária de 2008. São experiências distintas, cujo denominador foi uma reconstrução não só da economia, mas também das instituições políticas. Neste último caso, a reconstrução foi possível graças à substituição de sistemas anacrônicos de representação de interesses por estruturas novas, baseadas em grupos de interesses abrangentes e capilarizados.

Adriana Fernandes - Guerra das reformas

- O Estado de S.Paulo

Ninguém é capaz de responder com segurança a seguinte pergunta: depois da aprovação da reforma da Previdência, qual é a nova reforma prioritária?

A reforma tributária continua aprisionada à guerra fria que se instalou entre o Senado e a Câmara pela disputa da agenda econômica. Se não fosse esse embate, que ainda persiste, e a indecisão do governo Bolsonaro sobre o caminho de tramitação das propostas, muito provavelmente o projeto de reforma do sistema tributário já estaria mais adiantada no Congresso.

A verdade é que falta foco. Não se sabe até agora qual é a prioridade de fato. Ninguém é capaz de responder com segurança a seguinte pergunta: depois da aprovação da reforma da Previdência, qual é a nova reforma prioritária? Isso vale para a equipe econômica e também para as lideranças congressistas. As prioridades mudam todos os dias.
Na terça-feira passada, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse, no evento Empresas Mais do Grupo Estado, que a reforma administrativa pode andar mais rápido do que a tributária. Lideranças empresariais e da Câmara não gostaram.

Poucos dias depois, na sexta-feira, Maia voltou atrás e disse que a reforma tributária continua como prioridade da Câmara. “Não adianta reduzir gastos públicos se não trabalharmos para melhorar a produtividade das empresas”, escreveu no Twitter ao reproduzir reportagem do Estado que mostrava que o governo pode deixar para um segundo momento o envio da proposta de reforma tributária e focar na administrativa e nas medidas de ajuste fiscal para a redução dos gastos obrigatórios.

Empresários procuraram Maia para alertá-lo que não há reforma mais importante para a retomada do que a tributária. O líder do MDB, Baleia Rossi (SP), autor da PEC 45 de reforma tributária na Câmara, também reagiu no Twitter: “A reforma não vai parar”, postou. Ele e o relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), já estão com as negociações avançadas com setores.

Hélio Schwartsman - O mal do século

- Folha de S. Paulo

Querer determinar como os outros devem viver é praga que afeta a todos

O irrefreável desejo de determinar como os outros devem viver suas vidas se tornou o novo "mal du siècle". É uma praga que afeta a todos, dos religiosos que querem banir o pecado, à nova direita, que empastela exposições de arte, passando pela esquerda, em especial uma modalidade autoritária de feminismo que adora suprimir a autonomia das mulheres.

Esse grupo conseguiu com que o Congresso aprovasse um projeto de lei que obriga todos os serviços de saúde do país a comunicar à polícia, num prazo de 24 horas, toda suspeita de violência contra a mulher, independentemente da vontade da vítima. A notificação já é hoje compulsória, mas de forma anônima e em princípio só para as autoridades sanitárias, que não têm o poder de iniciar investigações criminais.

A mudança proposta me parece desastrosa, sob vários ângulos. É claro que o poder público precisa combater a violência contra a mulher, mas sem atropelar sua autonomia. Se é dado a um homem decidir se denuncia ou não uma agressão que tenha sofrido, não vejo por que a mulher não deva ter idêntica prerrogativa de escolha.

Julianna Sofia - Não será fácil

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro verá aliados se reposicionarem na votação da Previdência

Em sua versão original, a reforma da Previdência formulada pela equipe econômica de Jair Bolsonaro não tinha o condão de zerar o déficit do setor, mesmo com a potência fiscal estimada de R$ 1,2 trilhão em um período de dez anos. O propósito era conter a velocidade do aumento das despesas e elevar as receitas previdenciárias.

Pois bem. Já era bola cantada que o Congresso desidrataria a proposta. Na próxima semana, o Senado (espera-se!) deverá concluir a votação das mudanças no sistema de aposentadorias e pensões. Sem a chamada PEC paralela --um puxadinho criado pelos senadores, que terá tramitação arrastada--, o texto final deverá assegurar uma economia de aproximadamente R$ 800 bilhões em uma década.

O Tribunal de Contas da União esquadrinhou os dados e concluiu que, entre 2020 e 2029, essa reforma cobrirá menos de 20% do buraco calculado para os regimes previdenciários. Pelas projeções, seriam necessários R$ 5 trilhões para equilibrar os sistemas no período. Uma sinopse sobre a necessidade futura, e até premente, de nova revisão de regras.

Alvaro Costa e Silva - Antes que acabe

- Folha de S. Paulo

Em perigo, Amazônia vira destino preferido de visitantes estrangeiros

Uma das obras-primas do escritor Henry James é a novela "A Fera na Selva". Mas quem esteve para valer na selva foi o irmão dele, William James, que aos 23 anos visitou a Amazônia e ficou encantado com a região. Em 1865, ele percorreu o Brasil como membro da expedição Thayer e, em cartas para a família, discordou frontalmente de seu professor racista e escravista, Louis Agassiz, revelando enorme simpatia pelos povos do Alto Solimões:

"Os índios que vi até agora são ótimas pessoas, de uma linda cor acastanhada, com cabelos lindos e finos. Suas peles são secas e limpas, eles transpiram muito pouco. No fim das contas, acredito que eles são mais bem-apessoados que os negros e os brancos", escreveu o futuro filósofo. Adão no Éden, ele chegou a flertar com uma nativa: "Ah, Jesuína, Jesuína, minha rainha da floresta, minha flor do trópico, por que não pude fazer-me a vós inteligível?".

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

A estirpe e as práticas do PSL – Editorial | O Estado de S. Paulo

Desde o início do mandato, o presidente Jair Bolsonaro não manifestou interesse na formação de uma base de apoio no Legislativo. Agora, corre o risco de não poder contar nem mesmo com o seu partido para dar andamento às reformas no Congresso. O País assistiu nessa semana a verdadeiras batalhas tribais no PSL, que escancararam os piores costumes da chamada velha política. É de aguardar o que restará da legenda depois de tamanha dilaceração em praça pública. Seja como for, a disputa entre membros do PSL deixa claro que suas preocupações não estão alinhadas com o interesse nacional. Toda essa luta fratricida ocorreu a menos de uma semana de o Senado retomar a votação da reforma da Previdência. Esqueceram-se do País?

As divisões no PSL não são propriamente uma novidade. Vem de algum tempo a disputa pelo controle do partido entre o presidente Jair Bolsonaro e o deputado Luciano Bivar (PE), presidente da sigla. O grupo bolsonarista reivindica maior participação nas decisões sobre a distribuição dos recursos, o que inclui o preenchimento de cargos nos diretórios da legenda País afora.

Poesia | Carlos Pena Filho – Chopp*

Na avenida Guararapes,
o Recife vai marchando.
O bairro de Santo Antônio,
tanto se foi transformando
que, agora, às cinco da tarde,
mais se assemelha a um festim,
nas mesas do Bar Savoy,
o refrão tem sido assim:
São trinta copos de chopp,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados.

*O poema Chopp, de Carlos Pena Filho (1929/1960), citado acima, é uma fidedigna descrição do auge do Centro do Recife, na época em que, além de ser o centro comercial e intelectual da cidade, recebia os bon vivants para o happy hour.

Fundado em 1944 por um imigrante espanhol, o Bar Savoy logo cairia nas graças da boemia devido a sua localização. Fincado em uma das principais vias do coração da capital pernambucana, ele se tornaria o preferido de Lula Cardoso Ayres, Capiba, Ascenso Ferreira, Mauro Mota, Carlos Pena, Ariano Suassuna, Hermilo Borba Filho, Gilberto Freyre e de tantos outros.

Em meio à ditadura militar instaurada no Brasil, o Savoy era um diretório velado de pensadores que discutiam a redemocratização do país, mas também recebia jovens que queriam apenas se exibir e paquerar.

Entre uma cerveja e outra, era comum ocorrer concursos literários, saraus e notáveis visitas. Foram os casos de Jorge Amado, Heitor Villa-Lobos, Roberto Rosselini, Jean-Paul Sartre, Roberto Burle Marx e Simone de Beauvoir que, segundo registrou Edilberto Coutinho (1938/1995) em sua obra póstuma Bar Savoy (1995), deram o ar da graça no lugar.