segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques*

Este não será um tempo de partidos - oficialmente em crise, eles que foram moldados segundo os requisitos da sociedade industrial, hoje em trânsito acelerado para a digitalização -, mas continua a ser de homens partidos e de má política. Expliquemo-nos sobre esta última expressão: a política é má quando, por deficiência subjetiva dos atores ou pela natureza inédita das transformações que varrem o mundo, não dá conta dos fenômenos, vê-se atropelada por eles, sem conseguir identificar as boas possibilidades existentes mesmo durante os processos mais tumultuosos. E não se trata, obviamente, de uma condição fatal: ela, a política, é má quando ainda não compreende tais processos e deixa homens e mulheres comuns sem a capacidade, tanto intelectual quanto emocional, de tomar conta das forças que dirigem sua vida. Como se costuma dizer, em tais momentos os fatos, e não os sujeitos, parecem estar no comando. E os resultados em casos assim são, no mínimo, sofríveis, se não desastrosos.

*Tradutor e ensaísta, é autor de ‘reformismo de esquerda e democracia política’ (Fundação Astrojildo Pereira). “Guerras falsas, guerreiros de fancaria”, O Estado de S. Paulo, 19/1/2020.

Carlos Pereira* - Para que haja menos partidos

- O Globo

Presidencialismo brasileiro continuará fragmentado

A formatação de sistemas políticos e partidários é fruto de escolhas que sociedades fazem ao longo da sua história. Essas escolhas se dão por tentativa e erro, com adaptações e correções de potenciais problemas que vão sendo identificados por gerações futuras.

O sistema político brasileiro é conhecido pela grande permissividade de suas regras eleitorais. Uma combinação de representação proporcional com lista aberta em distritos de grande magnitude, que tem estimulado a inclusão dos mais variados interesses da sociedade no jogo político, gerando assim fortes incentivos para a criação de muitas legendas partidárias. A escolha por esse sistema inclusivo foi uma resposta aos efeitos negativos dos partidos regionais oligárquicos da Primeira República decorrentes do voto distrital majoritário.

Entretanto, os partidos, na grande maioria, não têm sido veículos de agregação ideológica ou mesmo programática, mas fundamentalmente organizações políticas que unem interesses eleitorais. Daí porque os eleitores terem tanta dificuldade de identificá-los e diferenciá-los entre si.

Atualmente, 30 partidos ocupam pelo menos uma cadeira na Câmara dos Deputados. A fragmentação é alta mesmo quando a medimos a partir do número efetivo de partidos (NEP), que leva em consideração não apenas o número de siglas partidárias, mas também o tamanho do partido em relação ao total de cadeiras do Parlamento e às demais bancadas partidárias. E, portanto, considera também a dispersão/concentração do mercado partidário. Entre 1989 e 2010, por exemplo, o NEP ficou em torno de 9, passou para 13 em 2014 e pulou para mais de 16 partidos em 2018, tornando o Brasil a democracia presidencialista mais fragmentada do mundo.

Fernando Gabeira - As dores do Rio

- O Globo

Não foram os pecados que levaram a cidade à beira do colapso. Foram escolhas econômicas e políticas

Quase não paro no Rio. É o tempo de matar saudade da família, refazer as malas, obter da emissora o sinal verde para um novo projeto e cair na estrada.

Isso aumenta minha preocupação com a cidade. No fim de semana, assisti ao filme “Coringa”. Parecia ter chegado a Gotham City. O filme começa com a notícia da greve dos lixeiros, a sujeira se acumulando e Gotham sendo tomada por uma grande quantidade de ratos.

No Rio, a notícia era o medo com a contaminação da água, as autoridades pedindo desculpas, especialistas dizendo que não há previsão de normalidade e a água mineral sumindo do mercado.
Em Gotham City, a polícia baixava o pau na multidão fantasiada de palhaço que se indignou com as autoridades e protestava contra os ricos. No Rio, cassetetes, gás lacrimogênio contra uma multidão fantasiada que, ao que parece, queria apenas extravasar sua alegria.

Não é a primeira vez que o Rio se parece com as metrópoles distópicas do cinema. Tive sensação semelhante ao ver “Blade Runner”, que era uma investigação sobre o futuro.

A diferença é que no filme sobre cidades do futuro, a natureza já não tem nenhum papel. Gotham City trata do lixo produzido pelo consumo, as luzes são artificiais, assim como os reflexos que pontuam a narração dramática.

É impossível dissociar a natureza do Rio, mesmo na sua decadência. Talvez seja por isso que, no meio da década de 50 do século passado, Rubem Braga escreveu sua célebre crônica “Ai de ti, Copacabana”.

Ana Maria Machado - Um terreno comum

- O Globo

Ideias progressistas ou virtudes éticas não são monopólio de um só lado

Sensatez em uma área não é incompatível com sanidade em outra. É possível apoiar o combate a milícias e querer a privatização da Cedae, por exemplo. Ser de centro esquerda e defender votos dissidentes como o de Tabata no caso da Previdência e o de Freixo no pacote anticrime. Ou considerar que alguns excessos ultrapassam linhas a respeitar mas também ter certeza de que a Lava-Jato faz bem em ser firme no combate à corrupção de quem foi convivente e não inocente.

Exercer autoridade sem abuso pressupõe seguir as leis. Mas não significa blindar poderoso. Criticar arbitrariedades na investigação não impede de reconhecer corrupção sistêmica e querer sua punição. Sem jogadas marotas.

Ricardo Noblat - Escolha de Regina Duarte para Cultura é um aceno à Rede Globo

- Blog do Noblat | Veja

Conversas de bastidores
Ao convidar a atriz Regina Duarte para secretária ou ministra da Cultura do seu governo, o presidente Jair Bolsonaro levou em conta o conselho de vários dos seus ministros de que é preciso que ele busque uma maneira de estabelecer uma relação menos conflituosa com a Rede Globo de Televisão, a quem tem tratado tão mal.

No final do ano passado, para surpresa do comando da emissora, um dos seus diretores foi convidado para uma conversa com o ministro da Educação Abraham Weintraub. Ouviu do ministro que até exércitos em guerra muitas vezes concordam em suspender os combates para o recolhimento dos seus mortos e feridos.

Este ano, o mesmo diretor foi chamado para um encontro sigiloso com Bolsonaro, o primeiro desde que o atual governo tomou posse. Embora fora da tela há algum tempo, Regina faz parte do elenco fixo da Globo. Seu nome foi bem recebido por parte da classe artística do Rio. O que por enquanto não quer dizer que ela aceitará o convite.

A atriz é estreitamente ligada aos tucanos paulistas. Não dirá sim ou não a Bolsonaro sem antes consultar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – se é que ainda não o fez. Sua decisão ficou para hoje. Bolsonaro já tem outro nome para o cargo caso ela o recuse.

Sem pressa, por medo de derrota

Aliança para depois
O menos interessado na formação imediata do partido Aliança pelo Brasil é o presidente Jair Bolsonaro. Ele teme que seu partido, e o dos seus filhos, montado assim às pressas, acabe tendo um desempenho pífio nas eleições municipais de outubro próximo.

Bolsonaro prefere testar as chances do Aliança só nas eleições gerais de 2022 quando imagina que a avaliação positiva do seu governo estará em alta. Este ano, se limitará a apoiar poucos candidatos de outros partidos com os quais tenha afinidade ideológica.

Marcus André Melo* - O poder do presidente

- Folha de S. Paulo

A combinação de Executivo institucionalmente fraco e governabilidade é inédita

Há certo consenso que as relações Executivo-Legislativo sob Bolsonaro têm se dado em um novo padrão: em vez de propalada expansão do poder presidencial em um governo iliberal, observamos sua redução.

Há duas questões inter-relacionadas: ocorreu transformação (estrutural ou cosmética)? O que a causou? A chave para ambas é a excepcionalidade das circunstâncias da ascensão de Bolsonaro: uma tempestade perfeita resultante da conjugação de escândalo ciclópico de corrupção e crise econômica inédita. Como consequência a corrupção substituiu as questões redistributivas e de inclusão como eixo vertebrador da disputa política.

O cataclismo levou ao impeachment, à destruição das reputações das principais lideranças e à proibição do financiamento empresarial de campanhas. Como consequência, os fatores decisivos para as eleições no passado —financiamento de campanha, tempo de TV, tamanho das alianças— perderam importância, e permitiram que um outsider brandindo bandeiras novas —corrupção e segurança— se tornasse politicamente viável.

Celso Rocha de Barros* - Não há nada de normal em nada disso

- Folha de S. Paulo

As instituições estão rechaçando o autoritarismo, mas não é normal que sejam testadas todo dia

Na semana passada, dois artigos foram publicados colocando em questão a tese de que a democracia brasileira está ameaçada. Eu defendo que está, por isso vou discuti-los.

Os artigos são “Apesar dos alarmistas, um país normal”, de Fernando Schüler, publicado nesta Folha, e “Ih...A democracia brasileira não ruiu”, de Carlos Pereira, publicado no Estadão.

O artigo de Pereira se baseia em um estudo do cientista político Kurt Weyland que concluiu que populistas só ameaçam a democracia quando as instituições são fracas e quando seus governos transcorrem na recuperação de uma crise econômica aguda.

O artigo de Weyland é muito interessante, mas tem problemas. Em um dado momento, argumenta que Collor não conseguiu consolidar-se como populista porque não resolveu a crise econômica da hiperinflação (correto) e porque o Brasil tinha um histórico de 20 anos em que todos os presidentes terminaram seus mandatos, o que é errado.

Não se pode usar estabilidade da ditadura como índice de robustez da nova institucionalidade democrática. E Weyland não fez uma análise estatística, mas de uma comparação usando o método booleano de Charles Ragin. Não desqualifico o método, que é uma tentativa de lidar com amostras pequenas, mas sugiro cautela em citar as conclusões obtidas dessa maneira como “demonstrações”. Nem análises estatísticas são isso.

Vinicius Mota - Política da presepada

- Folha de S. Paulo

Atos ridículos e insultos vicejam com testosterona de mais e capacidade de menos

O que acontece quando chega ao governo federal um conjunto de ressentidos que passou a vida gramando para tirar uma nota C na prova, achava que bons modos eram coisa de pessoas frescas e sobrevivia das migalhas do poder?

Acontece o governo Jair Bolsonaro.

A insciência passa a ser vendida como virtude, e o insulto, como método de comunicação. Mas, porque competência não se improvisa, a presepada amiúde vira a resultante do entrechoque entre habilidade de menos e testosterona de mais.

A dicção imperial de Roberto Alvim a interpretar o arauto genocida do 3º Reich, embolado numa maçaroca simbólica, talvez não ache rival na escala de cenas ridículas já originadas na Esplanada dos Ministérios. Mas a distância para outras quixotadas deste governo é apenas de grau.

No Carnaval passado, o presidente veiculou imagens obscenas a pretexto de denunciar o que considera indecência. A escatologia —as alusões a detritos e excrementos— nunca frequentou tanto a expressão de um chefe de Estado brasileiro, o que é tema para psicanalistas.

Leandro Colon – Conflito de interesse na Secom

- Folha de S. Paulo

Presidente reage sob pressão; caso contrário, barco segue, como nos casos do Turismo e da Secom

As redes sociais amanheceram em chamas na sexta (17) com o nefasto vídeo de Roberto Alvim, então secretário de Cultura do governo, copiando discurso nazista.

Autoridades do Legislativo e do Judiciário repudiaram logo cedo. O mundo político, de esquerda e de direita, se manifestou imediatamente.

Por volta das 10h, a assessoria da Presidência informou por escrito que não comentaria. Somente minutos depois das 13h, Jair Bolsonaro anunciou a demissão de Alvim.

Ele titubeou em mandar embora quem, um dia antes, chamara de “secretário de verdade”. A demissão ocorreu mais em razão da cobrança de outros Poderes do que pela convicção do presidente de que não havia outro caminho a tomar. Bolsonaro só reage sob pressão política. Se demora a chegar, o barco segue.

Ruy Castro* - A Terra é chata

- Folha de S. Paulo

Estou a fim de concordar com os terraplanistas. Mas, antes, meu cérebro terá de virar uma pizza

Um novo planeta foi descoberto por um satélite da Nasa. Fica na primeira galáxia à direita depois do Sol, a cem anos-luz daqui. É um pouquinho maior que a Terra e, como se constatou, redondo, em forma de globo.

Também como a Terra, gira em torno de si mesmo e de uma estrela e é dilatado nos polos e achatado no equador, ou vice-versa. Eles o estão chamando de TOI 700 d, sendo TOI a sigla em inglês para “Objeto de Interesse do Tess”. Tess é a nova sensação das varreduras espaciais: um satélite caça-planetas. Desde que entrou em ação, em 2018, já achou três.

Para descobrir um planeta, o Tess passa 27 dias observando uma estrela, de olho em qualquer oscilação de seu brilho. O que, se acontecer, terá sido provocado pela passagem de um corpo celeste —um planeta— ao redor dela. A vida é meio parada no espaço, donde não há outras opções. Mas, para não restar dúvida, exige-se que tal oscilação se dê pelo menos três vezes. Cada operação congrega um batalhão de cientistas, quase todos nóbeis, fazendo cálculos fora do alcance da nossa aritmética escolar.

Denis Lerrer Rosenfield* - Impostura

- O Estado de S.Paulo

Lula se colocar como defensor da democracia contra o presidente Bolsonaro é hilariante

É bem verdade que o atual governo tem dado ensejo a um pendor autoritário, como quando o próprio presidente mostra intolerância no tratamento com a imprensa ou seus filhos investem nas mídias sociais tratando todos os que deles discordam como inimigos. A crítica não é bem vista, apesar de constituir um elemento central de qualquer sociedade democrática, baseada no diálogo, seja com os Poderes republicanos, seja com a opinião pública em geral. Contudo a reação de setores da esquerda a essa atitude bolsonarista, colocando o PT, seus grupos e partidos assemelhados como defensores da democracia, é claramente uma impostura. Que essa esquerda queira se colocar como polo democrático só serve para enganar incautos. Pretende borrar o seu próprio passado.

O presidente Jair Bolsonaro, apesar de seus arroubos, não tomou nenhuma medida autoritária no encaminhamento de leis ou no exercício do Poder Executivo. Uma coisa é a sua narrativa, que obedece a uma lógica eleitoral, outra, muito diferente, é sua não apresentação de medidas concretas que coíbam a liberdade de pensamento ou empreendam a perseguição social ou policial de seus adversários. Algo inverso fazia o PT no governo. Sua narrativa era supostamente democrática e suas medidas práticas na arte de governar eram frequentemente autoritárias, embora procurassem se legitimar “socialmente”. Aqui “socialmente” significa o controle petista da sociedade.

No governo Lula, mais que no governo Dilma, várias foram as iniciativas de criação de conselhos ditos populares, visando, no discurso, a “democratizar” a sociedade. Várias foram as iniciativas, nesse sentido, de controle dos meios de comunicação, além do financiamento das mídias “amigas”, irrigadas com dinheiro público, o que, aliás, hoje criticam no atual governo. “Conselhos populares” foram constituídos pretensamente enquanto órgãos de interlocução com a sociedade, quando, na verdade, eram instrumentos de controle do próprio partido, seja atuando diretamente ou por intermédio de seus “movimentos sociais”. O governo Bolsonaro não só não tomou nenhuma iniciativa desse tipo, como aboliu os ditos conselhos, ferramentas autoritárias.

José Goldemberg* - O ‘fim da História’ e da inovação

- O Estado de S.Paulo

Analistas questionam se não atingimos os limites do nosso conhecimento científico

Em 1992 Francis Fukuyama, um renomado cientista político norte-americano, publicou um livro intitulado O Fim da História, que teve enorme repercussão. Nele o autor argumenta que a queda do Muro de Berlim e o fim do império soviético significavam a vitória final do capitalismo com liberalismo econômico e democracia. A globalização da economia mundial nas últimas décadas e a redução dos conflitos provocados pelo nacionalismo exacerbado, que levou às grandes guerras mundiais do século 20, parecem confirmar a análise de Fukuyama.

O único desafio real a essa visão da História foi a ascensão do Estado Islâmico, que, apesar do grande impacto que teve, não abalou a estrutura mundial. Até a China, que poderia mudar o curso do desenvolvimento da História com um novo socialismo, se incorporou à grande corrente mundial da globalização, apesar das suas restrições internas à democracia.

Em outras palavras, parece plausível a visão de Fukuyama de que o desenvolvimento social e econômico mundial teria atingido um nível tal que evitaria as grandes revoluções e guerras do passado, que, em geral, são o objeto do que se chama de História.

Mais recentemente surgiram outras análises que mostram que o mesmo pode estar acontecendo com a tecnologia e até com a própria ciência. Estudos sobre o “fim da tecnologia” e mesmo sobre o “fim da ciência” estão se tornando populares.

O primeiro desses estudos, feito por Robert Gordon, professor de uma universidade americana, atribui a estagnação da economia dos EUA nas últimas décadas ao fato de que a produtividade deixou de crescer na segunda metade do século passado. O professor Gordon argumenta que isso se deve ao fato de que os avanços tecnológicos mais recentes – principalmente na área da computação e informática – não são tão impressionantes como os que ocorreram na primeira metade do século 20, quando máquinas de lavar roupa, geladeiras, ar-condicionado, automóveis e aviões mudaram o mundo de uma maneira revolucionária e o que estamos presenciando hoje são apenas pequenos aperfeiçoamentos, muitos dos quais de caráter puramente comercial.

As ideias que captam hoje as manchetes dos jornais são inteligência artificial, automóveis sem motorista e viagens espaciais, que ainda não tiveram grande impacto na vida das pessoas e até sua necessidade está sendo questionada.

Bruno Carazza* - Férias numa colônia penal

- Valor Econômico

Rotina de presos da Lava Jato reproduzia privilégios

A vida dos detentos da Lava-Jato melhorou muito quando puderam utilizar na cadeia um produto denominado “bloqueador de odores sanitários”. Com o problema do mau-cheiro resolvido, o cotidiano na sexta galeria oferecia um serviço cinco estrelas comparado com as demais prisões no Brasil: rádio e TV liberados, um pátio maior para fazer exercícios físicos e livre trânsito entre as celas dos colegas.

A cena é descrita por Wálter Nunes em “A Elite na Cadeia: o dia a dia dos presos da Lava Jato”, lançado recentemente pela editora Objetiva. Repórter da “Folha de S.Paulo”, Nunes cobriu in loco o entra-e-sai de políticos e executivos de algumas das mais importantes companhias do país na carceragem da Polícia Federal em Curitiba e no Complexo Médico Penal de Pinhais.

Nos plantões em que acompanhava os efeitos de decisões judiciais e acordos de delação premiada no âmbito das várias fases da operação, o jornalista obteve a confiança de agentes penitenciários, carcereiros e diretores das prisões, além de advogados e parentes dos detentos, que lhe contaram o comportamento e a rotina dos presos mais famosos do Brasil - relatos esses que são a matéria-prima do livro.

A presença de políticos, empreiteiros, lobistas, doleiros e dirigentes de estatais no sistema prisional é um feito incomum dado nosso longo histórico de leniência não apenas com a corrupção, mas com os chamados crimes de colarinho branco em geral. Não é à toa que menos de 1% da população carcerária brasileira tem curso superior.

As prisões brasileiras são uma amostra, em cores ainda mais sombrias, da imensa desigualdade social brasileira, e o livro-reportagem de Wálter Nunes mostra como esse sistema gera privilégios para os mais ricos e poderosos até mesmo na cadeia.

Luiz Carlos Mendonça de Barros* - Finalmente estamos fora do buraco negro

- Valor Econômico

Para trazer a carga tributária a um nível que estimule a atividade empresarial será necessário enfrentar o mito da Constituição cidadã

Podemos, neste início de ano, dizer com segurança que, depois de seis anos de muito sofrimento, as consequências mais perversas criadas na sociedade brasileira por uma quase depressão econômica estão ficando para trás. Ainda que de maneira tímida o crescimento econômico está voltando e, mantida nos próximos anos a política econômica atual, poderemos progressivamente nos afastar das piores armadilhas criadas pela incompetência dos governos petistas em seus mais de 12 anos de poder.

Antes de continuar, faço uma observação que tem sido pouco citada pelos analistas sobre este período: nós só não vivemos a verdadeira depressão econômica porque não tivemos no Brasil uma crise bancária que, normalmente, vem associada à queda do PIB na dimensão da ocorrida em 2015 e 2016. Evitamos esta armadilha porque no governo Itamar Franco, com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no comando da economia e Gustavo Loyola na presidência do Banco Central, uma corajosa reestruturação do sistema bancário brasileiro, que se chamou Proer, foi levada adiante com muito custo para o Tesouro federal.

E por uma armadilha que a história sempre prega, o Proer foi violentamente criticado à época pelo PT e demais partidos de esquerda sem que soubessem que, mais de vinte anos depois, ele evitaria que uma catástrofe ainda maior ocorresse no governo da ex-presidente Dilma Rousseff.

Feitas estas observações, volto agora ao eixo central desta coluna que é a confirmação de que deixamos o pior da crise para trás e entramos agora em nova fase, denominada pelos economistas de recuperação cíclica. De certa forma esta coluna é o complemento de outras escritas por mim ao longo do ano passado em que tratei da minha convicção de que este momento ocorreria ainda em 2020. Esta confiança nascia da observação de vários momentos da história em que economias de mercado sofreram - por erros de gestão de seus governantes - uma queda violenta da atividade econômica. Em um primeiro momento ocorre uma queda no vazio - vejam o gráfico acima - seguida por uma recuperação ainda lenta, caso uma política econômica adequada seja implementada. E foi o que ocorreu no governo Temer e, de forma mais abrangente e segura, agora em 2019, a partir de reforma da Previdência e da gestão fiscal de alta qualidade e disciplina.

Fórum de Davos este ano será mais verde

A edição deste ano de Davos, que marca seus 50 anos, será inevitavelmente mais verde. A discussão ambiental supera o número de sessões previstas para macroeconomia. Muitos ministros de Meio Ambiente participarão do evento - mas não o brasileiro Ricardo Salles

Por Daniela Chiaretti – Valor Econômico

São Paulo e da Cidade do Cabo (África do Sul) - Greta Thunberg antecipou há dez dias o tom de sua participação no Fórum Econômico Mundial, que acontece esta semana em Davos, na Suíça. É a segunda vez que a jovem ativista sueca vai ao principal encontro mundial de chefes de Estado, empresários e executivos do mercado financeiro. “Nossa casa está queimando”, disse a adolescente a uma plateia surpresa com sua retórica, em janeiro de 2019, ano em que grandes incêndios de diferentes origens queimaram a Amazônia, a Califórnia e a Austrália, sempre agravados pela mudança do clima. Desta vez Greta promete tocar no ponto fraco do debate e dizer aos líderes que deixem de investir em combustíveis fósseis. A edição de Davos este ano, o 50º aniversário do encontro, será inevitavelmente mais verde.

Quase três mil participantes são esperados. Muitos virão em jatinhos emitindo grandes volumes de gases-estufa, como bem disse a CNN. Trata-se de uma contradição evidente em encontro onde questões ambientais ligadas à mudança do clima estão entre as cinco maiores preocupações dos líderes pela primeira vez em 10 anos, segundo o relatório de riscos globais do Fórum Econômico Mundial feito anualmente pelo Marsh & McLennan e a seguradora Zurich.

Falando em nome da sua geração, Greta publicou um artigo no “The Guardian” onde diz: “Exigimos que no fórum deste ano, participantes de todas as empresas, bancos, instituições e governos interrompam imediatamente todos os investimentos na exploração e extração de combustíveis fósseis, encerrem já todos os subsídios em combustíveis fósseis e deixem de investir imediata e completamente em combustíveis fósseis”. Como se pudesse ser mais clara, seguiu: “Não queremos que essas coisas ocorram até 2050, 2030 ou mesmo em 2021. Queremos que sejam feitas agora, neste exato momento.”

‘Desigualdade global está fora de controle’

Grupo de 2.153 bilionários tem mais riqueza que 4,6 bilhões de pessoas, diz Oxfam

Por Daniel Rittner – Valor Econômico

Davos (Suíça) - Um grupo de apenas 2.153 indivíduos no mundo com patrimônio superior a US$ 1 bilhão detém mais riqueza do que 4,6 bilhões de pessoas, o equivalente a 60% da população global, conforme indica um novo levantamento da rede de organizações não-governamentais Oxfam. O estudo chega à conclusão de que o número de bilionários dobrou na última década e a desigualdade econômica está fora de controle.

“Os 22 homens mais ricos do mundo detêm mais riqueza do que todas as mulheres da África”, compara a Oxfam no relatório, lançado horas antes da abertura do Fórum Econômico Mundial, em Davos. Para ilustrar o “grande fosso” de renda, há uma ilustração: se alguém tivesse juntado US$ 10 mil por dia desde que as pirâmides do Egito começaram a ser construídas, teria hoje só um quinto da fortuna média dos cinco maiores bilionários do planeta. Enquanto isso, quase metade da população global sobrevive com menos de US$ 5,50 por dia.

O estudo renova as discussões sobre concentração de renda e desigualdade, que estiveram no topo da agenda durante todo o ano passado, com manifestações espalhadas pela América Latina, além de protestos na França e no Líbano. Muitos atos, como no Chile, desaguaram em crise política.

Davos vai propor um novo capitalismo

O “Manifesto de Davos 2020” estabelece como premissas: pagamento justo de impostos, tolerância zero com a corrupção, proteção do meio ambiente, estímulo à qualificação dos empregados, uso ético das informações privadas na era digital, vigilância dos direitos humanos em toda a cadeia de fornecedores e remuneração responsável dos executivos

Por Daniel Rittner – Valor Econômico

Davos (Suíça) - O Fórum Econômico Mundial começa hoje sua 50ª reunião anual, no pacato resort alpino de Davos, tentando colocar em prática uma cartilha lançada meio século atrás por seu fundador, Klaus Schwab, para guiar as práticas corporativas. Agora, diz o alemão de 81 anos e sotaque carregado, a hora de colher uma reforma do capitalismo finalmente chegou. Tanto que ele lançou o “Manifesto de Davos 2020” para atualizar conceitos pensados originalmente em 1971.

Nunca foi tão urgente, segundo Schwab, dar significado concreto à ideia de um “capitalismo das partes interessadas” (stakeholder capitalism) no lugar de outros dois modelos em voga nas últimas décadas. O “capitalismo de acionistas” teve seu momento de esplendor enquanto centenas de milhões de pessoas prosperavam, tinham acesso a bens de consumo inéditos, empresas abriam novos mercados e empregos eram criados.

O que a mídia pensa – Editoriais

Ano de reformas – Editorial | O Estado de S. Paulo

Se o presidente Jair Bolsonaro pretende fazer de 2020 um ano de avanço econômico e social do País, será preciso não tratar esse período apenas como um ano de eleições e de campanha eleitoral. Para uma retomada da economia consistente, apta a gerar confiança e emprego e a aumentar a produtividade, o governo federal precisa ser capaz de tornar 2020 um ano de efetivas reformas.

Em 2019, o Congresso aprovou, mesmo sem o apoio integral do Palácio do Planalto, uma importantíssima reforma da Previdência. Mas neste ano, com as eleições municipais de outubro, será difícil que o Poder Legislativo leve adiante uma agenda reformista sem a ajuda efetiva, de negociação e coordenação, do Poder Executivo. Além disso, por óbvio, neste ano, é mais que necessário que o presidente Jair Bolsonaro e seu entourage se abstenham de produzir crises e instabilidades políticas.

Recentemente, o Estado mostrou o alto risco que as eleições municipais representam para a tramitação das reformas no Congresso. Em toda campanha eleitoral, tem-se forte pressão para postergar a discussão e a aprovação de temas considerados espinhosos, mesmo que sejam prioritários para o País. É como se todos os temas que não geram imediatos efeitos positivos perdessem urgência e relevância, dando a equivocada impressão de que os grandes desafios nacionais podem esperar. E aí está a grande ameaça para um 2020 produtivo: que o presidente Jair Bolsonaro assuma uma atitude eleitoreira, de cálculo imediatista, em cada decisão e negociação.

Poesia | Manuel Bandeira - Louvação a cidade do Rio de Janeiro

Louvo o Padre, louvo o Filho
E louvo o Espírito Santo.
Louvado Deus, louvo o santo
De quem este Rio é filho.

Louvo o santo padroeiro
- Bravo São Sebastião -
Que num dia de janeiro
Lhe deu santa defensão.

Louvo a Cidade nascida
No morro Cara de Cão.
Logo depois transferida
Para o Castelo, e de então
Descendo as faldas do outeiro,
Avultando em arredores,
Subindo a morros maiores
Grande Rio de Janeiro!

Rio de Janeiro, agora
De quatrocentos janeiros...
Ó Rio de meus primeiros
Sonhos! (A última hora
De minha vida oxalá
Venha sob teus céus serenos,
Porque assim sentirei menos
O meu despejo de cá.)

Cidade de sol e bruma,
Se não és mais capital
Desta nação, não faz mal:
Jamais capital nenhuma,
Rio, empanará teu brilho,
Igualará teu encanto.
Louvo o Padre, louvo o Filho
E louvo o Espírito Santo.